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APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA! Olá! Seja muito bem-vindo(a) à disciplina de Direito do Estado, vamos estudar juntos? Meu nome é Marialva de Souza Silva, sou professora de Direito no Instituto Federal de Rondônia, Campus Porto Velho Zona Norte, e atuo na docência há quatro anos. Sou mestranda em Educação pela Universidade Federal de RO; especialista em Metodologias Ativas aplicadas ao Ensino Superior e em Gestão da Educação a Distância; possuo Formação Pedagógica para Graduados Não Licenciados. Acredito que os aprendizados que obtive até aqui são de imensa importância para a construção do conhecimento nesta graduação de Gestão Pública. Será um prazer estar com você nesta disciplina de Direito do Estado, em que iremos estudar os seguintes conteúdos: • A supremacia da Constituição; • Princípios e regras; • O poder constituinte originário e derivado; • A aplicabilidade das normas constitucionais; • Direitos fundamentais (individuais e sociais) e cidadania; • Os direitos difusos e coletivos na Constituição Federal; • O controle de constitucionalidade sobre as leis e os atos normativos do poder público; controle de constitucionalidade difuso e concentrado; • Os princípios constitucionais voltados para a administração pública; • A organização administrativa; administração direta, indireta e terceiro setor; • A responsabilidade do Estado; • Os servidores, seu regime jurídico e previdenciário; • O controle sobre a administração pública: legalidade e transparência; participação popular e os Tribunais de Contas; • Discricionariedade e controle judicial sobre a administração pública; • O papel do Ministério Público no controle da administração pública; • Os regimes políticos e a participação popular; • A teoria da representação; • Os partidos políticos; • Os partidos e a escolha do governante; • Os partidos e a representação da opinião pública; • Os sistemas eleitorais; • O voto e as distorções; • A igualdade eleitoral e o acesso ao poder; • O direito eleitoral no Brasil; • A justiça eleitoral; • Os recursos em matéria eleitoral. Nosso estudo tem o objetivo de fazer com que você, estudante, tenha condições de compreender a importância do direito constitucional, do direito administrativo e, ainda, noções de direito eleitoral; o significado dos institutos fundamentais; o domínio de conceitos e da terminologia jurídica, bem como a argumentação, a interpretação e a valorização dos fenômenos jurídicos e sociais pertinentes ao direito em geral. Faremos nosso estudo de forma a abordar os pontos mais utilizados no seu dia a dia como gestor púbico. Não esqueça de observar a bibliografia recomendada no plano de ensino da disciplina, e procure sempre estar atualizado acerca das matérias, pois o direito é muito dinâmico e está em constante transformação. Outra dica não menos importante é a leitura da legislação indicada, isso é fundamental! Ademais, a disciplina está organizada em seis unidades temáticas e é composta por duas atividades de percurso, avaliação regular, avaliação em segunda chamada (espero que não seja necessário!), e exame final. A disciplina foi elaborada para que você realize os estudos de forma gradual e de acordo com a ementa proposta no Projeto Pedagógico do Curso. Bons estudos! Professora Marialva de Souza Silva 😊 UNIDADE I 1 A SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO; 2 PRINCÍPIOS E REGRAS; 3 PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO E DERIVADO; 4 APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS. Prezado(a) aluno(a), Nesta unidade temática, estudaremos a Supremacia da Constituição; seus Princípios e Regras; o Poder Constituinte Originário e Derivado; a Aplicabilidade das Normas Constitucionais. O objetivo é que, ao final desta unidade, você consiga: • Reconhecer o conceito do direito constitucional; • Identificar o conceito de Constituição; • Entender a supremacia da Constituição Federal; • Conhecer a diferença entre normas, princípios e regras; • Reconhecer os fundamentos e reflexos do poder constituinte originário e derivado; • Descrever a aplicabilidade das normas constitucionais e a ductibilidade principiológica dos direitos fundamentais. 1 A SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO Antes de falarmos mais especificamente sobre a Constituição, é importante destacar que o direito constitucional é o tronco do qual derivam todos os demais ramos da grande árvore jurídica, e seu objeto de estudo é a Constituição Federal. Já a Constituição é a lei fundamental e suprema de um Estado, criada pela vontade soberana do povo. É ela que determina a organização político-jurídica do Estado, dispondo sobre a sua forma, os órgãos que o integram e as competências destes e, finalmente, a aquisição e o exercício do poder. E, segundo o professor Alexandre de Moraes (2010), cabe também a ela estabelecer as limitações ao poder do Estado e enumerar os direitos e as garantias fundamentais. É importante ressaltar que a doutrina1 não tem um entendimento exato (uníssono) quanto à definição do conceito de Constituição, que pode ser analisado a partir de diversas concepções. Isso porque o direito não pode ser estudado isoladamente de outras ciências sociais, como sociologia e política, por exemplo. Para estudarmos a supremacia da Constituição, é imprescindível conhecer um pouco do trabalho do doutrinador austríaco Hans Kelsen, criador da teoria pura do direito. No sistema proposto por Kelsen, o fundamento de validade das normas está na hierarquia entre elas. Toda norma apoia sua validade na norma imediatamente superior. Para compreender bem a supremacia da Constituição, é fundamental que estudemos a hierarquia das normas, através do que a doutrina denomina “pirâmide de Kelsen”. Essa pirâmide foi concebida pelo jurista para fundamentar a sua teoria, baseada na ideia de que as normas jurídicas inferiores (normas fundadas) retiram seu fundamento de validade das normas jurídicas superiores (normas fundantes). Atenção! Nenhuma norma do ordenamento jurídico pode se opor à Constituição: ela é superior a todas as demais normas jurídicas, as quais são, por isso mesmo, denominadas infraconstitucionais. Veja a ilustração abaixo: 1 Trata-se de um conjunto de princípios, ideias e ensinamentos de autores e juristas que, no caso, servem de base para o direito e que influenciam e fundamentam as decisões judiciais. É fonte do direito, utilizada também para a interpretação das leis, fixando as diretrizes gerais das normas jurídicas. Fonte. Dicionário Net. Fonte: Próprio autor. Vale destacar que na Constituição há normas constitucionais originárias, que não podem ser declaradas inconstitucionais, e normas constitucionais derivadas, que podem sofrer controle de constitucionalidade. As normas constitucionais originárias são produto do poder constituinte originário (o poder que elabora uma nova Constituição); elas integram o texto constitucional desde que ele foi promulgado, em 1988. Já as normas constitucionais derivadas são aquelas que resultam da manifestação do poder constituinte derivado (o poder que altera a Constituição); são as chamadas emendas constitucionais, que também se situam no topo da pirâmide de Kelsen. Estudaremos de forma mais aprofundada sobre poder constituinte logo adiante, no item 1.2. Anote: ✓ Não existe hierarquia entre normas constitucionais originárias; ✓ Não existe hierarquia entre normas constitucionais originárias e normas constitucionais derivadas; ✓ No Brasil, embora as cláusulas pétreas* sejam, de certa forma, diferenciais, elas se encontram no mesmo patamar hierárquico das demais normas constitucionais originárias. Cláusulas pétreas são normas que não podem ser objeto de emendapública (ou delegatária) que causou o dano indeniza o particular independentemente de ela ter alguma culpa, mas o agente só será condenado a ressarcir a administração regressivamente se esta comprovar, em ação própria, que ele agiu com dolo ou culpa. A obrigação de ressarcir a administração pública (ou delegatária) em ação regressiva, sendo esta uma ação de natureza cível, transmite-se aos sucessores do agente que tenha atuado com dolo ou culpa. Mesmo após a morte do agente, seus sucessores podem ser chamados a responder pelo valor que a administração (ou a delegatária) foi condenada a pagar na ação de indenização, sempre respeitado o limite do valor do patrimônio transferido (art. 5º, XLV, CF/88). 9.5 Responsabilidades administrativa, civil e penal do agente público Há possibilidade de cumulação das responsabilidades civil, administrativa e penal do servidor em razão do ato danoso por ele praticado. O ato danoso do agente pode implicar responsabilização nas esferas administrativa, cível e penal. Por exemplo: o agente público, dirigindo a serviço, com imprudência, colide o seu veículo com o de um particular e dessa colisão resulta a morte de uma pessoa. Nesse caso o agente responderá à administração pública pela infração administrativa cometida, estando sujeito às penalidades disciplinares previstas na lei pertinente (ALEXANDRINO, 2016, p. 335). Vejamos: • Responderá civilmente, perante a administração, em ação regressiva, desde que comprovada a culpa dele, devendo ressarci-la pela indenização que a administração tenha sido condenada a pagar às vítimas do acidente; • Responderá ainda, no âmbito criminal, pelo ilícito penal praticado – homicídio culposo nesse exemplo. As responsabilidades administrativa, civil e penal são cumulativas e, em princípio, são independentes. No plano federal, essa regra está explicitada no art. 125 da Lei 8.112/1990. Quando a órbita penal está envolvida, é possível ocorrer exceção à regra de independência das esferas de responsabilidade. O julgamento, na esfera penal, de conduta imputada a um servidor público pode resultar em: • Condenação criminal do servidor; • Absolvição pela inexistência do fato ou pela negativa de autoria; • Absolvição por ausência de tipicidade ou de culpabilidade penal, por insuficiência de provas, ou por qualquer outro motivo. Na hipótese de um mesmo fato estar tipificado em uma lei penal como crime (ou contravenção), enquadrar-se em uma lei administrativa como infração disciplinar e, além disso, causar dano patrimonial ou moral a terceiro (responsabilidade civil), a condenação criminal do servidor por esse fato, uma vez transitada em julgado, interfere nas órbitas administrativa e cível, implicando o reconhecimento automático da responsabilidade do servidor, por esse fato, nessas duas esferas. Isso ocorre porque, sendo o ilícito penal mais do que o ilícito civil ou administrativo, existe a presunção de que a condenação na esfera penal sempre será baseada em uma quantidade de elementos maior do que aquela que seria suficiente para a responsabilização nas esferas civil e administrativa (ALEXANDRINO, 2016, p. 335). A absolvição penal cujo fundamento seja a negativa de autoria ou a inexistência do fato também interfere nas esferas administrativa e civil. Com efeito, se a jurisdição criminal, em que a apreciação das provas é muito mais abrangente e minuciosa, categoricamente afirma que não foi o agente o autor do fato a ele imputado, ou que sequer ocorreu o fato aventado, não há como sustentar o contrário nas outras órbitas. Por exemplo: se, na esfera administrativa, o servidor foi demitido pelo mesmo fato discutido na esfera penal, a sentença absolutória penal que tenha como fundamento a negativa de autoria ou a inexistência do fato acarretará a sua reintegração, pois terá sido cabalmente afirmado, na esfera penal, que não foi ele o autor do fato que acarretou a sua demissão administrativa, ou que esse fato nem mesmo existiu. Logo, a condenação cível também será tornada sem efeito, caso sobrevenha a absolvição penal fundada na negativa de autoria ou na inexistência do fato. A absolvição penal por mera insuficiência de provas ou por ausência de tipicidade ou de culpabilidade penal, ou por qualquer outro motivo, não interfere nas demais esferas. É possível (e bastante frequente) que um determinado fato, ou uma dada conduta, não configure crime ou contravenção, mas caracterize infração administrativa ou cause dano a alguém (ilícito civil). Leia mais sobre Responsabilidade do Estado em: Campos, Ana C. Direito Administrativo Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2ª edição). Grupo GEN, 2021. Pág. 513 e seguintes. UNIDADE V: 10 CONTROLES SOBRE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 11 SERVIDORES PÚBLICOS Nesta unidade, você irá estudar de forma objetiva os tipos de controle sobre a administração pública. O objetivo é, que ao final desta unidade, você consiga: ✓ Conhecer os tipos de controle sobre a administração pública; ✓ Descrever a função dos Tribunais de Contas; ✓ Reconhecer o papel do Ministério Público; ✓ Conhecer o regime jurídico dos servidores públicos; ✓ Entender o regime previdenciário dos servidores públicos. I 10 CONTROLES SOBRE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 10.1 O controle sobre a administração pública: legalidade e transparência; participação popular e os Tribunais de Contas No desempenho de suas atribuições, a administração pública sujeita-se a controle por parte dos poderes Legislativo e Judiciário, além de exercer, ela mesma, o controle sobre os próprios atos, em nome do princípio da autotutela. Esse controle abrange não só os órgãos do poder Executivo, incluindo a administração direta e a indireta, mas também os dos demais Poderes, quando exerçam função tipicamente administrativa; em outras palavras, abrange a administração pública considerada em sentido amplo. Segundo DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella12, a finalidade do controle é assegurar que a administração pública atue em conformidade com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico, como os da legalidade, moralidade, finalidade pública, publicidade, transparência, motivação, impessoalidade etc. Em determinadas circunstâncias, abrange também o controle chamado de mérito e que diz respeito aos aspectos discricionários da atuação administrativa. Embora o controle seja uma função estatal, o administrado participa dele à medida que pode e deve provocar o procedimento de controle, não apenas na defesa de seus interesses individuais, mas também na proteção do interesse coletivo. Ou seja, é o chamado controle por meio da participação popular. Continue lendo em: Pietro, Maria Sylvia Zanella D. Direito Administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (35ª edição). Grupo GEN, 2022. Pág. 1018 e seguintes. 10.2 Espécies de controles Quanto ao órgão que o exerce, o controle pode ser: ✓ administrativo, ✓ legislativo ou ✓ judicial. 12DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. Grupo GEN, 2020. Veja cada uma das espécies de controles e suas peculiaridades em: Pietro, Maria Sylvia Zanella D. Direito Administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (35ª edição). Grupo GEN, 2022. Pág. 932 e seguintes. 