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1 
 
 
 
 
 
 
 
APOSTILA NÚMERO 1 
 
 
 
APOSTILA DE COMENTÁRIOS A ALGUNS ARTIGOS DO CÓDIGO 
DE PROCESSO CIVIL 
 
Artigos Comentados por Inúmeros Juristas e Compilados por 
Mariângela Guerreiro Milhoranza 
(todos os comentários foram publicados no site Páginas de Direito e 
no CD Datadez) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 2 
OBSERVAÇÕES SOBRE O PRIMEIRO PONTO DA MATÉRIA: 
NOÇÕES GERAIS: DIREITO MATERIAL E DIREITO 
PROCESSUAL – Prof. Mariângela Guerreiro Milhoranza - 
Doutoranda em Direito pela PUCRS, Mestre em Direito pela PUCRS, 
Especialista em Direito Processual Civil pela PUCRS, Advogada e 
Professora da UCS. 
 
1.1. Relação Jurídica Material e Processual 
1.1.1. Relação Jur ídica Mater ia l: A re lação jur ídica mater ial é o que se 
discute no processo. No processo há uma relação entre as partes e o juiz , 
que não se confunde com a relação jur ídica de direito mater ia l 
controvert ida: é a denominada relação jur ídica processual. 
1.1.2. Relação Jur ídica Processual: A relação jur ídica processual é 
caracter izada pe la presença dos sujeitos (autor, réu e Estado -ju iz), pelo 
objeto (a prestação jur isdicional) e pelos seus pressupostos (os 
pressupostos processuais). RELAÇÃO JURÍDICA PROCESSUAL: 
Sujeitos: São as pessoas fís icas (ou Jur ídicas) envo lvidas 
Objeto da Relação Jurídica Processual : É o pedido do autor, ou seja, o 
que ele so lic ita que lhe seja assegurado pelo órgão jur isdicional , uma 
providência jur isdic ional quanto a um bem pretendido, mater ial ou 
imater ial. Portanto, o objeto da relação jur ídica processual é a obtenção 
de um provimento jur isdic ional, o int eresse de obter uma decisão 
judic ial. 
Características da Relação Jurídica Processual 
a) Tri lateralidade : A relação jur ídica processual é t rilateral (ou 
t riangular), porquanto entretecida entre o juiz e as partes e entre o réu e 
o autor, reciprocamente. "O ju iz e as partes são sujeitos do processo, isto 
é, os integrantes da relação jur ídica processual". (Nelson Nery Júnior) . 
b) Autonomia : A relação jur ídica processual não se confunde com a 
relação jur ídico -mater ia l que lhe é subjacente, sendo, portanto, 
completamente autônoma desta. Através da relação jur ídica processua l 
forma-se um vínculo entre o direito mater ial e o direito processual, em 
que o primeiro fornece, ao segundo, o conteúdo. 
 3 
c) Caráter público da relação jurídica processual : A relação jur ídica 
processual é pública, uma vez que se desenvo lve sob a tutela, diret iva e 
int ervent iva, do Estado -juiz. 
d) Progressividade : A relação jur ídica processual é progressiva, uma 
vez que avança inexoravelmente em direção à so lução do lit ígio 
(caracter izado aí o fenômeno da preclusão). A repet ição de atos 
processuais dentro de um mesmo processo somente se dá quando se 
ident ifica algum vício insanável a inva lidar um ato já prat icado. 
e) Complexidade : A relação jur ídica processual é composta por uma 
sér ie de relações secundár ias que vão surgindo durante o t ranscorrer do 
processo. A prát ica sucessiva de atos processuais enseja às partes uma 
alternância entre posições nas quais ora serão t itulares de direitos e 
poderes, ora serão t itulares de ônus e obr igações, ora est arão em posição 
de sujeição ( isto é, sujeit as a um poder). 
f) Unicidade : um único objet ivo que a prestação da tutela jur isdic iona l. 
Partes da Relação Jur ídica Processua l: 
Partes Diretas: O Juiz e as Partes 
O Juiz: O juiz é o suje ito processual que se mantém (deve manter) 
sempre imparcia l e eqüidistante das partes. É o juiz quem dir ige o 
processo, compet indo - lhe assegurar às partes igualdade de t ratamento, 
velar pela rápida so lução do lit ígio, prevenir ou repr imir qualquer ato 
contrár io à dignidade da just iça. Existem três pressupostos relat ivos ao 
cargo do juiz: invest idura, competência e imparcialidade. 
a. Invest idura ou juiz natural: o juiz deve estar dotado de 
jur isdição brasile ira para reso lver a ação. 
b. Competência: é do juiz a at r ibuição para so lucionar aquele 
lit ígio dentro da jur isdição que lhe é dada. 
c. Dever de Imparcialidade: o juiz deve ser um suje ito imparcia l. 
As Partes: Para o direito processual, os demandantes em um processo são 
designados simplesmente pelo nome de "partes". Parte autora é aquela 
que formula o pedido inic ial ao juiz e parte ré é aquela em cujo desfavor 
se impõe a lide, devendo vir ao processo para proporcionar sua defesa. 
 4 
1.2. Conceito, Princípios, Divisão, Classificação e Esboço Histórico 
do Direito Processual 
A) Conceito : O direito processual é o ramo da ciência jur ídica que t rata 
do complexo das normas reguladoras do exercíc io da jur isdição. O 
direito processual civil consiste no sist ema de pr inc ípios e leis que 
regulamentam o exercício da jur isdição quanto às lides de n atureza civi l 
como tais entendidas todas as lides que não são de natureza penal e as 
que não entram na ó rbit a das jur isdições especiais.
1
 O direito processual 
civil é o “ramo do direito público que consiste no conjunto sistemát ico 
de normas e pr incípios que regula a at ividade da jur isdição, o exercíc io 
da ação e o processo, em face de uma pretensão civil, entendida esta 
como toda aquela cuja decisão esteja fora da atuação da jur isdição pena l, 
penal militar, do trabalho e eleitoral.
2
 
B) Princípios : Os pr incíp ios que norteiam as diret r izes do direito 
processual são: 
1-Pr incíp io da imparcialidade do juiz: Para garant ir a validade e a just iça 
no processo é necessár io um juiz atuando de forma imparcial, evitando 
ações tendenciosas que acabem por favorecer uma da s partes. A posição 
do juiz no processo é de colocar -se acima das partes para poder julgar de 
modo eficaz. Sua imparcialidade é essencial para o andamento sadio do 
processo. 
2- Pr inc ípio da igua ldade: Ambas as partes devem ter um tratamento 
igual por parte do juiz. Seu fundamento encontra respaldo no art igo 5 da 
CF. 
3- Pr incípio do contraditór io e ampla defesa: É garant ida as partes 
envo lvidas no processo o pleno direito de se manifestar sobre assuntos 
ligados ao processo, bem como de defender -se de toda questão levantada 
no mesmo. 
4- Pr incípio da ação: Também denominado princípio da demanda, garante 
à parte a iniciat iva de provocação do exercício da função jur isd iciona l 
 
