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O r d e m d o s A d v o g a d o s d o B r a sil C o n se l h o F e d e r /Vl ADVOGADO: PRERROGATIVA D E PRISÃO EM SALA DE E s T A D O -M a IOR OU PRISÃO DOMICILIAR Parecer do Conselheiro Federal Nereu Lima (RS) no Processo n® 4.675/2001/COP. Brasília, DF - 2002 ©Ordem dos Advogados do Brasil Conselho Federal, 2002 D ir e t o r ia : Rubens Approbate Machado Presidente Roberto Antenío Busato Vice-Presidente Gilberte Gomes Secretário-Geral Sérgio Alberto Frazão do Couto Secretário-Geral Adjunto Esdras Dantas de Souza Diretor Tesoureiro Capa: Susele Bezerra Miranda Organização editorial: Luiz Carlos Maroclo Tiragem: 2.000 exemplares FICHA CATALOGRÁFICA Lima, Nereu Advogado: prerrogativa de prisão em sala de Estado-Maior ou prisão domiciliar / Nereu Lima, OAB, Conselho Federal, 2002. 24 p. 1. Advogado - Prerrogativa - Prisão. I. Ordem dos Advogados do Brasil. Conselho Federal. II. Título. CDD: 341.415 APRESENTAÇÃO O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, dentro de suas funções institucionais e corporativas, ao longo de sua profícua existência, se tornou a entidade mais representativa e combativa da sociedade brasileira, símbolo da própria liberdade, apanágio da democracia e fundamento da justiça. E, nessa sua tradição, as decisões do Conselho Federal, respaldadas em pareceres superiormente elaborados e fundamentados na pena de seus ilustres membros. Mantendo essa tradição, o Conselho Federal ao ser acionado pelo ilustre Presidente da Subsecção de Campinas-SP, advogado Dijalma Lacerda, ante o aparente conflito exegético do disposto no artigo 295 do Código de Processo Penal (com a redação que lhe foi dada pela Lei 10.258, de 11 de julho de 2.001), em face do comando enunciado no inciso V, artigo 7°, da Lei 8.906/94 (EAOAB), no que tange às regras sobre a prisão especial, se manifestou, através da pena brilhante do Conselheiro NEREU LIMA, digno representante da OAB do Rio Grande do Sul. NEREU LIMA, ressalte-se, é, inquestionavelmente, uma das figuras mais expressivas da advocacia brasileira e vem, de longa data, prestando relevantíssimos serviços à corporação, notabilizando-se como um dos mais atuante membro do Conselho Federal, doando sua inteligência às causas mais nobres, dedicada ao aperfeiçoamento da cidadania brasileira. NEREU LIMA é fiel obediente ao princípio de que o advogado desempenha, na sua atividade profissional, relevante missão social. Esses predicados, como de hábito ocorre em seus trabalhos, se revelam, mais uma vez, no PARECER lavrado no processo n® 4.675/2001/COP. Aborda, com a precisão e a lucidez que lhe são próprias, o tema da Prisão Especial, mostrando, no que concerne ao advogado, a prevalência da lei especial (Lei 8.906/94), impondo-se a obediência ao artigo 7“, inciso V, que assegura ao advogado o direito de “não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado-Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e, na sua fa lta , em prisão domiciliar'’. Os fundamentos do Parecer, que defende e assegura a prerrogativa do advogado, se mostram irrespondíveis. A par da análise, lógica, sistemática e teleológica da norma positiva, o Parecer dá uma lição do verdadeiro conteúdo do exercício da advocacia, trazendo à colação lições históricas e dá relevo, ao dizer que “/o í, assim, ao longo de muitas lutas que os Advogados se fizeram respeitar, em todos os quadrantes do mundo, nem tanto pelos nomes rutilantes que até hoje são invocados, mas acima de tudo, pelo relevante e indeclinável papel que lhes fo i reservado, qual seja, a defesa dos interesses, das liberdades, do patrimônio, dos direitos e garantias individuais e coletivos numa frase, defesa dos cidadãos perante o Estado". Trata-se, como grifado, não da defesa de um “privilégio”, mas sim de um direito que se volta muito mais ao interesse da sociedade do que ao do próprio advogado. E esse interesse da sociedade se deve a um desempenho efetivo do advogado na defesa da cidadania, tornando indissolúvel o binômio “advocacia-cidadania” , motivo pelo qual “o advogado há de se empenhar, com todas as suas energias, para reforçar, em nosso país, o conceito da activae civitatis. a Cidadania Ativa, única maneira de construirmos uma sociedade altaneira, dinâmica, justa, próspera solidamente comprometida com os ideais da liberdade, da Justiça e do Direito “(Rubens Approbate M achado - “in” “Homens & Idéias - Pequenas Homenagens - Grandes Esperanças” , pág.241). E, NEREU, no seu ilu stra tiv o , pedagógico e notável P arecer, realça: "'Advogado da cidadania, denuncia o arbítrio, luta pela paz, não a dos cemitérios, mas aquela que é sinônimo de pão, teto, lazer, saúde, bem-estar, em resumo: Justiça Social". Essas lições de NEREU LIMA devem ser, a lodo momento, lidas, relidas, trelidas, para serem fixadas, de forma indelével, em nossas consciências, na consciência nacional. Parecer de tão estelar grandeza