Buscar

Apostila DF 2 período - Conteúdo da ementa. COMPLETO

Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original

TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
1 Introdução
Desde o início da evolução do racionalismo humano, a luta pelo Direito foi o objetivo maior de todas as sociedades. A variação do Direito Natural ao Direito positivado, somada a acontecimentos históricos que levaram o homem a modificar suas aspirações, fez eclodir um movimento de reconstrução do conceito de Estado, que renasceu com o propósito de atender aos anseios de seus cidadãos.
Assim, a fim de cumprir com a função de defesa da sociedade na forma de limitação normativa ao poder estatal, sobreveio um conjunto de valores, direitos e liberdades, consubstanciados nos Direitos Fundamentais. Outrossim, considerando a necessidade de concretizar tais garantias, elas foram positivadas em um instrumento que limitou atuação do Estado e, ao mesmo tempo, traçou os parâmetros fundamentais de todo o ordenamento jurídico interno: a Constituição. Tal instrumento, porém, não foi suficiente para barrar a expansão dos Direitos Fundamentais, que passaram da esfera interna ao campo internacional.
Neste tangente, o presente estudo será voltado ao delineamento da trajetória histórica dos Direitos Fundamentais, a fim de que se vislumbre seu correto conceito, ressaltando-se sua importância e seu alcance. Neste ínterim, serão demonstrados os processos de constitucionalização, que tem como cerne a institucionalização dos Direitos Fundamentais e traz consigo o formalismo definidor da rigidez constitucional, e de internacionalização, que levou à universalização dos Direitos Fundamentais, reforçando sua força normativa.
Destarte, a presente digressão tem como objetivo o estudo da evolução histórica dos Direitos Fundamentais, que fazem da atual ordem constitucional um instrumento jurídico de garantia da sociedade frente ao Estado.
2 A definição dos direitos fundamentais
Os Direitos Fundamentais, sob uma perspectiva clássica, consistem em instrumentos de proteção do indivíduo frente à atuação do Estado. Sistematizados na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, há quem se limite ao elenco de seu artigo 5º, no qual estão previstos os direitos e deveres individuais e coletivos. De certa forma, ali está descrito um vasto rol de Direitos Fundamentais, mas a isso não se restringem, e nem sequer à Constituição Federal ou à sua contemporaneidade.
A definição do que sejam os Direitos Fundamentais mostra-se ainda mais complexa quando os mesmos são colocados sob uma perspectiva histórica e social. Uma das principais problemáticas dos Direitos Fundamentais é a busca de um fundamento absoluto sobre o qual respaldá-los, de modo a garantir seu correto cumprimento ou até mesmo como meio de coação para sua observância de maneira universal.
Bobbio (1992) aponta quatro dificuldades para a busca do fundamento absoluto dos Direitos Fundamentais. A primeira delas seria o fato de que a expressão "direitos do homem" é mal-definível, porque desprovida de conteúdo e, quando este aparece, introduz termos avaliativos(1), os quais são interpretados de modo diverso de acordo com a ideologia assumida pelo intérprete.
A segunda dificuldade consiste na constante mutabilidade histórica dos Direitos Fundamentais. O rol de direitos se modificou e ainda se modifica, pois as condições históricas determinam as necessidades e interesses da sociedade. São, portanto, direitos relativos, não lhes cabendo a atribuição de um fundamento absoluto.
Outra dificuldade na definição de um fundamento absoluto para os Direitos Fundamentais é a heterogeneidade dos mesmos, ou seja, a existência de direitos diversos e muitas vezes até mesmo conflitantes entre si. As razões que valem para sustentar alguns não valem para sustentar outros. Alguns Direitos Fundamentais são até mesmo atribuídos a categorias diversas, enquanto outros valem para todos os membros do gênero humano.
A última dificuldade apontada por Bobbio (1992) consiste na existência de Direitos Fundamentais que denotam liberdades, em antinomia a outros que consistem em poderes. Os primeiros exigem do Estado uma obrigação negativa, enquanto os segundos necessitam de uma atitude positiva para sua efetividade. Assim, é impossível verificar a existência de um fundamento absoluto idêntico para ambas as espécies, não havendo como construir um liame entre direitos antagônicos, pois, segundo Bobbio, "quanto mais aumentam os poderes dos indivíduos, tanto mais diminuem as liberdades dos mesmos indivíduos." (1992, p. 21)
Não obstante tais dificuldades, observamos que a busca do fundamento absoluto, em todo o transcorrer da história dos Direitos Fundamentais, é questão inerente à sua defesa, ou seja, serve como respaldo para garantir a sua efetividade. Isto demonstra porque os Direitos Fundamentais transformaram-se em uma preocupação filosófica, sociológica e política, e não apenas jurídica.
Primordial ao estudo do tema, faz-se necessária a definição da terminologia adequada a ser utilizada. Bonavides (2002) faz severas críticas ao uso "indiferente" das expressões direitos humanos, direitos do homem e direitos fundamentais(2).
Pelo vocábulo "fundamental", em seu significado lexical, compreende-se tudo aquilo "que serve de fundamento; necessário; essencial." Tal conceito não se afasta do sentido real do termo na esfera jurídica. Assim, como entende Vladimir Brega Filho, direito fundamental "é o mínimo necessário para a existência da vida humana." (2002, p. 66) Ressaltando-se que o mínimo essencial deve garantir a existência de uma vida digna, conforme os preceitos do princípio da dignidade da pessoa humana.
No tocante à expressão "Direitos Humanos", o significado atribuído é o mesmo, ou seja, são direitos essenciais à manutenção de uma vida humana sustentada pelo princípio da dignidade a ela inerente. Entretanto, Vladimir Brega Filho (2002) faz distinção entendendo serem os Direitos Fundamentais aqueles positivados em uma Constituição, enquanto os Direitos Humanos são os provenientes de normas de caráter internacional.
Diante disso, Canotilho (1998) sugere um argumento para a distinção. Para ele, direitos do homem são aqueles derivados da própria natureza humana, enquanto os Direitos Fundamentais são os vigentes em uma ordem jurídica concreta. In literis:
Direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos (dimensão jusnaturalista-universalista); Direitos Fundamentais são os direitos do homem, jurídico-institucionalmente garantidos e limitados espacio-temporalmente. (CANOTILHO, 1998, p. 359)
Ressalte-se que a ordem jurídica citada por Canotilho (1998) não se restringe à Constituição, pois ele separa os Direitos Fundamentais em "formalmente constitucionais", que são os enunciados por normas com valor constitucional formal, e "materialmente fundamentais", sendo estes os direitos constantes das leis aplicáveis de direito internacional não positivados constitucionalmente. Neste mesmo sentido versa Comparato, para o qual os Direitos Fundamentais 
são os direitos humanos reconhecidos como tal pelas autoridades, às quais se atribui o poder político de editar normas, tanto no interior dos Estados quanto no plano internacional; são os direitos humanos positivados nas Constituições, nas leis, nos Tratados Internacionais. (COMPARATO, 2001, p. 56)
Não obstante o debate, no presente estudo adotaremos a expressão "Direitos Fundamentais", pois trataremos de Direitos positivados, seja no direito interno ou no direito internacional, bem como por ser este o termo mais amplamente utilizado pela doutrina, bem como pela Constituição brasileira.
3 Origem e evolução dos direitos fundamentais
Partindo-se de uma observação restrita e atual, poderíamos chegar ao entendimento de que os Direitos Fundamentais são derivados da constitucionalização. Entretanto, através de uma análise histórica da evolução do pensamento humano, concluímos que a origem de tais direitos encontra-se muito antes, e que os Direitos Fundamentais positivados hodiernamente nas Constituições são produto de diversas transformações ocorridas no decorrer da História.
Os primeiros
mecanismos de proteção individual surgem ainda no antigo Egito e Mesopotâmia, consubstanciados no Código de Hamurabi (1690 a.C.), conforme lembra Moraes (1998). Foi a primeira codificação em que estavam presentes direitos comuns a todos os homens, como a vida, propriedade e dignidade, prevendo-se, também, a supremacia das leis em relação aos governantes.
Comparato (2001) elaborou obra com estudo aprofundado a respeito do tema. Segundo ele, no período axial(3), compreendido pelos séculos VIII a II a.C., com o surgimento do monoteísmo, surgiram os primeiros resquícios que deram origem aos Direitos Fundamentais. No mesmo período nasce a filosofia, substituindo o saber mitológico da tradição pelo saber lógico da razão. Através da tragédia grega, o homem passa a ser objeto de reflexão, e estabelecem-se os primeiros princípios e diretrizes fundamentais de vida. Nas palavras de Comparato:
É a partir do período axial que o ser humano passa a ser considerado, pela primeira vez na História, em sua igualdade essencial, como ser dotado de liberdade e razão, não obstante as múltiplas diferenças de sexo, raça, religião ou costumes sociais. Lançavam-se, assim, os fundamentos intelectuais para a compreensão da pessoa humana e para a afirmação da existência de direitos universais, porque a ela inerentes. (COMPARATO, 2001, p. 11)
Surge na Grécia, através do pensamento dos sofistas e estóicos, a noção de lei não escrita que, em contraponto à lei escrita, é reconhecida pelo consenso universal, e não apenas como a lei própria de cada povo. Tais leis possuem um fundamento moral e, como justificativa para sua vigência, começa a ser ressaltado o pensamento religioso, bem como a idéia de direito natural.