1 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Ci vi l . Vol . 1, 
Saraiva , 2007, p. 15. 
2 GRECO FILHO, Vicen te. Direito Processual Civi l Brasile i ro. 19 ed. São Paulo: 
Saraiva , p. 66. 
 5 
(em outras palavras, direito garant ido ao acesso dos serviços o ferecidos 
pelo poder judic iár io). 
5- Pr incíp io da disponibilidade e da indisponibilidade: Este pr incíp io faz 
referência ao poder disposit ivo, que é a liberdade garant ida a todo 
cidadão de exercício de seus dire itos. No direito processual este 
pr incípio se t raduz pela possibilidade ou não de apresentar em juízo a 
sua pretensão, do modo como bem entenda. 
6- Pr incípio da livre invest igação das provas: Neste pr incípio é 
estabelecido que o juiz depende das prova s produzidas pelas partes para 
que possa fundamentar sua decisão. 
7- Pr incípio da economia e inst rumentalidade das formas: O processo, 
como instrumento de afer ição de direito , não deve ter um dispêndio 
exagerado em relação aos bensem disputa. 
8- Princípio do duplo grau de jur isdição: É garant ido, por meio deste 
pr incípio, a revisão da decisão processual. Assim, pode o cidadão ter 
direito a novo julgamento além daquele profer ido pelo juiz de pr imeira 
instância (ou pr imeiro grau). 
9- Princípio da public idade: O pr incípio da public idade garante que o 
cidadão tenha acesso às informações do processo, vedado o sigilo , 
garant indo um instrumento importante de fiscalização popular. 
10- Pr incípio da mot ivação das decisões judic iais: Deve o juiz formular 
coerentemente sua decisão, demonstrando de modo inequívoco como 
determinada sentença fo i composta. 
C) Divisão : Como é una a jur isdição, expressão do poder estatal também 
uno, também é uno o direito processual, como sistema de pr incíp ios e 
normas para o exercício da jur isdição. O direito processual como um 
todo descende dos grandes pr incíp ios e garant ias const itucionais 
pert inentes e a grande bifurcação entre processo civil e processo pena l 
corresponde apenas às exigências pragmát icas relacionadas com o t ipo de 
normas jur ídico-substanciais a atuar. 
 6 
D) Classificação : O Direito Processual pode ser classificado em Direito 
Processual Civil, Direito Processual Penal, Direito Processual do 
Trabalho, Direito Processual Tr ibutár io e Dire ito Processual 
Previdenciár io. Todos com re gras própr ias, legislação específica e 
procedimento específico. 
E) Esboço Histórico do Direito Processual - O desenvo lvimento do 
Estado (principalmente os desenvo lvimentos cient ífico e int electual) está 
int ensamente correlacionado ao monopólio Estatal de produção e 
aplicação do direito . Em suma, o direito tem o condão de traduzir , 
mediante a edição de normas de conduta, os valores cultuados em 
determinada sociedade. Pois bem, nos pr imórdios, o direito era t ido 
como uma manifestação das leis de Deus. Tais leis eram conhecidas e 
reveladas somente aos sacerdotes. No t ranscurso da histór ia da 
humanidade, pode-se divid ir o ordenamento jur ídico em três grandes e 
dist intos est ilo s: o direito arcaico, o direito ant igo e o direito moderno. 
O direito arcaico é carac ter íst ica do denominado per íodo t r ibal onde os 
costumes do clã dit avam as regras de convivência em sociedade 
alicerçadas na crença dos antepassados. Não cabia ao Estado a produção 
do direito; não cabia ao Estado editar no rmas gerais e imposit ivas com 
caráter cogente, capazes de regular a conduta humana: a at ividade 
desenvo lvida pelos chefes dos c lãs era meramente organizacional e não 
jur isdicional. Na era do direito arcaico, segundo dispõe John Gilissen, 
“.. .precedentes judiciár ios do per íodo se propagavam entre gerações 
como provérbios e adág ios. . .” Com o passar dos tempos, os clãs 
passaram a se organizar em grupos maiores de pessoas e tais grupos, da 
união de alguns clãs, foram denominados de t r ibos. As t r ibos começaram 
a se mult iplicar terr itorialmente e a organização das mesmas passou a ser 
exercida por um chefe com poderes “divinos”. 3 
Com a gradual e lenta cr iação das t r ibos e com a t ransformação 
territorial das mesmas em pequenos centros urbanos (concomitantemente 
ao surgimento da escr it a e, pr incipalmente, da moeda metálica) surge a 
 
3 GILISSEN, John. Introdução histórica ao direito. Traduzido por A. M. Botelho 
Hespanha e I . M. Macaísta Malheiros. Lisboa: Calouste Gul benkian, 1995, p. 36. 
 7 
necess idade de adequação de regras de conduta ao aparecimento de uma 
sociedade que começava a se organizar. Daí o aparecimento do direito 
ant igo onde o direito passou a ganhar conceitos tendo em vista a 
complexidade da nova vida que se organizava. Portanto, é nesse contexto 
histór ico que surge a pr imeira codificação conhecida da história da 
humanidade: a codificação de Hamurabi da Babilônia. Imper ioso fr isar 
que, no que tange à leg islação codificada, de cunho escr ito , a mesm a 
cont inuou vincu lada à religião, como por exemplo, os dez mandamentos 
apregoados por Moisés. 
Na Grécia Ant iga, todavia, conforme dispõe Chr istopher Carey, as 
pr imordia is leis escr itas são t idas como mecanismos de aperfeiçoamento 
da just iça e da imposição de limit es ao exercíc io do poder. No ano de 
620 a.C., Drácon estabeleceu a pr imeira codificação legal grega sendo tal 
codificação extremamente severa e despót ica. Em 594 a.C., Sólon fez 
uma verdadeira reforma legis lat iva nas leis impostas por Drácon e fo i , 
neste per íodo, que surgiu a chamada po liteia, que, na realidade, era um 
conjunto de leis que estabeleciam regras de conduta tanto para os 
negócios de caráter público quanto para os negócios de caráter pr ivado. 
Logo, uma autênt ica jur isdição apareceu, somente, a part ir do surgimento 
de um Estado mais independente, mais desvinculado dos valores de 
cunho relig ioso e, nit idamente, mais acentuado nas regras de controle 
social. O surgimento deste Estado, editor de normas de conduta e de 
sanções àqueles que descumpram tais normas, t raz em seu bo jo, a 
vedação da autotutela. Sob esta ót ica, no Brasil, a atual previsão 
normat iva do acesso à just iça e à prestação jur isdicional está consagrada 
no disposto no inciso XXXV do art . 5º da Const ituição Federal, que 
dispõe que “a le i não exclu irá da apreciação do Poder Judiciár io lesão ou 
ameaça a direito”. 
1.3. Formas de Solução de Conflitos: Autotutela, Autocomposição, 
Conci liação, Mediação e Arbitragem 
 
