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contexto educacional e gagueira IV seminario paranaense 28.05

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Anais do IV Seminário Paranense de Fonoaudioloia 2013 
CONTEXTO EDUCACIONAL E GAGUEIRA: UMA ABORDAGEM DO 
SUJEITO . 
 
Douglas Fernandes (UFSC), Lais Oliva Donida (UFSC), Vitória Pereira 
Gonçalves (UFSC), Ana Paula de Oliveira Santana (orientador), e-mail: 
anaposantana@hotmail.com 
 
Universidade Federal de Santa Catarina, Setor de Ciências da Saúde, 
Coordenadoria Especial de Fonoaudiologia, Florianópolis, Santa Catarina. 
 
Palavras-chave: Discurso, Gagueira, Universitário. 
 
Resumo: 
O objetivo deste trabalho é analisar o discurso de um sujeito universitário sobre 
sua gagueira no contexto educacional. Foram analisadas entrevistas e os 
dados das avaliações fonoaudiológicas. Conclusão: Ao entrar no ambiente 
escolar o sujeito se oprime e não explora todo seu potencial pela vergonha e 
preconceito com relação à sua fala. O sistema educacional precisa se preparar 
para lidar com todo e qualquer processo de inclusão. 
 
Introdução: 
A gagueira é vista comumente como uma disfluência da fala, na qual há 
repetição de partes de palavras ou frases, prolongações sonoras e pausas 
(Carvalho, 2006). Não se sabe ainda a causa da gagueira, muitos fatores são 
descritos na literatura, tais como genéticos, ambientais, psicológicos 
(ansiedade, temperamento e relação pais-criança), (Delagracia, 2004). 
É importante ressaltar que descrever as características da gagueira não 
dá a dimensão subjetiva do que ela significa para cada sujeito. Segundo 
Friedman (2004), a gagueira é o apagamento do sujeito. A gagueira está no 
espaço discursivo, em uma relação direta com as condições de produção, a 
exterioridade. É nesse sentido que a gagueira se constitui como uma questão 
social e estigmatizada do falante. Ou seja, a gagueira é o efeito do 
funcionamento da imagem na subjetividade. 
Quem apresenta esses sintomas sofre nas suas interações sociais. A 
disfluência provoca no sujeito diversas dificuldades discursivas, pois ele acaba 
sofrendo exclusão social e também educacional. O preconceito na escola pode 
iniciar na educação infantil e perdurar até universidade. A partir dessas 
questões, torna-se relevante entender como esse sujeito se constitui enquanto 
falante, qual a imagem que ele tem de si mesmo e como essa imagem 
estigmatizada afetou e ainda afeta suas interações no contexto educacional. 
 
Metodologia: 
Esta pesquisa configura-se como um estudo de caso. Realizou-se uma 
entrevista reflexiva com um sujeito do gênero feminino, o qual chamaremos de 
 
 
Anais do IV Seminário Paranense de Fonoaudioloia 2013 
Sujeito S. A entrevista reflexiva se torna um momento de organização de ideias 
e de construção de um discurso pelo interlocutor que promove um processo 
interativo complexo de caráter reflexivo, num intercâmbio entre significados e o 
sistema de crenças e valores, perpassados pelas emoções e sentimentos entre 
os protagonistas. A entrevista, assim, é concebida como um encontro 
interpessoal na qual é incluída a subjetividade dos protagonistas (Szymanski, 
2011). Além da entrevista, foram recolhidos os dados para a presente pesquisa 
de relatórios de avaliações fonoaudiológicas. Os dados foram analisados a 
partir de uma perspectiva enunciativo-discursiva (Bakhtin, 1999). A entrevista 
foi transcritas para análise. Este trabalho faz parte do Projeto de Pesquisa 
“Fonoaudiologia, Linguagem e Inclusão”, aprovado pelo Comitê de Ética nº 
94.411. 
 