não pode ficar trancafiado nas gavetas da entidade. Deve, obrigatoriamente, ser dado a público, para que as idéias que contêm possam germinar no terrreno fértil do pensamento do cidadão brasileiro, tornando-o um “cidadão-ativo” . RUBENS APPROBATO MACHADO Presidente do Conselho Federal da OAB PROCESSO N" 4.675/2001/COP Protocolou-se neste Conselho Federal o Ofício de n° 3.818/001, em 07 de agosto de 2001, subscrito pelo Presidente da Terceira Subseção da OAB/SP, de Campinas, e datado de 1° de agosto de 2001, cuja capa está assim destacada: “ORIGEM: CONSELHO FEDERAL - GABINETE DA PRESIDÊNCIA. ASSUNTO: ARTIGO 295 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - MANTENÇA DO DISPOSITIVO NO INCISO V, DO ART. T DA LEI FEDERAL N“ 8.906/94 - PRISÃO ESPECIAL. RELATOR: Conselheiro Nereu Lima (RS)” Remetidos os autos a este Relator em 14 de agosto de 2001. RELATÓRIO Protocolou-se, neste Conselho, o ofício de n" 3.818/001, subscrito pelo Presidente da Terceira Subseção da OAB/SP, Campinas, datado em 1® de agosto do ano corrente (cf. fls. 02-03), e protocolado em 07 de agosto de 2001 (cf. fl. 02). O aludido ofício solicita providências a respeito da Lei n" 10.258, de 11 de julho de 2001, que alterou o artigo 295 do Código de Processo Penal, dispositivo esse que estatui normas sobre a prisão especial. Consta, à fl. 05 dos autos, o texto da Lei n® 10.258, de 11 de julho de 2001. Nesse passo, convém transcrever excerto da Lei em exame: "Art. 1° - O art. 295 do Decreto-Lei n°3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 2 9 5 ........................... V - os oficiais das Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios; 5 § J° A prisão especial, prevista neste Código ou em outras leis, consiste exclusivamente no recolhimento em local distinto da prisão comum. § 2" Não havendo estabelecimento específico para o preso especial, este será recolhido em cela distinta do mesmo estabelecimento. § 3'‘-A cela especial poderá consistir em alojamento coletivo, atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana. § 4'‘^ 0 preso especial não será transportado juntamente com o preso comum. § 5“ Os demais direitos e deveres do preso especial serão os mesmos do preso comum. ” (NR). ” Mencionada Lei entrou em vigor na data de sua publicação (DOU de 12.07.2001). O receio, argüido na manifestação exposta pelo representante da Terceira Subseção da OAB paulista, é de que a Lei, acima identificada, prejudique a prerrogativa contida no inciso V, do art. 7°, da Lei 8.906/94 - EAOAB que dispõe, textualmente: "Art. 7° São direitos do advogado: V - não ser recolhido preso,antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado-Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e, na sua falta, em prisão domiciliar. " A sugestão do Presidente da 3" Subseção, OAB-Campinas, é no sentido de que a Lei Federal em comento consigne, expressamente, a manutenção do disposto no art. T, inc. V, da Lei n“ 8.906/94. Após autuação do Oficio no Conselho Pleno, vieram os autos para Relatório e Voto. É o relatório. Porto Alegre, 22 de agosto de 2001. NEREU LIMA Conselheiro Federal (RS) Relator 6 VOTO Sugere o d iligente líder dos A dvogados Cam pinenses, Dr. Djalma Lacerda, que "Lei Federal dissesse, expressamente, que fica mantido o disposto no inciso V do art. 7" da Lei Federal 8.906/94, já que advogados não constam do rol exaustivo do artigo 295 do CPR, e sim de Lei Especial, a 8.906/94". É por tudo louvável a preocupação daquele, entretanto, entendemos que a mesma não se justifica. Ao menos, à luz dos textos expressos da recente Lei Federal n“ 10.258, de 11 de julho de 2001, já em vigor desde 12.07.01, e da Lei Federal n“ 8.906, de 4 de julho de 1994, que dispõe sobre o “Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB Para que se possa enfrentar o exame da matéria proposta com segurança, mister se faz uma análise da mesma no campo legal, jurisprudencial, histórico e sociológico em que se situa a figura do Advogado. Já o art. r da questionada Lei 10.258/2001 enuncia expressamente o conteúdo e finalidade específicos da mesma; “O art. 295 do Decreto-Lei n" 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, passa a vigorar com as seguintes alterações''. O caput do art. 295, do CPP, que permanece inalterado, está assim redigido: "Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva". Segue-se a enumeração, (como corretamente advertido pelo Líder dos Advogados Campinenses), de natureza exaustiva: M inistros de Estado; Governadores, interventores, prefeito do Distrito Federal (redação de 1957), seus 7 Secretários, Prefeitos Municipais, Vereadores, Chefes de Polícia; membros do Parlamento Nacional, do Conselho de Economia Nacional e das Assembléias Legislativas dos Estados; Cidadãos inscritos no “Livro de Mérito”; oficiais das Forças Armadas e do Corpo de Bombeiros; Magistrados; diplomados por qualquer das Faculdades Superiores da República; ministros