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DEPARTAMENTO DE GEOCIÊNCIAS Disciplina Análise Regional Prof. Heitor Soares de Farias Não pensamos que a região haja desaparecido. O que esmaeceu foi a nossa capacidade de reinterpretar e de reconhecer o espaço em suas divisões e recortes atuais, desafiando-nos a exercer plenamente aquela tarefa permanente dos intelectuais, isto é, a atualização dos conceitos. Milton Santos (1994) O conceito REGIÃO Região deriva do latim regere (radical reg) que deu origem a palavras como regra e regência. Assim, Regione era utilizado nos tempos do Império Romano para designar áreas que, ainda que tivessem administração local, estavam subordinadas às regras gerais e hegemônicas de Roma. Os mapas que representam o Império Romano são preenchidos com as regiões que representam a extensão espacial do poder hegemônico centrado em Roma. Região – relações de poder – esfera do político Atualmente poder = território Regionalizar ainda é um ato de poder (poder decisório) Região – senso comum - parte do todo; - recorte espacial. Ambos em múltiplas escalas - desde o corpo humano; - até o globo terrestre; - ou mesmo o universo. Saber popular, região = localização e extensão. (região pobre, região montanhosa, região...) Sentido administrativo permanece (regiões administrativas, divisão regional...) Utilizada nas ciências – biogeografia, ecologia, climatologia (região polar, região australiana... Área definida pela extensão das propriedades que a definem) Na Geografia tornou-se um conceito bastante complexo - muitas indefinições associadas ao uso comum. A “construção” da região (regionalização) é um reflexo do seu tempo. Seja o modo de interpretar região; Seja reflexo das mudanças espaciais. Espaço e tempo - indissociáveis.. Geografia e História Regionalização e periodização. Geografia - diferenciação de áreas - Corologia (distribuição geográfica). Heródoto (485-420 a.C.), Estrabão (64-24 d.C.) e Ptolomeu (90-168 d.C.) Geographia – descrição das diferentes áreas do planeta. Para Ptolomeu existem duas Geografias: Geographia – Terra (nomotética); Chorographia – paisagens (Idiográfica). Nomotética – abstrata, geral, científica, leis gerais, universal. Idiográfica – concreta, singularidades, descritiva, particular. Alexander Von Humboldt (1769 - 1859) - considerado como um dos fundadores da Geografia - era naturalista e grande viajante. Fez relatos de suas viagens, estabelecendo comparações entre as diferentes paisagens e aspectos físicos e biológicos. Através de seu método de observação, estabeleceu a existência de uma interação entre os mais diversos elementos constituintes da Terra, sendo que ocorre uma relação de causa e consequência entre eles, o principio da causalidade – lugares similares podem sofrer os mesmo fenômenos naturais. Karl Ritter (1779-1859) foi outro grande pensador importante na formação e sistematização da geografia. Foi o precursor do método comparativo. Realizando estudos dos lugares e da individualidade dos mesmos, estabeleceu comparações entre diferentes povos, culturas, instituições e sistemas de utilização de recursos, usando para isso, o empirismo como método de observação. Alguns debates: No séc. XIX, a Geologia alcança prestígio (antes da Geografia) já usando o conceito de região. Vidal de La Blache (1903) - Quadro da Geografia da França - utiliza uma divisão regional onde se percebe a influência dos geólogos. O conceito de região inicialmente proposto como parte de uma geografia física – região natural como extensão dos elementos naturais (determinista). Essa apropriação do termo também era feita pela Geografia no séc. XVIII. A utilização do termo pela geografia humana parte deste mesmo entendimento – a região natural é decisiva na configuração de uma sociedade, além de outras igualmente necessárias (possibilista). Determinismo x Possibilismo - a natureza pode influenciar e moldar certos gêneros de vida, mas é sempre a sociedade, sua cultura, educação, que tem a responsabilidade da escolha. Segundo esta perspectiva as regiões não são como unidades morfológicas pré-construídas, mas o resultado do trabalho humano em determinado ambiente. Para entendermos a região devemos observar a civilização, a ação humana, os gêneros de vida. São eles que dão a unidade cultural a