 8 
AUTOTUTELA – Há autotutela quando o part icular ap lica o direito com 
as própr ias mãos, sem a int ervenção do Estado. A autotutela ocorre 
quando o próprio sujeito busca afirmar, unilateralmente, seu interesse, 
impondo-o (e impondo-se) à parte contestante e à própria comunidade 
que o cerca. 
AUTOCOMPOSIÇÃO - Na autocomposição, o conflito é so lucionado 
pelas partes, sem a intervenção de outros agentes no processo de 
pacificação da controvérsia. As modalidades de autocomposição são as 
seguintes: renúncia, aceit ação (resignação/submissão) e a t ransação. 
CONCILIAÇÃO - É um meio alternat ivo de reso lução de conflitos em 
que as partes confiam a uma terceira pessoa (neutra), o conciliador, a 
função de aproximá- las e or ientá- las na construção de um acordo. O 
conciliador é uma pessoa da sociedade que atua, de forma vo luntár ia e 
após t reinamento específico, como facilitador do acordo entre os 
envo lvidos, cr iando um contexto propício ao entendimento mútuo, à 
aproximação de interesses e à harmonização das relações. 
MEDIAÇÃO - Caracter iza-se como um procedimento em que há a ação 
de um terceiro, d ito mediador, est ranho ao conflito de interesses, que 
conduz e induz as partes a um consenso. Todavia, as partes não ficam 
vinculadas à proposta do mediador. Trata -se na realidade de u m 
procedimento negocial revelado na tentat iva de so lucionar a 
controvérs ia. 
ARBITRAGEM – é uma técnica para so lução de controvérsias at ravés de 
uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção 
pr ivada, decidindo com base nesta convenção, sem int ervenção do 
Estado, sendo a decisão dest inada a assumir eficácia de se ntença 
judic ial. Natureza Jurídica da Arbitragem - Quanto à natureza 
jur ídica, há duas correntes que debatem duas teses pr incipais: a) tese 
contratualista e b) tese jur isdicional. A tese contratualista defende que a 
arbit ragem possui um caráter pr ivat ista uma vez que há falta de 
imper ium às at r ibuições confer idas ao árbit ro, eis que estesnão assumem 
 9 
a qualidade de funcionár io público e não administ ram a just iça em nome 
do Estado e sim pela vontade das partes. Já a tese jur isdicional est á 
balizada no caráter público da administ ração da just iça e, 
pr incipalmente, no fato do Código de Processo Civil, no art igo 475 -N, 
inc iso IV, confer ir à sentença arbit ral as caracter íst icas própr ias de uma 
sentença pro latada por um magist rado da função jur isdicional do Estado . 
No Brasil, a Lei 9307/96 (LA – Lei da Arbit ragem) regula o 
procedimento arbit ral de modo bastante completo. 
O objeto do lit ígio submet ido à arbit ragem somente poderá versar sobre 
direitos patr imonia is disponíveis (arts. 1o; 25 e 39 da LA). Do 
procedimento arbit ra l - O procedimento arbit ral – ou just iça dos árbit ros 
– implica, segundo a LA uma metodologia processual mínima, esta, 
inc lusive, já poderá ter sido desenhada pelas partes na convenção. A 
inst ituição da arbit ragem exige a indicação e aceitação d o árbit ro. O par. 
4o do art. 21 da LA, a semelhança do processo judic ial, deverá tentar, 
previamente, a conciliação das par-tes indutora de um acordo. Caso no 
curso da arbit ragem emergir dúvida sobre a nature-za dos bens, 
suspende-se o procedimento, remetendo-se as partes à jur isd ição para 
dir imir a questão, caso reconhecida a disponibilidade, renova -se o 
procedimento (art . 25, LA). O procedimento não impede a so lução 
amigáve l das partes. Ademais, poderão requerer a sentença arbit ra l 
declaratór ia do acordo (art . 28, LA). 
É direito das partes, por si mesmas, ou por representantes ou advogados, 
acompanhar todo o procedimento arbit ral (par. 3o, art . 21, LA). 
Os árbit ros não têm poderes coercit ivos, casos esses sejam necessár ios, 
poderão requerer ao Poder Judiciár io or igina-r iamente competente para 
julgar a causa (par. 4o, art . 22, LA). 
1.4. Conceito de Lide e Processo - A prestação jur isdicional passa 
inexoravelmente pela formação de uma relação jur ídico -processual, que 
pode ser conceituada como um conjunto concatenado de atos formais que 
levam a dia lét ica e uma consequente conclusão, quando se aplicará a 
 10 
norma objet iva ao caso concreto. O exercício dessa at ividade 
jur isdicional se dá at ravés do processo, verdadeiro inst rumento da 
jur isdição, que por seu turno é mater ia lizado através do exercício da 
ação, via pet ição. 
Conceito de Lide - Quando há conflito de interesses entre as partes, este 
é denominado de lide. Ainda que muitos sejam os conceitos dados à lide, 
Carnelut t i deu- lhe conceituação quase dogmát ica como “o conflito de 
int eresses qualificado por uma pretensão resist ida.” Deste conceito 
emergem do is outros conceitos importantes: o conceito de interesse e o 
conceito de pretensão. Interesse é a relação entre o homem e os bens. 
Sujeito do interesse é o homem; o bem, o seu objeto. O t rágico está em 
que os interesses humanos são ilimitados, mas limit ados os bens. Nesse 
sent ido, há conflito de interesses quando duas ou mais pessoas têm 
int eresse pelo mesmo bem, que a uma só possa sat isfazer, tem-se um 
conflito intersubjet ivo de interesses ou, simplesmente, um conflito de 
int eresses. Já a pretensão é o ato de se exigir a subordinação do interesse 
de outrem ao próprio. 
Conceito de Processo – A palavra Processo der iva do lat im procedere, 
verbo que indica a ação de avançar, ir para frente (pro+cedere) e é um 
conjunto sequencial e part icular de atos com um objet ivo comum: a 
prolação da decisão judic ial. 
1.5. Codificação do Processo Civi l - No Brasil, mesmo com a 
declaração da Independência, ainda cont inuaram a vigora r as leis 
portuguesas at inentes ao processo. Valiam, então, naquilo em que não 
fosse contrar iada a soberania nacional, as normas processuais civis 
cont idas nas Ordenações Filipinas (Livro III) 1 2, cujo processo al i 
disciplinado contava com as pr incipais c aracter íst icas de ser escr ito , 
detentor de fases r ígidas e marcado pelos pr incípios da iniciat iva da 
parte e do disposit ivo. Com a Const ituição de 1891, veio a competência 
da União e dos Estados para legis lar sobre direito processual e, então, 
passamos a t er uma legis lação federal de processo e, ao mesmo tempo, 
códigos de processo em cada um dos estados da federação - na maior ia, 
 11 
espe lhados no modelo federal - , destacando-se, dentre esses, os códigos 
de São Paulo e da Bahia. Com a Const ituição de 1934, a Un ião retoma 
sua competênc ia plena para legis lar sobre processo, decorrendo, daí, a 
necess idade de um novo Código de Processo Civil, capaz de atender às 
necess idades e aos reclamos de uma grande nação. Em 1939, surge o 
pr imeiro Código de Processo Civil Brasi leiro. Tal Código fo i revogado 
pelo Código de 1973, Lei n. 5869/73 que, atualmente, está em vigor. O 
CPC de 1973 está dividido em 5 livros: 
Livro I – Do Processo de Conhecimento 
Livro II - Do Processo de Execução 
Livro III - Do Processo Cautelar 
Livro IV – Dos Procedimentos Especiais 
Livro V – Das Disposições Finais e Transitórias 
Em 2005, com a promulgação da Lei n. 11.232/2005, a execução 
de t ítulo execut ivo judic ial saiu do Livro II e fo i para o Livro I. E m 
apertada sínt ese, a Lei n. 11.232/2005 t rata, especialmente, do 
cumprimento da sentença que condena o devedor ao pagamento de 
quant ia. A inserção da fase do cumprimento da sentença, dentro do 
processo de conhecimento, t raz à tona a assert iva de Araken de Assis
4
 de 
que há fals idade na r ígida t r ipart ição das funções – cognição, execução e 
cautelar – em estruturas autônomas e separadas, dizendo, ainda, que em 
todo o processo haverá cognição, uma vez que sem cognição, o Poder 
Judiciár io não ter ia como at ingir seus objet ivos. Nesse ponto, diz 
Barbosa Moreira
5
: 
 