10.3 Participação popular A participação popular na gestão e no controle da administração pública se refere à ideia de Estado democrático de direito, consagrado no preâmbulo da Constituição de 1988, proclamado em seu artigo 1º e ratificado no parágrafo único, com a regra de que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos, ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Além disso, decorre de forma implícita de diversas normas consagradoras daparticipação popular em vários setores da administração pública, em especial na parte referente à ordem social. Na ideia de participação, inserem-se, por exemplo: • Participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação (art. 10); • Participação do produtor e trabalhador rural no planejamento e execução da política agrícola (art. 187); • Participação da sociedade e dos poderes públicos nas iniciativas referentes à seguridade social (art. 194); • Caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e aposentados na seguridade social (art. 194, VII), reafirmado com relação à saúde (art. 198, III) e à assistência social (art. 204, II); • Gestão democrática do ensino público (art. 206, VI); • Colaboração da comunidade na proteção do patrimônio cultural (art. 216, § 1º). Essas são as modalidades de participação na gestão da atividade administrativa do Estado. Como instrumentos de controle, podem ser mencionados, dentre outros: • Direito à informação (art. 5º, XXXIII), com o que se assegura ao cidadão a possibilidade de conhecer os assuntos que estão sendo tratados no âmbito da administração pública; • Mandado de injunção, instituído precisamente para suprir a omissão do poder público na regulamentação de normas constitucionais (art. 5º, LXXI); • Ação popular, como meio posto nas mãos do cidadão para provocar o controle jurisdicional na defesa do interesse coletivo (art. 5º, LXXIII); • Direito de denunciar irregularidades perante o Tribunal de Contas (art. 74, § 2º); • Direito de fazer reclamações e denunciar irregularidades perante ouvidorias de justiça, não só contra membros do poder Judiciário e do Ministério Público, mas também contra seus serviços auxiliares, representando diretamente ao Conselho Nacional de Justiça ou ao Conselho Nacional do Ministério Público, conforme o caso (art. 103-B, § 7º, e art. 130-A, § 5º, da Constituição, acrescentados pela Emenda Constitucional 45/2004). Além disso, encontram-se na legislação infraconstitucional inúmeras normas que prestigiam diferentes formas de participação do cidadão, com a instituição de ouvidores junto a diferentes órgãos públicos, sistemas de “disque-denúncia”, audiências públicas, consulta pública e tantas outras. Na Lei 9.784/1999, embora não mencionada a participação do cidadão como princípio da administração pública, estão disciplinados vários instrumentos que facilitam a participação, como o direito à informação, a motivação, as regras sobre publicidade, já analisadas nos itens pertinentes. Estão também previstas a consulta pública (art. 31), a audiência pública (art. 32) e a participação dos administrados, diretamente ou por meio de organizações e associações legalmente reconhecidas (art. 33). A consulta pública não é prevista, nessa lei, como obrigatória para a administração pública, mas como faculdade a ser exercida, mediante despacho motivado, quando a matéria do processo envolver assunto de interesse geral e desde que não cause prejuízo à parte interessada. A consulta é divulgada por meios oficiais, a fim de que pessoas físicas ou jurídicas possam examinar os autos, fixando-se prazo para oferecimento de alegações escritas (§ 1º do art. 31); pelo § 2º do mesmo dispositivo, o comparecimento à consulta pública não confere, por si, a condição de interessado do processo, mas confere o direito de obter da administração resposta fundamentada, que poderá ser comum a todas as alegações substancialmente iguais. A audiência pública também não é prevista em caráter obrigatório, ficando a sua realização a critério da autoridade quando se tratar de matéria relevante. O objetivo é o de permitir debates sobre a matéria. Outros meios de participação poderão ser instituídos pelos órgãos administrativos, quando se tratar de matéria relevante (art. 33). Além dessa lei, outras existem que preveem medidas semelhantes, a exemplo da Lei 8.666, de 21 de junho de 1993 (lei de licitações e contratos), que exige, em caráter obrigatório, a realização de audiência pública na hipótese referida no artigo 39, que trata de contratos acima de determinado valor. Todos esses exemplos servem para demonstrar a presença da participação do administrado na administração pública, dentro de um objetivo maior de descentralizar as formas de sua atuação e de ampliar os instrumentos de controle. 10.4 O papel do Ministério Público no controle da Administração Pública O Ministério Público (MP) desempenha importantes funções no controle da administração pública. Na ação civil pública (ACP), por exemplo, pode atuar como autor. Se não tiver essa posição, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei (art. 5º, §1º da Lei 7.347/1985). Ainda na ACP, o MP deve promover a execução, se o autor não o fizer no prazo de 60 dias do trânsito em julgado da sentença condenatória (art. 15). O MP deve instaurar também o inquérito civil previsto no artigo 8º, §1º da Lei 7.347/1985, e no artigo 129, III da Constituição Federal. Esse procedimento constitui a única modalidade de inquérito civil prevista no direito positivo brasileiro e é de competência exclusiva do Ministério Público. Seu objetivo é o de buscar elementos que permitam a instauração de ação civil pública. Ele não é obrigatório, uma vez que, se os elementos forem suficientes, torna-se desnecessário. Para instrução da ação civil, o Ministério Público pode requisitar de qualquer organismo, público ou privado, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 dias úteis (art. 8º, §1 º). A recusa só é possível em caso de sigilo, hipótese em que cabe ao juiz requisitá-los. Fora dessa hipótese, o desatendimento constitui crime punido com pena de reclusão de um a três anos e multa (art. 10). O Ministério Público pode agir de ofício ou mediante provocação feita por qualquer pessoa ou por servidor público, nos termos do artigo 6º da Lei 7.347/1985. 11. OS SERVIDORES, SEU REGIME JURÍDICO E PREVIDENCIÁRIO A Constituição de 1988, na seção II do capítulo referente à administração pública, emprega a expressão servidores públicos para designar as pessoas que prestam serviços, com vínculo empregatício, a administração pública direta, autarquias e fundações públicas. No entanto, a seção I, que contém disposições gerais concernentes à administração pública, contempla normas que abrangem todas as pessoas que prestam serviços à administração pública direta e indireta, o que inclui não só as autarquias e fundações públicas, como também as empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações de direito privado. Isso significa que “servidor público” é expressão empregada ora em sentido amplo, para designar todas as pessoas físicas que prestam serviços ao Estado e às entidades da administração indireta, com vínculo empregatício, ora em sentido menos amplo, que exclui os que prestam serviços às entidades com personalidade jurídica de direito privado. Além disso, existem preceitos aplicáveis a outras pessoas que exercem função pública. Esta, em sentido amplo, compreende não só a função administrativa, mas também as funções legislativa e jurisdicional. E ainda há as pessoas que exercem função pública sem vínculo empregatício com o Estado. Daí a necessidade de adoção de outro vocábulo, de sentido ainda mais amplo do que servidor público para designar as pessoas físicas que exercem função pública, com ou sem vínculo empregatício. De um tempo para cá, os doutrinadores brasileiros passaram a falar em agente público nesse sentido amplo. Assim, agente público é toda pessoa física que presta serviços ao Estadoe às pessoas jurídicas da administração indireta. 11.1 Categorias de Agentes Públicos Perante a Constituição de 1988, com as alterações introduzidas pela EC 18/1998, pode-se dizer que são quatro as categorias de agentes públicos: • Agentes políticos; • Servidores públicos; • Militares; e • Particulares em colaboração com o poder público. 11.1 Regime previdenciário Aposentadoria é o ato pelo qual a administração pública concede esse direito ao servidor público. Dependendo do regime adotado, a aposentadoria do servidor público pode, em tese, apresentar-se como direito de natureza previdenciária, dependente de contribuição, ou como direito vinculado ao exercício do cargo público, financiado inteiramente pelo poder público, sem contribuição do servidor. Leitura obrigatória em: Pietro, Maria Sylvia Zanella D. Direito Administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (35ª edição). Grupo GEN, 2022. Pág. 712 e seguintes. UNIDADE VI 12 OS REGIMES POLÍTICOS. 13 OS PARTIDOS POLÍTICOS. 14 OS SISTEMAS ELEITORAIS. 15 O DIREITO ELEITORAL NO BRASIL. 16 A JUSTIÇA ELEITORAL Prezado(a) aluno(a), nesta unidade estudaremos assuntos voltados ao direito eleitoral, sendo que o objetivo é que, ao final desta unidade, você consiga: ✓ Reconhecer o direito eleitoral no Brasil; ✓ Identificar os regimes políticos e a participação popular; ✓ Compreender a teoria da representação política; ✓ Conhecer os partidos políticos e o processo de escolha do governante; ✓ Reconhecer os sistemas eleitorais adotado; ✓ Compreender o voto e as suas distorções, bem como a igualdade eleitoral e acesso ao poder; ✓ Conhecer o direito eleitoral no Brasil e a sua aplicabilidade; ✓ Identificar como se dá o funcionamento da Justiça Eleitoral e os recursos pertinentes a matéria eleitoral. Certamente você já ouviu falar ou até já estudou sobre alguns desses assuntos. Então, que tal nos aprofundarmos mais nesses temas? Sugiro que, ao final de cada unidade, você revise o conteúdo estudado e complemente os seus estudos com o material complementar disponibilizado na área do aluno. Para os seus estudos nesta Unidade, recomendamos o seguinte livro: Gomes, José J. Direito Eleitoral. Disponível em: Minha Biblioteca, (17ª edição). Grupo GEN, 2021. Vídeo aula indicada para se apropriar do conteúdo: https://youtu.be/2UmkL4APqWU 12 OS REGIMES POLÍTICOS Quando falamos em regime políticos, de certa forma estamos falando de poder, ou seja, o poder de tomar decisões, que poderão afetar toda a sociedade. O conceito de regime político se vincula às noções de instituições políticas e de governo, uma vez que o Estado se institucionaliza e se estrutura para exercer o poder; o governo constitui o conjunto ou sistema de órgãos por meio do qual realiza seus fins. A forma pela qual o governo se organiza e se estrutura, a maneira como exerce ou desempenha suas funções caracteriza, portanto, o regime político. Assim, podemos dizer que o conjunto de regras e critérios que define quem será o detentor desse poder consiste nos chamados regimes políticos. https://youtu.be/2UmkL4APqWU Outro ponto a ser esclarecido, é que não se pode confundir regime político com forma de governo. Por outro lado, pode-se dizer que o regime político está ligado ao próprio conteúdo do poder estatal e às suas relações com o indivíduo e seus respectivos direitos. Nesse sentido, o regime político pressupõe a forma de governo sobre cuja existência e realidade se estruturam as suas variações. Logo, é lícito afirmar que o regime político pode ser ditatorial ou democrático, autoritário ou liberal, consoante o tratamento dispensado aos direitos. Cabe esclarecer, que basicamente, existem dois tipos principais de regime político: • Regimes democráticos; • Regimes autoritários. 12.1 Regimes democráticos Partindo da premissa de que o Estado democrático é aquele em que o próprio povo governa, é evidente que se coloca o problema de estabelecer os meios para que o povo possa externar sua vontade. Não se pode perder de vista que, nos dias atuais, a regra são colégios eleitorais numerosíssimos e as decisões de interesse público, muito frequentes. Isso, de certa forma, exige uma intensa atividade legislativa; logo, é difícil pensar na hipótese de manifestações do povo para que se saiba rapidamente qual a sua vontade. Embora com amplitude reduzida, não desapareceu de todo a prática de pronunciamento direto do povo, existindo alguns institutos que são classificados como expressões de democracia direta. 12.1.1 Democracia direta O modelo clássico é a democracia direta. Nesse modelo, procura-se realizar o ideal de autogoverno, no qual os cidadãos participam das decisões governamentais. Na democracia direta, pretende-se fazer coincidirem as vontades de governantes e governados. As decisões são tomadas em assembleia pública, da qual devem participar todos os cidadãos. Trata-se de forma de organização social em que todo e qualquer cidadão pode participar ativamente da tomada de decisões. Significa que, ao invés de eleger um representante, é possível que os cidadãos de uma determinada sociedade tomem as suas próprias decisões Esse sistema de governo é chamado de democracia direta, ou deliberativa, em que existe possibilidade de os próprios cidadãos participarem diretamente da política. Na democracia direta, ao invés de deixar as decisões para representantes eleitos, todos os cidadãos participam do debate. A maior vantagem desse sistema é que as decisões refletem, de forma autêntica, as preferências e vontades da sociedade, o que nem sempre acontece em democracias representativas. Cabe lembrar que não se pode confundir democracia direta com voto direto. O voto é direto quando, por intermédio dele, o eleitor pode escolher seu representante ou interferir diretamente na política pública a ser traçada ou executada, como nos casos de plebiscito e referendo. Quando se cuida da democracia direta, as decisões governamentais são tomadas diretamente pelo povo, não havendo necessidade de um representante (que pode ser escolhido por voto direto) para fazê-las. 12.1.2 Democracia representativa Na democracia representativa, o povo concede um mandato a alguns cidadãos para que, na condição de representantes, estes externem a vontade popular e tomem decisões em seu nome, como se o próprio povo estivesse governando. A democracia representativa é a forma mais comum de regime democrático que encontramos hoje; inclusive, é a utilizada no Brasil. Na chamada democracia indireta representativa, os cidadãos escolhem aqueles que os representarão no governo. Os eleitos recebem um mandato. A participação das pessoas no processo político se dá, pois, na escolha dos representantes ou mandatários. A estes cabe a condução do governo, tomando as decisões político- administrativas que julgarem convenientes, de acordo com as necessidades que se apresentarem. Frisa-se que a ideia básica na democracia representativa é a da existência de representantes eleitos, ou seja, escolhidos pela população para tomar as decisões da sociedade. Significa dizer que os membros da sociedade que têm a possibilidade de escolher os seus representantes são chamados de eleitores. Para eleger seus representantes, os eleitores participam das eleições, dando o seu voto para o candidato que melhor represente suas preferências. Nesse formato, os cidadãos comuns não precisam se envolver diretamente nas principais questões da sociedade, que podem ser bem complexas e demandam tempo. Na democracia representativa, a maior vantagem é a possibilidade de haver uma classe política especializada, para se dedicar de forma integral aos debates dasquestões sociais de interesse público. Não podemos deixar de mencionar a democracia semidireta ou participativa, que comporta as duas técnicas de participação popular, admitindo que as políticas públicas a serem planejadas e executadas contarão com a participação direta do povo, por meio da realização de plebiscitos e referendos, ou com a de seus representantes. Frisa-se que esse é o modelo democrático adotado pelo Brasil, como se depreende do parágrafo único do art. 1º da CF, que dispõe que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Ainda de acordo com o art. 14 da Constituição Federal/88, “a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I – plebiscito; II – referendo; III –iniciativa popular.” Os modelos de democracia representativa (indireta) e participativa (ou semidireta) comportam também o voto direto. Por sua vez, o voto é indireto quando o eleitor não escolhe diretamente seus representantes, mas elege determinada pessoa que então escolherá o governante. 12.2 Regimes autoritários Nesse regime político, a soberania está fora do alcance e da vigilância da maioria; é autocrático, ou seja, está ligado ao exercício do poder por “direito próprio”. Os regimes autoritários, infelizmente, ainda são bastante comuns ao redor do mundo. Cumpre esclarecer que o regime político será autoritário quando as principais decisões são tomadas apenas por uma pessoa ou por um grupo de pessoas, sem a participação da sociedade. O poder é concentrado em um ou em poucos governantes. No regime autoritário, a população em geral desfruta de poucos direitos, que são na maioria atropelados pelas vontades dos governantes. Numa extensão do autoritarismo, temos o totalitarismo, que está em oposição ao Estado liberal. No Estado totalitário, há uma tendência do poder político para se dilatar e se apoderar de tantos domínios da vida quanto possível, numa perspectiva de amoldamento total da vida da comunidade e dos indivíduos. No Estado totalitário moderno, devem ser invadidas pelas finalidades do Estado e postas ao serviço não só a economia, o mercado do trabalho e a atividade profissional, mas também a vida social, os ócios, a família, as opiniões e costumes do povo. Na forma totalitária, há uma concentração de poder nas mãos do Estado, sendo este detentor da verdade única, do direcionamento da vida dos cidadãos. O totalitarismo apresenta-se como uma nova forma de governo baseada na organização burocrática de massas e apoiada no emprego do terror e da ideologia. Segundo a doutrina, o totalitarismo designa um certo modo extremo de fazer política antecipando-se a uma certa organização institucional ou a um certo regime. Este modo extremo de fazer política, que penetra e mobiliza uma sociedade inteira ao mesmo tempo que destrói sua autonomia, encarnou apenas em dois regimes políticos temporalmente circunscritos: nazismo e fascismo. 