Resultados 
O sujeito S. relatou que possui gagueira desde os 5 anos de idade e que 
sofreu na sua infância por não saber lidar com o assunto. Seus pais nunca a 
rotularam como gaga, tratando-a normalmente. S. não relacionou o início da 
gagueira com nenhum acontecimento e nem associou a permanência com 
alguma situação. Fez tratamento psicológico aos 8 anos de idade e 
fonoaudiológico apenas atualmente, aos 35 anos. Como formas para driblar a 
disfluência, S. fazia o uso de estratégias como: tomava o cuidado para se 
manter calma e trocava palavras que mais gaguejava por outras. Ao descrever 
sua gagueira, S. comentou que quando está com bebês, ou então cantando, 
não gagueja, mas quando está em um grupo maior de pessoas, sente grande 
dificuldade. S. disse ainda que gagueja ao falar palavras iniciadas com “s” e 
que não prevê quando vai gaguejar. Ela sente mais dificuldades em situações 
emocionantes e nas leituras em público. Também referiu que já se ouviu 
falando, e que não gostou da sua voz, mesmo sem ter gaguejado nenhuma 
vez. Com relação às questões sociais, S. isolava-se com frequência, 
percebendo que muitas pessoas a discriminavam. Ela acredita que isso possa 
ter atrapalhado sua personalidade, por estar sempre sozinha e deixar de fazer 
as coisas com medo da gagueira. Atualmente, aos 36 anos, isso ainda ocorre, 
porém com menos frequência. Sobre o contexto educacional, S. relatou que 
desde a pré-escola isolava-se, evitava ao máximo se expor. Ela sabia as 
respostas quando a professora perguntava, mas ficava sempre calada. 
Algumas crianças a discriminavam, ficando com um número muito reduzido de 
colegas que poderia chamar de amigos. Seus primeiros dias de aula, início de 
ano letivo, eram sempre um “tormento”, pois havia apresentação dos alunos e 
falar em público sempre causava um bloqueio. No discurso de S. vê-se 
enunciados como: “As pessoas não aceitam tu sê diferente”, “Se aliena muito a 
pessoa... A pessoa que sai do padrão”. 
S., atualmente, é aluna do curso de pedagogia. Na universidade, é bem 
aceita nos grupos em que convive e nunca percebeu se alguém já deixou de 
falar com ela por gaguejar. Mas nas apresentações de trabalho, sempre que 
 
 
Anais do IV Seminário Paranense de Fonoaudioloia 2013 
possível, é a primeira a apresentar, para evitar a ansiedade. Ela procurou 
atendimento fonaudiológico por indicação de uma professora do curso. 
 
Discussão 
A imagem do falante se constitui nas interações sociais. É na relação de 
alteridade que os indivíduos se constituem (Bakhtin, 1999). Se nos 
constituímos e nos construímos através do outro, o sujeito gago acaba por 
constituir-se como um mau falante se suas interações são repletas de 
preconceitos. No caso acima, vimos que a família parece não ter exercido 
grande influência na constituição da imagem de mau falante de S. Contudo, ao 
entrar na escola, na relação com os colegas, o discurso produzido sobre a fala 
de S. fez com que ela se legitimasse enquanto incapaz de ter uma fala fluente. 
O lugar que S. ocupava na escola era de incompetência. Utilizando a palavra 
usada por ela: “alienação de si mesmo”. Se eu “existo a partir do outro”, o outro 
também constitui a minha fala e minha subjetividade, no caso acima, S. se 
constituiu fora dos padrões de normalidade aceitos socialmente. A fala de S. 
não era aceita, não tinha responsividade, era um dizer que não tinha um 
auditório social para ser ouvido. Calar-se e afastar-se de situações de fala foi 
constituindo toda a vida escolar de S. Embora na universidade ela refira que foi 
mais aceita, pois conseguia driblar e ressignificar algumas de suas 
dificuldades, foi nesse mesmo lugar que ela procurou atendimento 
fonoaudiológico. Ou seja, a sua fala ainda a incomodava. A clínica constituiu-se 
como uma possibilidade de ressignificação da fala e de modificação da visão 
de falante. Já na clínica psicológica S. refere que fora a duas ou três sessões, 
e que “já que a psicóloga relatou que não tinha nada”, parou. Evidencia-se aqui 
que o sintoma é subjetivo e que deve ser escutado na dimensão da sua queixa. 
Essa queixa que é interacional, depende do contexto de produção e dos 
sujeitos envolvidos nesse contexto: “Até eu falava com algumas pessoas, mas 
não... Não... Outras eu não... não tinha muito coisa. E era uma coisa que eu 
ficava muito nervosa assim, né, quando...”,“Pra mim, hoje em dia, em si, eu já 
consigo é... Já... Me acostumar, entendeu? Já não não não fico tanto assim 
[...]”. As estratégias utilizadas ao sentir que não vai conseguir falar, 
demonstram parte de um ritual para desencadear as palavras e evitar a 
gagueira: “Quando o professor já vem para falar isso, eu: ‘professor tu vai 
perguntar o nome eu já vou já responder para senhor para depois não ficar 
nervosa, não ter que gaguejar...’ Eu já começo já comigo." “Até bater o pé 
ajuda a sair”. “Tudo que é /s/, [...] eu gaguejo..” Nesse ponto, nos contando 
sobre como está lidando com isso, buscando a aceitação do outro em relação 
às suas diferenças, S. chora relatando: “ Às vezes as pessoas acham estranho 
porque eu brinco com isso, porque eu já sofri tanto preconceito e hoje eu 
aproveito bastante”. O choro evidencia o sofrimento de S. diante de sua fala. 
Essa análise demonstra, assim, que o contexto educacional é fortemente 
marcado pela exclusão social, exclusão daquele que é diferente, que fala 
diferente. 
 