A concepção derivada do Cristianismo, segundo a qual todos os homens são irmãos enquanto filhos de Deus, foi um dos fundamentos para a construção de uma base de proteção aos direitos de igualdade entre os homens, apesar de todas as diferenças individuais e grupais. Para explicar tal fenômeno, foi adotada a teoria do estado natural, segundo a qual os homens são livres e iguais e têm direitos a eles inerentes, por natureza. O Direito Natural é anterior e superior à ordenação estatal e, por isso, nem o Estado, nem o próprio homem, pode subtraí-lo.
Tal é o entendimento da doutrina jusnaturalista, que Bobbio (1992) coloca como a real precursora da teoria individualista, pois considera o homem como titular de direitos por si mesmo, e não apenas como um membro da sociedade, ao contrário da anterior concepção organicista, segundo a qual a sociedade é um todo, e o todo está acima das partes. No entender de Bobbio, "concepção individualista significa que primeiro vem o indivíduo [...], que tem valor em si mesmo, e depois vem o Estado, e não vice-versa, já que o Estado é feito pelo indivíduo e este não é feito pelo Estado." (BOBBIO, 1992, p. 60)
Ressalte-se que tais fundamentos acentuam a universalidade dos direitos, não diferenciando o homem segundo sua nacionalidade. Não obstante, a simples afirmação da existência de direitos não era suficiente para assegurar a sua efetividade. Nas palavras de Bobbio:
Enquanto teorias filosóficas, as primeiras afirmações dos direitos do homem são pura e simplesmente a expressão de um pensamento individual: são universais em relação ao conteúdo, na medida em que se dirigem a um homem racional fora do espaço e do tempo, mas são extremamente limitadas em relação à sua eficácia, na medida em que são (na melhor das hipóteses) propostas para um futuro legislador. (BOBBIO, 1992, p. 29)
Ainda segundo Bobbio (1992), a segunda fase dos Direitos Fundamentais começa, então, a partir do momento que os mesmos passam a ser positivados pelos Estados. Ainda que os ideais de democracia e controle dos órgãos políticos, iniciados em Atenas e na República Romana respectivamente, tenham desaparecido com o surgimento do feudalismo, a afirmação positivada dos Direitos Fundamentais inicia-se ainda na Idade Média.
Neste período, conforme leciona Comparato (2001), foram extintos os poderes políticos e econômicos. Entretanto, na Baixa Idade Média, os reis passaram a reivindicar seus poderes, juntamente com o papa. Contra os abusos dessa reconcentração do poder surgiram as primeiras manifestações. Por conseguinte, no ano de 1215 o Rei João da Inglaterra, o João Sem-Terra, assinou a Magna Carta, como forma de fazer cessar os inúmeros conflitos que possuía frente aos barões feudais e ao papado.
A Magna Carta não se constituiu essencialmente em uma declaração de direitos, pois se tratava de uma Carta que tão-somente concedia privilégios para os senhores feudais. Entretanto, sua importância para o estudo dos Direitos Fundamentais consiste no fato de que foi o primeiro vestígio de limitação do poder soberano do monarca. Pela primeira vez na história medieval, o rei se acha limitado pelas leis que ele próprio edita.
Além disso, a Magna Carta possuía cláusulas prevendo as liberdades eclesiásticas, apontando para uma futura separação institucional entre Igreja e Estado. Previa também limitações ao poder de tributar, que se achava restrito ao consentimento dos contribuintes, além de lançar as bases do tribunal do júri e o princípio do paralelismo entre delitos e penas, dentre outros Direitos Fundamentais ainda hoje consagrados.
Ainda segundo Comparato (2001), já em meados do século XVII, sob um novo contexto histórico, a Inglaterra passou a enfrentar constantes rebeliões, derivadas de querelas religiosas. Após um período de constantes revoltas contra a dinastia que lá reinava com inabalável apelo à religião católica, a nobreza conseguiu destronar o rei Jaime II, declarando o trono vago. A coroa foi então oferecida ao príncipe Guilherme de Orange, que a assumiu após aceitar uma declaração de direitos votada pelo Parlamento, a Bill of Rights (1689).
Com ela extingue-se o regime de monarquia absoluta, retornando-se à idéia de governo representativo através dos poderes atribuídos ao Parlamento, o qual possuía garantias especiais de modo a preservar sua liberdade diante do chefe de Estado, gerando já uma noção de separação de poderes. Ainda que não fosse uma declaração de direitos humanos, no entender de Comparato:
O Bill of Rights criava, com a divisão de poderes, aquilo que a doutrina constitucionalista alemã do século XX viria denominar, sugestivamente, uma garantia institucional, isto é, uma forma de organização do Estado cuja função [...] é proteger os Direitos Fundamentais da pessoa humana. (2001, p. 88-9)
Quase um século após, em seu movimento de Independência, as colônias dos Estados Unidos da América do Norte elaboraram suas Declarações. A Declaração de Virgínia, segundo Comparato, foi o "registro de nascimento dos direitos humanos na História." (2001, p. 48) Isto porque anteviu uma gama de Direitos reiterados posteriormente na Declaração da Independência, a qual é considerada por Comparato (2001) como "uma declaração à humanidade", que deu início a uma nova legitimidade política: a soberania popular. Foi também o primeiro documento a reconhecer a existência de direitos inerentes a todo ser humano, independente de sexo, raça, religião, cultura ou posição social(4).
A Declaração dos Estados Unidos, entretanto, teve um caráter fechado ou, melhor dizendo, preocupou-se tão somente "em firmar a sua independência e estabelecer seu próprio regime político do que levar a idéia de liberdade a outros povos." (COMPARATO, 2001, p. 127)
Diante disso, com a positivação dos direitos em Declarações dos Estados, Bobbio (1992) entende que os Direitos Humanos(5) ganham em concretividade, mas perdem em universalidade, pois só têm validade no âmbito do Estado que os reconhece.
Neste ínterim, Bobbio (1992) cita como exemplo, além das Declarações acima estudadas, a Declaração de Direitos da Revolução Francesa. Entretanto, neste estudo acompanhamos o entender de Comparato (2001) segundo o qual, ao contrário da Declaração de Independência dos Estados Unidos, a Revolução Francesa pretendeu anunciar-se para todos os povos e todos os tempos.
Neste sentido, na Assembléia Nacional Francesa sobre a redação da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, Duquesnoy, citado por Comparato, explicou:
Uma declaração deve ser de todos os tempos e de todos os povos; as circunstâncias mudam, mas ela deve ser invariável em meio às revoluções. É preciso distinguir as leis e os direitos: as leis são análogas aos costumes, sofrem o influxo do caráter nacional; os direitos são sempre os mesmos. (COMPARATO, 2001, p. 128)
Assim também pensa Bonavides, segundo o qual "a universalidade se manifestou pela vez primeira, qual descoberta do racionalismo francês da Revolução, por ensejo da célebre declaração dos Direitos do Homem de 1789." (2002, p. 516) No entendimento de Bonavides, as declarações anteriores, de ingleses e americanos ganhavam em concretude, entretanto dirigiam-se ou a um povo específico, ou a uma camada social privilegiada, enquanto a Declaração francesa tinha por destinatário o gênero humano. Assim,
enquanto os norte-americanos mostraram-se mais interessados em firmar sua independência em relação à coroa britânica do que em estimular igual movimento em outras colônias européias, os franceses consideraram-se investidos de uma missão universal de libertação dos povos. (COMPARATO, 2001, p. 50)
Além disso, os Estados Unidos deram ênfase às garantias judiciais dos Direitos Fundamentais, ao oposto dos franceses, que se limitaram quase que tão somente a declarar direitos, sem mencionar os instrumentos judiciais que os garantissem. Comparato (2001), contudo, não entende tão necessárias as garantias, pois, segundo ele:
O Direito vive, em última análise, na consciência humana. Não é porque certos direitos subjetivos estão desacompanhados de instrumentos assecuratórios próprios que eles deixam de ser sentidos no meio social como exigências impostergáveis. [...] a vigência dos direitos humanos independe do seu reconhecimento constitucional, ou seja, de sua consagração no direito positivo estatal como Direitos Fundamentais. (COMPARATO, 2001, p. 134)
Não obstante, em princípio achava-se que a Declaração de 1789 não tinha caráter normativo, por não possuir a sanção do monarca, não passando de uma declaração de princípios. Posteriormente, entretanto, foi reconhecido que a competência decisória por ela exercida era proveniente da vontade da Nação, como Poder Constituinte, e que o rei não passava de poder constituído.
José Afonso da Silva, inspirado em Jacques Robert, refere ainda que a Declaração Francesa partiu de três caracteres fundamentais: o intelectualismo, porque a declaração era "antes de tudo um documento filosófico e jurídico que devia anunciar a chegada de uma sociedade ideal" (2002, p. 158); o mundialismo, pois os valores ali declarados ultrapassavam a esfera do país para atingir toda a universalidade de seres humanos; e o individualismo, pois só consagrava as liberdades do indivíduo, preocupando-se tão somente em defendê-lo contra o Estado. 
Há que se referir, ainda, a Declaração do Povo Trabalhador e Explorado, aprovado em 1918 na ex-União Soviética, que, nas palavras de José Afonso da Silva,
não se limitara a reconhecer direitos econômicos e sociais, dentro do regime capitalista, mas a realizar uma nova concepção da sociedade e do Estado e, também, uma nova idéia de direito, que buscasse libertar o homem, de uma vez por todas, de qualquer forma de opressão. (SILVA, 2002, p. 161)
Não há dúvidas de que tal declaração, aliada aos ideais Marxistas, influenciou profundas transformações na Sociedade e, conseqüentemente, na forma de atuação dos Direitos Fundamentais, como será estudado a seguir. 