12.3 Participação popular A participação popular no governo é condição sine qua non da democracia. Em vista disso, foram concebidos alguns modelos de democracia, os quais podem ser reunidos em três grupos: democracia direta, indireta e semidireta (GOMES, 2016, p. 67). A Declaração Universal dos Direitos Humanos considera a participação política um direito fundamental de todos os indivíduos. Diz, entre outras coisas, em seu artigo 21, que todo ser humano tem o direito de tomar parte no governo de seu país e que a vontade do povo será a base da autoridade do governo. Sendo assim, a participação política é uma necessidade da natureza humana. Para todos os seres humanos, a vida em sociedade é indispensável; para que esta seja possível, é necessária uma organização, ou seja, é preciso que exista uma ordem, na qual as pessoas possam viver e conviver (DALLARI, 2011, p. 64). Frisa-se que a participação política não é apenas participação eleitoral, e muitas vezes é mais eficiente por outros meios. Desde o século XVIII se afirmou como ideal político a democracia, sistema em que a vontade do povo deve estar acima de qualquer outra. Historicamente, o sistema de escolher representantes para participarem de assembleias políticas já aparece no século XVII. Quando os burgueses conquistaram o direito de participar das decisões políticas, foi necessário escolher representantes, porque não era possível reunir numa sala ou mesmo numa praça pública todos os que tinham direitos políticos. Em razão da impossibilidade de reunir o povo em praças públicas diariamente para tomar decisões políticas, foi criado o sistema de “democracia representativa”, em que o povo escolhe representantes e, através deles, manifesta sua vontade. Assim, para a escolha dos representantes, foi criado o processo eleitoral; surgiram as figuras do eleitor e do candidato. No entanto, para que o povo possa escolher seus representantes é preciso, antes de tudo, que haja plena liberdade de informação, permitindo que as pessoas formem livremente sua opinião com base no maior número possível de dados. Paralelamente, tem-se verificado que, ao lado das restrições impostas aos governos para que haja liberdade de informação, existe o problema das empresas e dos interesses que controlam os meios de comunicação. Além disso, existem os grupos econômicos mais poderosos que usam a imprensa para apresentar os fatos do modo como lhes convém, e com frequência o povo é mais enganado do que informado. Ademais, não se pode perder de vista que o processo eleitoral é sempre dispendioso, impondo sacrifícios econômicos aos que se candidatam. Com isso, os candidatos mais ricos e menos escrupulosos para ocupar posições vantajosas se valem dessas lacunas para fazer grande publicidade, muitas vezes mentirosa. Por outro lado, deve-se reconhecer que o processo eleitoral vem sendo aperfeiçoado e que, apesar de todas as suas falhas, oferece ao povo algum espaço para que manifeste sua vontade. Além disso, a participação política é um dever moral de todos os indivíduos, ou seja, é uma necessidade fundamental da natureza humana. Assim, a participação intensa e constante de muitos é necessária para impedir que alguns imponham uma ordem injusta, que sempre acaba sendo prejudicial para todos. 12.4 A teoria da Representação Nas palavras de Dallari (2011, p. 161), a necessidade de governar por meio de representantes deixa para o povo o problema da escolha desses representantes. Para o autor, cada indivíduo tem suas aspirações, seus interesses e, mesmo que de maneira indefinida e imprecisa, suas preferências a respeito das características dos governantes. No que tange ao sistema de representação política, são inumeráveis no campo teórico os esforços que se fazem por aclarar o conceito de representação. As reiteradas divergências teóricas, em geral decorrentes de posições doutrinárias ou ideológicas, reduzem esta expressão a um juízo de valor. O conceito de representação política tem sido usado nos mais diferentes sentidos, servindo para justificar o poder em regimes dos mais diferentes matizes. A “duplicidade” do termo foi o ponto de partida para a elaboração de todo o moderno sistema representativo, nas suas raízes constitucionais, que assinalam o advento do Estado liberal e a supremacia histórica. Cabe destacar que o governo representativo está inserido num contexto histórico bastante peculiar e se diferencia de outras formas de exercício do poder político. O governo representativo se diferencia do modelo de democracia direta, como também se diferencia dos sistemas autocráticos de governo nos quais os súditos não têm acesso e nem controle sobre as decisões políticas, como no caso dos regimes absolutistas.Com base nessas considerações, pode se dizer que o sistema representativo, na mais ampla acepção, refere-se a um conjunto de instituições que definem uma certa maneira de ser ou de organização do Estado. Em outras palavras, está associado a uma modalidade de controle regular do poder governamental por parte daqueles que não podem exercê-lo pessoalmente, transferindo para outros essa tarefa. Atualmente, a representação política se faz por intermédio de partidos políticos. Os partidos tornaram-se peças essenciais para o funcionamento do complexo mecanismo democrático contemporâneo. Nesse sentido, os partidos captam e assimilam rapidamente a opinião pública; catalisam, organizam e transformam em postulados, em bandeiras de luta, as díspares aspirações surgidas no meio social, sem que isso implique ruptura no funcionamento do governo constituído (GOMES, 2016, p 67). O sistema partidário é assegurado pelo artigo 14, § 3º, V da Constituição Federal, que instituiu a filiação partidária como condição de elegibilidade. Isso significa que os partidos políticos detêm o monopólio das candidaturas e, para ser votado, o cidadão deve filiar-se. ATENÇÃO: Inexistem no sistema brasileiro candidaturas avulsas. O entendimento consolidou-se no sentido de que mandato público eletivo pertence à agremiação política, e não ao eleito. No sistema brasileiro, a democracia representativa é temperada com mecanismos próprios de democracia direta, entre os quais citam-se o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular (CF, art. 14, I, II, III, e art. 61, § 2º). ❖ Plebiscito: consiste na consulta prévia à edição de “ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo, pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe tenha sido submetido” (Lei 9.709/1998, art. 2º, § 1º); ❖ Referendo: é a consulta posterior à edição de “ato legislativo ou administrativo, cumprindo ao povo a respectiva ratificação ou rejeição” (Lei 9.709/1998, art. 2º, § 2º); ❖ Iniciativa popular: é o poder atribuído aos cidadãos para apresentar projetos de lei ao Parlamento, desfechando, com essa medida, procedimento legislativo que poderá culminar em uma lei. Por fim, a implementação da representação passa necessariamente pelos partidos políticos, a cujas tendências e orientações encontra-se o mandatário vinculado. Para saber mais sobre teoria da representação, leia o artigo “Representação Política”, disponível no link: https://www.sabedoriapolitica.com.br/products/representacao- politica/ Para saber sobre a diferença entre plebiscito e referendo, assista ao vídeo disponível no link: https://youtu.be/S3mEdQKdkfU 13 OS PARTIDOS POLÍTICOS Partidos políticos são associações civis formada pela livre associação de pessoas, com organização estável, cujas finalidades são alcançar e/ou manter de maneira legítima o poder político estatal e assegurar, no interesse do regime democrático de direito, a autenticidade do sistema representativo, o regular funcionamento do governo e das instituições políticas, bem como a implementação dos direitos humanos fundamentais. De acordo com a Lei 9.096/1995, em seu artigo 1º, “os partidos destinam-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal”. Além disso, os partidos políticos ainda possuem direta relação com a defesa de ideologias por diversos segmentos da sociedade, garantindo-se, pela pluralidade de partidos, a manifestação da voz das minorias e o pluralismo. https://www.sabedoriapolitica.com.br/products/representacao-politica/?utm_source=copy&utm_medium=paste&utm_campaign=copypaste&utm_content=https%3A%2F%2Fwww.sabedoriapolitica.com.br%2Fproducts%2Frepresentacao-politica%2F https://www.sabedoriapolitica.com.br/products/representacao-politica/?utm_source=copy&utm_medium=paste&utm_campaign=copypaste&utm_content=https%3A%2F%2Fwww.sabedoriapolitica.com.br%2Fproducts%2Frepresentacao-politica%2F https://youtu.be/S3mEdQKdkfU É sabido que o pluralismo político é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, pois viabiliza por meio do debate o alcance de seus objetivos, entre os quais promover o bem de todos sem preconceitos. Assim, os partidos políticos, como pessoas jurídicas essenciais ao regime democrático, organizam-se em torno de ideias representativas de valores que são defendidos por grupos sociais, que buscam, de alguma forma, influenciar ou participar do poder estatal. Leitura obrigatório em: Ramos, MACHADO, Raquel C. Manual de Direito Eleitoral, 2ª edição. Págs. 104 até 140. [Minha Biblioteca]. 14 OS SISTEMAS ELEITORAIS, O VOTO E AS DISTORÇÕES 14.1 Os sistemas eleitorais Trata-se de uma estrutura complexa, racional e dinamicamente ordenada. O sistema eleitoral nada mais é do que um complexo de técnicas e procedimentos empregados na realização das eleições, ensejando a conversão de votos em mandato, e, consequentemente, a legítima representação do povo no poder estatal. O sistema eleitoral permite a aferição da vontade dos cidadãos manifestada nas urnas, de modo a propiciar a representação popular no governo, na gestão do Estado. Ele tem por função a organização das eleições e a conversão de votos em mandatos políticos. Nesse contexto, o sistema eleitoral visa proporcionar a captação eficiente, segura e imparcial da vontade popular democraticamente manifestada, de forma que os mandatos eletivos sejam conferidos e exercidos com legitimidade. Ressalta-se que o sistema eleitoral também possui função de estabelecer meios para que os diversos grupos sociais sejam representados, bem como para que as relações entre representantes e representados se fortaleçam. O direito eleitoral conhece três sistemas tradicionais: o majoritário, o proporcional e o misto. A adoção de um ou outro tipo depende das circunstâncias históricas de cada sociedade. Nesse sentido, a Constituição do Brasil consagrou os sistemas majoritário e proporcional. Aprofunde seus conhecimentos sobre sistemas eleitorais em: Ramos, MACHADO, Raquel C. Manual de Direito Eleitoral, 2ª edição. Págs. 40 até 51[Minha Biblioteca]. Após a leitura do acima recomendada, assista ao vídeo disponível no link: https://www.youtube.com/watch?v=RkZ3OBaur3k 14.2 O voto e as distorções Primeiramente, cabe mencionar que o voto e o sufrágio não se confundem. Isso significa que enquanto o sufrágio é um direito, o voto representa seu exercício do direito. Ou seja, o voto é a concretização do sufrágio. https://www.youtube.com/watch?v=RkZ3OBaur3k É importante esclarecer que a soberania popular é exercida pelo sufrágio universal. Nessa seara, o vocábulo sufrágio significa aprovação, opinião favorável, apoio, concordância, aclamação. Em outras palavras, significa manifestação da vontade de um conjunto de pessoas para a escolha de representantes políticos. O sufrágio traduz o direito de votar e de ser votado, encontrando-se entrelaçado ao exercício da soberania popular. Trata-se do poder de decidir sobre o destino da comunidade, os rumos do governo, a condução da administração pública. Assim, o sufrágio é a essência dos direitos políticos, porquanto enseja a participação popular no governo, sendo este o responsável pela condução do Estado. Além disso, o poder de sufrágio poderá ser exercido através do voto pelo escrutínio secreto (art. 60, II da CF). Hipóteses de sufrágio existentes: • Sufrágio universal: é o direito conferido a todos os cidadãos de participar do processo eleitoral; consiste no direito de votar e ser votado; • Sufrágio restrito: o sufrágio é restrito quando o poder de participação no processo eleitoral é conferido apenas a pessoas que preenchem determinados requisitos. O que diferencia o sufrágio universaldo sufrágio restrito é a razoabilidade das restrições. A Constituição Federal estabelece que o menor de 16 anos não pode votar. Contudo, tal restrição não retira o caráter universal do sufrágio. O sufrágio restrito pode ser classificado da seguinte forma: CLASSIFICAÇÃO CONCEITO Censitário Leva em conta o poder econômico do eleitor. É preciso ter uma determinada renda para votar. • Existiu no Brasil no período do império. Capacitário O poder de sufrágio é conferido a quem tiver um certo grau de instrução. • Exemplo: só poderá votar quem tiver curso superior completo. Racial Restrição do exercício do poder do sufrágio em razão da etnia. Por gênero Só poderão votar as pessoas de determinado sexo. • Apenas a partir de 1932, com a promulgação do Decreto 21.076, as mulheres passaram a ter direito ao voto no Brasil. Religioso Só poderá votar quem pertencer a determinada religião. Sufrágio plural O mesmo indivíduo tem o poder de exercer mais de uma vez seu direito ao voto. • Isso faz com que o poder de voto de certas pessoas seja maior do que o de outras. Sufrágio singular É adotado no Brasil. • É o chamado “one man, one vote”, em que cada pessoa tem direito a um voto. Sufrágio direto Poder exercido diretamente pelo cidadão. Sufrágio indireto Poder democrático exercido por representantes do povo. ❖ Exemplo: nos Estados Unidos, quem vota para presidência da República são os delegados, que foram escolhidos pela população. Fonte: Próprio autor No que tange ao voto, pode se dizer que é um dos mais importantes instrumentos democráticos, pois enseja o exercício da soberania popular e do sufrágio. É o ato pelo qual os cidadãos escolhem os ocupantes dos cargos político-eletivos. Por ele, concretiza-se o processo de manifestação da vontade popular. Além disso, o voto é também um dever cívico e, por isso, é obrigatório para os maiores de 18 anos e menores de 70 anos (CF, art. 14, § 1º, I). O não comparecimento à seção eleitoral no dia do pleito por se encontrar fora de seu domicílio eleitoral deve ser justificado no dia da eleição em formulário próprio, ou até 60 dias depois, sob pena de multa (art. 7º, caput, CE). Se o eleitor estiver no exterior na data do pleito, esse prazo passa a ser de 30 dias, contados, porém, do retorno ao país. Destaca-se que o artigo 7º §, 3º do Código Eleitoral disciplina que o eleitor que se abstiver de votar por três vezes consecutivas, não justificar sua ausência às urnas nem recolher a multa imposta terá sua inscrição eleitoral cancelada, perdendo, pois, sua condição de cidadão. Apesar de haver o dever de comparecimento às eleições, pois é dever votar, todos são livres para escolher ou não um candidato e até anular voto ou votar em branco. Nesse contexto, pode-se dizer que a obrigatoriedade do voto nada mais é do que a obrigatoriedade de comparecimento à seção eleitoral, já que não fica o eleitor adstrito a emanar sua vontade, isto é, a escolher determinado candidato e nele votar. Outro ponto a ser lembrado diz respeito ao sigilo do voto, que assegura a probidade e a lisura no processo eleitoral, pois evita o suborno, a corrupção do voto, a intimidação do eleitor. Significa que somente o eleitor, querendo, poderá revelar seu voto, descortinando suas preferências políticas. Além do mais, cada voto deverá ser contabilizado individualmente e ter assegurados o sigilo e a inviolabilidade (Lei 9.504/1997, arts. 59, § 4º, e 61). Na votação eletrônica, o sigilo é assegurado pelo uso de sistemas de informática desenvolvidos com exclusividade para a Justiça Eleitoral e por mecanismos específicos da urna, como a autonomia operacional, o não funcionamento em rede, a chave de segurança e a lacração a que é submetida. Apesar de atualmente votação e a totalização dos votos ser feitas pelo sistema eletrônico, o TSE poderá autorizar, em caráter excepcional, a votação pelo sistema convencional, no qual são empregadas cédulas. Isso só ocorrerá se a urna eletrônica apresentar defeito insanável ou de difícil reparação no momento da votação e não puder ser substituída por outra, a chamada urna de contingência. Vale destacar que somente quando não houver êxito com esta e com os respectivos procedimentos de contingência é que a votação passa a ser por cédula. Nesse caso, aplicam-se os artigos 83 a 89 da Lei 9.504/1997. Complementando tais dispositivos, o artigo 103 do Código Eleitoral arrola providências a serem ultimadas com o objetivo de se assegurar o sigilo do voto. 14.2.1 Voto e escrutínio O voto não se confunde com escrutínio. O voto é o exercício do sufrágio, dos direitos políticos, traduzindo o ato de escolher. Já o termo escrutínio comporta vários significados. Escrutínio designa a maneira como o processo de votação se perfaz, isto é, o modo como o voto se concretiza. Por exemplo: • Diferentemente do que ocorre no escrutínio secreto, no público, o votante é identificado; • No chamado escrutínio de lista, os nomes dos candidatos são arrolados em uma lista. A palavra escrutínio também identifica o processo de apuração dos votos depositados na urna. Nesse sentido, o verbo escrutinar significa apurar os resultados de uma votação; logo, o escrutinador é a pessoa que realiza a apuração ou a contagem dos votos. Em outras palavras, significa o número de vezes que os mesmos eleitores são chamados a votar na mesma eleição, ou seja, é o sinônimo de turno. Pode-se dizer que a eleição se deu em primeiro ou segundo escrutínio. Leitura obrigatória em: Ramos, MACHADO, Raquel C. Manual de Direito Eleitoral, 2ª edição. Pág. 05 e 06 [Minha Biblioteca]. 