certas porções do território. Nasce daí a noção de região geográfica – região paisagem na cultura alemã e anglo-saxônica – sintetiza a ação transformadora do homem sobre o ambiente. A partir de então muitas monografias regionais são produzidas a partir da descrição das características físicas seguida da descrição das características da estrutura populacional e das atividades econômicas. O objetivo desses trabalhos é encontrar uma “personalidade” para cada região, uma forma de ser diferente e particular. Assim, a(s) característica(s) que dão unidade a cada região são “infinitas” – clima, relevo ou mesmo o quadro histórico. O fundamental é que cada região é um produto único da interrelação dos fatores combinados. Ao geógrafo cabe desvendar a combinação de fatores responsáveis por sua configuração. O método recomendado é a descrição para penetrar na complexa dinâmica que estrutura este espaço (Vidal de La Blache – 1921) Daí a enorme importância do trabalho de campo, momento em que o geógrafo se aproxima das manifestações únicas da individualidade de cada região – Escola Francesa de Geografia, com grande repercussão no Brasil. Apesar de ficar conhecido como Escola Francesa, essa forma de pensar a atividade geográfica se desenvolveu em diversas escolas nacionais – a geografia regional como síntese do trabalho geográfico. A compreensão exige a proximidade entre o sujeito e o objeto posto que a Geografia é uma ciência idiográfica (Hettner). Estuda o espaço terrestre e este é diferenciado, não regular e único em cada paisagem. Sendo assim, através da região a Geografia garantiria um objeto próprio, um método específico e uma interface particular (estudo dos fenômenos físicos e humanos combinados, considerando suas diferenças locais). Além disso, segundo Hartshorne, há outro ponto que distingue a Geografia das outras ciências, principalmente as naturais. O método regional de identificar a localização e a distribuição espacial dos fenômenos que caracterizam as unidades regionais. Segundo Hartshorne, só a Geografia tem a preocupação primordial com a localização e a distribuição espacial dos fenômenos. Esse período da Geografia clássica se encerra com um debate que recoloca em dúvida a validade de uma ciência idiográfica. Se compromete com os fatos únicos e ao mesmo tempo renuncia às leis gerais, à teoria e à explicação – Morte do conceito região. Geografia clássica - descreve áreas Geografia quantitativa - classifica áreas. É importante reconhecer que o conceito de região, nesta forma clássica, foi fundamental para manter a unidade da Geografia. É no conceito de região que há o pleno encontro do homem com a natureza, das ciências naturais com as ciências sociais – uma reflexão verdadeiramente geográfica. Mas para os críticos, em um mundo sem teoria e sem modelos cada lugar será sempre único. A perspectiva regional-descritiva jamais transformaria a Geografia em ciência – Geografia Moderna ou Teorética-quantitativa. É preciso estabelecer relações, análises e correlações entre os fatos. A região não será mais vista como uma evidência do mundo real. Para entrar no mundo científico tem que estar submetida a critérios explícitos, uniformes e gerais – ruptura com o senso comum. O estabelecimento de regiões passa ser uma técnica e não mais um produto. É um meio para demonstração de uma hipótese e não mais o final de uma pesquisa – o conceito região ressuscita – classificar é buscar leis. Regionalizar passa a ser a tarefa de dividir o espaço segundo diferentes critérios que devem ser explicitados, e que podem variar segundo a intenção de cada trabalho. As divisões não são definitivas, mas somente devem contribuir para o entendimento de um problema e colaborar para uma explicação. A variabilidade de divisões possíveis é quase infinita assim como os critérios utilizados como possibilidade de análise. Só interessa aquilo que é geral e está sempre presente, pois o fato particular não é domínio da ciência – essas novas regras são chamadas de análise regional. Nessa nova abordagem a região passa a ser uma nova classe de área, fruto de uma classificação geral que divide o espaço segundo critérios. Os critérios são arbitrários e utilizados para justificar uma explicação. Dentro dessa perspectiva surgem as regiões homogêneas e as regiões