Convicçã o assen te nos mei os jur ídicos é a de que a 
novidade capi ta l in troduzida pela Lei n . º 11.232, de 
2.11.2005, consiste na junção das a t ividades jur isdicionais 
cogn i t iva e execut iva , el iminando-se, a di ferenciação formal 
en tre o processo de conhecimen to e o processo de execuçã o, 
r essalvadas as h ipóteses do ar t . 475 -N, parágrafo ún ico, do 
Código de Processo Ci vi l e a de ser devedora a Fazenda 
Públ ica . 
 
 
4 ASSIS, Araken de. Cumprimento da Sentença . Ri o de Janeiro: Forense, 2006, p. 
6. 
5 BARBOSA MOREIRA, José Car los. “Cumprimen to” e “Execuçã o” de sen tença: 
necessidade de esclarecimen tos concei tuais. In Revista Jurídica n . º 346, agost o de 
2006, p.11. 
 12 
Destarte, mesmo que inexistente, na prát ica, essa divisão das 
funções jur isdic ionais, não poder ia o legis lador elaborar um pro jeto de 
lei em que não fossem previstas regras gerais aplicáveis a todas as 
funções jur isdic ionais. Com efe ito , diversamente, as reformas t razidas 
rechaçaram a arquitetura inic ial do Código de Processo Civil, po is como 
a lei não prevê uma parte geral de regras aplicáveis às funções 
jur isdicionais previstas no diploma legal, acabou -se por disso lver regras 
comuns no Livro do Processo de Conhecimento.
6
 A bem da verdade, 
observa-se que a Lei n. 11.232/2005 dá lugar a um processo de natureza 
mesclada: junto à cognição efet iva -se o julgado.
7
 Nesse mesmo sent ido, 
Ada Pe llegr ini Gr inover
8
 atesta que “a efe t ivação dos preceitos cont idos 
em qualquer sentença civil condenatória se realizará em prossegu imento 
ao mesmo processo em que forprofer ida”. 
 
COMENTÁRIOS AOS ARTIGOS 1º E 2º DO CÓDIGO DE 
PROCESSO CIVIL 
Mariângela Guerreiro Milhoranza 9 
 
INTRODUÇÃO 
 
1 – DO CONCEITO DE JURISDIÇÃO, DO ACESSO À JUSTIÇA E 
DA EFETIVIDADE PROCESSUAL 
 
O desenvo lvimento do Estado (principalmente os desenvo lvime ntos 
cient ífico e intelectual) está intensamente correlacionado ao monopó lio 
estatal de produção e aplicação do direito . Em suma, o Direito tem o 
condão de t raduzir, mediante a edição de normas de conduta, os valores 
 
6 ASSIS, Araken de. Cumprimento da Sentença . Ri o de Janeiro: Foren se, 2006, p. 
3. 
7 MITIDIERO, Daniel Francisco. In : OLIVEIRA, Carlos Alber to Alvaro de (org. ) . A 
nova e xecução: Comentários à Lei n. 11.232 de 22 de Novembro de 2005 . Rio de 
Janeiro: Forense, 2006, p. 3. 
8 GRINOVER, Ada Pel legr ini . Cumpr imen to da sen tença. In BRUSCHI, Gi lber to 
Gomes. Exec ução Ci vi l e Cumprimento da Sentença . São Paulo: Método, 2006, 
p.19. 
9 Dout oranda em Direi to pela PUCRS, Mes tre em Direi to pela PUCRS. Especia l ista 
em Direi to Processual Civi l pela PUCRS. Advogada. Professora da UCS/RS. 
 13 
cultuados em determinada sociedade. Pois bem, nos pr imórdios 10, o 
direito era t ido como uma manifestação das le is de Deus . Tais le is eram 
conhecidas e reveladas somente aos sacerdotes. No transcurso da história 
da humanidade, pode-se dividir o ordenamento jur ídico em três grandes e 
dist intos est ilo s: o dire ito arcaico, o direit o ant igo e o direito moderno 11. 
Concernentemente ao direito arcaico, pondera -se que o mesmo é 
caracter íst ica do denominado per íodo t r ibal em que os costumes do clã 
ditavam as regras de convivência em sociedade alicerçadas n a crença dos 
antepassados. Não cabia ao Estado a produção do direito; não cabia ao 
Estado editar normas gerais e imposit ivas com caráter cogente, capazes 
de regular a conduta humana: a at ividade desenvo lvida pelos chefes dos 
clãs era meramente organizacional; não jur isdicional. Na era do direito 
arcaico, segundo dispõe JOHN GILISSEN 12: “(. . . ) precedentes judic iár ios 
do per íodo se propagavam entre gerações como provérbios e adágios 
( . . . )” . Com o passar dos tempos, os clãs passaram a se organizar em 
grupos maiores de pessoas, e tais grupos, da união de alguns clãs, foram 
denominados de t r ibos. As t r ibos começaram a se mult iplicar 
territorialmente, e a organização das mesmas passou a ser exercida por 
um chefe com poderes “divinos”. 
Seja como for, com a gradual e lenta cr iação das t ribos e a 
t ransformação territoria l das mesmas em pequenos centros urbanos 
(concomitantemente ao surgimento da escr it a e, pr incipalmente, da 
moeda metálica) , surge a necessidade de adequação de regras de conduta 
ao aparecimento de uma sociedade que começa a se organizar. 
Daí o aparecimento do direito ant igo , em que o dire ito passou a 
ganhar conceitos, tendo em vista a complexidade da nova vida que se 
organizava. Portanto, é nesse contexto histór ico que surge a pr imeira 
codificação conhec ida da histór ia da humanidade: a codificação de 
Hamurabi da Babilônia. Imper ioso fr isar que, no que tange à legis lação 
codificada, de cunho escr ito , a mesma cont inuou vinculada à religião, 
como, por exemplo, os dez mandamentos apregoados por Moisés. 
 