14.2.2 Voto eletrônico ou informatizado O marco inicial do voto eletrônico no Brasil ocorreu com Lei 7.444/1985, que informatizou os procedimentos de alistamento eleitoral e revisão do eleitorado. A Justiça Eleitoral passou a contar com setor próprio de informática, desenvolvendo e implantando sistemas computacionais para o atendimento de suas necessidades. A partir disso, Justiça Eleitoral desenvolveu uma rede de transmissão de dados interligando todos os órgãos da Justiça Eleitoral, ou seja, o TSE, os TREs e as Zonas Eleitorais. Em 1994, já foi possível proceder-se à totalização dos votos por meio eletrônico. Embora tivessem sido apurados manualmente, os dados foram lançados em computadores e aí totalizados. A Lei 9.504/1997 consolidou o sistema de votação eletrônica: o artigo 59 definiu que a votação e a totalização dos votos serão feitas de forma eletrônica, mas o TSE poderá autorizar, em caráter excepcional, a votação pelo sistema convencional, no qual serão empregadas cédulas. Além disso, a urna eletrônica deverá dispor de recursos que, mediante assinatura digital, permitam o registro digital de cada voto e a identificação da urna em que foi registrado, resguardado o anonimato do eleitor (LE, art. 59, § 4º). Deverá ainda contabilizar cada voto, assegurando-lhe o sigilo e a inviolabilidade, garantida ampla fiscalização aos partidos políticos, coligações e candidatos (LE, art. 61). Para saber mais sobre sistema de votação, acesse a Lei 9.504/1997, disponível no link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm 14.3 A igualdade eleitoral e o acesso ao poder Para falarmos de igualdade eleitoral, primeiramente é preciso compreender o princípio da lisura das eleições que se respalda na perseguição da verdade real, inclusive possibilitando que o juiz produza prova de ofício. O teor do art. 23 da Lei Complementar 64/1990 dispõe que o Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.Nesse sentido, os candidatos devem disputar o pleito eleitoral em paridade de condições. Significa que, pela lisura das eleições, os meios empregados nas propagandas, nas campanhas devem ser éticos e justos. O princípio da lisura eleitoral busca garantir a igualdade de todos os candidatos perante a Lei Eleitoral. Ele decorre diretamente do princípio da moralidade, o que significa que as eleições devem estar livres de corrupção, fraude e abuso do poder econômico. Vejamos algumas características desse princípio: • Corolário da moralidade; • Tutela a integridade e a ética nas eleições; http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm • Busca assegurar a legitimidade política; • Coíbe o uso indevido dos meios de comunicação; • Garante que os candidatos terão tratamento isonômico e que concorrerão em igualdade de condições. Como já vimos, esse princípio eleitoral tem a função de garantir a igualdade de oportunidade de acesso aos cargos públicos eletivos; porém, pode ser violado pela prática das condutas ilícitas como o abuso de poder eleitoral. No que diz respeito ao abuso de poder eleitoral, cabe destacar que o poder é a capacidade de determinada pessoa ou grupo fazer valer a sua vontade numa relação. Ou seja, ele advém de causas distintas, como a posição jurídica ou social ocupada por determinada pessoa, ou eventual condição de preponderância física, econômica e intelectual. Para o direito eleitoral, importam o poder político, o econômico e aquele nos meios de comunicação, com a análise de sua interferência desequilibrada no processo eleitoral (MACHADO, 2018, p. 243). Para o autor, é relevante não apenas a compreensão do poder, mas do poder legítimo, cujo exercício se considera válido. Segundo descreve Machado (2018, p. 243), o poder político legítimo é prerrogativa detida por algumas pessoas para melhor exercerem determinada função. Exemplo disso é a hipótese do poder do chefe do Executivo para organizar a máquina administrativa, com a finalidade de realizar o interesse público, concretizar o bem comum e o princípio da eficiência. Entretanto, ocorrerá abuso de poder quando seu titular extrapolar suas atribuições ou tentar alcançar fins diversos dos que justificam suas prerrogativas. Ou seja, a partir do momento em que o chefe do Executivo utiliza a prerrogativa de organização da máquina administrativa para beneficiar um protegido político, ou a própria campanha eleitoral, claramente agirá com abuso de poder. No que tange ao abuso de poder econômico, esse ilícito se caracteriza quando os candidatos utilizarem o poder financeiro com a finalidade de obter vantagem, mesmo que indireta, durante as eleições. Assim, o poder, nada mais é do que o reconhecimento de uma situação de prevalência juridicamente limitada, ou seja, de um direito cujos contornos são dados por outras normas do ordenamento. Em outras palavras, o direito admite, e muitas vezes até requer, o exercício do poder, mas sempre dentro de determinados limites, seja o poder político, seja o econômico. 14.3.1 Abuso de poder simples O abuso de poder simples configura-se independentemente de afetar a lisura da disputa, ou a normalidade e a legitimidade, não sendo necessária a comprovação da gravidade da conduta. Nas palavras de Machado (2018, p. 244), sua teorização e sua normatização têm por fim levar ao: Aperfeiçoamento das instituições democráticas, combatendo condutas claramente ilícitas durante a campanha, que revelam a aptidão de jogar qualquer jogo para se alcançar o poder, como a compra de voto, a fraude, o uso de valores indevidamente arrecadados, gastos não declarados, o abuso de prerrogativas do cargo etc. Essa teorização advém de gradativa alteração da legislação eleitoral, diante da percepção de que algumas condutas deveriam ser combatidas, com o manejo de ações próprias, por meio da tipificação específica de comportamentos prejudiciais ao desenvolvimento da democracia. Por fim, a finalidade primordial das normas que visam a atacar o abuso de poder simples é a cassação do registro ou do diploma, ou ainda a desconstituição do mandato. Apenas indiretamente elas podem levar à inelegibilidade. 14.3.2 Abuso de poder qualificado O abuso de poder qualificado materializa-se apenas diante de condutas graves, nos termos do art. 22, XVI da LC 64/1990: Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: [...] XVI – para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam. (BRASIL, 1990). A finalidade imediata é, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, a aplicação direta da sanção de inelegibilidade. O abuso de poder qualificado pode ser atacado por meio da ação de investigação judicial eleitoral nos termos do art. 22 da LC 64/1990. Por outro lado, o abuso de poder simples, com hipóteses específicas para cada uma de suas subespécies, pode ser causa de pedir da ação de impugnação de mandato eletivo (art. 14, §§ 10 e 11 da CF/88), da ação por captação ilícita de recursos (art. 30-A da Lei 9.504/1997), da ação por captação ilícita de votos (art. 41-A da Lei 9.504/1997) e da ação por prática de conduta vedada (art. 73 da Lei 9.504/1997). 14.3.3 Abuso de Poder Econômico e Abuso de Poder Político O abuso de poder econômico ocorre quando há uso indevido do patrimônio ao longo do processo eleitoral, malferindo, dentre outros, princípios como o da liberdade de voto, da igualdade entre candidatos, da transparência. É importante deixar claro que este não necessariamente guarda relação direta com as contas prestadas pelos candidatos e gastos por ele realizados. Significa que, eventualmente, as contas podem preencher os requisitos formais previstos pelo ordenamento e ainda assim ter havido, por exemplo, abuso do poder econômico com a compra de votos. Nesse sentido, o abuso se configura sempre que os valores econômicos são utilizados para distorcer o pleito, como no caso de compra de votos. Apesar de ser possível sua ocorrência em outras situações que não apenas aquelas relacionadas às contas de campanha, a forma mais eficiente de evitá-lo é exatamente pelo controle dos valores movimentados durante o período eleitoral. Logo, se a entrada de valores é licita e contabilizada, se os gastos são lícitos e contabilizados, não há como ocorrer abuso de poder econômico. Partindo desse princípio, é correto afirmar que o abuso de poder econômico se configura, sobretudo, quando são utilizadas nas campanhas verbas vedadas, ou verbas, ainda que lícitas, obtidas por meios ilícitos, acima dos limites permitidos pela legislação. Exemplos disso são as quantias não contabilizadas representativas de um “Caixa 2”, ou mascaradas por meio de operações inexistentes, como a compra de material gráfico de empresa inexistente, ou sem porte para realizar a operação. Assim, a obtenção de valores não admitidos pelo ordenamento leva a gastos também não admitidos. Por fim, o abuso do poder político é o uso das prerrogativas de cargo, emprego ou função pública para obter vantagens na disputa eleitoral, prejudicando a liberdade de voto. Saiba mais sobreessa temática em: Ramos, MACHADO, Raquel C. Manual de Direito Eleitoral, 2ª edição. Págs. 249 até 282. [Minha Biblioteca]. 15 O DIREITO ELEITORAL NO BRASIL O direito eleitoral é o ramo do direito público cujo objeto são os institutos, as normas e os procedimentos que regulam o exercício do direito fundamental de sufrágio com vistas à concretização da soberania popular, à validação da ocupação de cargos políticos e à legitimação do exercício do poder estatal (GOMES, 2016, p. 48). Em outras palavras, incumbe ao direito eleitoral disciplinar a manifestação de soberania popular de escolha dos governantes, com a definição de quem pode ser eleitor e o que é preciso para ser eleito, passando pela eleição até chegar à investidura dos governantes nos cargos para os quais foram eleitos. Como ocorre em relação a outros ramos do direito, “direito eleitoral” é expressão plurissignificativa, pois pode designar tanto a ciência que estuda o conjunto de normas jurídicas disciplinadoras de determinada relação como o conjunto de textos dos quais se extraem essas normas jurídicas. Assim, a observância dos preceitos eleitorais confere legitimidade a eleições, plebiscitos e referendos, o que enseja o acesso pacífico, sem contestações, aos cargos eletivos, tornando autênticos o mandato, a representação popular e o exercício do poder político. Entre os bens jurídico-políticos tutelados pelo direito eleitoral, destacam-se a democracia, a legitimidade do acesso e do exercício do poder estatal, a representatividade do eleito, a sinceridade das eleições, a normalidade do pleito e a igualdade de oportunidades entre os concorrentes. Considerando que o direito eleitoral em sua primeira acepção, de ciência, pode-se afirmar que é o ramo do direito que estuda o “processo eleitoral” à luz das normas jurídicas que o disciplinam. Para Machado (2018, p. 23), o “processo eleitoral” transborda a ideia de contencioso eleitoral, abarcando meros procedimentos. Assim, o conjunto de atos, procedimentos e relações jurídicas vai desde o alistamento eleitoral, com o ingresso dos cidadãos no corpo de eleitores, até a fase da diplomação, momento em que os candidatos eleitos recebem da Justiça Eleitoral o diploma para a posse e o exercício no cargo. Vejamos: Alistamento Convenção partidária Registro de candidatura Propaganda eleitoral Eleição Diplomação É importante lembrar que, em cada fase, estuda-se não apenas seu desenrolar, mas as instituições, os sujeitos e os institutos envolvidos, assim como os direitos que são pré-requisitos para a participação na vida política. Outro ponto a ser destacado é que a Justiça Eleitoral, além de realizar atos, examinar procedimentos administrativos e julgar ações judiciais propostas ao longo de todo o processo eleitoral, julga ações cujo prazo inicial de propositura é a diplomação dos eleitos, após, portanto, o período que classicamente se chama processo eleitoral. Integram o objeto de estudo do direito eleitoral as condições para o exercício dos direitos políticos e para a aquisição da capacidade eleitoral ativa e passiva, além de todas as etapas do processo eleitoral em sua fase administrativa, bem como a organização da Justiça Eleitoral, do Ministério Público Eleitoral, o processo eleitoral contencioso e os crimes eleitorais. Em linhas gerais, pode se dizer que objetivo do direito eleitoral é garantir a normalidade e a legitimidade do processo eleitoral. Outro ponto diz respeito à competência para legislar sobre direito eleitoral, que é privativa da União (art. 22, I da CF). Não obstante, lei complementar poderá autorizar os estados a legislar sobre questões específicas (art. 22, parágrafo único da CF). 15.1 Fontes do direito eleitoral O direito eleitoral pode ser considerado um microssistema jurídico, pois é composto de normas de caráter material e processual de natureza civil, administrativa e penal. O microssistema jurídico integra o sistema. O prefixo micro, do grego mikrós, significa pequeno, curto, de diminuta proporção. Nesse sentido, microssistema remete a um sistema de proporções menores que outro, no qual se encontra inserido. São fontes diretas do direito eleitoral: • A Constituição Federal; • O Código Eleitoral (Lei 4.737/1965) - • A Lei das Eleições (Lei 9.504/1997); • A Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei 9.096/1995); • A Lei das Inelegibilidades (LC 64/1990); • E as Resoluções do TSE. Vale lembrar que existe um poder regulamentar instituído pelo Código Eleitoral, reafirmado pela Lei das Eleições, a partir do qual o legislador conferiu ao poder Judiciário (TSE) a prerrogativa de esmiuçar o conteúdo previsto em lei e nas normas gerais produzidas pelo poder Legislativo. Código Eleitoral: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4737compilado.htm Lei das Eleições: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm Lei dos Partidos Políticos: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9096.htm Lei da inelegibilidade: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp64.htm Leia mais em: Ramos, MACHADO, Raquel C. Manual de Direito Eleitoral, 2ª edição. Pág. 18. [Minha Biblioteca]. 15.2 Princípios do direito eleitoral Entre os princípios fundamentais, podem-se apontar os que mais se destacam: princípio da lisura das eleições, princípio do aproveitamento do voto, princípio da http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4737compilado.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9096.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp64.htm celeridade, princípio da anualidade eleitoral, princípio da moralidade eleitoral, princípio da periodicidade da investidura das funções eleitorais. Os princípios ajudam a compreender mais sistematicamente matérias próprias do direito eleitoral, como a votação, a aplicação da lei eleitoral, a atuação de partidos políticos e o desenrolar do processo contencioso, pois propiciam reflexão sobre a forma mais justa de realizar e implementar cada um de seus passos. É importante mencionar que não há consenso doutrinário ou jurisprudencial sobre os princípios do direito eleitoral, assim como não há texto normativo que os enumere exaustivamente. Além disso, como a legislação eleitoral é mutante, o conhecimento dos princípios, mais sólidos e perenes, é necessário – pois permite uma compreensão mais consistente da disciplina. Leia mais em: Ramos, MACHADO, Raquel C. Manual de Direito Eleitoral, 2ª edição. Pág. 20 [Minha Biblioteca]. 