Entretanto, não podemos deixar de seguir o entendimento de Bobbio (1992) quando afirma que a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, é quem dá início à terceira e mais importante fase dos Direitos Fundamentais pois, além de sua universalidade, ela:
Põe em movimento um processo em cujo final os direitos do homem deverão ser não mais apenas proclamados ou apenas idealmente reconhecidos, porém efetivamente protegidos até mesmo contra o próprio Estado que os tenha violado. (BOBBIO, 1992, p. 30)
Não obstante, Bobbio (1992) lembra também que a Declaração de 1948 é apenas o início de um longo processo, pois não tem forças de norma jurídica. Surgida com o fim da Segunda Guerra Mundial a fim de combater as atrocidades cometidas contra a dignidade humana, no entender de Bobbio, a Declaração é apenas um ideal a ser alcançado(6).
Diante dessa vasta evolução histórica, podemos verificar a impossibilidade de ser atribuído aos Direitos Fundamentais apenas um fundamento absoluto. Ainda que a teoria do Direito Natural seja consistente no que diz respeito ao surgimento do pensamento direcionado à proteção da dignidade humana, não é suficiente para explicar todos os Direitos Fundamentais hoje existentes.
Para Bobbio (1992), os direitos humanos positivados não derivam do estado de natureza, o qual foi utilizado apenas como argumento para justificar racionalmente determinadas exigências do homem. Segundo ele, o real surgimento de alguns direitos deriva das lutas e movimentos travados pelos homens cujas razões devem ser buscadas na realidade social da época, e não no estado de natureza, pois este revela a hipótese abstrata de um estado simples, primitivo, onde o homem vive com poucos carecimentos essenciais, oposto ao mundo de onde derivou toda a gama de Direitos Fundamentais que hoje conhecemos. Nas palavras de Cademartori:
O seu fundamento de validade não é um dado objetivo extraível da natureza humana, mas o consenso geral dos homens acerca da mesma, já que tais direitos são reconhecidos por todas as sociedades civilizadas e estampados em Declarações Universais. (CADEMARTORI, 1999, p. 34)
4 Transformação do conceito: as três gerações de direitos fundamentais
O conceito de Direitos Fundamentais está intimamente ligado à evolução da sociedade, o que, como visto anteriormente, acarretou uma modificação nas tutelas pretendidas e, conseqüentemente, abriu espaço para o surgimento constante de novos Direitos.
Os Direitos Fundamentais clássicos eram satisfeitos por meio de uma mera omissão do Estado. Com o desenvolvimento da sociedade, entretanto, tal conceito não mais bastou para o cumprimento das exigências supervenientes. Surgiram direitos que passaram a exigir uma atitude positiva por parte do Estado, o que atribui aos titulares de Direitos Fundamentais dois tipos de prerrogativas: liberdade e poder. Celso Ribeiro Bastos não compartilha, porém, do entendimento de Bobbio no sentido de que liberdade e poder são direitos antagônicos, pois entende que:
Há muitas liberdades que nenhum prejuízo sofrem com o surgimento das novas modalidades protetoras do homem, demonstrando que numa grande área há plena complementaridade entre as duas sortes de garantias. (BASTOS, 2001, p. 181)
O lema da Revolução Francesa, conforme afirma Bonavides (2002), profetizou a seqüência histórica da gradativa institucionalização dos Direitos Fundamentais, do que decorre sua divisão em três gerações(7), sucessivamente: direitos da liberdade, da igualdade e da fraternidade.
Os direitos de primeira geração correspondem aos direitos da liberdade, e foram os primeiros previstos constitucionalmente. Referem-se aos direitos civis e políticos, têm como titular o indivíduo e são direitos de resistência ou oposição contra o Poder Público. Pressupõem uma separação entre Estado e Sociedade, em que esta exige daquele apenas uma abstenção, ou seja, uma obrigação negativa visando a não interferência na liberdade dos indivíduos. Segundo Bobbio (1992), são direitos que reservam ao indivíduo uma esfera de liberdade "em relação ao" Estado. Nesta mesma dimensão, porém no que concerne aos direitos políticos, Bobbio afirma serem direitos que concedem uma liberdade "no" Estado, pois permitiram uma participação mais ampla, generalizada e freqüente dos membros da comunidade no poder político.
Podem ser citados como exemplos de Direitos Fundamentais de primeira geração os direitos à vida, à liberdade
e à igualdade, previstos no caput do artigo 5º da Constituição Federal de 1988. Derivados de tais direitos, também podem ser destacados como direitos de primeira geração na Constituição brasileira as liberdades de manifestação (art. 5º, IV), de associação (art. 5º, XVII) e o direito de voto (art. 14, caput).
Os direitos da segunda geração são os sociais, culturais e econômicos. Derivados do princípio da igualdade, surgiram com o Estado social e são vistos como direitos da coletividade. São direitos que exigem determinadas prestações por parte do Estado, o que ocasionalmente gerou dúvidas acerca de sua aplicabilidade imediata, pois nem sempre o organismo estatal possui meios suficientes para cumpri-los. Tal questionamento, entretanto, foi sanado nas mais recentes Constituições, tal como a brasileira, que prevê no art. 5º, § 1º a auto-aplicabilidade das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais. Tratam-se dos direitos sociais. Partindo-se do raciocínio de Bobbio, são direitos de liberdade "através" ou "por meio" do Estado.
Na Constituição brasileira de 1988, tais direitos estão elencados em capítulo próprio, denominado "dos diretos sociais", onde estão descritos diversos Direitos Fundamentais, dentre os quais os direito a educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança e previdência social (art. 6º, caput).
Nesta tangente, nasceu um novo conceito de Direitos Fundamentais, os quais passaram a ser objetivados. Segundo Bonavides (2002), o Estado passou a ter a obrigação de criar pressupostos fáticos para a realização dos direitos, indispensáveis ao pleno exercício da liberdade, sobre os quais o indivíduo já não tem propriamente o poder. Tais pressupostos começam a inspirar também a legislação de Direitos Fundamentais constante de Tratados, pactos e convenções internacionais. Conforme Bonavides, "passaram a ser vistos numa perspectiva também de globalidade, enquanto chave de libertação material do homem." (2002, p. 521) A ação começa a partir não de um Estado em particular, mas de uma comunidade de Estados.
Assentados sobre a fraternidade, surgem os Direitos Fundamentais de terceira geração, os direitos difusos, os quais visam à proteção do ser humano, e não apenas do indivíduo ou do Estado em nome da coletividade. Nas palavras de Sarlet, "trazem como nota distintiva o fato de se desprenderem, em princípio, da figura do homem-indivíduo como seu titular, destinando-se à proteção de grupos humanos." (1998, p. 50)
A atribuição da denominação de "direitos de solidariedade" ou "fraternidade" aos direitos da terceira geração, no entender de Sarlet, é conseqüência da sua implicação universal, "por exigirem esforços e responsabilidades em escala até mesmo mundial para sua efetivação." (1998, p. 51)
A princípio, são identificados cinco direitos como sendo da terceira geração: o direito ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, o direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade e o direito de comunicação. Podem, entretanto, surgir outros direitos de terceira geração, à medida que o processo universalista for se desenvolvendo. Segundo Sarlet (1998), tais direitos ainda não estão completamente positivados nas Constituições, sendo em sua maior parte encontrados em Tratados e outros documentos transnacionais.
Alguns autores têm admitido a existência de uma quarta geração de Direitos Fundamentais. Segundo Bonavides (2002), em meio a uma sociedade que caminha rumo a uma globalização econômica neoliberal, cuja filosofia de poder é negativa e intenta a dissolução do Estado Nacional debilitando os laços de soberania, os direitos de quarta geração surgem junto à globalização política na esfera da normatividade jurídica. São eles os direitos à democracia, à informação e ao pluralismo. Tais direitos formam o ápice da pirâmide dos Direitos Fundamentais. Para Bonavides, "os direitos de quarta geração compendiam o futuro da cidadania e o porvir da liberdade de todos os povos. Tão somente com eles será legítima e possível a globalização política." (2002, p. 525)
No tocante à aplicabilidade dos Direitos Fundamentais, Comparato atribui-lhes alguns princípios, os quais, segundo ele, "dão coesão ao todo e permitem sempre a correção de rumos, em caso de conflitos internos ou transformações externas." (2001, p. 60) Dividem-se em princípios axiológicos e estruturais. Os princípios axiológicos supremos são os que formam a tríade da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade.
Os princípios estruturais são de duas espécies. O primeiro deles é o princípio da irrevogabilidade dos Direitos Fundamentais. A evolução histórica só faz ampliar a necessidade de formulação de novos Direitos e, por isso, aqueles já declarados e reconhecidos oficialmente não podem ser revogados,
dado que eles se impõem, pela sua própria natureza, não só aos Poderes Públicos constituídos em cada Estado, como a todos os Estados no plano internacional, e até mesmo ao próprio Poder Constituinte. (COMPARATO, 2001, p. 64)
O outro princípio consiste na complementaridade solidária. Seu conceito é bem declarado na Conferência Mundial dos Direitos Humanos, realizada em Viena em 1993, segundo a qual:
Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos globalmente, de modo justo e eqüitativo, com o mesmo fundamento e mesma ênfase(8).