10 GILISSEN, John . Introdução histórica ao di reito . Tradução de A. M. Bot elho 
Hespanha e I . M. Macaísta Malheiros. Lisboa: Calouste Gul benkian, 1 995, p.34. 
11 Idem, ibidem , p .36. 
12 Idem, ibidem , p .36. 
 14 
Na Grécia Ant iga, todavia, conforme dispõe CHRISTOPHER 
CAREY 13, as pr imordia is leis escr itas são t idas como mecanismos de 
aperfeiçoamento da just iça e da imposição de limit es ao exercíc io do 
poder. No ano de 620 a.C., Drácon estabeleceu a pr imeira codificação 
legal grega, sendo tal codificação extremamente severa e despót ica. E m 
594 a.C., Só lon fez uma verdadeira reforma legis lat iva nas leis impostas 
por Drácon. Fo i neste per íodo que surgiu a chamada po liteia, que, na 
realidade, era um conjunto de leis que estabe lecia regras de conduta 
tanto para os negócios de caráter público quanto para os negócios de 
caráter pr ivado. A po liteia fo i a pr imeira Const ituição não codificada da 
humanidade
14
. Sob esse pr isma, assevera ÁLVARO RICARDO DE 
SOUZA CRUZ 15: 
Poli teia era , pois, a ordem fundamental da comunidade, 
que r egrava as r elações en tre governan tes e governados, bem 
como as r elações en tre os órgãos pol í t icos. Con tudo, a mesma 
não pode ser compreendida sob o hor izon te dos modernos. 
Ela não era propr iamen te um instrumento de garan tia do 
indivíduo con tra o absolut ismo esta ta l . Não era, pois, fruto 
de seu con tra to socia l rousseaun iano. 
Logo, uma autênt ica jur isdição apareceu somente a part ir do 
surgimento de um Estado mais independente, mais desvinculado dos 
valores de cunho rel igioso e, nit idamente, mais acentuado nas regras de 
controle social. O surgimento desse Estado, editor de normas de conduta 
e de sanções àqueles que descumpra m tais normas, t raz em seu bo jo a 
vedação da autotutela 16. O Estado, ao vedar a chamada “just iça pe las 
próprias mãos”, assumiu para si o monopólio da jur isdição, obr igando -
 
13
 CAREY, Christopher . Trials from classical Athens . Londres: Rout ledge, 1997, 
p.2-3. 
14 MARCELO ANDRADE CATTONI DE OLIVEIRA, ao fazer r eflexões acerca da 
pol i teia , depreende que: “Um outro t ermo para et icidade pol í t ica , no sen t ido aqui 
ut i l izado, ser ia pol i teia , en tão, const i tut ivo, de onde provém o termo const i tuição 
pol í t ica . A const i tuição pol í t ica é o con jun to de t r adições cul tura is, um emaranhado 
de concepções r el igiosas, et c. , não diferenciadas, própr ias de uma forma de vida que 
const i tui , que consubstancia e se substancia na iden t idade da pol is, fazendo com que 
uma dada pol is seja di feren te de todas as out ras” (OLIVEIRA, Marcel o Andrade 
Catton i de. Direito Processual Consti tucional . Belo Hor izon te: Mandamentos, 
2001, p.69). 
15 CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. Jurisdição Consti tuci onal Democrática . Bel o 
Hor izon te: Del Rey, 2004, p.33. 
16 Elucida PONTES DE MIRANDA: “( . . . ) o Estado reconhece a pretensão à tutela 
jur ídica , com que, passando a si o fazer just iça , subst i tuiu o an t igo dir ei to de se 
fazer just iça com as própr ias mãos ( . . . )” (PONTES DE MIRANDA, Francisco 
Cavalcan t i. Sistema de Ciência Posit iva do Di reito . 2 .ed. Ri o de Janeiro: Borsoi , 
1972, t. II , p.301). 
 15 
se, então, a so lucionar, de forma adequada, os conflitos de int eresses que 
inevitavelmente nascem da convivênc ia humana, da vida em sociedade. 
Em decorrência disso, emerge o acesso à just iça, insculpido no seleto ro l 
dos direitos fundamentais do cidadão , servindo - lhe, inclusive, de 
proteção cont ra os abusos do próprio Estado. 
Sob essa ópt ica, no Brasil, a atual previsão normat iva do acesso à 
just iça e à prestação jur isdic ional está con sagrada no disposto no inciso 
XXXV do art. 5º da Const ituição Federal, que dispõe que “a lei não 
excluirá da apreciação do Poder Judiciár io lesão ou ameaça a direito”. 
Seguindo essa linha de raciocínio, destaca mos que DARCI GUIMARÃES 
RIBEIRO 17 vem, acertadamente, tecendo constataçõesacerca do 
monopó lio da jur isdição. Para DARCI RIBEIRO, cabe ao Estado a 
prerrogat iva de so lucionar os conflitos de interesses, vedando, assim, 
qualquer espécie de just iça part icular ; logo, cabe ao Estado administ rar a 
just iça e deter o monopó lio da jur isd ição 18. Portanto, o monopólio da 
jur isdição é o resultado natural da formação do Estado . O monopó lio da 
jur isdição tem o condão de cr iar, para o próprio Estado, o dever de 
prestar a tutela jur isdicional apropr iada à pretensão proc essual que a 
parte traz a juízo 19. A bem da verdade, o monopólio da jur isdição decorre 
da soberania 20 do Estado , e o acesso à just iça decorre do monopó lio da 
jur isdição. 
 
17 RIBEIRO, Darci Guimarães. Provas Atí picas . Por to Alegre: Livrar ia do 
Advogado, 1998, p.19. 
18 Afi rma DARCI GUIMARÃES RIBEI RO que: “Es el Estado quien administr a la 
just icia e deten ta el monopol i o de la jur isdicci ón , o com o prefere denominar 
BORDIE U el ‘monopol io de la vi olencia simból ica leg i t ima’, r azón por la cual los 
mandatos ut i l izados por él para dir imir los confl ict os se r eal izan a través de la 
jur isdicci ón” (RIBEIRO, Darci Guimarães. La pretensión pr ocesal y la tutela 
judicial efectiva – Hacia una teor ía procesal del derecho. Barcelona: J.M. Bosch , 
2004, p.75). 
19 RIBEIRO, Darci Guimarães. La pretensión procesal y la tutela judicial efectiva 
– Hacia una teor ía procesal del derecho. Barcelona: J.M. Bosch , 2004, p.76 -77. 
20 O concei t o de soberan ia vem evoluindo a t r avés dos t empos. Segundo evidencia 
SIMONE GOYARD-FABRE (GOYARD-FABRE, Simone. Os princípios f i losófic os 
do direito pol í t ico moderno . Tradução de Ir ene A. Paternot . São Paul o: Mar t ins 
Fon tes, 1999, p.121), BODIN, ao estudar a soberania , bal iza suas convicções a par t ir 
da noção romana de imperium . Assim, na obra Methodus , BODIN apresen ta sua 
pr imeira concepçã o de soberan ia ao discor rer sobre o t ema ao l ongo do capí tulo VI, 
en tendendo a soberan ia pol í t ica com o caracter íst ica da ordem jur ídica temporal . Em 
1576, JEAN BODIN, na obra Os Seis Livros da Repúbl ica , a fere que a soberan ia é 
um poder perpétuo que possui duas l imitações: a lei divina e a lei natural . A 
soberania é, para o autor , absoluta den tro dos l i mites estabel ecidos por essas leis (a 
 16 
 