15.3 Funções da Justiça Eleitoral A Justiça Eleitoral é um ramo especializado do poder Judiciário. É responsável por organizar todas as etapas do processo eleitoral brasileiro, desde o alistamento dos eleitores até a diplomação dos candidatos eleitos. Segunda a doutrina, a Justiça Eleitoral desempenha quatro funções: • Jurisdicional; • Administrativa; • Legislativa (normativa); • Consultiva. Na função jurisdicional, impera o princípio da demanda, em que o juiz decide dentro dos limites em que a tutela jurisdicional foi requerida. Assim, a função jurisdicional da Justiça Eleitoral está ligada ao processo eleitoral, sendo o marco inicial, em regra, o alistamento e o marco final, a diplomação. Quanto às matérias interna corporis dos partidos políticos, a jurisprudência dos Tribunais Superiores é pacífica no sentido de que carece de competência à Justiça Eleitoral para apreciá-las, sendo competente à Justiça Comum. Conforme já se decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ), as causas envolvendo a validade de uma convenção partidária não são de competência da Justiça Eleitoral, quando não tiver se iniciado o processo eleitoral. No que tange a função administrativa da Justiça Eleitoral, dá-se através da organização e administração do processoeleitoral, tendo ainda, como atribuições, o alistamento de eleitor, a nomeação de mesários, a revisão de eleitorado, a designação dos locais de votação, a criação e extinção de seções e zonas eleitorais, dentre outras atividades de cunho administrativo. Dentre as atividades administrativas da Justiça Eleitoral, destaca-se o poder de polícia. O art. 41 da Lei 9.504/1997 dispõe que aos juízes eleitorais cabe o combate à propaganda irregular. Frisa-se que poder de polícia sobre a propaganda eleitoral será exercido pelos juízes eleitorais e pelos juízes designados pelos Tribunais Regionais Eleitorais. Não se pode perder de vista que poder de polícia se restringe às providências necessárias para inibir práticas ilegais, vedada a censura prévia sobre o teor dos programas a serem exibidos na televisão, no rádio ou na internet. Trata-se de função administrativa da Justiça Eleitoral. Logo, o juiz eleitoral não pode de ofício aplicar imediatamente multa ao infrator; a sanção somente pode ser aplicada após o devido processo legal, cujo legitimado para a demanda é o Ministério Público, partido político, coligação e candidato (Súmula 18 do TSE). Passando para a função normativa ou legislativa, cabe destacar a disposição contida nos art. 1°, parágrafo único, e art. 23, inciso IX. do Código Eleitoral: Art. 1º Este Código contém normas destinadas a assegurar a organização e o exercício de direitos políticos precipuamente os de votar e ser votado. Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral expedirá Instruções para sua fiel execução. Art. 23 - Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior, [...] IX - Expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código; [...] (BRASIL, 1965). Nesse sentindo, as instruções e demais deliberações de caráter normativo do TSE são veiculadas em resoluções, que podem ter caráter temporário ou não. E as resoluções expedidas pelo TSE ostentam força de lei, pois detém a mesma eficácia geral e abstrata atribuída as leis. Quanto à função consultiva, esta é uma peculiaridade que decorre do art. 23, XII, e do art. 30, VIII do Código Eleitoral (Lei 4.737/1965). Vejamos primeiramente o disposto no art. 23, XII: Art. 23 - Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior, [...] XII - responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas em tese por autoridade com jurisdição, federal ou órgão nacional de partido político; [...] (BRASIL, 1965). As consultas dirigidas ao TSE devem ser formuladas por autoridades públicas federais ou órgão nacional do partido político. Art. 30. Compete, ainda, privativamente, aos Tribunais Regionais: [...] VIII - responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou partido político; [...] (BRASIL ,1965). A consulta deverá ser sempre formulada em tese, sobre um tema eleitoral, não sendo admitida consulta sobre caso concreto. E a resposta à consulta deve ser fundamentada. Ainda que não tenha caráter vinculante, orienta a ação dos órgãos da Justiça Eleitoral, podendo servir de fundamento para decisões na esfera administrativa e/ou judicial. Por fim, não podemos deixar de mencionar que são órgãos da Justiça Eleitoral: o Tribunal Superior Eleitoral, os Tribunais Regionais Eleitorais, os Juízes Eleitorais e as Juntas Eleitorais (art. 118 da CF): Art. 118. São órgãos da Justiça Eleitoral: I - o Tribunal Superior Eleitoral; II - os Tribunais Regionais Eleitorais; III - os Juízes Eleitorais; IV - as Juntas Eleitorais. A Justiça Eleitoral não tem uma composição própria, pois seus membros não integram carreira própria. Por esse motivo, não detêm vitaliciedade, apesar de terem irredutibilidade de subsídios e inamovibilidade. Nos termos do art. 121, § 2º da CF, os juízes dos tribunais eleitorais, salvo motivo justificado, servirão por dois anos, no mínimo, e nunca por mais de dois biênios consecutivos, sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo processo, em número igual para cada categoria. Para saber mais sobre recursos justiça eleitoral: https://www.justicaeleitoral.jus.br/ Referências ALEXANDRINO, Marcelo. Resumo de direito administrativo descomplicado. 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016. ALMEIDA, Roberto Moreira de. Curso de direito eleitoral. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2017. BARRETTO, Rafael. Direito eleitoral. São Paulo: Saraiva, 2012. BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 10. edição. São Paulo: Malheiros, 2000. BRASIL. Lei 7.347, de 24 de julho de 1985. Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (VETADO) e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, p. 10649, 24 jul. 1985, BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 30 nov. 2020. https://www.justicaeleitoral.jus.br/ http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm BRASIL. Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 128, n. 237, p. 23935, 12 dez. 1990. BRASIL. Lei 8.745, de 9 de dezembro 1993. Dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 131, n. 235, p. 18937, 10 dez. 1993. BRASIL. Lei 9.962, de 22 de fevereiro de 2000. Disciplina o regime de emprego público do pessoal da administração federal direta, autárquica e fundacional, e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 138, n. 38, p. 1, 23 fev. 2000 . BRASIL. Lei 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei nº 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências. Diário Oficial da União: Edição Extra, Brasília, ano 148, n. 221-A, p. 1, 18 nov. 2011. BRASIL ESCOLA. O que é cidadania? https://brasilescola.uol.com.br/o-que- e/geografia/o-que-e-cidadania.htm. Acesso em: 28 de nov. 2020. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. CARVALHO, Matheus. Manual de direito administrativo. 4. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2017. DALLARI, Dalmo Abreu de. O que é participação política. Edição do Kindle. São Paulo: Brasiliense, [s. d.]. (Coleção Primeiros Passos). DALLARI, Dalmo de Abreu de. Elementos de teoria geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 2011. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2014. https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/geografia/o-que-e-cidadania.htm https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/geografia/o-que-e-cidadania.htm DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 33. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020. FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional - 9. ed. rev. ampl. e atual. Salvador. JusPOOIVM, 2017. FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Direito e cidadania na Constituição Federal. Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista3/rev1.htm. Acesso em: 28 de nov. 2020. GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016. GOMES, José J. Direito Eleitoral. São Paulo: Grupo GEN,2021. LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 23. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. (Coleção Esquematizado). MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos. Direito eleitoral. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2018. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 9. ed. São Paulo: Atlas: 2010. NUNES JÚNIOR, Flávio Martins Alves. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. POLITIZE. Por que é importante falarmos em cidadania? Disponível em: https://www.politize.com.br/por-que-e-importante-cidadania/ Acesso em: 28 de nov. 2020. SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 29. ed. São Paulo: Malheiros: 2015. http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista3/rev1.htm https://www.politize.com.br/por-que-e-importante-cidadania/constitucional (EC) tendente a aboli-las. As cláusulas pétreas estão previstas no art. 60, § 4º, da CF/1988. Vejamos: Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais. Outro fator importante que garante a supremacia da Constituição está na classificação, pois a doutrina apresenta diversos critérios para classificá-la. Na classificação das constituições “quanto à estabilidade”, considera-se o grau de dificuldade para a modificação do texto constitucional. A CF/88 é rígida, pois exige procedimento especial para sua modificação por meio de emendas constitucionais, qual seja: votação em dois turnos, nas duas casas do Congresso Nacional, e aprovação de pelo menos três quintos dos integrantes das casas legislativas (art. 60, §2º, CF/88). Assim, da rigidez constitucional decorre o princípio da supremacia da Constituição. É que, em virtude da necessidade de processo legislativo especial e mais complexo para que uma norma seja inserida no texto constitucional, fica claro, por consequência lógica, que as normas constitucionais estão em patamar hierárquico superior ao das demais normas do ordenamento jurídico. 2 PRINCÍPIOS E REGRAS Você sabe a diferença entre regras e princípios? Pois bem; primeiro, é importante saber que as NORMAS se dividem em dois tipos: 1. Regras e; 2. Princípios. NORMAS são o GÊNERO, e regras e princípios são espécies. Quando estivermos tratando de regras e princípios (implícitos e explícitos) previstos na Constituição, estaremos nos referindo às espécies de NORMAS CONSTITUCIONAIS. Segundo o professor Ricardo Vale2, as regras são mais concretas e servem para definir condutas. Já os princípios são mais abstratos: não definem condutas, mas sim diretrizes para que se alcance a máxima concretização da norma. As REGRAS não admitem o cumprimento ou descumprimento parcial e seguem a lógica do “tudo ou nada”; ou seja, se uma regra vale, então, deve-se fazer exatamente aquilo que ela exige; nem mais, nem menos. Portanto, quando duas regras entram em conflito, cabe ao aplicador do direito determinar qual delas foi suprimida pela outra. Vale destacar que as regras servem para impor, permitir ou proibir uma situação. Exemplos de regras: Art. 143. O serviço militar é obrigatório nos termos da lei. [...] Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. (BRASIL, 1988). 2 Professor de direito constitucional do Estratégia Concursos (2019). Por outro lado, os princípios podem ser cumpridos apenas parcialmente. No caso de colisão entre princípios, o conflito é apenas aparente, ou seja, um NÃO será excluído pelo outro. Assim, apesar de a Constituição, por exemplo, garantir a livre manifestação do pensamento (art. 5º, IV, CF/88), esse direito não é absoluto. Ele encontra limites na proteção à vida privada (art. 5º, X, CF/88), outro direito protegido constitucionalmente; outro conflito muito comum é o que ocorre entre o princípio do desenvolvimento nacional e o princípio do meio ambiente sadio. É por isso que, segundo o dicionário da língua portuguesa, dúctil significa algo que se consegue distender ou comprimir sem que haja rompimento; flexível e maleável – assim são os princípios, que podem ser aplicados de forma apenas parcial, quando houver conflito entre eles. Assim, quando houver conflito entre os princípios, este será resolvido pela autoridade julgadora, sendo observado o caso concreto para definir qual princípio sofrerá limitação em detrimento do outro. De certo que o magistrado fará juízo de ponderação/balanceamento (atribuindo pesos), a concordância prática e a proibição de excesso, destacando o postulado da igualdade, o da razoabilidade e o da proporcionalidade. Veja um exemplo de princípio: art. 1º, III da CF de 1988: a dignidade da pessoa humana. Veja o esquema abaixo: Fonte: Próprio autor. Importante que você saiba que a doutrina afirma que os princípios têm função normogenética, pois eles dão origem às regras, ou seja, eles estão na gênese de várias regras. Assim, nas palavras do professor Pedro Leanza (2019)3, “não se pode dizer nem que os princípios são mais importantes do que as regras, nem que as regras são mais necessárias que os princípios. Cada espécie normativa desempenha funções diferentes e complementares, não se podendo sequer conceber uma sem a outra, e a outra sem a uma”. Em resumo, nas palavras do professor Nunes Júnior4, enquanto as regras são normas de conteúdo mais determinado, delimitado, claro, preciso, os princípios são normas de conteúdo mais amplo, vago, indeterminado, impreciso. O que diferencia a regra do princípio não é o assunto da norma jurídica, mas a forma através da qual ela é tratada. 3 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 23. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. (Coleção Esquematizado). 4 NUNES JÚNIOR, Flávio Martins Alves. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Para saber mais sobre essa temática, assista aos vídeos: https://youtu.be/oCpVnGdWMsU e https://youtu.be/BANmMU36SuU Leia Lenza, Pedro. Esquematizado: Direito Constitucional. Editora Saraiva, 2020. [Minha Biblioteca]. 3 PODER CONSTITUINTE A primeira informação é a seguinte: poder constituinte, basicamente, é aquele que cria a Constituição, ou seja, é aquele que inaugura um novo ordenamento jurídico. Indo mais além, podemos dizer que o poder constituinte pode criar, garantir ou eliminar uma Constituição entendida como lei fundamental da comunidade política. Mas quem é o titular do poder constituinte? A titularidade do poder constituinte é do povo, pois só este pode determinar a criação ou modificação de uma Constituição. Lembrando que nosso estudo será voltado a nossa Constituição Federal de 1988. Segundo o Professor Ricardo Vale5, “a forma democrática de exercício pode se dar tanto diretamente quanto indiretamente. Na primeira, o povo participa diretamente do processo de elaboração da Constituição, por meio de plebiscito, referendo ou proposta de criação de determinados dispositivos constitucionais. Na 5 Professor de direito constitucional do Estratégia Concursos (2019). https://youtu.be/oCpVnGdWMsU https://youtu.be/BANmMU36SuU segunda, mais frequente, a participação popular se dá indiretamente, por meio de assembleia constituinte, composta por representantes eleitos pelo povo” (grifos nossos). 3.1 Espécies de Poder constituinte O poder constituinte classifica-se em poder constituinte originário ou de primeiro grau e poder constituinte derivado, constituído ou de segundo grau. Fonte: Próprio autor. Importante dizer que há possibilidade de apontar duas formas básicas de expressão do poder constituinte originário: assembleia nacional constituinte (promulgação) e movimento revolucionário/revolução (outorga). A outorga é o estabelecimento da Constituição por declaração unilateral do agente revolucionário, que autolimita seu poder. É imposta. Por exemplo, as Constituições de 1824. A assembleia nacional constituinte, também denominada convenção, nasce da deliberação da representação popular, devidamente convocada pelo agente revolucionário, para estabelecer o texto organizatório e limitativo de poder. Por exemplo, a CF de 1988. 