Daí extrai-se que "todos os seres humanos merecem igual respeito e proteção, a todo tempo e em todas as partes do mundo em que se encontrem." (COMPARATO, 2001, p. 65)
5 A constitucionalização dos direitos fundamentais
Como conseguimos verificar, os Direitos Fundamentais são anteriores à idéia de constitucionalismo que, segundo Moraes, "tão somente consagrou a necessidade de insculpir um rol mínimo de direitos humanos em um documento escrito, derivado diretamente da soberana vontade popular." (1998, p. 19) Assim, a Constituição reflete nada mais do que a positivação dos Direitos Fundamentais no âmbito interno dos Estados.
Para Ricardo Fiuza, a finalidade primeira de uma Constituição é a garantia dos direitos individuais, "pois são os indivíduos que, unidos em soberania nacional, formam um Estado, cujos órgãos de poder, então, são estruturados." (1991, p. 48)
A constitucionalização surgiu justamente com os movimentos que formaram o ápice da institucionalização dos Direitos Fundamentais referidos anteriormente. Segundo Comparato (2001), os Estados Unidos foram os pioneiros no reconhecimento dos Direitos Fundamentais pelo Estado, elevando-os a nível constitucional. Não menos importante foi a Revolução Francesa, que trouxe no art. 16 de sua Declaração que "qualquer sociedade em que não esteja a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes, não tem Constituição."
Pela acepção antiga de Constituição, esta não refletia um ato de vontade, nem do povo, nem dos governantes: exprimia simplesmente a estrutura social. Para Jorge Miranda, neste período a Constituição possuía um sentido institucional, que apenas legitimava a atuação do Estado, pois "sem princípios e preceitos normativos a regê-lo, o Estado não poderia subsistir; [...] é através desses princípios e preceitos que se opera a institucionalização do poder político." (MIRANDA, 2002, p. 323)
Assim, a Constituição moderna, que a doutrina denomina de "Constituição material", passa a ser um ato de vontade, "o supremo ato de vontade política de um povo." (COMPARATO, 2001, p. 107) O novo Estado constitucional reflete uma profunda alteração nos ideais políticos, nas palavras de Jorge Miranda:
Em vez da tradição, o contrato social; em vez da soberania do príncipe, a soberania nacional e a lei como expressão da vontade geral; em vez do exercício do poder por um só ou seus delegados, o exercício por muitos, eleitos pela colectividade; em vez da razão do Estado, o Estado como executor de normas jurídicas; em vez de súditos, cidadãos e atribuição a todos os homens, apenas por serem homens, de direitos consagrados nas leis. (MIRANDA,
2002, p. 45)
A partir de então, o constitucionalismo passa a regular as atividades dos governantes e suas relações com os governados: "Em vez de os indivíduos estarem à mercê do soberano, eles agora possuem direitos contra ele, imprescritíveis e invioláveis." (MIRANDA, 2002, p. 326) Ainda conforme Jorge Miranda, a Constituição não passa de um meio para atingir uma finalidade, que consiste na proteção que se conquista em favor dos indivíduos. Segundo suas palavras:
O Estado constitucional é o que entrega à Constituição o prosseguir a salvaguarda da liberdade e dos direitos dos cidadãos, depositando as virtualidades de melhoramento na observância dos seus preceitos, por ela ser a primeira garantia desses direitos (grifamos). (MIRANDA, 2002, p. 326)
Em razão da importância da Constituição material, surge então a necessidade de redigi-la em um documento solene, segundo Kelsen, "um conjunto de normas jurídicas que pode ser modificado apenas com a observância de prescrições especiais cujo propósito é tornar mais difícil a modificação dessas normas" (1998, p. 182), pelo que é denominada de Constituição formal.
Destarte, as Cartas Constitucionais, na forma como hoje são conhecidas, são um reflexo da positivação dos Direitos Fundamentais, do que derivou a rigidez e supremacia constitucional que predominam no Estado de Direito.
6 Internacionalização dos direitos fundamentais
Conforme já estudado, os Direitos Fundamentais foram desde sempre direitos universais, ou seja, direitos inerentes ao homem pelo simples fato de fazer parte da raça humana. Entretanto, a proteção dos Direitos Fundamentais era exercida, até o século XIX, apenas nos limites do Estado do qual o cidadão fazia parte. Neste período, como refere Piovesan (2000), o Direito Internacional limitava-se a regular as relações entre Estados, em âmbito estritamente governamental.
A internacionalização dos Direitos Fundamentais teve seu início na segunda metade do século XIX, conforme leciona Comparato (2001), o qual divide-a em duas fases. A primeira delas manifesta-se em três setores, dos quais faz parte o Direito Humanitário, que compreende o conjunto de leis e costumes de guerra, visando à proteção dos soldados feridos, prisioneiros e sociedade civil(9). Segundo Piovesan, o Direito Humanitário "se aplica na hipótese de guerra, no intuito de fixar limites à atuação do Estado e assegurar a observância de Direitos Fundamentais." (2000, p. 123) Em decorrência, segundo a mesma doutrinadora, caracterizou a primeira expressão de limitação à liberdade e autonomia dos Estados no plano internacional.
Junto ao Direito Humanitário, o outro setor indicado por Comparato (2001) consistiu na luta contra a escravidão, movimento marcado pelo Ato Geral da Conferência de Bruxelas, de 1890, que estabeleceu regras de repressão ao tráfico de escravos africanos.
Ao lado desses setores assume grande importância para a primeira fase da internacionalização dos Direitos Fundamentais a regulação dos direitos do trabalhador assalariado, que se deu com a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1919. Instituída com o intuito de regular a condição dos trabalhadores no âmbito mundial, já possuía 183 Convenções aprovadas até junho de 2001(10).
Piovesan (2000) cita ainda o surgimento da Liga das Nações, criada após a Primeira Guerra Mundial com o intuito de promover a cooperação, paz e segurança internacional. A Convenção da Liga das Nações, de 1920, continha previsões genéricas relativas aos direitos humanos, alcançando limites à soberania estatal através de sanções impostas aos Estados que violassem suas obrigações.
Os referidos institutos, segundo Piovesan (2000), assemelham-se à medida que inserem o tema dos direitos humanos na ordem internacional. A partir daí, o homem passa a ser sujeito de Direito Internacional, e não somente o Estado do qual ele faz parte. Passaram a existir interesses transnacionais, que não mais representavam a vontade do Estado, mas sim interesses mundiais. Nas palavras da referida autora:
Através destes institutos, não mais se visava proteger arranjos e concessões recíprocas entre os Estados. Visava-se sim ao alcance de obrigações internacionais a serem garantidas ou implementadas coletivamente que, por sua natureza, transcendiam os interesses exclusivos dos Estados contratantes. Estas obrigações internacionais voltavam-se à salvaguarda dos direitos do ser humano e não das prerrogativas dos Estados. (PIOVESAN, 2000, p. 126)
Ainda conforme Piovesan,
Prenuncia-se o fim da era em que a forma pela qual o Estado tratava seus nacionais era concebida como um problema de jurisdição doméstica, restrito ao domínio reservado do Estado, decorrência de sua soberania, autonomia e vontade. (PIOVESAN, 2000, p. 128)
Como sujeitos de Direito Internacional, consolida-se a idéia de que os indivíduos possuem capacidade internacional, e que o problema dos Direitos Fundamentais não se encontra restrito à jurisdição doméstica, mas "constituem matéria de legítimo interesse internacional." (PIOVESAN, 2000, p. 128)
A segunda fase da internacionalização dos Direitos Fundamentais, segundo Comparato (2001), situa-se no pós Segunda Guerra Mundial. Após os massacres e atrocidades praticados em decorrência do fortalecimento do totalitarismo estatal, a humanidade viu a necessidade de reconstrução dos Direitos Fundamentais, percebendo o valor supremo da dignidade humana.
A partir de então, reforça-se a idéia de que a proteção dos Direitos Fundamentais não deve ser restrita à esfera do Estado, mas sim uma preocupação de âmbito internacional. Conforme Cançado Trindade (2000), já não se tratava de proteger indivíduos sob certas condições ou em determinadas situações, como na primeira fase, mas de proteger o ser humano como tal.
Como afirma Piovesan (2000), passou-se então a buscar uma ação internacional mais eficaz para a proteção desses direitos, que culminou em uma sistemática normativa de proteção internacional, fazendo possível a responsabilização do Estado quando este mostrar falhas ou omissões na tarefa de proteção dos Direitos Fundamentais. Ainda segundo Cançado Trindade (2000), a proteção dos Direitos Fundamentais não se esgota na ação do Estado, e quando as vias internas ou nacionais se mostram incapazes para resguardar tais direitos é que são acionados os instrumentos internacionais de proteção.
Para atingir tal fim, em 1945 criaram-se as Nações Unidas, com diversos objetivos de prossecução internacional, dentre os quais destaca-se a proteção internacional dos direitos humanos. Neste sentido versa o art. 1º da Carta da Organização das Nações Unidas, de 1945:
Art. 1º Os propósitos das Nações Unidas são:
[...]
3. conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião. (grifo nosso)
Nos dizeres de Piovesan:
A Carta das Nações Unidas de 1945 consolida, assim, o movimento de internacionalização dos direitos humanos, a partir do consenso de Estados que elevam a promoção desses direitos a propósito e finalidade das Nações Unidas. Definitivamente, a relação de um Estado com seus nacionais passa a ser uma problemática internacional, objeto de instituições internacionais e do Direito Internacional. (PIOVESAN, 2000, p. 139)
Também responsável pela internacionalização dos Direitos Fundamentais foi a Declaração Universal dos Direitos do Homem. Assinada em Paris em 10 de dezembro de 1948, foi o ápice do humanismo político da liberdade. Nascida com o intuito de cumprir com o disposto no art. 55 da Carta das Nações Unidas(11), foi elaborada com o fim maior de fazer cessar a guerra e destruição entre países, cujo ponto crucial foi a Segunda Guerra Mundial. Em seu preâmbulo, coloca que "o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade,
da justiça e da paz no mundo."
Nos dizeres de Piovesan, "para a Declaração Universal a condição de pessoa é o requisito único e exclusivo para a titularidade de direitos." (2000, p. 143) Tal documento foi, no entender de Bonavides, um misto de convergência e síntese:
Convergência de anseios e esperanças [...]. Síntese, também, porque no bronze daquele monumento se estamparam de forma lapidar direitos e garantias que nenhuma Constituição lograra ainda congregar, ao redor do consenso universal. (BONAVIDES, 2002, p. 527)
Segundo Piovesan, o fato de ter sido aprovada por 48 Estados, com oito abstenções, inexistindo qualquer questionamento ou voto contrário, torna a Declaração um documento de afirmação de uma ética universal "ao consagrar um consenso sobre valores de cunho universal a serem seguidos pelos Estados." (PIOVESAN, 2000, p. 142)
7 A experiência brasileira
Desde a sua primeira Constituição, o Brasil já se preocupava com a defesa dos Direitos Fundamentais. A Carta de 1924 previa, em seu artigo 179, um rol de 35 (trinta e cinco) direitos destinados aos cidadãos brasileiros. Entretanto, a verdadeira garantia dos Direitos Fundamentais foi instituída com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, na qual estão previstos, além do vasto rol de direitos e garantias individuais contidos em seu artigo 5º, uma enorme gama de Direitos Fundamentais espalhados pelo texto constitucional. É em decorrência dessa imensidão de direitos que a Carta de 1988 é hoje denominada "Constituição Cidadã".
No que concerne ao contexto internacional, o Brasil acompanhou a evolução da universalização dos Direitos Fundamentais desde o seu início, tendo demonstrado histórica preocupação com a garantia desses mesmos direitos. Como afirma Cançado Trindade:
[...] já nos primórdios da fase legislativa de elaboração dos instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos, e mesmo antes deles, se formara no Brasil uma corrente de pensamento entre jusinternacionalistas aos quais corresponderam, em diferentes graus, contribuições para iniciativas de outrora do governo brasileiro, no sentido de que a noção de soberania, em sua acepção absoluta, mostrava-se inadequada ao plano das relações internacionais, devendo ceder terreno à noção de solidariedade. (TRINDADE, 2000, p. 35)
Segundo Cançado Trindade (2000), ocorreram, entretanto, oscilações na prática do Direito Internacional no Brasil, ocorridas no período da ditadura militar, em que o país abarcou um longo período de autoritarismo, passando a adotar uma posição defensiva no plano internacional.
Conforme afirma Piovesan (2000), foi ao longo do processo de democratização que a internacionalização dos Direitos Fundamentais fortaleceu-se no Brasil, "aceitando expressamente a legitimidade das preocupações internacionais e dispondo-se a um diálogo com as instâncias internacionais sobre o cumprimento conferido pelo país às obrigações internacionalmente assumidas." (PIOVESAN, 2000, p. 232)
Destarte, o rol de Tratados Internacionais de Direitos Fundamentais ratificados pelo Brasil é hoje substancial. Dentre eles destacam-se: Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1992), Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1992), Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio (1951), Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (1989), Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher (1984), Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial (1968), Convenção sobre os Direitos da Criança (1990), Convenção Americana de Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (1992) e seu Protocolo Adicional (1996), Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura (1989) e Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (1995).
Dentre os Tratados dos quais o Brasil é signatário, destaca-se a Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de São José da Costa Rica - de 1969, que, além de prever normas de direito material, estabelece órgãos competentes para verificar o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados-partes, quais sejam a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. O Brasil aderiu à convenção em 1992, porém reconheceu a competência jurisdicional da Corte apenas em 1998.
8 Considerações Finais
A conjugação de idéias basilares a respeito dos Direitos Fundamentais permitiu-nos verificar que a busca pelo correto conceito desses direitos envolve a delimitação de sua trajetória histórica, que se iniciou logo que o homem passou a se relacionar em sociedade.
Seguindo esta análise, percebemos que os Direitos Fundamentais não estão limitados à Constituição, e estão nela dispostos apenas para eivarem-se de uma maior intangibilidade. Nesta tangente, verificamos que os Direitos Fundamentais não se restringem à esfera interna, mas são um misto de conquistas derivadas da luta pelo direito e da tentativa de regulação da vida em uma sociedade cada vez mais internacional.
TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 
de Robert Alexy. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008.
O livro Teoria dos direitos fundamentais é um dos mais citados e estudados atualmente no Brasil1 no campo das ciências jurídicas. Não só pesquisadores, mas também advogados e juízes utilizam a teoria de Alexy para embasar pareceres, petições e decisões. O constante uso das idéias do jurista alemão inclusive pelos ministros do Supremo Tribunal Federal motivou estudos recentes sobre o assunto2.
Pretende-se aqui dar enfoque a uma das idéias centrais do trabalho e apontar um debate no qual o livro se insere e que é ainda pouco explorado nas discussões da literatura nacional. Desse modo, a resenha terá como ponto de partida a estrutura das normas de direitos fundamentais descrita por Alexy (capítulo 3), detendo-se especialmente na idéia de sopesamento e nas críticas à teoria analisadas no posfácio do livro, escrito em 2002 e também traduzido na versão em português.
 
DISTINÇÃO ENTRE REGRAS E PRINCÍPIOS
Um dos pontos mais importantes da teoria de Alexy é a distinção entre princípios e regras utilizada para analisar a estrutura das normas de direitos fundamentais. Segundo o autor, essa distinção é a base da teoria da fundamentação no âmbito desses direitos e a chave para a solução de problemas centrais da dogmática dos direitos fundamentais (p. 85). Sem essa distinção não pode haver nem uma teoria adequada sobre as restrições e as colisões entre esses direitos, nem uma teoria suficiente sobre o papel dos direitos fundamentais no sistema jurídico. Por isso, Alexy afirma que essa distinção é uma das "colunas-mestras" do edifício da teoria dos direitos fundamentais.
O autor faz uma distinção precisa entre regras e princípios e uma utilização sistemática dessa diferença em sua teoria. O método adotado não é em relação ao grau de generalidade ou abstração das normas, como é usualmente descrito pela doutrina tradicional. Trata-se de uma distinção qualitativa. Isso porque, seguindo a concepção de Alexy, princípios são mandamentos de otimização, ou seja, normas que ordenam que algo seja feito na maior medida possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas do caso concreto (p. 90)3. Por outro lado, regras são mandamentos definitivos, ou seja, normas que só podem ser cumpridas ou não, sendo realizadas por meio da lógica "tudo ou nada". Isso implica formas diversas de solucionar conflitos entre regras e colisões entre princípios: enquanto o primeiro deve ser solucionado por meio de subsunção, a colisão deve ser resolvida por meio do sopesamento. Cabe aqui explicar o que significa cada método.
Um conflito de regras só pode ser solucionado de duas maneiras: (1) por meio da introdução de cláusula de exceção em uma das regras, eliminando, desse modo, o conflito; (2) por meio da declaração de invalidade de uma das normas. Isso ocorre porque o problema
está localizado no plano da validade, o que não é graduável: "uma norma vale ou não vale juridicamente" (p. 92). Regras garantem deveres definitivos, não podendo existir graduações nesse sentido. Por isso, o conflito entre regras deve ser resolvido por subsunção, aplicando-se integralmente uma determinada regra para o caso. A outra será necessariamente declarada inválida no caso de incompatibilidade total entre as normas e estará fora do ordenamento jurídico.
Já a colisão de princípios é solucionada de forma distinta. Quando dois princípios entram em colisão, um deles tem que ceder perante o outro. Entretanto, isso não significa que exista a declaração de invalidadedeum princípio. Diantedecertascircunstâncias do casoconcreto, um princípio precede o outro. A dimensão a ser avaliada não é de validade, mas sim de peso de cada princípio (p. 93). Por isso essa colisão deve ser resolvidapor meio do sopesamento. É necessário considerar as variáveis presentesnocasoconcretoparaatribuirpesosacadadireitoeavaliarqual deverá prevalecer. A avaliação dos pesos dos princípios deverá levar em conta o seguinte raciocínio: "Quanto maior for o grau de não satisfação ou de afetação de umprincípio, tanto maiorterá que ser a importância de satisfação do outro" (p. 167)4. Após sopesá-los, chega-se a uma relação de precedência condicionada, isto é, sob certas condições um princípio precedeo outro (P1PP2) C;sob outras condições, essaprecedência pode ser estabelecida inversamente (P2 P P1) C' (p. 97).
A partir dessa distinção se estabelece uma das teses centrais do livro: os direitos fundamentais têm natureza de princípios e são mandamentos de otimização, o que implica a máxima da proporcionalidade, com suas três máximas parciais - adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito (p. 588)5. Essa tese tem sido alvo de crítica desde sua primeira edição, em 1985. Pretende-se expor, então, duas dessas críticas, contrapondo-as às respostas de Alexy. Esse debate é ainda pouco explorado pela literatura nacional, apesar de tal teoria ser hoje altamente difundida.