lei divina e a lei natural ) . Para explanar melhor o pensamento de BODIN quan to à 
idéia de soberan ia absoluta , SIMONE GOYARD -FABRE ( Ibidem , p .131) par te de 
uma metáfora de BODIN rela tada no l ivro Os Seis Livros da Repúbl ica , sobre a 
Nave-Repúbl ica . Em ta l metáfora , parte BODIN da idéia de que, na ve rdade, a Nave- 
Repúbl ica ser ia uma “nau” e que cada pedaço de madeira que compunha essa nau 
ser ia um membro da soci edade. Já o todo da “nau”, para não naufragar, depender ia 
de um t imoneiro chamado Estado, r epresen tado pela figura do príncipe, ún ico senhor 
a bordo da Nave-Repúbl i ca abaixo de Deus. Pois bem, a t ravessando da idéia 
metafór ica para a defin ição propr iamen te di ta , BODIN, en tão, caracter iza a 
soberania como a pot ência absoluta e perpétua de uma Repúbl ica e que “os pr íncipes 
soberanos são esta beleci dos por Deus como seus lugares -tenen tes para comandar os 
outros hom ens. ( . . . ) Por conseguin te, aquele que r ecebe de Deus a potência soberana 
é também, de Deus, a imagem na terra” (GOYARD -FABRE, Simone. Ibidem , p.138-
139). Logo, BODIN caracter iza a soberan i a com o a potência de comando perpétua de 
uma Repúbl ica . Dado o exposto, percebemos que a idéia de poder absolut o de 
BODIN está l igada à sua crença na necessidade de concen trar o poder tota lmen te nas 
mãos do governan te; o poder soberano só exist e quando o p ovo se despoja de seu 
poder soberano e o t r ansfere in tei ramente ao governan te. Para esse autor , o poder 
confer ido ao soberano é o r efl exo do poder divino, e, assim, os súdi t os devem 
obediência ao seu soberano. Depois de BODIN, foi a vez de T HOMAS HOBBE S 
(1588-1679) teor izar acerca do concei t o de soberania . Para HOBBES, a soberan ia é 
absoluta , uma vez que houve t ota l t ransferência dos poderes dos súdi tos para o 
soberano, sendo ta l soberania il imitada e i rr evogá vel . ROUSSEAU, por seu turno, 
t raz à bai la a dou tr ina da soberan ia popular , que é a soma das dist in tas fr ações de 
soberania , que per tencem como atr ibuto a cada indivíduo, o qual , membro da 
comunidade esta ta l e deten tor dessa parcela do poder soberano fr agmentado, 
part icipa a t ivamente na escolha dos gove rnantes. Essa doutr ina funda o process o 
democrát ico sobre a igualdade pol í t ica dos cidadãos e o su frágio un iver sal , 
conseqüência necessár ia a que chega ROUSSEAU (ROUSSEAU, Jean Jaques. D u 
contrat social . Par is: Garn ier , 1954) quando afi rma que se o Estado for compost o de 
dez cidadãos, cada um deles terá a décima milésima par te da autor idade soberana. 
Aduz DUGUIT que se a soberan ia é uma força suprema, incon testável , só pode ter 
sido cr iada por uma força supraterrest r e, ou seja , Deus; o que pr ivi legia a 
on ipotência do Estado e faci l i ta - lhe o a buso de poder . Por outro lado, r efere 
DUGUIT que se a soberania vem do povo, nada prova que a von tade col et iva 
naturalmen te possa se sobrepor à individual; que a von tade colet iva valha mais que a 
individual e possa , legi t imamente, se sobrepor , já que, mesmo sendo colet i va , 
con t inua sendo von tade humana e não está demonstrado que uma von tade humana 
possa se impor sobre outra . Nessa l inha de raciocín io lógico, con t inua o autor 
dizendo que esse poder de comandar , r econhecido a um grupo major i tár io, pode ser 
uma necessidade de fa to, mas não um poder legí t imo (DUGUIT, Leon . Traité de 
Droit Consti tuti onnel . 3 .ed. Bordeaux: J. Bi ère, 1927, v.1, p.551 -592). Por fim, 
afi rma DUGUIT, a inda, que a soberan ia decor re da noçã o de serviço públ i co, ou 
se ja , a força e a moral do Estado decor rem da existência de a t ividades cu ja 
manutenção é considerada obr igatór ia para os governos. Para DUGUIT, já que o 
Estado pode formular e subst i tui r o Direi to, quando e com o bem en tender , ele – 
Estado – não é verdadeiramen te l imitado pelo Di rei to, e a teor ia da autol imitação, de 
Jel l inek, é um simples jogo de palavras, porque um dever que se cr ia a si mesmo e 
do qual se pode fugir quando e como se achar conven ien te não é um dever de 
verdade. Destar te, em qu e pese esses clássicos concei t os de soberan ia, afer imos que, 
hodiernamente, o concei t o clássi co de soberan ia não tem conseguido cor responder às 
exigências da a tual idade e, pr incipalmen te, da global ização, poi s mudanças vêm 
ocor rendo no que tange às caracte r íst icas da soberan ia no mundo fá t ico. Nessa es fera 
de pensamento, aduzimos que uma das mudanças que se pode observar diz r espei t o 
aos l imites da soberan ia: r efutamos o caráter il imitado da soberania . Atualmen te, 
en tendemos que a soberan ia apresen ta dois a spectos: o in terno e o externo. O 
pr imeiro r eflet e a von tade soberana do Estado, quer dizer, a von tade que predomina 
sobre a von tade dos indivíduos e grupos socia is existen tes em seu t er r itór io. O 
segundo aspect o, por sua vez, r efere -se à von tade independen te do Estado, ou se ja , a 
 17 
JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS BEDAQUE 21 afiança que o acesso 
à just iça é acesso à ordem jur ídica justa, em que é proporcionado a 
todos, sem qualquer discr iminação ou rest r ição, o direito de ple itear a 
tutela jur isdicional do Estado. 
No direito brasileiro, a at ividade jur isdicional compete ao Poder 
Judiciár io. A jur isdição é at ividade estatal , consoante bem esclarece 
ARAKEN DE ASSIS 22: 
Ao proi bir os cidadãos de r esolverem por si suas 
con tendas, o Estado avocou o poder de r esol ver os confl i tos 
de in teresses, ineren tes à vida socia l , e, cor rela tamente, 
adquir iu o dever de prestar cer to serviço públ ico, que é a 
jur isdição. Aos in teressados nessa a t ividade, o Estado 
reconhece o dir ei to de provocá -la , preven t iva ou 
repressivamente (ar t . 5º , XXXV, da CF/88). 
Mas, qual o significado da jur isdição? O que é, em últ ima análise, 
jur isdição? O brocado jur isdição vem do lat im jurisdictio e revela a ação 
de administ rar just iça. Juiz é quem diz o direito , na condição de órgão do 
Estado. Ao dizer o direito , o juiz emite um “parecer” ou uma “opinião” , 
com eficácia imperat iva. A jur isd ição 23 se apresenta, assim, como 
inseparável do “ imperium” , t rata-se, portanto, de um poder do Estado. 
JOSÉ MARIA ROSA TESHEINER 24, com propriedade, afirma que 
“vár ias têm sido as tentat ivas de conceituar a jur isdição. Nenhuma é 
imune à cr ít ica”. Veja mos, então, breve modo, a seguir, alguma s destas 
teorias. Segundo GIUSEPPE CHIOVENDA, a jur isdição é a função 
estatal que tem por fina lidade a atuação da vontade concreta da le i 
at ravés da subst ituição (pela at ividade de órgãos públicos) da at ividade 
 