3.2 Poder ConstituinteOriginário ou de primeiro grau Segundo o professor Alexandre de Moraes, “O poder constituinte originário estabelece a Constituição de um novo Estado, organizando-o e criando os poderes destinados a reger os interesses de uma comunidade. Tanto haverá poder constituinte no surgimento de uma primeira Constituição, quanto na elaboração de qualquer Constituição posterior”. Ademais, o poder constituinte originário apresenta algumas características que o distinguem do derivado: é político, inicial, ilimitado juridicamente, incondicionado, e autônomo. ✓ Político: anterior ao direito; é ele que cria o ordenamento jurídico de um Estado; ✓ Inicial: a Constituição é a base da ordem jurídica, bem como dá início a uma nova ordem jurídica, rompendo com a anterior (se houver); ou seja, o poder constituinte originário inaugura a ordem jurídica, não encontra limites em norma de direito positivo anterior; ✓ Ilimitado juridicamente: não está limitado pelo direito anterior; ✓ Incondicionado: não está sujeito a qualquer forma prefixada para manifestar sua vontade; não tem que seguir qualquer procedimento determinado para realizar sua obra de constitucionalização; ✓ Autônomo: tem liberdade para definir o conteúdo da nova Constituição; ✓ Permanente: o poder constituinte não esgota sua titularidade, que permanece latente, manifestando-se novamente mediante uma nova assembleia nacional constituinte ou um ato revolucionário. Atenção! Em que pese o poder constituinte originário ser ilimitado, é importante destacar os ensinamentos do professor Canotilho6: o poder constituinte originário deverá obedecer a “padrões e modelos de conduta espirituais, culturais, éticos e sociais radicados na consciência jurídica geral da comunidade”. Isso porque não devemos abrir mão de certos direitos que foram conquistados com muitos esforços, sob pena de configurar um verdadeiro retrocesso jurídico da humanidade. Curiosidade: você sabia que o abade francês Emmanuel Sieyès foi um dos precursores dessa doutrina (poder constituinte)? Emmanuel Joseph Sieyès (1748-1836) é o autor do livro Qu’est-ce que le tiers État? (O que é o terceiro Estado?), verdadeiro manifesto da Revolução Francesa, onde expõe as reivindicações da burguesia, definindo-a como a nação e, consequentemente, titular do poder constituinte. 3.3 Poder constituinte derivado ou de segundo grau O poder constituinte derivado deve obedecer às regras colocadas e impostas pelo originário, sendo, nesse sentido, jurídico (pois é regulado pela Constituição e está, portanto, previsto no ordenamento jurídico vigente); limitado (deve obedecer às regras impostas pela Constituição e não pode desrespeitá-la, sob pena de inconstitucionalidade); e condicionado (a forma de seu exercício é determinada pela Constituição). Conforme a doutrina majoritária, subdivide-se em poder constituinte reformador, decorrente e revisor. Vamos ver cada um deles? ✓ Poder constituinte reformador: consiste na possibilidade de se alterar o texto constitucional, respeitando-se a regulamentação especial prevista na própria Constituição Federal, e tem natureza jurídica. Importante: a manifestação do 6 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. poder constituinte reformador verifica-se por meio das emendas constitucionais (arts. 59, I, e 60 da CF/88). Vale destacar que o poder constituinte originário permitiu a alteração de sua obra, mas obedecidos alguns limites como: quorum qualificado de 3/5, em cada casa, em dois turnos de votação para aprovação das emendas (art. 60, § 2.º); proibição de alteração da Constituição na vigência de estado de sítio, defesa ou intervenção federal (art. 60, § 1.º); um núcleo de matérias intangíveis: as cláusulas pétreas do art. 60, § 4.º, da CF/88 etc. Veja o vídeo https://youtu.be/GpfzRaiGjw4 para reforçar a leitura. ✓ Poder constituinte decorrente: consiste na possibilidade que os Estados- membros têm, em virtude de sua autonomia político-administrativa, de se auto-organizarem por meio de suas respectivas CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS, sempre respeitando as regras limitativas estabelecidas pela Constituição Federal. Sua missão é estruturar a Constituição dos Estados-membros; ✓ Poder constituinte revisor: o processo de revisão está limitado por uma força maior que é o poder constituinte originário, ou seja, a este está vinculado. Nas palavras do professor Pedro Lenza (2019), “O art. 3.º do ADCT determinou que a revisão constitucional seria realizada após 5 anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral”. Assim, o art. 3.º do ADCT introduziu verdadeira competência de revisão para “atualizar” e adequar a Constituição às realidades que a sociedade apontasse como necessárias. Ainda nas palavras de Lenza (2019), “Como o próprio texto constitucional prescreve, após 5 anos, contados de 05.10.1988, seria realizada uma revisão na Constituição. Desde já observamos que referida revisão constitucional deveria dar-se após, pelo https://youtu.be/GpfzRaiGjw4 menos, 5 anos, podendo ser 6, 7, 8... e apenas uma única vez, sendo impossível uma segunda produção de efeitos”. Você sabe o que são os ADCT? Para melhor ilustrar essa temática, primeiro você precisa saber que a Constituição se divide em três partes: preâmbulo, parte dogmática e os atos das disposições constitucionais transitórias (ADCT). O preâmbulo é a parte que antecede o texto constitucional propriamente dito. A parte dogmática da Constituição é o texto constitucional propriamente dito, que prevê os direitos e deveres criados pelo poder constituinte. Trata-se do corpo permanente da Carta Magna, que, na CF/88, vai do art. 1º ao 250. O ADCT visa integrar a ordem jurídica antiga à nova quando do advento de uma nova Constituição, garantindo a segurança jurídica e evitando o colapso entre um ordenamento jurídico e outro. Assista ao vídeo a partir dos 23 min: https://youtu.be/RBnwmRdo_Eo 3.4 Efeitos da entrada em vigor de uma nova Constituição A entrada em vigor de uma nova Constituição gera três efeitos básicos: ✓ No Brasil, a Constituição anterior é integralmente revogada; ela é inteiramente retirada do mundo jurídico, deixando de ter vigência e, consequentemente, validade; ✓ As normas infraconstitucionais editadas na vigência da Constituição anterior que forem materialmente compatíveis (compatibilidade de conteúdo) com a nova Constituição são por ela recepcionadas; ✓ As normas infraconstitucionais editadas na vigência da Constituição anterior que forem materialmente incompatíveis com a nova Constituição são por ela revogadas tácita e automaticamente. https://youtu.be/RBnwmRdo_Eo Assim, a entrada em vigor de uma nova Constituição não torna inconstitucionais as normas infraconstitucionais com ela materialmente incompatíveis. Perceba: não há inconstitucionalidade porque elas são de plano revogadas (inexistência de recepção). Como exemplo, lembramos o Código Tributário Nacional (CTN – Lei 5.172/1966, criado sob a égide da Constituição de 1946), que, embora tenha sido elaborado com natureza jurídica de lei ordinária (incompatibilidade formal), foi recepcionado pela nova ordem como lei complementar, sendo que os ditames que tratam das matérias previstas no art. 146, I, II e III da CF só poderão ser alterados por lei complementar, aprovada com o quórum da maioria absoluta (art. 69). Perceba, trata-se de incompatibilidade formal, ou seja, compatibilidade formal não é necessária. Vamos fazer um resumo, conforme as palavras do professor Pedro Lenza (2019). Para uma lei ser recepcionada pelo novo ordenamento jurídico, deverá preencher os seguintes requisitos:• Estar em vigor no momento do advento da nova Constituição; • Não ter sido declarada inconstitucional durante a sua vigência no ordenamento anterior; • Ter compatibilidade formal e material perante a Constituição sob cuja regência ela foi editada (no ordenamento anterior); • Ter compatibilidade somente material perante a nova Constituição, pouco importando a compatibilidade formal. Para fixar esse conteúdo, veja o vídeo da AGU Explica: https://youtu.be/l9GA1bXQPBQ Leitura obrigatória em: Lenza, Pedro. Esquematizado: Direito Constitucional. Editora Saraiva, 2020. Págs. 210 a 224 [Minha Biblioteca]. 4 A APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS Sobre essa temática, podemos dizer que se uma lei pode produzir efeitos, tem eficácia, mas essa eficácia pode variar quanto a sua intensidade. De fato, as normas constitucionais têm eficácia variada. Algumas normas constitucionais produzem muitos efeitos e outras normas constitucionais produzem poucos efeitos. Em razão da eficácia das normas, surgem importantes classificações, das quais destacaremos duas delas (NUNES JÚNIOR, 2019, p. 402). Segundo o doutrinador José Afonso da Silva, classificam-se as normas constitucionais em três modalidades: • Norma constitucional de eficácia plena; • Norma constitucional de eficácia contida; • Norma constitucional de eficácia limitada. https://youtu.be/l9GA1bXQPBQ Leia mais em: Lenza, Pedro. ESQUEMATIZADO - DIREITO CONSTITUCIONAL. Disponível em: Minha Biblioteca, (25ª edição). Editora Saraiva, 2021. Págs. 117 e seguintes [Minha Biblioteca]. UNIDADE II 4 DIREITOS FUNDAMENTAIS E CIDADANIA; 5 DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL Nesta unidade, estudaremos de forma objetiva os Direitos Fundamentais (individuais e sociais) e Cidadania e os Direitos Difusos e Coletivos na Constituição Federal; porém, para ter sucesso, a leitura do texto constitucional é imprescindível. O objetivo é que, ao final desta unidade, você consiga: • Reconhecer os direitos fundamentais (individuais e sociais); • Descrever os vários aspectos da cidadania, especialmente o conceito jurídico; • Explicar e os direitos difusos e coletivos na Constituição Federal. 4 DIREITOS FUNDAMENTAIS E CIDADANIA 4.1 Características dos Direitos Fundamentais Não há direitos fundamentais absolutos. Trata-se de direitos relativos, limitáveis, no caso concreto, por outros direitos fundamentais. No caso de conflito entre eles, há uma concordância prática ou harmonização: nenhum deles é sacrificado definitivamente, ou seja, em caso de conflito entre dois direitos, não haverá o sacrifício total de um em relação ao outro, mas redução proporcional de ambos, buscando-se, com isso, alcançar a finalidade da norma. Até mesmo a vida, que é o maior bem jurídico, não é um direito absoluto. A CF abre a possibilidade de pena de morte em caso de guerra declarada, bem como a legislação brasileira infraconstitucional estabelece uma série de hipóteses em que a vida deixa de ser juridicamente tutelada e pode ser violada, em alguns casos. Exemplo: o bem-estar sentimental e a dignidade da pessoa da gestante que foi estuprada. Inúmeros outros direitos podem ser limitados pela lei ou por outros direitos. A liberdade de manifestação encontra limites na intimidade, na honra alheia, por exemplo. A liberdade de religião igualmente não é absoluta, pois jamais admitiríamos uma seita que adote como prática religiosa o sacrifício humano etc. Vejamos as características principais, apontadas pela doutrina pátria: Historicidade; Universalidade; Concorrência; Inalienabilidade; Irrenunciabilidade; Imprescritibilidade; Efetividade, e Proibição do retrocesso (Leia Pedro Lenza, pág. 564. 25ª Edição. Minha Biblioteca). Por fim, vale dizer que os direitos fundamentais vinculam não somente o Estado, como também os particulares (em maior ou menor grau, de acordo com a teoria adotada). 4.2 Classificação das gerações/dimensões dos direitos fundamentais Mas antes de nos aprofundarmos no que é pertinente à CF de 1988, é oportuno dizer que a doutrina nos apresenta a classificação das gerações/dimensões dos direitos fundamentais, baseando-se na ordem histórica, cronológica, em que passaram a ser constitucionalmente reconhecidos. Eles são frutos de uma evolução histórico-social, de conquistas progressivas da humanidade. Vejamos: • Primeira geração/dimensão: também chamados liberdades negativas: traduzem a liberdade de não sofrer ingerência abusiva por parte do Estado. • Segunda geração/dimensão: são os direitos que envolvem prestações positivas do Estado aos indivíduos (políticas e serviços públicos). • Terceira geração/dimensão: são os direitos que não protegem interesses individuais, mas que transcendem a órbita dos indivíduos para alcançar a coletividade (direitos transindividuais ou supraindividuais). Curiosidade: percebeu como as três primeiras gerações seguem a sequência do lema da Revolução Francesa, “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”? • Quarta geração/dimensão: para Paulo Bonavides7, estes incluiriam os direitos relacionados à globalização: o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. • Quinta dimensão: representados pelo direito à paz. Curiosidade: os direitos de uma geração seguinte se acumulam aos das gerações anteriores. Em virtude disso, parte da doutrina tem preferido usar a expressão “dimensões de direitos”. Teríamos, então, os direitos de primeira dimensão, segunda dimensão e assim por diante. Leia: Lenza, P. (2020), Esquematizado: Direito Constitucional, 25ª edição, Editora Saraiva, Págs. 553. Disponível em: Minha Biblioteca. 7 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2008. Para saber mais veja o vídeo: https://youtu.be/p-nP87rE2n4 4.3 Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos na Constituição Federal Conforme os ensinamentos do professor Alexandre de Moraes (2017), a Constituição Federal de 1988 trouxe, em seu Título II, os direitos e garantias fundamentais, subdivididos em cinco capítulos: ✓ Direitos individuais e coletivos (art. 5º da CF); ✓ Direitos sociais (art. 6º ao 11º da CF); ✓ Nacionalidade (arts. 12 e 13 da CF); ✓ Direitos políticos (arts. 14 a 16 da CF); e ✓ Partidos políticos (art. 17 da CF). Assim, a classificação adotada pelo legislador constituinte estabeleceu cinco espécies ao gênero direitos e garantias fundamentais: direitos e garantias individuais e coletivos; direitos sociais; direitos de nacionalidade; direitos políticos; e direitos relacionados à existência, organização e participação em partidos políticos. Direitos individuais e coletivos (art. 5º da CF) - Lenza, Pdcfo. 2021, Esquematizado: Direito Constitucional, 25ª edição, Editora Saraiva. Pág. 568 e seguintes. Disponível em Minha Biblioteca. 4.3.1 Remédios Constitucionais https://youtu.be/p-nP87rE2n4 É importante que você saiba que os Remédios Constitucionais estão elencados dentro do rol do artigo 5º da CF, e é imprescindível que o estudante conheça cada uma de suas peculiaridades. São eles: Habeas Corpus; Habeas Data; Manado de Segurança; Mandado de injunção; Ação Popular. Leia tudo sobre os remédios constitucionais em: Moraes, Alexandre D. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (38ª edição). Grupo GEN, 2022. Página 173 e seguintes. 4.4 Direitos Sociais Nos termos do art. 6.º, são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados na forma da Constituição de 1988. Importante destacarque direitos sociais têm aplicação imediata. Segundo Pedro Lenza 20198, os direitos sociais são direitos de segunda dimensão e apresentam-se como prestações positivas a serem implementadas pelo Estado (social de direito) e tendem a concretizar a perspectiva de uma isonomia substancial e social na busca de melhores e adequadas condições de vida, estando, ainda, consagrados como fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1.º, IV, da CF/88). 8 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 23. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. p. 2014. (Coleção Esquematizado). Dentro do contexto dos direitos sociais, é importante destacar a natureza da “reserva do possível”, que é considerada uma condição da realidade que impacta na eficácia dos direitos fundamentais, sendo considerada também um princípio, bem como uma cláusula ou postulado – ou seja, a reserva do possível corresponde a um dado de realidade, um elemento do mundo dos fatos que influencia na aplicação do direito. Assim, entendemos que a “reserva do possível” é uma situação fática que limita a aplicação e a eficácia dos direitos sociais. Isso porque da efetivação de direitos sociais e fundamentais, afastando a teoria da reserva do possível surge no direito como uma forma de limitar a atuação do Estado no âmbito o direito constitucional de interesse privado e “prezando” pelo direito da maioria. Muitas vezes a reserva do possível tem sido utilizada entre nós como argumento impeditivo da intervenção judicial e desculpa genérica para a omissão estatal no campo da efetivação dos direitos fundamentais, especialmente os de cunho social. A aplicação dos direitos fundamentais sociais está condicionada pela realidade; é certo que o intérprete não poderá demandar dos poderes públicos o que for logicamente impossível, ou seja, não se pode exigir o absurdo. Mas é importante que saber que, segundo o Supremo Tribunal Federal, o Estado, a administração pública, não pode alegar a “reserva do possível” (limitações financeiras e orçamentárias) para descumprir o “mínimo existencial” dos direitos fundamentais: a cláusula da reserva do possível não pode ser invocada, pelo poder público, com o propósito de fraudar, frustrar e inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição. Não deixe de fazer a leitura da CF (art. 6º ao 11º), que foi disponibilizada no início da disciplina. Leia tudo sobre os Direitos sociais (art. 6º da CF) em: Lenza, Pedro. ESQUEMATIZADO - DIREITO CONSTITUCIONAL. Disponível em: Minha Biblioteca, (25ª edição). Editora Saraiva, 2021. Pág. 647 e seguintes. 4.5 Direitos relativos aos trabalhadores Fonte: Pedro Lenza, 24ª Edição. Leia mais sobre os Direitos dos Trabalhadores (art. 7º até 11º da CF) em: Lenza, P. (2020), Esquematizado: Direito Constitucional, 24ª edição, Editora Saraiva. Págs. 1.355 até 1.362. Disponível em: Minha Biblioteca. 