A primeira crítica diz respeito à suposta falta de racionalidade para o método do sopesamento, que conduziria a um excessivo subjetivismo na interpretação jurídica e, portanto, ensejaria arbitrariedade e voluntarismo nas decisões judiciais. Desse modo, o sopesamento submeteria as disposições constitucionais ao jogo próprio da política e à imprevisibilidade, representando grande ameaça para os direitos fundamentais. Essa é uma das críticas de Habermas, que afirma que não haveria nenhum parâmetro racional para o método (p. 575)6.
A segunda crítica concerne à perda de autonomia do legislador por causa da natureza de mandamento de otimização dos direitos fundamentais. Se os princípios devem ser realizados de maneira mais ampla possível, segundo as possibilidades fáticas e jurídicas, existiria sempre um ponto máximo a ser definido, tirando a discricionariedade do legislador para elaborar normas. Essa é uma das críticas de Ernst-Wolfgang Böckenförde, que se refere principalmente à associação entre o sopesamento e o perigo de excesso dos direitos fundamentais (p. 576)7.
 
SOPESAMENTO E RACIONALIDADE
O recurso ao sopesamento é, pois, constantemente criticado no debate jurídico internacional. Alega-se, sobretudo, sua falta de critérios racionais de decidibilidade. Entre os autores que argumentam contra o sopesamento sob este e outros pontos de vista destacam-se Jürgen Habermas, Friedrich Müller, Bernhard Schlink e Ernst-Wolfgang Böckenförde8.
A objeção mais freqüente diz respeito à idéia de que o sopesamento seria uma técnica inconsistente do ponto de vista metodológico, pois a noção de ponderação é vaga e pouco clara sobre o conteúdo da técnica. Além disso, inexistiria um padrão de medida homogêneo e externo aos bens em conflito capaz de pesar de forma consistente a importância de cada um deles. Tal inconsistência metodológica relacionada com falta de parâmetros racionais para o sopesamento corresponde, em linhas gerais, à crítica formulada por Habermas, o que levou Alexy, no posfácio do livro, a dialogar justamente com esse autor para rebater as críticas sobre a racionalidade do método.
Alexy apresenta inicialmente duas teses contrárias à idéia de que não seria possível chegar a uma conclusão de forma racional em nenhum caso de sopesamento: uma radical e outra moderada. A primeira (p. 594) sustenta que o sopesamento possibilita uma conclusão racional em todos os casos. Esse não é o ponto de vista de Alexy, visto que a teoria dos princípios sempre considerou o sopesamento um procedimento que não conduz a um resultado único e inequívoco em todo e qualquer caso. Desse modo, as atenções do autor recaem sobre a tese moderada: "embora o sopesamento nem sempre determine um resultado de forma racional, isso é em alguns casos possível, e o conjunto desses casos é interessante o suficiente para justificar o sopesamento como método" (p. 594).
Essa forma racional seria construída a partir de um "modelo fundamentado" do método, sendo possível existir parâmetros com base nos quais o sopesamento entre direitos fundamentais poderia ser decidido. Para isso, seria preciso considerar que a lei do sopesamento pode ser dividida em três passos (p 594)9. No primeiro seria avaliado o grau de não-satisfação ou afetação de um dos princípios. No segundo, avaliar-se-ia a importância da satisfação do princípio colidente. Por fim, deveria ser discutido se a importância da satisfação do princípio colidente justificaria a afetação ou a não-afetação do outro princípio.
A crítica de Habermas, segundo o autor, justificar-se-ia se não fosse possível fazer julgamentos racionais sobre a intensidade da interferência, os graus de importância e sua relação entre si. Contudo, sustenta Alexy que o método para obter tal racionalidade seria a construção de uma escala de valores, atribuindo aos princípios, conforme o caso concreto, um grau de interferência ou importância "leve", "moderado" e "sério" (p. 595). A outra crítica de Habermas-"aplicação irrefletiva" do sopesamento -, não teria fundamento, pois, apesar de os padrões para o sopesamento levarem em consideração sobretudo uma linha de precedentes, a sua aplicação ocorreria de forma argumentativa, considerando também a sua correção (p. 599).
Com isso, Alexy tenta refutar a idéia de que o sopesamento permitiria tudo em razão da falta de parâmetros racionais. É claro que essa discussão está longe de chegar a um consenso, mas a resposta de Alexy teve papel relevante no debate contemporâneo sobre a questão10.
 
DISCRICIONARIEDADE E OTIMIZAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS
Muito se fala sobre a utilização da proporcionalidade e do sopesamento pelos tribunais e o crescente protagonismo judicial, mas a questão sobre a existência de uma discricionariedade para o legislador, veiculada pelo próprio Alexy, é pouco abordada no debate nacional.
A objeção, formulada principalmente por Böckenförde, diz respeito à falta de discricionariedade legislativa acarretada pela tese da otimização. Ela seria justificada se o sopesamento exigisse sempre uma única decisão do legislador (p. 594). Para refutar tal idéia, Alexy mostra que a lei do sopesamento é compatível com um grau suficiente de discricionariedade. Para isso, é necessário examinar o sistema que dá base à construção das escalas do sopesamento e analisar em detalhe o modelo de três níveis.
Combinando as possibilidades de graduação das escalas em três níveis, observam-se três casos de impasse no sopesamento, quando há empate entre as intensidades de intervenção e os graus de importância de realização dos princípios. Segundo Alexy, esses casos de impasse levam a uma discricionariedade estrutural para sopesar (p. 603). Para entender a existência desses impasses, é preciso ter em mente que a escala formada pelos três níveis do modelo proposto não pretende fazer uma metrificação das intensidades e dos graus por meio de uma escala cardinal como, por exemplo, de 0 a 1, já que os escalonamentos jurídicos não podem
ser metrificados dessa forma, mas somente por limiares rudimentares (p. 603)11. Com efeito, as escalas não podem ser divididas de forma tão refinada a ponto de excluir impasses estruturais - isto é, impasses reais no sopesamento (p. 611).
Para os casos de impasse, tem-se a equivalência de valores entre os princípios em exame. Tal equivalência leva à discricionariedade estrutural. Isso porque, nesses casos, é permitido ao legislador tanto agir como não agir. Aquilo que as normas de uma constituição facultam é abarcado pela discricionariedade do legislador (p. 584). Ela é estrutural, pois decorre daquilo que é válido em virtude dos direitos fundamentais.
A partir daí, como diferenciar os impasses que decorrem da estrutura normativa desses direitos daqueles que surgem somente porque as possibilidades cognitivas são limitadas? Apenas os primeiros fundamentam uma discricionariedade estrutural; os outros poderão ser, no máximo, objeto de uma discricionariedade epistêmica, vinculada à dificuldade de se identificar o que a constituição determina. Trata-se de uma capacidade limitada de se reconhecer as determinações da constituição. Para encontrar a resposta, Alexy procura analisar, por meio dos princípios formais, as diferenças entre as discricionariedades.
Observam-se dois tiposdediscricionariedadeepistêmica:aempírica e a normativa. A primeira diz respeito à cognição de fatos relevantes. A segunda relaciona-se à "incerteza acerca da melhor quantificação dos direitos fundamentais em jogo e ao reconhecimento em favor do legislador de uma área no interior da qual ele pode tomar decisões com base em suas próprias valorações" (p. 612). O princípio formal que está em jogo é o da competência decisória do legislador democraticamente legitimado. É formal, porque não determina conteúdo, apenas diz quem deve definir conteúdos (p. 615) - espécie de "princípio procedimental". Ele determina quais decisões relevantes para a sociedade devem ser tomadas pelo legislador democraticamente legitimado. Nesse sentido, a tensão entre o princípio material e formal é, em última análise, a mesma que ocorre entre direitos fundamentais e democracia.
Se existisse uma precedência absoluta do princípio material de direito fundamental, a conseqüência seria que o legislador somente poderia perseguir seus objetivos com base em premissas empíricas comprovadamente verdadeiras, o que praticamente nunca ocorre nos casos minimamente complexos (p. 616). Em um cenário como esse, haveria pouca margem de ação para o legislador, o que torna procedente a crítica de Böckenförde. A outra solução extrema também não seria possível, pois daria permissão ao legislador para se basear "em prognósticos extremamente incertos e até mesmo intervenções muito intensas em direitos fundamentais" (p. 617).
Nesse ponto, Alexy é a favor de soluções intermediárias, que levam em consideração os diferentes graus de certeza dependentes das diferentes intervenções. Essa solução poderia ser definida pela "segunda lei do sopesamento": "quanto mais pesada for a intervenção em um direito fundamental, tanto maior terá que ser a certeza das premissas nas quais essa intervenção se baseia" (p. 617). Essa lei está associada à qualidade epistêmica das razões que sustentam a intervenção, e não se vincula à importância material das razões, que embasa a primeira lei.
A discricionariedade epistêmica normativa, por sua vez, está relacionada com a discricionariedade estrutural. Em um caso concreto, quando há impasse estrutural no sopesamento, é necessário apenas que os interesses em jogo sejam classificados como sendo de importância similar, para se chegar à conclusão de que tanto uma ação como outra estão inseridas na discricionariedade estrutural, pois ambas são facultadas ao legislador (p. 621). O resultado é que os princípios de direitos fundamentais podem constituir objetos de sopesamento na discricionariedade estrutural, mas eles não podem determinar o sopesamento em razão do impasse.