de confissão religiosa; Ministros do Tribunal de Contas; Cidadãos que já tiverem exercido efetivamente a função de Jurado, salvo quando excluídos da lista por motivo de incapacidade para o exercício daquela função; Delegados de Polícia e guardas-civis dos Estados e Territórios, ativos e inativos. Essa enumeração exaustiva sofreu modificações de redação e acréscimos decorrentes de leis esparsas, já incorporados ao texto. Por sua vez, o art. 296, do CPP, que não foi objeto de alteração, está assim redigido: "Os inferiores e praças de pré, onde fo r possível, serão recolhidos à prisão, em estabelecimentos militares, de acordo com os respectivos regulamentos’*. Primeira alteração da Lei 10.258/2001:0 original inciso V, assim redigido; “os oficiais das Forças Armadas e do Corpo de Bombeiros'’ passa a ter a seguinte redação: “os oficiais da Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal edos Territórios”. Os cinco parágrafos que foram acrescentados pela aludida Lei ao art. 295, do CPP, tratam de estabelecer normas atinentes à PRISÃO ESPECIAL, seja esta prevista no Diploma Adjetivo Penal ou em outras leis (§ T). Ademais, é importante notar que mencionado art. 295, agora com a redação da nova Lei, faz parte das denominadas “DISPOSIÇÕES GERAIS” do importante título do CPP que trata da “PRISÃO E LIBERDADE” . A Lei 8.906/94, por seu turno, de natureza especial, regula à saciedade a atividade da advocacia e sua Entidade representativa, a OAB, assegurando ao Advogado, para que possa desempenhar seus graves encargos com independência, dignidade e liberdade, dentre outras, a prerrogativa expressa de “/jflo ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado-Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e, na sua falta, em prisão domiciliar". (Art. 7“, inciso V, da Lei 8.906/94) Por Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pela AMB (ADIn n® l .127-8), a eficácia da expressão “assim reconhecidas pela OAB'\ foi suspensa pelo STF, em medida liminar, logo, mantendo-se íntegro o referido inciso V em todos os seus demais termos. Pretendesse o legislador regulamentar também a prisão do Advogado, antes da condenação definitiva, e lançaria mão das expressões tradicionais que encerram os diplomas legais: “revogam-se as disposições em contrário” ou “fica revogado o inciso V, do art. T , da Lei 8.906/94”. Conquanto o Advogado, por ser portador de diploma de nível superior, também estivesse abrangido pelo art. 295, do CPP, para efeito de gozar da prerrogativa da prisão especial a que alude o referido artigo, verdade é que ele possui o direito àquela modalidade distinta de prisão - em sala de Estado-Maior - assegurada expressamente em todos os Estatutos da OAB, como se verá adiante. Deflui dos dois textos sub examen que não se pode considerar a custódia do Advogado como prisão especial, nos moldes preconizados pela Lei Processual Penal. Trata-se, isto sim, de uma modalidade de prisão que só pode ser executada em sala de Estado-Maior. E, na sua falta, em prisão domiciliar (art. 7°, V, do EAOAB). Essa conclusão é uma decorrência lógica da literalidade do texto da Lei Federal n“ 8.906, de 4 de julho de 1994. Se ainda pairasse dúvida, aplicável aqui à espécie o lapidar ensinamento de Fernando da Costa TOURINHO FILHO: '"Insta esclarecer que o bacharel em Direito fazjus à prisão especial, nos termos do art. 295, por ser diplomado por escola superior. Mas, se inscrito na OAB, nos termos do art. 7.°, % da Lei n. 8.906, de 4-7-1994 (Estatuto da Advocacia), não pode ser recolhido preso antes de sentença transitado em julgado, senão em sala do Estado-Maior, com instalações e comodidades 9 condienas. e. na sua falta, em prisão domiciliar. Trata-se de lei especial, e, a nosso juízo, em face do princípio da especialidade, a nova lei não a revogou, não só porque lex posterior qeneralis non deroeaí soecialL como também porque ali não se fala em “prisão especial”, mas em Sala do Estado- Maior ou prisão domiciliar."' (In “Em que consiste a prisão especial?”, www.direitocriminal.com.br, 24.07.2001) São dois diplomas legais distintos, com finalidades distintas. De um lado, o CPP, buscando resguardar determinados segmentos de pessoas do convívio promíscuo e nefasto dos cárceres e presídios em razão, seja do trabalho que exercem, seja em decorrência do cargo que ostentam, todos eles, como já elencado, merecedores, aos olhos do legislador, dessa custódia diferenciada que, ao nosso ver, deveria ser estendida, de legeferenda, a todos os presos provisórios. De outro lado, surge o Estatuto da Advocacia e da OAB. E tal prerrogativa, decorrente do relevante trabalho de interesse público desempenhado pelo Advogado, está ungida pelo povo brasileiro, ao longo dos tempos. Primeiro Regulamento da Ordem dos Advogados do Brasil, aprovado pelo Decreto n® 20.784, de 14 de dezembro de 1931: « Ari. 25 • São direitos dos advogados: V lll - não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala especial de Estado Maior". O exponenciai jurista LEVI FERNANDES CARNEIRO, idealizador do Regulamento e primeiro Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, citado pelo não menos ilustre Advogado ALOYSIO TAVARES PICANÇO, assim se pronunciava: ''Tenho sempreqfirmado que nosso dever de advogados, de juristas, de homens v< t^ados ao cuUo da ordem jurídica - é, menos a defesa de itUeresses eventuais de certo número de indivíduos envolvidos em pleitos jurídicos que os da própria coletividade nacional” (“No lAB e na OAB” , Rio de Janeiro, 2000, p. 143). 