 
Anais do IV Seminário Paranense de Fonoaudioloia 2013 
 
Conclusões: 
 A partir dessas discussões evidencia-se que, ao entrar na meio escolar, 
a criança com gagueira se isola deixando de participar efetivamente das 
interações escolares por causa da vergonha e do preconceito. Ou seja, há uma 
necessidade emergencial de que essas reflexões possam ser feitas no 
contexto educacional. Se a criança recebesse um auxílio desde o início e 
ainda, se o professor tivesse formação para lidar com alunos que apresentam 
essa dificuldade, essas situações poderiam ser ressignificadas. Ao chegar no 
meio universitário, o sujeito já se constituiu como mau falante, é estigmatizado. 
A gagueira tem, assim, implicações para as relações familiares, sociais, 
profissionais e escolares. 
O sistema educacional não está preparado para lidar com o diferente. 
Seja qual for a diferença, há uma exclusão de quem não segue um padrão de 
normalidade socialmente estabelecido. O processo educacional exige um 
preparo dos docentes que vai além dos conteúdos didáticos. É emergente a 
necessidade de uma formação para os docentes relacionada a questões de 
inclusão e exclusão social e escolar. A mudança nas políticas públicas 
relacionadas à inclusão ainda não se efetivou na prática. Há muitas questões 
voltadas aos deficientes, mas os diferentes também sofrem exclusão. Isso 
ocorre tanto na educação básica quanto na educação regular. Se a constituição 
do sujeito falante se faz a partir de suas interações é importante proporcionar 
interações com interlocutores que valorizem o sujeito e sua fala, mesmo que 
diferente. Essa posição de valorização ajuda ao sujeito gago a poder 
ressignificar a sua visão de “mau falante”. Logo, o modo como esse su jeito 
interage nas várias esferas de sua vida tem, também, implicações diretas para 
a sua subjetividade. 
 
Referências 
Bakthin, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1999. 
 
Carvalho, A. P. G. de; Galvão, V. S. Concepções e atitudes de sujeitos gagos 
sobre a gagueira. Revista de Iniciação Científica da FFC, 2006, v. 5, n.1/2/3, p. 
15-24. 
 
Delagracia, J. D; Galvão, V. S. O conhecimento de mães e professores das 
séries iniciais sobre a gagueira de crianças em fase inicial de escolarização. 
Revista de Iniciação Científica da FFC, 2004, v. 4, n. 2. 
 
Friedman, S. Gagueira: Origem E Tratamento. 4ª Edição, São Paulo: Plexus, 
2004. 
 
Szymanski, H. A Entrevista na Pesquisa em Educação: A Prática Reflexiva. 
Brasília: Plano, 2002.

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