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Biotransformação: Importância e Toxicidade

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Saúde em Revista 69
BIOTRANSFORMAÇÃO: IMPORTÂNCIA E TOXICIDADE
Biotransformação: 
importância e toxicidade
Biotransformation: importance and 
toxicity
RESUMO – A biotransformação de drogas é uma etapa primordial no pro-
cesso de eliminação e diminuição da toxicidade. Entretanto, ela também é
responsável pelo surgimento de metabólitos reativos intermediários, que se
ligam às macromoléculas do organismo. Dependendo da estrutura e do
tipo de ligação, diferentes efeitos patológicos poderão ocorrer, como ne-
crose, fibrose, formação de imunógenos, mutagênese, carcinogênese e tera-
togênese. Este artigo mostra a importância da biotransformação, os
sistemas enzimáticos envolvidos e os fenômenos de inibição e indução das
enzimas, além de sinalizar os efeitos tóxicos que podem ocorrer após rea-
ções de biotransformação, sendo esse o lado “vil” da biotransformação.
Palavras-chave: CITOCROMO P450 – INDUÇÃO E INIBIÇÃO ENZIMÁTICA –
RADICAIS LIVRES. 
ABSTRACT – The biotransformation of drugs is an essential step in the pro-
cess of elimination and reduction of toxicity. However, biotransformation
is also responsible for the appearance of intermediary reactive metabolites,
that bind to the organism’s macromolecules. Depending on the structure
and the kind of binding, different pathological effects may occur, such as
tissue necrosis, fibrosis, immunogenic formation, mutagenesis, carcinoge-
nesis and teratogenesis. This article shows the importance of biotransfor-
mation, besides pointing out the toxic effects that may occur after the
biotransformation reactions, which is its “mean” side.
Keywords: CYTOCHROME P450 – ENZYMATIC INDUCTION AND INHIBITION
– FREE RADICALS.
YOKO OSHIMA-FRANCO*
Curso de Farmácia – Faculdade de 
Ciências da Saúde (UNIMEP/SP)
LUIZ MADALENO FRANCO
Curso de Farmácia – Faculdade de 
Ciências da Saúde (UNIMEP/SP)
*Correspondências: 
Rua das Garças, 80
Nova Piracicaba – 13405-132
Piracicaba/SP
E-mail: yofranco@terra.com.br
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 70 SAÚDE REV., Piracicaba, 5(9): 69-76, 2003
INTRODUÇÃO
exposição diária a uma variedade de compostos
estranhos (xenobióticos) é capaz de levar à
absorção deles através dos pulmões, da pele ou
ingeridos, não intencionalmente, como contaminantes
nos alimentos e na água ou, deliberadamente, na for-
ma de medicamentos com fins terapêuticos ou não. A
exposição a xenobióticos pode ser inadvertida e aci-
dental, às vezes inevitável. Alguns são inofensivos; ou-
tros, porém, podem provocar respostas biológicas de
natureza farmacológica ou tóxica. Essas respostas bio-
lógicas geralmente dependem da conversão da subs-
tância absorvida em um metabólito ativo ou não, com
a finalidade principal de ser eliminada.
Biotransformação é a alteração química sofrida
pelo xenobiótico no organismo, comumente sob a
ação de enzimas específicas e/ou inespecíficas
(MEYER, 1996). Juntamente com os fenômenos
de absorção, distribuição e excreção, ela participa
da regulação de níveis plasmáticos de drogas. A
biotransformação, portanto, é um processo alter-
nativo, em que os metabólitos formados possuem
propriedades diferentes das drogas originais, com ca-
racterísticas mais hidrofílicas, tendo por objetivo faci-
litar a excreção pelo organismo (MEYER, 1996).
Contudo, nem sempre as drogas são inativadas;
pelo contrário, alguns metabólitos apresentam ati-
vidade aumentada (por exemplo, codeína em mor-
fina) ou propriedades tóxicas (entre elas, parathion
em paraoxon), incluindo a mutagenicidade, a tera-
togenicidade e a carcinogenicidade. 
SISTEMAS ENZIMÁTICOS
As enzimas são as responsáveis pelas reações de
biotransformação e encontram-se presentes em todo
o organismo (sangue, rins, pulmões, pele, tecido ner-
voso, intestino delgado e fígado). Embora elas este-
jam distribuídas em todo o organismo, o fígado é,
sem dúvida, o órgão que mais as concentra (WA-
TKINS, 1992). Testes bioquímicos realizados com o
tecido hepático por centrifugações sucessivas permiti-
ram constatar a presença de enzimas nas diferentes
frações denominadas solúvel (desidrogenases, estera-
ses, amidases e transferases), mitocondrial (monoami-
no oxidases) e microssomal (citocromos P450). 