10 Sucedeu o regulamento a Lei n° 4.215, de 27 de abril de 1963 (“Dispõe sobre o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil”); Art. 89. São direitos do advogado e do provisionado: V - não ser recolhido preso antes da sentença transitada em julgado, senão em sala especial de Estado-Maior*’. A novidade, assim, do atual Estatuto, é que. não havendo Sala de Estado- Maior, o Advogado deverá ser recolhido em prisão domiciliar. Registre-se, por oportuno, que o Conselho Federal da OAB cogitou a hipótese de assegurar ao Advogado a prerrogativa genérica da “prisão especial”, quando das discussões sobre o atual Estatuto, sem menção a “Sala de Estado-Maior”, com isso, nivelando-se aos demais profissionais universitários. Contudo, como bem consigna o insigne Advogado ANTÔNIO CARLOS MONREAL: "'prevaleceu, no entanto, a continuidade desta prerrogativa, após os depoimentos dos advogados que se expuseram aos arbítrios dos regimes autocráticos, porforça de sua atuação profissional em defesa de dissidentes políticos.” {in. “Cinco anos de Estatuto da Advocacia e da OAB - Comentários”, OAB/Mato Grosso do Sul, 1999, p. 173). Mas, afinal, por qual razão as sociedades de todos os tempos sempre reservaram uma especial atenção a esse operário do Direito e da Eqüidade? Nossa pátria-mãe portuguesa, pela voz abalizada do Advogado ABEL LAUREANO, reforça essa idéia-força da independência do Advogado: “a máxima responsabilidade do advogado reside no seu especial dever de obediência à lei. As normas essenciais que regem a sua actividade são de interesse e ordem pública, inderrogáveispor estipulação contrária. Vale dizer que o advoeado é independente para asseeurar a supremacia 11 do império da lei, sobre o da vontade que àquela tente opor-se. Em suma, o advogado não se serve a si próprio, nem serve o cliente, m m serve afinal pessoa alguma. Como impressivamente o qualifica o Estatuto (art. 76% n.° 1), é um “servidor da Justiça e do direito’*; o que enforma a nobreza da sua missão." (“O Cliente e a Independência do Advogado - Uma Chave da Deontologia Profissional”, Edit. “Quid Juris?”, LISBOA, 1992, p. 137) Outro não é o ensinamento do festejado RUY DE AZEVEDO SODRÉ sobre o papel reservado ao Advogado na sociedade: '^ Mas mesmo esse conceito de função social vem se ampliando nos dias atormentados em que vivemos. O advogado é o baluarte da liberdade. Sua função só pode ser exercida livremente num clima de liberdade." (“Ética Profissional e Estatuto do Advogado”, LTt, 4“ ediç., 1991, p. 288). Não se pode perder de vista, para melhor entendimento do texto, que a regra é a liberdade, a prisão é a exceção. Em boa hora o constituinte brasileiro de 1988 introduziu em nossa Lei Magna o princípio da presunção de inocência (art. 5”, LVn), consagrado pela Revolução Francesa, no art. 9“ da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 3 de novembro de 1789 {verbis): "'Todo o homem, sendo presumido inocente até que seja declarado culpado, se fo r decidido que é indispensável prendê-lo, todo o rigor que não seja necessário para segurança de sua pessoa deve ser severamente reprimido pela lei", Quando a nossa Constituição diz expressamente que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória*' (art. 5“, LVII)), qualquer prisão ou detenção terá um caráter meramente cautelar e a prisão de qualquer 12 pessoa somente deverá ocorrer em casos excepcionalíssimos e de extrema necessidade. É a lição repisada do consagrado processualista TOURINHO FILHO: ‘Wa verdade, já se disse que toda e qualquer prisão que anteceda a um decreto condenatório é medida odiosa e que se admite como um ‘mal necessário Sendo assim, é evidente que a prisão provisória somente poderá ser admitida dentro nos limites do inevitável, do indispensável, do necessário."' (“Processo Penal”, ed. Saraiva, 12* ediç., 1990, 3° vol. p.372) Toda a restrição, pois, ao sagrado direito de locomoção, deve limitar-se ao estritamente indispensável, o que importa, dessarte, em não juntar promiscuamente presos provisórios aos que já se encontram definitivamente condenados e cumprindo suas penas nas masmorras, nos depósitos humanos, eufemisticamente denominados de presídios brasileiros. E essa regra vale não só para os Advogados como para todos os presos provisórios, independentemente de suas condições sócio-culturais. Regra que, lamentavelmente, é transformada em tabula rasa pelos responsáveis pela política penitenciária em nosso país. Os outros dois importantíssimos operadores do Direito, Magistrados e membros do Ministério Público, também têm asseguradas tais prerrogativas em suas Leis Orgânicas: “Art. 33. São prerrogativas do magistrado: III • ser recolhido a prisão especial, ou a sala especial de Estado-Maior, por ordem e à disposição do tribunal ou do Orgão Especial competente, quando sujeito a prisão antes do julgamento fin a l' (Lei Complementar 35, de 14.3.79 - Lei Orgânica da Magistratura Nacional - LOMAN). “Art. 40. Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, além de outras previstas na Lei Orgânica: V - ser custodiado ou recolhido à prisão domiciliar ou à sala especial de Estado Maior, por ordem e à disposição do tribunal competente, quando 13 sujeito a prisão antes do julgamento final" (Lei 8.625, de 12.2.93 - Lei Orgânica Nacional do Ministério Público - LOMIN). De sua parte, os Tribunais pátrios, em reiteradas e remansosas Decisões, vêm albergando essa salular prerrogativa dos Advogados: ""Enquanto não houver transitado em ju lg a d o a sentença condenaíória, deve o advogado permanecer recolhido em prisão domiciliar, por absoluta inexistência de Sala Especial de Estado-Maior. Esse direito, que a princípio parece se constituir num privilégio, não fo i conferido em atenção à pessoa, mas sim, em homenagem aos interesses públicos que a esses profissionais são confiados, porquanto, inobstante não seja funcionário público na acepção jurídica do termo, o advogado, no exercício de sua atividade privada, presta serviço público, sendo elemento indispensável à Administração da Justiça'" (TACrSP, ‘Habeas Corpus’ 275.474/5 - 15" C. - Relator Juiz SILVA RICO, publicado na RT 723, p. 591). Interessante observar que esse entendimento, corrente nos demais Tribunais, data de 1.6.95, isto é, quando já em vigor o atual Estatuto da OAB. Submetida a matéria à apreciação de nossa Corte Constitucional, in casu, o Supremo Tribunal Federal, assim espancou qualquer possibilidade de controvérsia, através do voto sempre brilhante do Min. Relator CELSO DE MELLO, decisão essa que, induvidosamente, não se altera, com o advento da Lei 10.258/2001: “o Advogado tem o insuprimível direito, uma vez efetivada a sua prisão, e até o trânsito em iuleado da decisão oenal condenatória. de ser recolhido a sala de Estado-Maior, com instalações e comodidades condignas (Lei n^8.906/94, art. 7°, V). Trata-se de prerrogativa de ordem profissional que não pode deixar de ser respeitada, muito embora cesse com o trânsito em julgado da condenação penal. Doutrina e .Jurisprudência. O recolhimento do Advogado a prisão especial constitui direito público subjetivo outorgado a esse profissional do Direito pelo ordenamento positivo brasileiro, não cabendo opor-lhe quaisauer embaraços, desde que 14 a decisão penal condenatória ainda não se tenha qualificado pela nota da irrecorribilidade. A inexistência, na comarca, de estabelecimento adeauado ao recolhimento prisional do Advogado, antesde consumado o trânsito em julgado da condenação penal, confere-lhe o direito de beneficiar-se do regime de prisão domiciliar. ” (STF, ‘Habeas Corpus’ 72.465-5, SP, 1“ Turma, Decisão unânime pelo deferimento parcial do HC, em 5.9.95). Para que se possa entender, com clareza solar, as razões que levaram o legislador a assegurar ao Advogado a prerrogativa de não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado-Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e, na sua falta, em prisão domiciliar, faz- se mister, ainda que perfunctoriamente, uma análise do papel relevante desse operador do direito ao longo da história dos povos. A história da advocacia se confunde com a história da própria humanidade. Se emprestarmos ao termo um conteúdo mais amplo, a figura do advogado esteve presente na vida dos povos em todos os tempos. Em Roma, ao tempo da república, a advocacia foi evoluindo até ter existência própria, com direitos e deveres estabelecidos. Não obstante, com o declínio da República, o poder concentrou-se nas mãos dos imperadores e com o passar dos tempos a advocacia culminou por perder sua liberdade. No período feudal a advocacia sofreu privações, pois, ''os defensores era aqueles que, de armas nas mãos combatiam pelo próprio ou pelo direito alheio’... Todavia, houve então homens que rompendo com os costumes da época e levados por sentimentos de eqüidade tomaram para si a defesa dos interesses públicos e privados. Eram chamados advocati, clamatores, causidicL... Foi São Luiz quem organizou regularmente essa profissão, aboliu o combatejudiciário, reconheceu o corpo dos advogados, decretou certas regras para o exercício da profissão" (Souza, Mário Guimarâes. “O ADVOGADO”, 1935, Recife, PE, p. 20/21). 