funcionais. Regiões homogêneas (uniformes) - definem espaços homogêneos. Regiões funcionais (polarizadas) - hierarquização de polos e fluxos. Não há uniformidade espacial, mas nas múltiplas relações que circulam e dão forma a um espaço internamente diferenciado – valorização da vida econômica. Os progressos realizados no domínios dos transportes e das comunicações, bem como a expansão da economia internacional – que se tornou generalizada -, explicam a crise da noção clássica de “região”. Se ainda pretendemos manter a denominação, somos obrigados a redefinir a palavra. Milton Santos (1978) Baseado em modelos econômicos - Teoria dos lugares centrais – Christaller - grandes cidades teriam grandes áreas de influência, sobre a qual gravitariam os pequenos núcleos urbanos vizinhos - Teoria dos anéis concêntricos – von Thünen o valor do transporte determina a localização da produção. Teoria da Facilidade Central – Weber um empreendimento deve localizar-se em um ponto que minimize a distância total viajada para satisfazer as procuras de fregueses. Forte crítica a esta perspectiva que se amparava nos modelos econômicos neoclássicos - Morte do conceito região. Produzir regionalizações baseadas nessas noções é colaborar com a produção do desenvolvimento espacial desigual. Assumir a dinâmica de mercado como a lógica da organização espacial é naturalizar o capitalismo como única forma possível de conceber o desenvolvimento social, além de manter o status quo. Esta corrente crítica ficou também conhecida como geografia radical. Afinal de contas, qual é a diferença essencial, num país capitalista plenamente desenvolvido como os Estados Unidos da América do Norte, entre a Califórnia e Nova Iorque, entre Michigan e a Nova Inglaterra? À parte certas diferenças que chamaremos aqui de “culturais” – e que a própria evolução capitalista, sob a forma das comunicações, da televisão, da indústria “cultural” em suma, se encarrega de dissolver – na essência do movimento de reprodução do capital, na estruturação das classes sociais, não há mais “regiões” neste país norte-americano, há razões de localização diferenciada de atividades econômicas. Oliveira (1981) É importante destacar que essas tendências à homogeneização só ocorreria nos países centrais. Em qualquer outra situação a homogeneização não irá ocorrer pela acentuação das desigualdades espaciais. Isso não impede de haver uma proposta de regionalização a partir da divisão regional do trabalho, que no processo de acumulação capitalista provoca a diferenciação espacial - o conceito região ressuscita. Grammsci trabalha com o conceito de bloco histórico enquanto bloco regional, ou simplesmente região. A abordagem está centrada em processos e sujeitos (classes sociais), em uma dimensão geográfica. A divisão regional deve se ater ao processo de produção do espaço, à divisão territorial do trabalho. Qualquer outra proposta de regionalização que não considere esse novo ângulo crítico, visa esconder as contradições sociais e sua luta pelo espaço. Apesar dos novos critérios para construção da região, a metodologia é mantida, ou seja, continua a ser um processo de classificação do espaço. As sociedade produzem seu espaço de forma determinada e são determinadas por eles (princípios da lógica dialética marxista). A última morte do conceito região é quase que uma continuação da abordagem anterior, mas em outra escala. Acreditava-se que o processo de globalização iriam cada vez mais impor sociedades em rede, e não mais uma sociedade territorial. Desta maneira, a região desapareceria enquanto recortes regionais contínuos. A globalização intensifica o processo contínuo de fragmentação e articulação. Outra corrente crítica, chamada de humanista, ao contrário da radical, resgatou a noção de região. A consciência regional, o sentimento de pertencimento – revalorização do regional como o espaço vivido. A região volta a ser vista como um produto real, uma teia de experiências. Para compreender a região é preciso viver a região. O conceito de região foi importante para afirmar um campo de pesquisas unificado. Tanto a região natural quanto a região geográfica significaram a manutenção de uma reflexão que incluiu o homem e a natureza dentro da mesma análise.
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