A mesma situação pode ser construída com o auxílio de uma discricionariedade para sopesar do tipo epistêmico-normativo. É nesse ponto que ambas as discricionariedades se relacionam. Seus limites são, nesses casos, idênticos. A diferença, conforme Alexy, reside somente na não-eliminação do elemento jurídico e na diversidade de possibilidades jurídicas. De um lado, o caso concreto se caracteriza como sendo fundamentável, ou seja, possível que os direitos fundamentais em jogo não só permitam como também obriguem determinada ação; de outro, considera-se impossível reconhecer qual das possibilidades pode ser mais bem fundamentada. Visto que há direitos fundamentais de ambos os lados, há entre eles um impasse epistêmico (p. 622). Cada um dos direitos exige a solução mais vantajosa para si, mas nenhum deles possui, em razão do impasse, força para decidir o conflito. Por isso nesses casos pode se falar da existência de uma discricionariedade cognitiva também de tipo normativo (p. 622).
A tradução de Teoria dos direitos fundamentais proporciona uma visão de conjunto da obra de Alexy, que até então permanecia quase que exclusiva ao problema do sopesamento. Em um primeiro momento do debate nacional, formou-se uma corrente de entusiastas da ponderação, a qual foi exaustivamente estudada e aplicada em decisões judiciais. Em seguida, passou-se a criticar o protagonismo judicial gerado pelo uso exagerado e sem critérios desse método. Atualmente, iniciaram-se estudos que dialogam com os novos apontamentos de Alexy, que dizem respeito à racionalidade da técnica12 e à existência de uma discricionariedade do legislador na teoria dos princípios, questionando as críticas direcionadas ao sopesamento em um primeiro momento.
Os direitos fundamentais: suas dimensões e sua incidência na Constituição
 
Sumário: Introdução; 1 Os direitos fundamentais; 1.1 Conceito de direitos fundamentais; 1.2 Os direitos fundamentais de primeira geração; 1.3 Os direitos fundamentais de segunda geração; 1.4 Os direitos fundamentais de terceira geração; 1.5 Os direitos fundamentais de quarta geração; 2 O estado de direito e os direitos fundamentais; 3 Os direitos fundamentais na constituição federal; 3.1 Os direitos fundamentais explícitos na Constituição Federal; 3.2 Os direitos fundamentais implícitos na Constituição Federal; Conclusão; Referências.
Introdução
O presente trabalho tem como finalidade apresentar um estudo sobre os direitos os direitos fundamentais, suas formas, dimensões, e a sua incidência na Constituição da República.
Mas para se falar em direitos fundamentais, convém inicialmente estudar o seu conceito.
Analisaremos, também, a quarta dimensão dos direitos fundamentais, tema pouco discutido na doutrina, o Estado de Direito, os direitos fundamentais implícitos e explícitos na Constituição.
Simplificando, o principal desafio do presente trabalho será apontar alguns aspectos e incidência na Constituição Federal dos direitos fundamentais.
1 Os direitos fundamentais
1.1 Conceito de direitos fundamentais
Os direitos fundamentais são também conhecidos como direitos humanos, direitos subjetivos públicos, direitos do homem, direitos individuais, liberdades fundamentais ou liberdades públicas. A própria Constituição da República de 1988 apresenta diversidade terminológica na abordagem dos direitos fundamentais, utilizando expressões como direitos humanos (artigo 4º, inciso II), direitos e garantias fundamentais (Título II e artigo 5º, parágrafo 1º), direitos e liberdades constitucionais (artigo 5º, inciso LXXI) e direitos e garantias individuais (artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV).
Optamos, dessa forma, por adotar a terminologia “Direitos Fundamentais”, pois esse termo abrange todas as demais espécies de direitos[1]. Neste obstante, “a expressão direitos fundamentais é a mais precisa”[2].
Os direitos fundamentais surgiram com a necessidade de proteger o homem do poder estatal, a partir dos ideais advindos do Iluminismo dos séculos XVII e XVIII, mais particularmente com as concepções das constituições escritas.
Acerca do surgimento dos direitos fundamentais, Alexandre de Moraes afirma:
“[...] surgiram como produto da fusão de várias fontes, desde tradições arraigadas nas diversas civilizações, até a conjugação dos pensamentos filosóficos-jurídicos, das idéias surgidas com o cristianismo e com o direito natural”.[3]
Do ensinamento acima transcrito, concluí-se que a teoria dos direitos fundamentais, como conhecemos hoje, é o resultado de uma lenta e profunda transformação das instituições políticas e das concepções jurídicas.
A luta contra o poder absoluto dos soberanos, o reconhecimento de direitos naturais inerentes ao homem, isso sem deixar de mencionar “a agitação política em torno às idéias de Locke, Rousseau, os enciclopedistas, os liberais que conquistaram a independência americana”[4], constituíram os elementos essenciais que vieram a desenvolver as idéias concretizadas na Declaração de Virgínia de 1777 e na Declaração de Direitos do Homem, proclamadas pela Revolução Francesa em 1789.
As evoluções do direito e, principalmente, a influência dos problemas sociais, contribuíram grandemente para a dilatação daqueles velhos preceitos, conquistas dos movimentos do século XVIII, mais precisamente os direitos fundamentais de primeira dimensão, como se verá adiante.
José Afonso da Silva, em sua meritória obra sobre Direito Constitucional, ensina que os direitos fundamentais não são a contraposição dos cidadãos administrados à atividade pública, como uma limitação ao Estado, mas sim uma limitação imposta pela soberania popular aos poderes constituídos do Estado que dele dependem[5].
Frisa-se, que além da função de proteger o homem de eventuais arbitrariedades cometidas pelo Poder Público, os direitos fundamentais também se prestam a compelir o Estado a tomar um conjunto de medidas que impliquem melhorias nas condições sociais dos cidadãos.
Em termos mais didáticos, citamos:
“Os direitos fundamentais podem ser conceituados como a categoria jurídica instituída com a finalidade de proteger a dignidade humana em todas as dimensões. Por isso, tal qual o ser humano, tem natureza polifacética, buscando resguardar o homem na sua liberdade (direitos individuais), nas suas necessidades (direitos sociais, econômicos e culturais) e na sua preservação (direitos relacionados à fraternidade e à solidariedade)”.[6]
Para um melhor entendimento, repisamos, os direitos fundamentais devem ser vistos como a categoria instituída com o objetivo de proteção aos direitos à dignidade, à liberdade, à propriedade e à igualdade de todos os seres humanos. A expressão fundamental demonstra que tais direitos são imprescindíveis à condição humana e ao convívio social. Esse o entendimento de Ingo Wolfgang Sarlet:
“Os direitos fundamentais, como resultado da personalização e positivação constitucional de determinados valores básicos (daí seu conteúdo axiológico), integram, ao lado dos princípios estruturais e organizacionais (a assim denominada parte orgânica ou organizatória da Constituição), a substância propriamente dita, o núcleo substancial, formado pelas decisões fundamentais, da ordem normativa, revelando que mesmo num Estado constitucional democrático se tornam necessárias (necessidade que se fez sentir da forma mais contundente no período que sucedeu à Segunda Grande Guerra) certas vinculações de cunho material para fazer frente aos espectros da ditadura e do totalitarismo”.[7]
Na Constituição Federal, os direitos fundamentais são observados no Título II da Constituição de 1988 e também em outros dispositivos nela dispersos nos quais se verifique características de historicidade, universalidade, limitabilidade, concorrência e irrenunciabilidade, próprias dos direitos fundamentais[8], mas que não nos caberá explorar nesta oportunidade.
Imperioso mencionar os dizeres Jayme Benvenuto Lima Junior acerca dos direitos fundamentais e a Constituição Federal:
“A Constituição Brasileira de 1988 é, até o momento a que melhor acolhida faz aos Direitos Humanos em geral. Tanto em termos da quantidade e da qualidade dos direitos enumerados, como da concepção embutida no texto constitucional, a Carta de 1988 é inovadora”.[9]
1.2 Os direitos fundamentais de primeira dimensão
Os direitos fundamentais de primeira dimensão estão presentes em todas as Constituições das sociedades democráticas e são integrados pelos direitos civis e políticos, como exemplo citamos o direito à vida, à intimidade, à inviolabilidade de domicílio, à propriedade, a igualdade perante a lei etc.
“Os direitos de primeira dimensão são os direitos de liberdade, pois são fruto do pensamento liberal burguês, de caráter fortemente individualista, aparecendo como uma esfera limitadora da atuação do Estado, isto é, demarcando uma zona de não-intervenção do Estado nas liberdades do indivíduo”.[10]
O professor Celso Lafer leciona sobre o tema com maestria:
 “[...] são, neste sentido, direitos humanos de primeira geração, que se baseiam numa clara demarcação entre Estado e não-Estado, fundamentada no contratualismo de inspiração individualista. São vistos como direitos inerentes ao indivíduo [...]”.[11]
Da análise dos ensinamentos supra transcritos, pode se afirmar que são direitos que apresentam um caráter destatus negativus, eis que representam uma atividade negativa por parte da autoridade estatal, de não violação da esfera individual. É o afastamento do Estado das relações individuais e sociais.
Sobre o tema, Paulo Bonavides ministra:
“Os direitos da primeira geração são os direitos da liberdade, os primeiros a constarem do instrumento normativo constitucional, a saber, os direitos civis e políticos, que em grande parte correspondem, por um prisma histórico, àquela fase inaugural do constitucionalismo do Ocidente.