15 Interessante o registro desse período de trevas jurídicas, quando o Prof. Fernando da Costa Tourinho Filho enfocou, em sua consagrada obra “Processo Penal”, o deturpado e estranho conceito de defesa criminal adotado em França, à época da Inquisição: “Se o réu era inocente, não necessitava de defesa", entretanto, “se era culpado, era indigno de defesa” ( op. ci7., Ed. Jaiovi, 1979,5. ed., v.I/p.93). Aliás, foi a mesma França palco, séculos depois, dessa constante reafirmação da independência e da coragem do Advogado. Por ocasião do julgamento de Luiz XVI, no auge da Revolução, um Advogado chamado Chrétien-Guillaume de Lamoignon de MALESHERBES, sabedor dos riscos que corria pelo exercício de tão impopular defesa, não titubeou, iniciando seu pronunciamento com a célebre frase recomendada pelo Bastonário BERRYER, o velho: '"J^apporte à la convention la vérité et ma tête; ellepourra disposer de Vune après avoir entendu Votre” (Trago a esta Convenção a verdade e a minha cabeça; ela poderá dispor desta, mas antes terá de ouvir aquela). Os Revolucionários do ‘Gorro Vermelho’ optaram pela cabeça do Rei. E, mais tarde, pela de seu Advogado de defesa, pois, Malesherbes, aos 73 anos, também foi guilhotinado. Foi, assim, ao longo de muitas lutas, que os Advogados se fizeram respeitar, em todos os quadrantes do mundo, nem tanto pelos nomes rutilantes que até hoje são invocados, mas acima de tudo, pelo relevante e indeclinável papel que lhes foi reservado, qual seja, a defesa dos interesses, das liberdades, do patrimônio, dos direitos e garantias individuais e coletivos, numa frase, defesa dos cidadãos perante o Estado. Quase dois séculos passados, desde a criação dos dois primeiros Cursos de Ciências Jurídicas e Sociais, em Olinda e São Paulo, através da Lei de 11 de agosto de 1827, a corporação dos Advogados não tem descurado quanto à espinhosa, mas nobre missão delegada pelo povo aos seus filiados. Prova desse serviço público relevante, dentro de uma sociedade alicerçada no primado do Estado de Direito Democrático, é sua inviolabilidade, enquanto no exercício profissional, indenidade essa há muito reconhecida não como privilégio do Advogado, mas como, por intermédio dele, um direito público subjetivo dos cidadãos que ele representa. 16 Aonde houver uma afronta às liberdades do cidadão, ali estará a voz do Advogado bradando pela restauração do direito violado. '"'Legalidade e Liberdade são o oxigênio e hidrogênio de nossa atmosfera profissional", sentenciava do alto de sua genialidade Ruy Barbosa, em 1914, quando de sua posse na Presidência do Instituto dos Advogados Brasileiros. E não poderia ser de outra forma, afinal, a sua força desarmada, como dizia RUY, repousa na palavra, no argumento, no contraditório, na razão. Advogar é mais do que simplesmente exercer uma profissão. O papel que a sociedade outorgou ao Advogado não se exaure no mandato para preservar a liberdade, os bens, os direitos individuais e sociais de seu constituinte. Ele ouve, consola, dá esperança, acalma, de tudo guardando segredo tumular. Com razão FRANCESCO CARNELUTTI, quando reafirmou, em seu célebre opúsculo “Misérias do Processo Penal” (Ed. Conan, p. 41), o papel exercido pelos Advogados: ’’Eles são os cireneus da sociedade: carregam a cruz por um outro, e esta éa nobreza deles.” Advogado da cidadania, denuncia o arbítrio, luta pela paz, não a dos cemitérios, mas aquela que é sinônimo de pão, teto, lazer, saúde, bem-estar, em resumo. Justiça Social. Debate no foro, arrazoa, discute com o pólo contrário na demanda, enfrenta a burocracia cartorária, sua, sofre e se estressa. No fim do dia, no recôndito sagrado do lar, não acha justo compartilhar suas agruras com aqueles que lhe são caros. E, no dia seguinte, repete quase que religiosamente aquela via-crúcis. Esta é a sina do Advogado. Entretanto, fatigado da luta, chega-lhe um dia o filho pedindo-lhe conselho sobre seu futuro. De pronto, retempera suas energias, infla-se de orgulho e, sem titubear, invoca o décimo mandamento do Advogado, de EDUARDO COUTURE: 17 - Seja Advogado! Atributos, portanto, imprescindíveis de sua atuação, não poderiam deixar de ser a independência e a liberdade, sem o que, morreria o Advogado um pouco a cada dia e, com ele, também o sonho da humanidade de construir uma sociedade mais justa, mais fraterna e, acima de tudo, livre, pressupondo, pois, respeito integral aos Direitos Humanos. Tem sido o Advogado o sentinela avançado do Estado de Direito Democrático, que exige, para sua preservação plena uma série de postulados indispensáveis a serem observados rigorosamente. Entre eles, já destacava o festejadíssimo constitucionalista argentino SEGUNDO V. LINARES QUINTANA, o respeito aos sagrados direitos e garantias individuais, freqüente e sistematicamente violados por alguns maus detentores eventuais do poder (m “Tratado de la Ciência dei Derecho Constitucional Argentino y Comparado”, Edit. ALFA, 1956, vol. I). Impõe-se, em complementação, o respeito aos não menos sagrados