4.6 Nacionalidade (arts. 12 e 13 da CF) Segundo o professor Pedro Lenza, “nacionalidade pode ser definida como o vínculo jurídico-político que liga um indivíduo a determinado Estado, fazendo com que esse indivíduo passe a in-tegrar o povo desse Estado e, por consequência, desfrute de direitos e se submeta a obrigações.” Leia mais sobre Nacionalidade (arts. 12 e 13 da CF) em: Lenza, Pedro. ESQUEMATIZADO - DIREITO CONSTITUCIONAL. Disponível em: Minha Biblioteca, (25ª edição). Editora Saraiva, 2021. Pág, 651 e seguintes 4.7 Direitos políticos (arts. 14 a 16 da CF) Nas sábias palavras do professor Pedro Lenza, os direitos políticos nada mais são que instrumentos por meio dos quais a CF garante o exercício da soberania popular, atribuindo poderes aos cidadãos para interferirem na condução da coisa pública, seja direta, seja indiretamente. Leia mais sobre Direitos Políticos (arts. 14 e 16 da CF) em: Lenza, Pedro. ESQUEMATIZADO - DIREITO CONSTITUCIONAL. Disponível em: Minha Biblioteca, (25ª edição). Editora Saraiva, 2021. Pág. 675 e seguintes. 4.8 Partidos Políticos (art. 17) Partido político pode ser conceituado como uma “... organização de pessoas reunidas em torno de um mesmo programa político com a finalidade de assumir o poder e de mantê-lo ou, ao menos, de influenciar na gestão da coisa pública através de críticas e oposição”. Leia mais sobre Partidos Políticos (arts. 17 da CF) em: Lenza, Pedro. ESQUEMATIZADO - DIREITO CONSTITUCIONAL. Disponível em: Minha Biblioteca, (25ª edição). Editora Saraiva, 2021. Pag. 688 e seguintes. Atenção! Além das leituras recomendadas acima, você deve acessar o site do planalto e fazer a leitura de todo o art. 5º da Constituição Federal de 1988 - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm 4.9. Cidadania Segundo definição do site Politize (2016), ser cidadão é “ter consciência de que é um sujeito de direitos. Direitos à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade, enfim, direitos civis, políticos e sociais. Entretanto, cidadania pressupõe também deveres. O cidadão tem que ser consciente das suas responsabilidades enquanto parte integrante de um grande e complexo organismo que é a coletividade e, para que alcancemos o bom funcionamento, todos têm que dar sua parcela de contribuição. Somente assim se chega ao objetivo final, coletivo: a justiça em seu sentido mais amplo, ou seja, o bem comum. A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá a pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo do seu povo”. Ainda conforme essa definição de cidadania, “A Constituição da República de 1988 foi, sem dúvida, um dos marcos deste avanço. Apelidada de Constituição Cidadã, foi a partir de 1988 que novos instrumentos foram colocados à disposição daqueles que lutam por um país cidadão, como por exemplo, o sufrágio universal, o voto direto e secreto, além do surgimento de estatutos como o Estatuto da Criança e do Adolescente, Estatuto do Idoso, etc.” (POLITIZE, 2016). Para o nosso estudo, interessa dizer que a cidadania está relacionada ao “direito de participação no exercício do poder político, como eleito ou eleitor, no conjunto das instituições de autoridade pública.” (BRASIL ESCOLA, S/D). Deste modo, nas palavras do professor Tercio Sampaio Ferraz Junior, “a cidadania, na Constituição brasileira, tem um sentido amplo, equivalente a todos os direitos e obrigações decorrentes da nacionalidade, bem como um sentido estrito referente à participação no governo. No sentido amplo é preciso, pois, examinar sua expansão no campo econômico e social”. Fonte: Câmara dos Deputados A cidadania é uma conquista diária. Não há como compreender o conceito de cidadania sem considerar seus vários aspectos e sem relacioná-los aos direitos humanos, direitos de nacionalidade, direitos políticos, à democracia à ética. Para saber mais acesse os links: https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/geografia/o-que-e-cidadania.htm https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/geografia/o-que-e-cidadania.htm https://mundoeducacao.uol.com.br/geografia/cidadania.htm Assista ao vídeo: https://youtu.be/xF0JJ-fosys 5 DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL Os direitos difusos e coletivos encontram equivalência apenas com relação à natureza indivisível do bem jurídico, ou seja, seu objeto. Isso significa que não é possível satisfazer apenas um dos titulares dos interesses difusos ou coletivos. A satisfação de um, implica necessariamente na satisfação de todos. 5.1 Direitos difusos x Direitos coletivos A distinção entre interesse difuso e interesse coletivo se faz por intermédio da determinabilidade dos titulares do interesse: enquanto neste são determináveis, naquele são indetermináveis. O interessecoletivo (organizado entre si ou não) será coletivo por causa do seu objeto indivisível que pertença a um número determinável de titulares. O interesse difuso: por seu grau de dispersão e pela indeterminabilidade de seus titulares, não se pode atribuir qualquer tipo de exclusividade na fruição do objeto do interesse. Tanto isso é verdade que o vínculo que une os titulares desse direito é apenas uma circunstância de fato (e não jurídica). Interesses/direitos difusos: são aqueles que possuem a mais ampla transindividualidade real. Características: a indeterminação do sujeitos titulares – unidos por um vínculo meramente de fato; a indivisibilidade ampla; a indisponibilidade; a ressarcibilidade indireta. https://mundoeducacao.uol.com.br/geografia/cidadania.htm https://youtu.be/xF0JJ-fosys Os interesses difusos possuem uma “veia pública”, é porque a indeterminabilidade de seus sujeitos pressupõe o raciocínio de que o interesse em jogo é disperso, de tal maneira que atinge um número ilimitado de pessoas, dando-lhe uma conotação publicista. Assim, não há como dividir a tutela almejada. O que ameaça a um sujeito, ameaça a todos. O que repara a um repara a todos. Ex.: dano ao meio ambiente (no caso de dano ao meio ambiente o ente que ingressar com a ação civil pública obterá decisão judicial que poderá determinar a reparação dos danos causados – assim, a reparação ao meio ambiente alcançará a todos; noutro lado, caso o juiz indefira a reparação, todos serão prejudicados na mesma medida. Não há como contabilizar o prejuízo que cada pessoa sofreu ou poderá sofrer. Por esta indivisibilidade os efeitos da coisa julgada são ERGA OMNES, alcança a todos. Para entender mais, veja o vídeo: https://youtu.be/scxxaqnd-rs UNIDADE III 6 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO PODER PÚBLICO Prezado(a) aluno(a), Nesta unidade temática, estudaremos o controle de Constitucionalidade. O objetivo é que, ao final desta unidade, você consiga: https://youtu.be/scxxaqnd-rs • Reconhecer os aspectos gerais do controle de constitucionalidade sobre os atos normativos do poder público; • Identificar o controle de constitucionalidade difuso e concentrado; • Entender a supremacia da Constituição Federal; • Conhecer a diferença entre o controle de constitucionalidade difuso e concentrado. 6 O Controle de Constitucionalidade sobre as Leis e os Atos Normativos do Poder Público O legislador constituinte originário criou mecanismos por meio dos quais se controlam os atos normativos, verificando sua adequação aos preceitos previstos na “Lei Maior”. Segundo Nunes Júnior (2019), o controle de constitucionalidade consiste na verificação da compatibilidade das leis e dos atos normativos com a Constituição. Decorre da supremacia formal da Constituição sobre as demais leis do ordenamento jurídico de um país. Ora, se a Constituição é a lei mais importante do ordenamento jurídico, sendo o pressuposto de validade de todas as leis, para que uma lei seja válida ela precisa ser compatível com a Constituição. Caso a lei ou o ato normativo não sejam compatíveis com a Constituição, serão inválidos, inconstitucionais. Importante destacar que a supremacia da Constituição, a hierarquia normativa da Constituição sobre as demais leis, só se verifica em países de constituição rígida (que possuem um procedimento de alteração mais rigoroso que o destinado às outras leis), como é o caso do Brasil. 6.1 Controle de constitucionalidade difuso Segundo Nunes Júnior (2019), algo difuso é algo espalhado, disperso, disseminado. Controle difuso de constitucionalidade é aquele que pode ser feito por qualquer juiz ou Tribunal, observadas as regras de competência. Todavia, há importantes condições: no controle difuso, qualquer juiz ou Tribunal poderá declarar uma lei inconstitucional, desde que haja um caso concreto e que a inconstitucionalidade seja matéria incidental. Sobre o caso concreto: primeiramente, só se pode exercer o controle difuso de constitucionalidade desde que haja um caso concreto. Dessa maneira, não é possível iniciar um processo perante o juiz de primeira instância com o único objetivo de declarar uma lei (municipal, estadual ou federal) inconstitucional. Por exemplo, se alguém está sendo processado criminalmente pelo crime de porte de drogas (art. 28 da Lei 11.343/2006), em sua sentença, o magistrado poderá absolver o réu pela atipicidade da conduta (art. 386, III, CPP), sob o argumento de que a lei é inconstitucional. Sobre matéria incidental: no controle difuso, é imperioso afirmar que a inconstitucionalidade é matéria incidental (incidenter tantum). Ou seja, qualquer juiz ou Tribunal pode apreciar, no caso concreto, a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, desde que a inconstitucionalidade NÃO seja a matéria principal do processo. No sistema de controle pela via incidental (também chamada de via de exceção ou defesa), o controle será exercido como questão prejudicial e premissa lógica do pedido principal. Exemplo: na época do Presidente Collor, os interessados pediam o desbloqueio dos cruzados fundando-se no argumento de que o ato que motivou tal bloqueio era inconstitucional. O pedido principal não era a declaração de inconstitucionalidade, mas sim o desbloqueio (LENZA, 2019). O controle incidental de constitucionalidade se dá no curso de qualquer ação submetida à análise do poder Judiciário em que haja um interesse concreto em discussão. Assim, são legitimados ativos (competentes para provocar o Judiciário) todas as partes do processo e eventuais terceiros intervenientes no processo, bem como o Ministério Público, que atua como fiscal da lei (custos legis). 6.1.1 Controle difuso nos tribunais e a cláusula de reserva de plenário (full bench), art. 97 da CF/88 Quando o controle difuso é feito pelos tribunais, é necessário que seja obedecida a cláusula de reserva de plenário (ou regra do full bench), nos termos do art. 97 da CF/88. Desde a Constituição de 1934, a apreciação da constitucionalidade feita pelos tribunais (estaduais ou federais) deve obedecer a esse procedimento. Vejamos: Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo do Poder Público. (BRASIL, 1988). Assim, os tribunais somente poderão declarar uma lei inconstitucional pela maioria absoluta de todos os seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial. Note: a regra do art. 97 é estabelecida para tribunal; não está, portanto, direcionada para o juízo monocrático, mesmo que, incidentalmente, no controle difuso, declare a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo. Assim, a norma inscrita no art. 97 da Carta Federal, porque exclusivamente dirigida aos órgãos colegiados do poder Judiciário, não se aplica aos magistrados singulares quando no exercício da jurisdição constitucional. Efeitos da decisão: o objetivo do controle difuso não é, portanto, proteger a ordem constitucional, mas sim proteger direitos subjetivos das partes. Com base nessa lógica, a decisão no controle de constitucionalidade incidental só alcança as partes do processo, ou seja, tem eficácia inter partes. Além disso, não vincula os demais órgãos do Judiciário e a administração; por isso, diz-se que as decisões no controle de constitucionalidade difuso são não vinculantes. 6.2 Controle de Constitucionalidade Concentrado No Brasil, o controle abstrato é realizado pelo Supremo Tribunal Federal (tendo como parâmetro a Constituição Federal) ou pelos Tribunais de Justiça (tendo como parâmetro as respectivas Constituições Estaduais). Em razão disso, diz-se que o controle abstrato é efetuado de modo concentrado. O controleabstrato de constitucionalidade é aquele que busca examinar a constitucionalidade de uma lei em tese. Não há um caso concreto em análise; é a lei, em abstrato, que tem sua constitucionalidade aferida pelo poder Judiciário. No controle abstrato, a constitucionalidade da lei ou ato normativo é arguida na via principal, por meio de ação direta. O controle concentrado/abstrato de constitucionalidade face à Constituição Federal deve ser feito ao STF por meio de algumas ações, das quais destacamos a Ação Direta de Inconstitucionalidade genérica (ADI). A pergunta que fazemos, agora, é a seguinte: quem pode propor Ação Direta de Inconstitucionalidade perante o STF? A resposta está no art. 103, CF/88, que relaciona os legitimados a propor ADIn perante o STF. Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; VI - o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. (BRASIL, 1988). As decisões de mérito em ADI (decisões definitivas) têm os seguintes efeitos: • Eficácia erga omnes: a decisão em sede de ADI terá eficácia contra todos, ou seja, alcança indistintamente a todos. Isso se deve ao fato de que a ADI é um processo de caráter objetivo, no qual inexistem partes; a ADI tem como finalidade tutelar a ordem constitucional (e não interesses subjetivos); • Efeitos retroativos (ex tunc): a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo terá, em regra, efeitos retroativos (ex tunc). Aplica-se, aqui, a teoria da nulidade, segundo a qual se considera que a lei já “nasceu morta”. Em razão disso, os efeitos por ela produzidos são todos considerados inválidos; assim, é meramente declaratória de uma situação que já existia: a nulidade da norma; • Efeito vinculante: a decisão definitiva de mérito proferida pelo STF em ADI terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Observe que o STF não estará vinculado às decisões que ele próprio tomar em ADI. É perfeitamente possível, dessa maneira, que o STF mude a orientação firmada em julgados anteriores. O efeito vinculante também não alcança o poder Legislativo, que poderá editar nova lei de conteúdo idêntico ao da norma declarada inconstitucional pelo STF. Leia mais sobre Controle de Constitucionalidade em: Lenza, Pedro. ESQUEMATIZADO - DIREITO CONSTITUCIONAL. Disponível em: Minha Biblioteca, (25ª edição). Editora Saraiva, 2021. Pág. 126 e seguintes. UNIDADE IV 7 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 8 A ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA E O TERCEIRO SETOR. 9 A RESPONSABILIDADE DO ESTADO Prezado(a) aluno(a), nesta unidade temática estudaremos matérias sobre o direito administrativo dentro da Constituição Federal. O objetivo é que, ao final desta unidade, você consiga: • Apontar os princípios constitucionais voltados à administração pública; • Descrever a organização administrativa: administração direta, indireta e terceiro setor; • Identificar como se dá a responsabilidade do Estado. Não esqueça de acompanhar nossa disciplina por meio da bibliográfica recomendada! Vamos lá? 7 OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS VOLTADOS À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Para iniciar o estudo acerca dos princípios, é importante destacarmos que eles determinam o alcance e o sentido das regras, servindo de parâmetro para a exata compreensão delas e para a própria produção normativa. Eles não se restringem a fixar limites ou a fornecer soluções exatas, e sim consagram os valores a serem atingidos. Dessa forma, os princípios não fornecem solução única, mas propiciam um elenco de alternativas, exigindo, por ocasião de sua aplicação, que se escolha por uma dentre diversas soluções. Feitas essas considerações acerca dos princípios e regras, devemos destacar dois princípios basilares na definição deste conceito, quais sejam: A SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O INTERESSE PRIVADO e a INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO pelos administradores do Estado. 