[...]
Os direitos de primeira geração ou os direitos de liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa que ostentam ma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado”.[12]
Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Junior, ao lecionarem sobre o tema, afirmam:
“Trata-se de direitos que representavam uma ideologia de afastamento do Estado das relações individuais e sociais. O Estado deveria ser apenas o guardião das liberdades, permanecendo longe de qualquer interferência no relacionamento social. São as chamadas ‘liberdades públicas negativas’ ou ‘direitos negativos’, pois exigem do Estado um comportamento de abstenção”.[13]
Mister se faz elucidar, ainda, os ensinamentos de José Afonso da Silva:
“[...] direitos fundamentais do homem-indivíduo, que são aqueles que reconhecem autonomia aos particulares, garantindo iniciativa e independência aos indivíduos diante dos demais membros da sociedade política e do próprio Estado; por isso são reconhecidos como direitos individuais, como é de tradição do Direito Constitucional brasileiro (art. 5º), e ainda por liberdades civis e liberdades-autonomia (França)”; [...][14]
Diante de todo o explanado, nos direitos fundamentais de primeira dimensão são considerados e valorizados direitos de resistência ou oposição perante o Estado, sendo deste exigido um comportamento de abstenção, por isso também são chamados de direitos negativos. Seria um “agir ou não agir, fazer ou não fazer. Usar ou não usar. Ir, vir ou ficar”[15].
1.3 Os direitos fundamentais de segunda dimensão
Com o avanço do liberalismo político e econômico no inicio do século XX, após a Primeira Guerra Mundial, o mundo assistiu a deterioração do quadro social.
Ante a degradação do próprio homem, da vida humana, há o advento de um modelo novo de Estado, o Estado Social de Direito.
“[...] século marcado por convulsões bélicas, crises econômicas, mudança sociais e culturais e progresso técnico sem precedentes (mas não sem contradições), o século XX é, muito mais que o século anterior, a era das ideologias e das revoluções. [...] É, portanto, um século em que o Direito público sofre poderosíssimos embates e em
que à fase liberal do Estado constitucional vai seguir-se uma fase social”.[16]
Portanto, a segunda dimensão dos direitos fundamentais reclama do Estado uma ação que possa proporcionar condições mínimas de vida com dignidade, são os direitos sociais, econômicos e culturais. Sempre buscando diminuir as desigualdades sociais, notadamente proporcionando proteção aos mais fracos.
Importante mencionar que os direitos de segunda dimensão não negam, tampouco exclui os direitos de primeira dimensão, mas a estes se somam[17].
“A primeira geração de direitos viu-se igualmente complementada historicamente pelo legado do socialismo, cabe dizer, pelas reivindicações dos desprivilegiados a um direito de participar do “bem-estar social”, entendido como os bens que os homens, através de um processo coletivo, vão acumulando no tempo. É por essa razão que os assim chamados direitos de segunda geração, previstos pelo welfare state, são direitos de crédito do indivíduo em relação à coletividade. Tais direitos – como o direito ao trabalho, à saúde, à educação – têm como sujeito passivo o Estado porque, na interação entre governantes e governados, foi a coletividade que assumiu a responsabilidade de atendê-los [...] Daí a complementaridade, na perspectiva ex parte populi, entre os direitos de primeira e segunda geração, pois estes últimos buscam assegurar as condições para o pleno exercício dos primeiros, eliminando ou atenuando os impedimentos ao pleno uso das capacidades humanas”.[18]
A nota distintiva destes direitos é a sua dimensão positiva, uma vez que se cuida não mais de evitar a intervenção do Estado na esfera da liberdade individual, mas, sim, de propiciar o direito ao bem-estar social.
“A partir da terceira década do século XX, os Estados antes liberais começaram o processo de consagração dos direitos sociais ou direitos de segunda geração, que traduzem, sem dúvida, uma franca evolução na proteção da dignidade humana. Destarte, o homem, liberto do jugo do Poder Público, reclama uma nova forma de proteção da sua dignidade, como seja, a satisfação das carências mínimas, imprescindíveis, o que outorgará sentido à sua vida”.[19]
Isto posto, os direitos da referida segunda dimensão estão ligados intimamente a direitos prestacionais sociais do Estado perante o indivíduo, como assistência social, educação, saúde, cultura, trabalho, lazer, dentre outros.
Com os direitos da segunda dimensão, brotou um pensamento de que tão importante quanto preservar o indivíduo, segundo a definição clássica dos direitos de liberdade, era também despertar a conscientização de proteger a instituição, uma realidade social mais fecunda e aberta à participação e valoração da personalidade humana, que o tradicionalismo da solidão individualista, onde se externara o homem isolado, sem a qualidade de teores axiológicos existenciais, ao qual somente a parte social contempla. Nesse sentido, citamos os dizeres de Themistocles Brandão Cavalcanti:
“Assim, o direito ao trabalho, à subsistência, ao teto, constituem reivindicações admitidas por tôdas as correntes políticas, diante das exigências reiteradamente feitas pelas classes menos favorecidas no sentido de um maior nivelamento das condições econômicas, ou, pelo menos, uma disciplina pelo Estado das atividades privadas, a fim de evitar a supremacia demasiadamente absorvente dos interesses economicamente mais fortes”.[20]
Por derradeiro, por reclamarem pela presença do Estado em ações voltadas à minoração dos problemas sociais, os direitos fundamentais de segunda dimensão são também denominados de direitos positivos[21].
1.4 Os direitos fundamentais de terceira dimensão
Após a Segunda Guerra Mundial, ligada ao surgimento de entidades como a Organização das Nações Unidas (1945) e a Organização Internacional do Trabalho (1919), surge a proteção internacional dos direitos humanos, voltado para a essência do ser humano, ao destino da humanidade, pensando o ser humano como gênero e não adstrito ao indivíduo ou mesmo a uma coletividade determinada[22].
“[...] a aparição dessa terceira dimensão dos direitos fundamentais evidencia uma tendência destinada a alargar a noção de sujeito de direitos e do conceito de dignidade humana, o que passa a reafirmar o caráter universal do indivíduo perante regimes políticos e ideologias que possam colocá-lo em risco, bem como perante toda uma gama de progressos tecnológicos que pautam hoje a qualidade de vida das pessoas, em termos de uso de informática, por exemplo, ou com ameaças concretas à cotidianidade da vida do ser em função de danos ao meio ambiente ou à vantagem das transnacionais e corporações que controlam a produção de bens de consumo, o que desdobra na proteção aos consumidores na atual sociedade de massas”.[23]
Emerge, portanto, um novo escopo jurídico que se vem somar aos direitos do homem com os historicamente versados direitos de liberdade e igualdade.
Paulo Bonavides leciona:
“Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo, ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta. Os publicistas e juristas já o enumeram com familiaridade, assinalando-lhe o caráter fascinante de coroamento de uma evolução de trezentos anos na esteira da concretização dos direitos fundamentais. Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade”.[24]
Alexandre de Moraes, acerca do assunto, ensina:
“Por fim, modernamente, protege-se, constitucionalmente, como direitos de terceira geração os chamadosdireitos de solidariedade e fraternidade, que englobam o direito a um meio ambiente equilibrado, uma saudável qualidade de vida, ao progresso, a paz, a autodeterminação dos povos e a outros direitos [...]”[25]
Como visto, muito se fala em direito a paz, a autodeterminação dos povos, ao meio ambiente, à comunicação, dentre outros. Mas isso não significa que a vida humana, o ser humano não seja mais o titular de direitos, muito pelo contrário.
É da proteção do próprio ser humano que emanam tais direitos, típicos direitos transindividuais. O direito a vida passa a ser analisado como um direito suscetível de ser lesado coletivamente. Isto é, uma lesão pode ser dirigida a uma ou muitas pessoas.
“Da proteção da vida em terceira dimensão emanam direitos como o direito ao meio ambiente e os direitos do consumidor, típicos direitos transindividuais, e, em geral, o conjunto daqueles interesses da sociedade que constituíam o núcleo de relações entre os indivíduos da espécie humana, todos ligados naturalmente pelo fato de existirem”.[26]
Em outras palavras, os direitos de terceira dimensão são os direitos coletivos em sentido amplo, também conhecidos como interesses transindividuais, gênero em que estão incluídos os direitos difusos, os coletivos em sentido estrito e os direitos individuais homogêneos.
Para finalizar, citamos os ensinamentos de Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior:
“A essência desses direitos se encontra em sentimentos como a solidariedade e a fraternidade, constituindo mais uma conquista da humanidade no sentido de ampliar os horizontes de proteção e emancipação dos cidadãos”.
[...]
Enfoca-se o ser humano relacional, em conjunção com o próximo, sem fronteiras físicas ou econômicas”.[27]
Manoel Gonçalves Ferreira Filho, buscando uma melhor forma de ensinar, fez uma relação entre as três dimensões de direitos e garantias fundamentais e o lema da Revolução Francesa, onde os de primeira dimensão seriam os relativos à liberdade os de segunda, os relacionados à igualdade e os de terceira, à fraternidade[28].
1.5 Os direitos fundamentais de quarta dimensão
A historicidade das dimensões dos direitos fundamentais se verifica

Teste o Premium para desbloquear

Aproveite todos os benefícios por 3 dias sem pagar! 😉
Já tem cadastro?

Outros materiais