direitos sociais e econômicos, com a exigência de uma política setorial mais sensível e humana. A observância do império da lei, que não se compatibiliza com o Estado policialesco, onde prevalece, tristemente, o sepultado princípio de “manda quem pode e obedece quem necessita”. Impõe-se a partilha do poder, pois, quanto mais fragmentado este, menos risco haverá de tiranias, que normalmente se alimentam da eliminação ou esvaziamento dos demais poderes. A vigilância e proteção do Estado Democrático pressupõem necessariamente, complementa LINARES QUINTANA, a consulta periódica aos súditos, através de seus votos, para que, como exclusivos interessados nos seus próprios destinos, tenham assegurado o seu histórico direito de exercício direto, pleno e participativo da soberania popular. O Professor PAULO BONAVIDES, com aquela sensibilidade social própria dos grandes Constitucionalistas, enfrenta com clareza solar a questão da participação popular num verdadeiro Estado deDireito Democrático: “As letras jurídicas carecem, pois, de renovação e rumos. A teoria constitucional da democracia participativa segue a trilha renovadora que fará o povo senhor de seu futuro e de sua soberania, coisa que ele nunca foi 18 nem será enquanto governarem em seu nome privando-o de governar^sepor si mesmo". (In “Teoria Constitucional da Democracia Participativa - Por um Direito Constitucional de luta e resistência - Por uma Nova Hermenêutica - Por uma repolitização da legitimidade”, Malheiros Editores, 2001, p. 14) Aliás, participação essa que, em nossa Constituição brasileira, se confunde com o próprio exercício direto do poder pelo povo (art. 1°, Parágrafo Único), tratando- se, por ora, apenas de um sonho, mas que poderá se transformar em realidade no dia em que houver o verdadeiro encontro do poder com a nação. No que diz com nosso país, os Advogados brasileiros têm marcado sua presença de forma indelével na construção dessa nova sociedade, mercê de suas posições corajosas, que pairam acima de qualquer labareda de paixão político- partidária. Voltada sempre para postulados permanentes e não meramente emergenciais, filosofia inspiradora do comando nacional da Classe, a Ordem, assim, busca atingir, na parte que lhe compete, os próprios postulados da nação, que desembocam, em última palavra, nas águas de um tão sonhado Brasil de paz e bem- estar social, onde não haja vaga para desigualdades e violências e onde os homens e mulheres se realizem integralmente. Enquanto a tão projetada sociedade ainda não chega, quem tem erguido sua voz contra as prisões arbitrárias, as torturas, sevícias, coações, ameaças, seqUestros, assassinatos, insegurança, desaparecimentos de pessoas? - O Advogado! Aliás, falando em homicídios, a data de 27 de agosto de 1980 não pode e não deve ser olvidada por nenhum Advogado. Uma mão assassina, até hoje impune, por meio de uma carta-bomba, ceifou a vida de uma funcionária exemplar do Conselho Federal da OAB, D. LYDA MONTEIRO DA SILVA. A bomba não era dirigida a ela e sim à Ordem. Aos Advogados. Ela encarnava, pela direção nacional da Entidade, todos os Advogados brasileiros, que teimavam em íutar contra a ditadura militar que se implantou no país, a partir de 1964. A relevância da preservação da independência da Ordem e da garantia das prerrogativas de seus filiados, nesse período sombrio da vida jurídica brasileira, está retratada por um Advogado - FERNANDO COELHO - que lutou, ao lado de tantos outros Colegas,com bravura invulgar, nesse palco de trevas: 19 "Homenageando a OAB - pela importância da sua participação na resistência contra o regime implantado pelo golpe de 1964- nosso principal objetivo é registrar e manter viva a memória desses episódios, para que os advogados mais jovens conheçam melhor a história de sua corporação e, sobretudo, possam contribuir, mais eficazmente, para que outra noite de violência e obscurantismo, semelhante à que vivemos naqueles anos, nunca mais volte a se abater sobre este País.” (in “A OAB e o regime Militar - 1964- 1986”, OAB-Conselho Federal, 2. ed., p.19) E enfatiza, na obra citada, aquele líder da classe: *‘Pela sua formação jurídica e pela natureza, do trabalho que executa, ao advogado afetam mais de perto as restrições arbitrárias à Liberdade. Por menores que sejam, quando elas agridem o cidadão comum - na dignidade de sua condição humana - agridem ainda mais intensamente aquele que o defende, no espaço incompreensível de sua atuação. Arremata FERNANDO COELHO essa lapidar passagem de sua obra, citando a frase antológica e emblemática de nosso trabalho, proferida por um dos maiores líderes da advocacia brasileira, em todos os tempos, RAIMUNDO FAORO: “Não há advogado sem liberdade e não há liberdade sem advogado”. O Advogado é hoje, finalmente, por força do art. 133, da Lei Maior, tido como indispensável à administração da justiça. E sobre a importância do papel que a Constituição expressamente