7.1 Princípio da Supremacia do Interesse Público Para Matheus Carvalho (2017)9, considera-se a supremacia do interesse público uma pedra fundamental na noção de Estado organizado, sendo relevante para a formação de qualquer estrutura organizacional de poder público, como condição de convívio social no bojo da sociedade organizada. Não se trata de princípio expresso, ou seja, não está escrito no texto constitucional, embora existam inúmeras regras que impliquem suas manifestações de forma concreta; para isso, podemos nos referir a 9 Manual de direito administrativo/ Matheus Carvalho - 4. ed. rev. ampl. e atual. - Salvador: JusPODIVM, 2017. institutos correlatos dispostos na Constituição da República, como a possibilidade de desapropriação (5°, XXIV), a requisição administrativa (5°, XXV) entre outras prerrogativas que submetem os direitos do cidadão às restrições impostas pelo Estado. 7.2 Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público Ao administrador, não pertencem os bens da administração; ou seja, ele não é o titular do interesse público – portanto, não tem livre atuação, fazendo-o, em verdade, em nome de terceiros. Assim, podemos dizer que a indisponibilidade do interesse público se configura como um contrapeso do princípio da supremacia estatal. O princípio da Indisponibilidade serve para limitar a atuação desses agentes públicos, evitando o exercício de atividades com a intenção de buscar vantagens individuais. Assim, podemos afirmar que a supremacia do interesse público e a indisponibilidade do interesse público alicerçam o sistema administrativo que se resume nas prerrogativas de que o Estado goza para satisfazer as necessidades coletivas. A administração só pode atuar dentro do limite do interesse público, não obstante goze de vantagens amparadas no próprio interesse coletivo. Desses dois princípios acima referidos decorrem todos os demais. Saiba mais em: Campos, Ana C. Direito Administrativo Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2ª edição). Grupo GEN, 2021. Pág. 23 7.3 Princípios expressos (LIMPE) A Administração Pública, em todos os seus níveis, deverá observar certos princípios constitucionais em sua atuação. Esses princípios estão expressos no art. 37, CF/88: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) • Legalidade: representa a submissão do Estado à lei; • Impessoalidade: finalidade ou isonomia; • Moralidade: atuação ética e honesta dos agentes públicos na gestão da coisa pública; • Publicidade: eficácia e transparência da administração em sua atuação; • Eficiência: deve-se buscar a melhoria da qualidade dos serviços públicos e a racionalidade dos gastos públicos. Atenção! Exceções à legalidade Apesar de a legalidade ser uma regra, em algumas situações, mediante autorização da própria Carta Maior, poderá o administrador agir diretamente sem a necessidade de uma prévia lei. São três as exceções à legalidade, a saber: Medidas provisórias; Estado de defesa e Estado de sítio. Campos, Ana C. Direito Administrativo Facilitado. Disponível em: MinhaBiblioteca, (2ª edição). Grupo GEN, 2021. Pág. 31 Leitura obrigatória em: Moraes, Alexandre D. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (38ª edição). Grupo GEN, 2022. Pág. 396 e seguintes. 8. A ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA: ADMINISTRAÇÃO DIRETA, INDIRETA E O TERCEIRO SETOR A organização administrativa é a estruturação do Estado. Seu estudo é o conhecimento acerca de pessoas, entidades e órgãos que irão desempenhar a função administrativa para formação do modelo do aparelho administrativo do Estado. Assim, a função administrativa abarca a prestação dos serviços públicos essenciais à vida em coletividade, bem como o controle das atividades privadas. A organização é feita, primordialmente, mediante leis ou por meio de decretos e outros atos normativos. Isso porque, para o melhor funcionamento estatal, alguns serviços são prestados diretamente pelos entes federativos, sem que seja transferida a execução a outrem; porém, em determinadas situações, as pessoas políticas transferem a prestação dos serviços a outros entes. Fonte: Campos, Ana C. Direito Administrativo Facilitado. 2021. 8.1 Administração Direta Administração direta é o conjunto de órgãos que integram as pessoas políticas do Estado (União, estados, Distrito Federal e municípios), aos quais foi atribuída a competência para o exercício de atividades administrativas, de forma centralizada. Em outras palavras, na administração direta, “a administração pública é, ao mesmo tempo, a titular e a executora do serviço público10”. São, portanto, entidades da administração direta: • A União; • Os estados; • Os municípios; • O Distrito Federal. Fonte: Cláudia, CAMPOS, A. Direito Administrativo Facilitado. Grupo GEN, 2018. Por ostentarem personalidade jurídica de direito público, essas entidades gozam de todas as prerrogativas inerentes à administração e se submetem a todas as limitações estatais que decorrem da indisponibilidade do interesse público. As pessoas 10 Carvalho Filho (2014, p. 459). que aí exercem atividades internas e externas, valendo-se para isso de seus órgãos, que possuem competência própria e específica, são os servidores públicos. Ressalte-se que o órgão público não tem personalidade jurídica; logo, não tem vontade própria. Todos eles são meros instrumentos de ação do Estado, e não podem ser sujeitos de direitos e obrigações. Pode-se dizer que são centros de competência especializada, dispostos, na intimidade de uma pessoa jurídica, com a intenção de garantir especialização nas atividades prestadas e, consequentemente, maior eficiência. Nas situações em que as atividades são exercidas diretamente pelos entes políticos, a prestação não é transferida a nenhuma outra entidade. Nesse caso, a prestação é feita diretamente pelos entes federativos; denomina-se essa execução de prestação centralizada do serviço. Assim, a União, os estados, municípios e o Distrito Federal executam as atividades diretamente, por meio de seus agentes e órgãos e, nesse sentido, essas entidades são chamadas pela doutrina de entes da administração direta ou entes da administração centralizada. 8.2 Administração Pública Indireta Já a transferência dos serviços a pessoas jurídicas diversas recebe o nome de descentralização, haja vista o fato de que a prestação, até então centralizada, é entregue a outra entidade. A descentralização pode ser executada com a transferência na prestação do serviço a pessoas jurídicas criadas pela própria administração pública, especializadas na execução daquela atividade. São os chamados entes da administração indireta ou entes da administração descentralizada, os quais se dividem em: • Autarquias (incluindo as associações públicas); • Fundações públicas; • Empresas públicas; • Sociedades de economia mista. Isso porque o Estado pode transferir a responsabilidade dos exercícios que lhes são pertinentes, criando pessoas jurídicas especializadas, autorizando que elas executem a prestação dos serviços. Isso é feito porque a transferência a pessoa especializada na prestação de determinado serviço garante uma maior eficiência no desempenho da atividade administrativa, sempre na busca do melhor ao interesse da coletividade. Por outro lado, quando a União se responsabiliza pela prestação, por exemplo, do serviço de saúde, o faz mediante a distribuição interna de competência entre órgãos responsáveis por essa atividade, como o Ministério da Saúde, o Sistema Único de Saúde, os hospitais públicos, entre outros. Essa distribuição interna de competências, entre órgãos e agentes de uma mesma pessoa jurídica, é denominada de desconcentração administrativa. ATENÇÃO! Não confunda descentralização X desconcentração! A descentralização é realizada entre pessoas jurídicas diversas, enquanto a desconcentração se configura pela distribuição interna de competências no âmbito de uma mesma pessoa jurídica, mediante especialização interna (há hierarquia). Na descentralização não há hierarquia, mas se sujeitam a controle finalístico a ser exercido pelas entidades da administração centralizada. Saiba mais em: Campos, Ana C. Direito Administrativo Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2ª edição). Grupo GEN, 2021. Pág. 108 e seguintes. Saiba mais sobre Administração Direta e indireta em: Almeida, Fabrício Bolzan D. Manual de direito administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (5ª edição). Editora Saraiva, 2022. Pág. 53 e seguintes. Saiba mais sobre Autarquias; Fundações públicas; Empresas Estatais (Empresas públicas; Sociedades de economia mista), em Campos, Ana C. Direito Administrativo Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2ª edição). Grupo GEN, 2021. Pág, 122 e seguintes. 8.3. Terceiro Setor A primeira informação acerca dessa temática é que o terceiro setor não integra o sistema da administração pública formal, direta ou indireta: ele coopera com o governo, prestando serviços de utilidade pública; são entidades paraestatais. As entidades paraestatais são aquelas pessoas jurídicas que atuam ao lado e em colaboração com o Estado, sem com ele se confundirem. Trata-se de pessoas privadas, vale dizer, instituídas por particulares, sem fins lucrativos, que exercem função típica, embora não exclusiva, do Estado, se sujeitando ao controle direto ou indireto do Poder Público. (ALVES, 2018).11 11 ALVES, Erick. Direito Administrativo. Estratégia Concursos, 2018. Por atuarem na prestação de serviços, estas entidades recebem incentivos do poder público, mediante dotação orçamentária, cessão de bens públicos, entre outros benefícios e, consequentemente, se submetem às restrições de controle impostas ao ente estatal. Sendo assim, se sujeitam à regulação financeira efetivada pelo Tribunal de Contas, além de se submeterem aos princípios básicos que norteiam a atuação administrativa. São cinco as espécies de entes do terceiro setor tratados no direito brasileiro, a saber: • Entidades do serviço social autônomo; • Organizações sociais (OS); • Organizações da sociedade civil de interesse público (Oscip); • Organizações da sociedade civil; • Entidades de apoio. Para saber tudo sobre o TERCEIRO SETOR, leia: Campos, Ana C. Direito Administrativo Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2ª edição). Grupo GEN, 2021. Pág. 171 e seguintes. 9 A RESPONSABILIDADE DO ESTADO Passaremos agora a estudar a reponsabilidade civil do Estado enquanto sujeito de direito. A Constituição Federal, assevera que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentescausarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. A responsabilidade civil do Estado no Brasil, hoje, está prevista no art. 37, § 6º, que dispõe: § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. (BRASIL, 1988). Ressalta-se que a responsabilidade objetiva é a regra no país, acatada como padrão a teoria do risco administrativo. A doutrina e a jurisprudência admitem ser possível compatibilizá-la com a responsabilidade subjetiva, nos casos de danos decorrentes de atos omissivos (teoria da culpa do serviço). A responsabilidade civil, também denominada responsabilidade extracontratual, tem sua origem no direito civil. Consubstancia-se na obrigação de indenizar um dano patrimonial ou moral decorrente de um fato humano. 9.1 Responsabilidade objetiva do Estado Segundo Alexandrino (2016, p. 851), a fundamentação da responsabilidade estatal reside na busca de uma repartição isonômica, equânime, do ônus proveniente de atos ou dos efeitos oriundos das atividades da administração. Para o autor, evita-se, com a repartição entre todos os cidadãos, o ônus financeiro da indenização, visto que somente alguns suportam os prejuízos ocorridos por causa de uma atividade desempenhada pelo Estado no interesse de todos. Em resumo, significa dizer que, se todos são beneficiados pelos fins visados pela administração, todos devem igualmente suportar os riscos decorrentes dessa atividade, ainda que essa atividade tenha sido praticada de forma irregular, porém em nome da administração. Observa-se que a responsabilidade objetiva reconhece a desigualdade jurídica existente entre o particular e o Estado, decorrente das prerrogativas de direito público a este inerentes, prerrogativas estas que, por visarem à tutela do interesse da coletividade, sempre assegurarão a prevalência jurídica destes interesses diante dos interesses particulares. Partindo dessa premissa, seria injusto que aqueles que sofrem danos patrimoniais ou morais decorrentes da atividade da administração precisassem comprovar a existência de culpa da administração ou de seus agentes para que vissem assegurado seu direito à reparação. 9.2 Responsabilidade subjetiva da administração É equivocado afirmar que, diante de qualquer situação, a responsabilidade da administração pública seja sempre objetiva (ALEXANDRINO, 2016, p. 858). Nesse contexto, o art. 37, § 6º da CF/88 atribui responsabilidade extracontratual objetiva ao Estado apenas na hipótese de danos que decorram direta e imediatamente de alguma atuação, de alguma conduta comissiva de seus agentes. A Constituição de 1988 não traz qualquer regra expressa relativa a responsabilidade civil por eventuais danos ocasionados por omissões do poder público. Nesse sentido, construiu o entendimento jurisprudencial respaldado na doutrina de que é possível configurar a responsabilidade extracontratual do Estado nos casos de danos ensejados por omissão do poder público. Embora haja controvérsias, a jurisprudência entende que o Estado responde com base na teoria da culpa administrativa (responsabilidade civil subjetiva). Contudo, a pessoa que sofreu o dano tem que provar (o ônus da prova é dela) que houve falta na prestação de um serviço que deveria ter sido prestado pelo Estado, provando, também, que existe nexo causal entre o dano e essa omissão estatal. Nesse caso, aplica-se a teoria da culpa administrativa (ou culpa anônima), em que o particular, para ser indenizado, tem que comprovar omissão de agente público, dano, nexo causal e a culpa do Estado. Imagine, por exemplo, uma situação em que a polícia seja avisada de que um grupo armado está realizando um assalto em determinada localidade da cidade e, mesmo estando próxima ao local e com bastante tempo disponível para agir, não tome nenhuma providência para evitar o dano ao patrimônio privado. Para ensejar a responsabilização, a pessoa que sofreu o dano deve provar que houve falta no serviço que o Estado deveria ter prestado (nas modalidades omissivas inexistência do serviço, deficiência do serviço ou atraso na prestação do serviço). Nas hipóteses de danos decorrentes de atos de terceiros ou de fenômenos da natureza, para se configurar a obrigação estatal de indenizar, há necessidade de comprovação de que determinada omissão culposa da administração pública concorreu para o resultado danoso. O ônus da prova de todos esses elementos é da pessoa que sofreu o dano. 9.3 Ação de reparação do dano (art.37, §6º, CF/88) O particular que sofreu dano decorrente de atuação do agente público, que estivesse agindo nessa qualidade, deverá ajuizar ação de indenização contra a administração pública, e não contra o agente causador do dano. Por exemplo: se um servidor público federal causar algum dano a um particular, digamos, numa colisão de veículos, a ação de indenização movida pelo particular será contra a União, e não contra o servidor. Na ação de indenização, bastará ao particular demonstrar a relação direta de causa e consequência entre a atuação lesiva e o dano, bem como o valor patrimonial desse dano. Nesse caso, a responsabilidade da administração pública (ou da delegatária de serviço público) é do tipo objetiva, bastando, para a configuração da sua obrigação de indenizar, que a vítima comprove estarem presentes os pressupostos: DANO + NEXO CAUSAL DIRETO E IMEDIATO Cabe à administração pública (ou à delegatária), para afastar ou atenuar a obrigação de indenizar, comprovar, se for o caso, que o particular concorreu com dolo ou culpa para o evento danoso, ou provar a ocorrência de força maior ou caso fortuito, o que pode resultar em três situações. Vejamos: • Se não conseguir provar, responderá integralmente pelo dano, devendo indenizar o particular; • Se comprovar culpa exclusiva do particular, ou ocorrência de força maior ou caso fortuito, ficará eximida da obrigação de reparar; • Se comprovar que houve culpa recíproca (parcial de ambas as partes), a obrigação será atenuada proporcionalmente. Frisa-se que é de cinco anos o prazo de prescrição da ação de reparação que o particular tem para ajuizar a ação contra a pessoa jurídica de direito público, ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, visando a obter a indenização dos danos causados pela atuação dos agentes dessas pessoas jurídicas (art. 1º-C, da Lei 9.494/1997). 9.4 Ação regressiva contra o agente causador do dano A Constituição Federal, no seu art. 37, § 6º, autoriza a ação regressiva da administração pública (ou da de legatária de serviço público) contra o agente cuja atuação acarretou o dano, desde que seja comprovado dolo ou culpa na atuação do agente. Fonte: