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aristóteles e Higgs uma parábola etérea

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uN I Da D E 5 | P r o b l e m a s c o n t e m p o r â n e o s250
aristóteles e Higgs: uma parábola etérea
Aristóteles e Peter Higgs entram num bar. Higgs, como sempre, pede o seu 
uísque de puro malte. Aristóteles, fiel às suas raízes, fica com um copo de vinho.
– Então, ouvi dizer que finalmente encontraram – diz Aristóteles, animado.
– É, demorou, mas parece que sim – responde Higgs, todo sorridente.
– Você acha que 40 anos é muito tempo? Eu esperei 23 séculos!
– Como é? – pergunta Higgs, atônito. – Você não acha que...
– Claro que acho! – corta Aristóteles. – Você chama de campo, eu de éter. No 
final dá no mesmo, não?
– De jeito nenhum! – responde Higgs, furioso. – O seu éter é inventado. Eu 
calculei, entende? Fiz previsões concretas.
– Vocês cientistas e suas previsões...– diz Aristóteles. – Basta ter imaginação 
e um bom olho. Você não acha que o meu éter é uma excelente explicação para 
o que ocorre nos céus?
– Talvez tenha sido há 2 000 anos. Mas tudo mudou após Galileu e Kepler 
– diz Higgs.
Aristóteles olha para Higgs com desprezo.
– Você está se referindo a esse “método” de vocês, certo?
– O método científico, para ser preciso – responde Higgs, orgulhoso. – É a 
noção de que uma hipótese precisa ser validada por experimentos para que seja 
aceita como explicação significativa de como funciona o mundo.
– Significativa? A minha filosofia foi muito mais significativa para mais 
gente e por muito mais tempo do que sua ciência e o seu método.
– É verdade, Aristóteles, suas ideias inspiraram muita gente por muitos sécu-
los. Mas ser significativo não significa estar correto.
– E como você sabe o que é certo ou errado? – rebate Aristóteles. – O que 
você acha que está certo hoje pode ser considerado errado amanhã.
– Tem razão, a ciência não é infalível. Mas é o melhor método que temos 
para aprender como o mundo funciona – responde Higgs.
– Nos meus tempos bastava ser convincente – reflete Aristóteles com 
nostalgia. – Se tinha um bom argumento e sabia defendê-lo, dava tudo certo 
– continuou. – As pessoas acreditavam em você, mas não era fácil. A compe-
tição era intensa!
– Posso imaginar – responde Higgs.
– Ainda é difícil. A diferença é que argumentos não são suficientes. Ideias 
têm que ser testadas. Por isso a descoberta do bóson de Higgs é tão importante.
– É, pode ser. Mas no fundo é só um outro éter – provoca Aristóteles.
– Um éter bem diferente do seu – responde Higgs.
– E por quê? – pergunta Aristóteles.
– Pra começar, o campo de Higgs interage com a matéria comum. O seu éter 
não interage com nada.
– Claro que não! Era perfeito e eterno – diz Aristóteles.
– Nada é eterno – rebate Higgs.
– Pelo seu método, a menos que você tenha um experimento que dure uma 
eternidade, é impossível provar isso! – afirma Aristóteles.
– Touché, você me pegou – admite Higgs. – Não podemos saber tudo.
– Exato – diz Aristóteles. – E é aí que fica divertido, quando a certeza acaba.
– Parabéns pela descoberta do seu éter – diz Aristóteles.
– Existem muitos tipos de éter – afirma Higgs.
– E muitos tipos de bósons de Higgs – retruca Aristóteles.
– É, vamos ter que continuar a busca.
– E o que há de melhor? – completa Aristóteles, tomando um gole.
GLEISER, Marcelo. In: Caderno Ciência, Folha de S.Paulo, 29 jul. 2012. 
Disponível em: <www1.folha.uol.com.br/colunas/marcelogleiser/1127415-
aristoteles-e-higgs-uma-parabola-eterea.shtml>. Acesso em: 18 fev. 2013.
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