lhe reservou, o brilho da palavra autorizada de JOSÉ AFONSO DA SILVA evidencia: '^Bem sabem os ditadores reais ou potenciais que os advogados, como disse Calamandrei, são ‘*as supersensíveis antenas da justiça”(8). E esta está sempre do lado contrário de onde se situa o autoritarismo. Acresce ainda que a advocacia é a única habilitação profissional que constitui pressuposto 20 essencial à formação de um dos Poderes do Estado: o Poder Judiciário. Tudo isso deve ter conduzido o constituinte à elaboração da norma do art. 133." (“Curso de Direito Constitucional Positivo”, 16. ed., Malheiros, 1999, p. 581). Outro gigante da Advocacia, MIGUEL SEABRA FAGUNDES, justifica, ao sabor do mais rutilante improviso, as imunidades legais e constitucionais que cercam o advogado: "o advogado é o único profissional que é obrigado a contender com o poder. O médico não é, o agrônomo não é, o arquiteto não é, nenhum. Agora, o advogado é obrigado a enfrentar o poder. E como ele é obrigado a enfrentar o poder, e isso por si só já bastaria, mas a experiência mostrou, quando ele é obrigado a enfrentar o poder, ele precisa ter cobertura para esse enfrentamento. E o regime militar mostrou que o advogado era desprotegido no exercício da sua atividade, pelo extremo obscurantismo que então comandou no País. Então, inseriu-se isso na Constituição, experiência do regime autoritário, e muito feliz contemplação." (m. “Miguel Seabra Fagundes - Guerreiro do Direito”, Conselho Federal da OAB, 1999, p. 132/133 - art. 133, da CF). Donde, termos desencadeado à testa da OAB/RS, Gestão 91/93, campanha de conscientização da coletividade para o relevante papel do Advogado junto ao Poder Judiciário e à própria sociedade, ocasião em que desfraldamos duas bandeiras: ‘^PROCESSO SEM ADVOGADO É COMO JUSTIÇA SEM JUIZ” “TODO ABUSO DE AUTORIDADE COMETIDO CONTRA O ADVOGADO NO EXERCÍCIO PROFISSIONAL É UM ATENTADO CONTRA A PRÓPRIA CONSTITUIÇÃO FEDERAL (Arí. 133)’' Sobre o munus público exercitado pelo advogado de defesa, preleciona o inolvidável patrono nacional da XVII Conferência Nacional dos Advogados , o 21 extraordinário EVARISTO DE MORAES FILHO: "'Aos que insistem em não reconhecer a importância social e a nobreza de nossa missão, e tanto nos desprezam quando nos lançamos, com redobrado ardor, na defesa dos odiados, só lhes peço que rejliíam, vençam a cegueira dos preconceitos e percebam que o verdadeiro cliente do advogado criminal é a liberdade humana, inclusive a deles que não nos compreendem e nos hostilizam, se num desgraçado dia precisarem de nós, para livrarem- se das teias da fatalidade" {[n “Advogado Criminal, esse desconhecido”, ANTÔNIO EVARISTO DE MORAES FILHO - RBCCRIM n“ 9, p. 114). Finalizando, para que nossas prerrogativas não sejam pisoteadas, reafirmamos o alerta que fizemos no Rio de Janeiro, em 1999, quando da XVII Conferência Nacional dos Advogados: "'Não abandonemos nossos postos, estejamos de olhos bem abertos e, como sentinelas permanentes do Estado Democrático de Direito, se preciso for, passemos as noites em claro, para impedir que os salteadores da estabilidade jurídica não usem a calada da noite para nos impingir, na aurora do dia seguinte, mais um golpe em nossa tão frágil democracia.” Aceitemos e adotemos o sábio conselho do consagrado escritor gaúcho ÉRICO VERÍSSIMO, como uma reza obrigatória da coberta da noite, que embala o sono dos que, como nós, estão em paz com suas próprias consciências; “Desde que, adulto, tem-me animado até hoje a idéia de que o menos [que cada um] pode fazer, numa época de atrocidades e injustiças como a nossa, é acender a sua lâmpada, faz/er luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e do horror. Se não tivermosuma lâmpada elétrica, acendamos o nosso toco de vela, ou em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como um sinal de que não desertamos nosso posto. ('Érico Veríssimo, in.“Solo deClarii^ta”, 22 vol. I, edit. Globo, 3. ed., 1974, p. 45). Essas são, pois, as razões legais, jurisprudenciais, históricas e sociológicas pelas quais entendemos não haver dúvida quanto à intangibilidade da prerrogativa assegurada ao Advogado no inciso V, do art. T , da Lei 8.906/94, perfeitamente distinta e compatível com a Lei 10.258/2001, norma jurídica esta que possui outros destinatários. Tentar acomodar matéria tão complexa e relevante em um sumário seria, de nossa parte, missão temerária, razão por que não apresentamos ementa. Se nossa posição merecer o respaldo do órgão supremo da classe - o plenário do Conselho Federal - , propomos que esta manifestação seja distribuída a todos os Conselheiros Federais, Presidentes das Seccionais e das Subseções da OAB, bem como, aos Tribunais Superiores e demais Tribunais do país. É como votamos, sub censura democrática de nossos Pares. Brasília, DF, em 11 de setembro de 2001. NEREULIMA Conselheiro Federal (RS) Relator 23
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