SISTEMA MICROSSOMAL
A fração hepática microssômica corresponde
aos fragmentos dos retículos endoplasmáticos cen-
trifugados por 60 minutos a 150 mil G. As enzimas
localizam-se predominantemente na superfície do
retículo endoplasmático liso e constituem o sistema
oxidase de função mista ou monoxigenases ou siste-
ma citocromo P450 (BENET & SHEINER, 1987).
Ele possui importantes funções metabólicas, além
de ser o sistema de sentinela que primeiro apreende
e inativa vários xenobióticos no organismo (fig. 1).
Para uma droga ser metabolizada pelos microssomas,
é necessário ser lipossolúvel, pois essa propriedade fa-
cilita a penetração dela no retículo endoplasmático e
a sua ligação ao citocromo P450.
Apesar de o fígado ser o principal órgão bio-
transformador, importa ressaltar que as enzimas mi-
crossomais expressam-se em vários outros tecidos,
como pulmão e rins (LLAMA & AVENDAÑO,
1993; HONKAKOSKI & NEGHISHI, 1997; BU-
TLLETÍ GROC, 1999), pele, cérebro e intestino
(WATKINS et al., 1987; PETERS & KREMERS,
1989). 
Os componentes do sistema P450 são:
• citocromo P450: componente primordial do
sistema enzimático oxidativo. Foi assim deno-
minado por Omura & Sato (1964), porque o
complexo formado com o monóxido de car-
bono apresentava um pico de aborção espec-
trofotométrica no comprimento de onda 450
nm. Essa enzima apresenta um núcleo pirrólico
com o átomo de ferro à semelhança da hemo-
globina, sendo considerada uma hemoproteí-
na;
• NADPH-citocromo P450 redutase ou NADPH-
citocromo C redutase: enzima intermediária,
flavoproteína, contendo quantidades equimo-
lares de flavina monomucleotídio (FMN) e fla-
vina adenina dinucleotídio (FAD). Um outro
grupo enzimático, NADH-citocromo b5 redu-
tase, acompanha o citocromo P450 e funcio-
na como alternativa na transferência de
elétrons, da fonte para o citocromo P450. Es-
sas enzimas necessitam de um agente redutor,
a nicotinamida adenina dinucleotídio fosfato
(NADPH), e do oxigênio molecular. Consome-
se uma molécula de oxigênio por molécula de
substrato, com um átomo de oxigênio apare-
cendo no produto e o outro, na forma de
água (OGA et al., 1988; OGA, 1996). 
A
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Saúde em Revista 71
BIOTRANSFORMAÇÃO: IMPORTÂNCIA E TOXICIDADE
Figura 1. Reação de oxidação catalisada pelo citocromo P450 (fonte: OGA, 1996).
Tabela 1. Principais isoformas do citocromo P450 (STRECK & DALLA COSTA, 1999).
ISOFORMA CYP3A4 CYP2D6 CYP2C19 CYP1A2
Substratos
Alprazolam
Amitriptilina
Astemizol
Carbamazepina
Ciclosporina
Eritromicina
Imipramina
Lidocaína
Midazolam
Lidocaína
Nifedipina
Omeprazol
Quinidina
Terfenadina 
Triazolam
Amitriptilina
Clomipramina
Clozapina
Codeína
Debrisoquina
Esparteína
Fluvoxamina
Haloperidol
Imipramina
Metoprolol
Mianserina
Nortriptilina
Paroxetina
Propranolol
Amitriptilina
Citalopram
Clomipramina
Diazepan
Imipramina
Mefenitoína
Omeprazol
Proguanil
Tolbutamida
Varfarina
Amitriptilina
Cafeína
Clomipramina
Clozapina
Fluvoxamina
Haloperidol
Imipramina
Paracetamol
Propranolol
Teofilina
Varfarina
Marcadores
Ciclosporina
Eritromicina
Midazolam
Nifedipina
Omeprazol
Debrisoquina
Esparteína
Mefenitoína
Omeprazol
Cafeína
Fenacetina
Inibidores 
seletivos
Cetoconazol
Claritromicina
Eritromicina
Fluoxetina
Fluvoxamina
Setralina
Flufenazina
Fluoxetina
Paroxetina
Quinidina
Sertralina
Fluoxetina
Fluvoxamina
Sertralina
Fluvoxamina
Indutores
Carbamazepina
Dexametasona
Etanol
Fenitoína
Fenobarbital
Rifampicina
Troleandomicina
Rifampicina BarbitúricosRifampicina
Omeprazol
TabagismoPolimorfismo 
genético
Não há estudos até o 
momento Sim Sim
Não há estudos até o 
momento
 
 
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 72 SAÚDE REV., Piracicaba, 5(9): 69-76, 2003
O substrato forma um complexo com a forma
oxidada do citocromo P450, que recebe um elétron
procedente do NADPH, via NADPH-citocromo P450
redutase. Esse elétron reduz o Fe3+ para Fe2+. O
complexo, então, liga-se à molécula de O2 e capta
mais um elétron procedente também do NADPH.
Esse segundo elétron, às vezes, procede do NADH e é
transportado pelo citocromo b5 redutase, de modo
a desmembrar o O2 molecular em átomos de oxigê-
nio, altamente reativos e instáveis (radical livre). Um
radical livre é uma molécula ou fragmento molecu-
lar contendo um ou mais elétron não pareado em
sua última camada orbital (GREGUS & KLAAS-
SEN, 1995). Um desses átomos liga-se à droga, re-
sultando em substrato oxidado, que se desliga do
complexo enzimático. O outro átomo de oxigênio
é utilizado na produção da molécula de água. A
enzima, por sua vez, oxida-se para reiniciar o novo
ciclo. Reduções ocorrem em condição de baixa
concentração de oxigênio molecular.
FATORES QUE AFETAM A VELOCIDADE 
DE BIOTRANSFORMAÇÃO
A velocidade de biotransformação depende da
concentração de citocromo P450, da proporção das
isoformas, da afinidade pelo substrato, da redução
do complexo droga-citocromo P450 e da competi-
ção entre substratos endógenos e exógenos. Estima-
se que o citocromo P450 apresente de 20 a 200 iso-
formas (RELLING & EVANS, 1992). Quatro delas
(CYP3A4, CYP2D6, CYP2C19 e CYP1A2) foram mais
estudadas por estarem relacionadas com a
biotransformação de drogas. A tabela 1 discrimina
os diferentes substratos, marcadores, inibidores, in-
dutores e a ocorrência ou não de polimorfismo ge-
nético das diferentes isoformas.
A velocidade da biotransformação também é
afetada por outros fatores, como genéticos (poli-
morfismos), fisiológicos (doença, estado clínico, ida-
de, sexo) e ambientais (poluentes e substâncias
químicas industriais) ou por uso concomitante de
outras drogas. Esses fatores podem levar a duas con-
seqüências antagônicas: inibição ou indução na ve-
locidade de biotransformação, de suma importância
no estabelecimento dos regimes terapêuticos (posos-
logia). 
Inibição – A inibição pode ocorrer com todos os
sistemas enzimáticos, microssomais e não microsso-
mais. Algumas vezes ela é extremamente desejável,
como no caso da terapia antidepressiva e uso dos
inibidores da monoamino-oxidase (IMAO) ou no da
terapia antietílica e uso de inibidores da desidroge-
nase aldeídica (antabuse). Outras vezes a inibição é
extremamente tóxica, como no caso da inibição da
acetilcolinesterase, na intoxicação por praguicidas
organofosforados e carbamatos. A competição entre
os muitos substratos metabolizados pelas enzimas
microssomais pode levar à inibição, assim como o
fluxo sanguíneo hepático é capaz de se tornar o fa-
tor limitante da velocidade. A destruição do citocro-
mo P450 por agentes hepatotóxicos ou pelo
monóxido de carbono diminui o fluxo sanguíneo
hepático de maneira crônica. 
As conseqüências da inibição correspondem a
menor velocidade de biotransformação, aumento
dos níveis do xenobiótico no organismo, aumento
dos efeitos farmacológicos e maior incidência de to-
xicidade da droga (BENET & SCHEINER, 1987).
Indução – A indução é um fenômeno particular
às enzimas microssomais. São relatados dois tipos de
indução (CORREIA, 1994). Ao primeiro pertence
o fenobarbital, em que o aumento da atividade enzi-
mática pode ser atribuído à síntese de citocromo
P450, citocromo redutase e outras enzimas, à
proliferação do retículo endoplasmático, ao aumen-
to do peso hepático e ao aumento do fluxo sanguí-
neo e biliar e de outras proteínas hepáticas. Ao
segundo tipo pertencem os hidrocarbonetos policí-
clicos aromáticos (HPA) (GONZALEZ, 1988), por
exemplo, 3,4-benzopireno em que ocorre aumento
da síntese de proteínas, ao passo que o aumento no
metabolismo de drogas limita-se a poucos substra-
tos, não resulta em aumento na concentração dos
citocromos P450 redutases e associa-se ao apareci-
mento de uma oxidase terminal qualitativamente
diferente. Essa classe de indutor também pode acele-
rar a formação de intermediários reativos durante o
metabolismo de outras drogas ou de compostos quí-
micos ambientais. 
São as seguintes as conseqüências da indução:
aumento da síntese de proteínas, maior velocidade
de biotransformação, menor disponibilidade da
droga original e aumento de toxicidade, no caso de
drogas metabolizadas para formas reativas. 
Há diferenças entre os dois tipos de indução, es-
pecialmente quanto ao tempo de indução e duração
da indução. No caso de anticonvulsivantes, a indu-
ção é lenta (no mínimo três dias) e a duração é curta
(cinco a sete dias). No HPA, a indução é rápida (algu-
mas horas) e a duração é longa (cinco a 12 dias). 
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Saúde em Revista 73
BIOTRANSFORMAÇÃO: IMPORTÂNCIA E TOXICIDADE
A indução causada por medicamentos pode ser
benéfica, como na icterícia neonatal, causada pela
excessiva quantidade de bilirrubina, que, por não
ser conjugada e eliminada, atravessa a barreira he-
matoencefálica e produz uma forma de lesão cere-
bral conhecida como Kernicterus. Administra-se
fenobarbital para induzir a glicuronil transferase, au-
mentando, assim, a conjugação de bilirrubina e,
conseqüentemente, reduzindo o risco da doença. A
indução causada por HPA, presente nos poluentes
ambientais pode, por sua vez, trazer conseqüências
indesejáveis, como a produção de oxidases termi-
nais qualitativamente diferentes.
BIOTRANSFORMAÇÃO E TOXICIDADE
A biotransformação, tão importante para a
excreção de substâncias, apresenta o seu lado per-
verso como resultado da oxidação microssômica.
Os metabólitos tóxicos podem formar ligação cova-
lente e/ou não-covalente com moléculas-alvo. As
interações não-covalentes, entre elas, a peroxidação
lipídica, a produção de espécies tóxicas de oxigênio
e as reações causadoras de alteração da concentra-
ção de glutation e modificação de grupos sulfidril,
podem resultar em citotoxicidade. Já as interações
covalentes de metabólitos reativos à proteína po-
dem produzir um imunógeno; a ligação ao DNA
pode causar carcinogênese e teratogênese. 
O paracetamol exemplifica vários dos mecanis-
mos gerais de lesão celular, tanto para interação
covalente (formação de adição e de imunógeno)
como para as não-covalentes. Em doses tera-
pêuticas, o paracetamol é normalmente excretado,
conjugado ao ácido glicurônico ou ao sulfato. Pe-
quenas quantidades, entretanto, são biotransfor-
madas em metabólitos reativos intermediários (N-
acetil-p-benzo-quinona-imina, NAPBQI), elimina-
dos através do varredor nucleofílico, glutation
(GSH), na forma de ácido mercaptúrico. Como o
glutation tem suprimento limitado e ainda pode
ser depletado (estresse oxidativo) por formação de
adição entre NAPBQI e GSH (ligação covalente), a
droga na forma de epóxido ou quinona pode atin-
gir concentração suficiente para reagir com os
constituintes celulares nucleofílicos (BOOBIS et
al., 1989; NELSON & PEARSON, 1990). Sobre-
vém daí uma necrose hepática ou renal.
A figura 2 ilustra as vias de metabolização do pa-
racetamol. É importante ressaltar as propriedades
analgésica e antitérmica do paracetamol, droga de
escolha em pacientes grávidas e em condições de
afecções virais. A dose terapêutica para adultos é de
325-650 mg a cada 4-6 horas ou 1.000 mg 3-4 ve-
zes/dia, não devendo exceder 4 g/dia, sob risco de
hepatotoxicidade (LEIKIN & PALOUCEK, 1996-
1997). A toxicidade com o paracetamol, portanto,
pode ocorrer com quantidades de apenas 3-4 vezes
a dose terapêutica.
Os hidrocarbonetos policíclicos são indutores po-
tentesdo metabolismo microssômico e acarretam o
acúmulo de quantidade relativamente pequena de
intermediários reativos, que, presumivelmente, se in-
tercalam na hélice do DNA e iniciam a carcinogênese.
A figura 3 mostra a classificação dos carcinógenos
químicos. Observe que carcinógenos genotóxicos
(causadores de mutação no gene) podem ser primários
(causam mutações diretamente) e secundários (após
conversão em metabólitos reativos).
Os carcinógenos epigenéticos são agentes que,
por si só, não causam lesão genética. No entanto,
aumentam a probabilidade de causar câncer (BAR-
RET, 1992), por vários mecanismos, entre eles: au-
mento de concentrações efetoras do genotóxico,
potencialização da metabolização do genotóxico,
diminuição da desintoxicação de um genotóxico,
inibição do reparo de DNA e aumento da prolifera-
ção de células com DNA danificado.
PERSPECTIVAS
Este artigo enfoca a importância da biotransforma-
ção, pois, se ela não ocorresse, o organismo seria um
depósito de substâncias químicas estranhas por tempo
indeterminado. Nesse sentido, as enzimas exercem um
papel biológico de extrema importância, sobretudo as
enzimas do citocromo P450, presentes nas membranas
do retículo endoplasmático liso. 
A família de genes do citocromo P450 diversifi-
cou-se desde sua origem, há mais 3,5 bilhões de
anos, para adaptar-se ao metabolismo de um núme-
ro crescente de substâncias químicas ambientais, to-
xinas alimentares e drogas ingeridas diariamente
(BENET et al., 1996). Essas enzimas apresentam
uma particularidade fantástica: são passíveis de in-
dução enzimática, além de inibição enzimática, co-
mum a todas. Embora a indução enzimática ocorra
com alguns medicamentos, esse aspecto tem re-
levância na exposição aos poluentes químicos, pois
as reações de biotransformação catalisadas por enzi-
mas microssomais podem levar à formação de uma
oxidase terminal qualitativamente diferente. 
Saude_09.book Page 73 Wednesday, September 3, 2003 10:20 AM
 74 SAÚDE REV., Piracicaba, 5(9): 69-76, 2003
Figura 2. Metabolismo do paracetamol (fonte: BOOBIS et al., 1989; NELSON & PEARSON, 1990).
Figura 3. Classificação de carcinógenos químicos (fonte: RANG & DALE, 1997).
 
 
 
 
 
 
Saude_09.book Page 74 Wednesday, September 3, 2003 10:20 AM
Saúde em Revista 75
BIOTRANSFORMAÇÃO: IMPORTÂNCIA E TOXICIDADE
Naturalmente o organismo dispõe de várias for-
mas de neutralizar os metabólitos reativos intermedi-
ários formados nas reações de biotransformação ou
na exposição a vírus, toxinas e radiações. Entre elas,
destacam-se a deleção da célula danificada, por apop-
tose (morte celular programada) ou necrose, e a pos-
terior substituição da célula danificada, por mitose.
Mas se esses mecanismos falham, podem ocorrer ne-
crose tecidual (requerendo, às vezes, amputação de
membros), fibrose ou mutagênese (GREGUS &
KLAASSEN, 1995). 
Já se sabe a necessidade da seqüência de quatro
a seis mutações para a criação de uma célula cance-
rosa. O câncer é uma doença que afeta o gene (por-
tanto, genética) e uma das mais temidas entre todas
as doenças. Se falham os mecanismos de reparo e o
de interrupção do ciclo mitótico, ocorrerá uma
proliferação celular, totalmente incontrolável, tor-
nando a célula imortal. Desse conceito de imortali-
dade surge um novo paradigma dessa doença,
relatado pelo físico Kaku (2001), de que “envelhe-
cer pode ser o preço que pagamos para nos proteger
contra o câncer”. 
Nesse contexto, a exposição a novas substâncias
químicas deve ser cuidadosa, incluindo-se aqui as
drogas de abuso. Mortes têm ocorrido com drogas
usadas com finalidade não médica, entre elas, o ecs-
tasy e o 1,4-butanodiol (vendidos como estimulan-
tes para clubbers e esportistas). Outro exemplo
bastante comum, pelo uso socialmente aceito, é o
acetaldeido, produto de biotransformação do álcool
etílico e composto intermediário extremamente rea-
tivo, responsável também pelos efeitos deletérios
causados pelo uso crônico do álcool. Some-se a esse
cenário a exposição aos poluentes químicos, coran-
tes e conservantes fenólicos. 
Assim, quer-se ressaltar que a ponte entre
biotransformação e toxicidade é o metabólito rea-
tivo intermediário, ou radical livre, capaz de cau-
sar graves danos, como as mutações, que podem
levar à perda de informação e, finalmente, ao
câncer. Por fim, cabe chamar a atenção sobre a
responsabilidade do uso de drogas, lícitas ou ilíci-
tas, terapêuticas ou não, pois o organismo tem
seus limites.
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Submetido: 15/abr./2002
Aprovado: 22/out./2002
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