von tade que não permite que o Estado se subordine, tota l ou parcia lmen te, à von tade 
de outros Estados. Na prát ica , observamos que o Estado não possui von tade 
inquest ionável e i l imitada para se r elaci onar com outros países; tampouc o tem o 
poder de decidir o que quiser com relação à sua populaçã o. Concluímos, por fim, que 
a soberania muda conforme as formas de organ ização do poder e, hoje, quem tem o 
poder é quem tem o poder econômico. Em suma: a soberan ia do Estado não é 
i l imitada e tampouco é o Estado completamen te independen te. 
21 BEDAQUE, José Rober to dos San tos. Garant ia da ampli tude de produção 
probatór ia . In: TUCCI, José Rogér io Cruz e ( coord. ) . Garantias Consti tucionai s d o 
Processo Ci vi l . São Paulo: Revista dos Tr ibunais, 1999, p.158. 
22 ASSIS, Araken de. Garan t ia de acesso à jus t iça: benefí ci o da gratuidade. In: 
TUCCI, José Rogér io Cruz e ( coord. ) . Garantias Consti tucionais do Pr ocess o 
Civi l . São Paulo: Revista dos Tr ibunais, 1999, p.9. 
23 PONTES DE MIRANDA, Francisco Ca valcan ti . Comentários ao Código de 
Processo Ci vi l . Rio de Janeiro: Forense, 1973, t .I , p.104. 
24 TESHEINE R, José Mar ia Rosa. Elementos para uma teoria geral do processo . 
São Paulo: Saraiva , 1993, p.62. 
 18 
de part icu lares ou de outros órgãos públicos 25. A jur isdição é uma 
at ividade secundár ia, porque atua a vontade da le i, sendo at ividade 
pr imár ia a legis lação 26. 
Opondo-se a essa concepção, assevera OVÍDIO ARAÚJO 
BAPTISTA DA SILVA 27: 
A objeçã o a ser fei ta à cél ebre doutr ina ch iovendiana 
sobre a jur isdição, está em que o eminen te processual ista 
i ta l iano, sob a in fluência a inda das idéias jur ídico - fi losófica s 
predominantes no sécul o XIX, concebia como coisa s 
separadas e a té, em cer to sen t ido, an tagônicas a função de 
legislar e a função de apl icar a lei . 
Além da objeção formulada por OVÍDIO, cumpre evidenciar que 
a teoria de CHIOVENDA encontra, também, óbices de cunho prát ico, 
segundo pondera o eminente processualista GALENO LACERDA, 
salientando que, nas at ividades que dizem respeito à própr ia at ividade do 
juiz (ao se pronunciar, por exemplo, sobre a própr ia competência ou 
suspeição), não há qualquer t raço de subst itut ividade 28. Sobre esse 
assunto, mister t razer lição de ARAKEN DE ASSIS 29: 
O fat o de o processo, geralmen te, r estaurar valores que 
os par t iculares – ou a Admin istração – desrespei taram, sub-
rogando-se, por tan to, àquela conduta, induziu conclusã o 
er rônea, considerando “subst i tut iva” a a t ividade jur isdicional . 
Ora, ao apl icar as r egras de competência , por exemplo, a 
n inguém o juiz subst i tui r á , à medida q ue ta is normas a ele, e 
não às par tes, se dest inam. Descobre -se, a í , a cogn ição sobr e 
o própr io processo. 
Noutro diapasão, PIERO CALAMANDREI 30 apontou a coisa 
julgada como sendo a “pedra de toque” da at ividade jur isdic ional, sendo 
duas as caracter íst icas pr incipais da jur isdição: a subst itut ividade 
 
25 CHIOVENDA, Giuseppe. Insti tuiç ões de Direito Pr ocessual Ci vi l . 2 .ed. São 
Paulo: Saraiva , 1965, t . II, p.12. 
26 Afirma CHIOVENDA: “( . . . ) o juiz age a tuando a lei ; a admin istr ação age em 
conformidade com a lei ; o juiz considera a lei em si mesma; o admin istr ador 
considera -a com o norma de sua própr ia conduta . E a inda, a a dminist ração é uma 
at ividade pr imár ia ou or iginár ia ; a Jurisdição é uma at ividade secundár ia ou 
coordenada” ( Idem, ibidem , p.12). 
27 SILVA, Ovídi o Araújo Bapt ista da . Curso de Processo Civi l . 2 .ed. Por to Alegre: 
SAFE, 1991. v. I , p.21. 
28 LACE RDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Ci vi l . Ri o de Janeiro: 
Forense, 1980. v. III , t . I, p.22. 
29 ASSIS, Araken de. Cumulação de Ações . 4 .ed. São Paulo: Revista dos Tr ibunais, 
2002, p.52. 
30 CALAMANDREI, Piero. Límites en tre jur isdicci ón y admin istr ación en la 
sen tencia civi l . In: Estudi os de derecho pr oc esal c ivi l . Buenos Aires: Edi tor ia l 
Bi bl iográfica Argen t ina, 1961, p.48. 
 19 
( jur isdição como at ividade de subst ituição) e a declarat ividade 
( jur isdição é uma at ividade essencia lmente declarat iva) 31. 
Posteriormente, ENRICO ALLORIO, ao formular sua teoria 
acerca da natureza jur isdicional do Estado, part iu da idéia (de matr iz 
kelseniana) de que as diversas at ividades estatais não se diferenciam por 
seus fins, mas, sim, pelas suas formas e efeitos. Com essa premissa, 
ALLORIO concluiu que a co isa julgada caracter iza a jur isd ição por se 
t ratar de efeito que decorre da sentença , e somente da sentença, jamais 
de ato administ rat ivo 32. Um dos adeptos dessa concepção é EDUARDO J. 
COUTURE. Assevera COUTURE que “o objeto própr io da jur isdição é a 
co isa julgada”, que const itui a “pedra de toque” do ato ju r isdicional 33. 
Mas não há co isa julgada nos processos de execução, assim como nos 
cautelares. Trata-se, contudo, de at ividade est r itamente jur isdic ional, 
observando TESHEINER que: “(. . .) uma teoria processual nada ganha 
com essa redução conceitual, que exclu i de seu âmbito não apenas os 
atos judic iais execut ivos e cautelares, mas , dentro do mesmo processo de 
conhecimento, os atos de inst rução e as sentenças meramente 
processuais.” 
FrancescoCARNELUTTI 34, por seu turno, inic ialmente, definiu 
jur isdição como at ividade estatal dir igida a so lucionar uma lide, 
entendida como conflito de interesses qualificado por uma pretensão 
resist ida. Excluía do conceito a execução: 
( . . . ) Não me preocupa que no t r anscurso da h istór ia e 
inclusive na lei a tual a palavra “jur isdição” se ut i l ize fora dos 
l imites de seu sign ificado natural , para indicar qualquer 
função processual . Tal uso se deve à preponderância que teve 
o processo jur isdici onal na len ta elaboração do pensamento 
acerca dos fenômenos processuais. O processo execut ivo e , 
em geral , os outros t ipos de processo permaneceram até on tem 
na sombra, e desse modo a noçã o de jur isdição absorveu 
integralmen te a noção de processo. 
 
31 CALAMANDREI, Piero. Límites en tre jur isdicci ón y admin istr ación en la 
sen tencia civi l . In: Estudi os de derecho pr oc esal c ivi l . Buenos Aires: Edi tor ia l 
Bi bl iográfica Argen t ina, 1961, p.48. 
32 ENRICO ALLORIO (Ensayo Polémico sobre la “Jur isdicci ón Volun taria”. In: 
Problemas de Derecho . Buenos Aires: Ejea , 1963, t. II , p.15): “.. . o sea de la 
jur isdicci ón de declaración de cer teza , in separable de la presencia del efect o 
declara t ivo, que iden t i fico con la cosa juzgada . . .” . 
33 COUTURE, Eduardo J. Fundamentos del der echo pr ocesal c ivi l . 2 .ed. Buenos 
Aires: Depalma, 1981, p.42 -43. 
34 CARNELUTTI, Francesco. Siste ma de direito processual c ivi l . Tradução de 
Hil tomar Mar t ins Oliveira . São Paulo: Classic Book, 2000, v. I , p.222. 
 20 
JOSÉ FREDERICO MARQUES 35 assevera que “a at ividade 
jur isdicional pressupõe, sempre, uma situação conten ciosa anter ior”, ou 
seja, para exist ir processo jur isdicional é mister que haja pretensão 
anter ior resist ida. Ainda, OVÍDIO 36 afirma que “o vício da doutrina 
carnelut t iana reside “(. . .) em procurar definir o ato jur isdiciona l 
indicando não o que ele é, mas aquilo a que ele serve; não o seu ser, mas 
a sua função, ou a sua fina lidade”. E mais: conceituando-se a 
contencios idade como ato jur isdicional, não há como explicar a 
jur isdicionalidade dos atos de jur isdição vo luntár ia e dos atos 
execut ivos. 
Entretanto, revisando seu posicionamento, CARNELUTTI veio a 
ampliar o conceito de lide, para inc luir não só pretensões negadas ou 
resist idas, mas também pretensões não negadas, com o que se reconheceu 
o caráter jur isd icional da execução. 
Estatalidade e imparcia lidad e são as caracter íst icas da jur isdição, 
consoante a teor ia formulada por OVÍDIO 37: 
a) o a to jur isdicional é pra t icado pela autor idade esta ta l , 
no caso pel o juiz , que o r eal iza por dever de função, o juiz a o 
apl icar a lei ao caso concreto prat ica essa a t ivid ade com o 
final idade especí fica de seu agir , ao passo que o 
admin istr ador deve desenvol ver a a t ividade especí fica de sua 
função t endo a lei por l imite de sua ação, cu jo objet i vo não é 
a apl icação simplesmente da lei ao caso concreto, mas a 
r eal ização do bem comum, segundo o dir ei to objet i vo; b) o 
outro componen te essencia l do a to jur isdicional é a condiçã o 
de terceiro imparcia l em que se encon tra o juiz com relaçã o 
ao in teresse sobre o qual r ecai a sua a tividade. Ao real izar o 
a to jur isdicional , o juiz man tém-se numa posi ção d e 
independência e est r aneidade rela t ivamente ao interesse. 
A tese da imparc ialidade destaca a circunstância de que a 
jur isdição envo lve heteroregulação, visando a estabelecer “regu lação de 
relações est ranhas ao julgador; não de relações de que seja parte” , 
consoante aduz TESHEINER 38. 
 
35 MARQUE S, José Freder ico. Insti tuiç ões de direito processual c ivi l . 3 .ed. Rio de 
Janeiro: Forense, 1967, p.261. 
36 SILVA, Ovídio Araújo Bapt ista da . Curso de Processo Ci vi l . 7.ed. Ri o de Janeiro: 
Forense, 2006, p.24. 
37 Idem, ibidem, p .24. 
38 TESHEINE R, José Mar ia Rosa. Elementos para uma teoria geral do processo . 
São Paulo: Saraiva , 1993, p.71. 
 21 
Para SCHÖNKE 39: “Jur isdicción es el derecho y el deber al 
ejercicio de la función de just icia, y jur isdicción civil significa, en 
consecuencia, el derecho e el deber de juzgar en asuntos civiles” . Para 
ARAKEN DE ASSIS 40: “O poder do Estado dest inado a eliminar o 
conflito se chama jur isdição”. 
Destarte, aqui defendemos o ponto de vis ta de que jur isdição é o 
poder do Estado em aplicar e apropr iar regras de direito objet ivo a uma 
pretensão regularmente deduzida; jur isdição é o poder do Estado de dizer 
o direito . Logo, por todo o exposto , refutamos a teor ia de CHIOVENDA, 
uma vez que a mesma encontra empecilhos de caráter prát ico, eis que nas 
at ividades inerentes à prestação jur isdicional (at ividades es sas que dizem 
respeito à competência e à suspe ição) inexiste qualquer possibilidade de 
ocorrer a subst itut ividade. No que tange à teoria defendida por 
ALLORIO, ressaltamos que, em níve l processua l, a mesma padece de 
robustez, dada a exclusão de objet ividade e a sua limit a ção prát ica. 
Relat ivamente à teoria patrocinada por CARNELUTTI, aduzimos que a 
idéia de lide não tem o condão de conceituar a jur isdição , e, sim, 
somente de caracter izá- la como tal. Concernentemente à teor ia 
acastelada por OVÍDIO ARAÚJO BAPTISTA DA SILVA, entendemos 
que a mesma é de fácil argumentação contrár ia , dada a débil atenção à 
questão da jur isdição penal. 
Pois bem, teorias doutrinár ias (acerca do conceito de jur isdição) à 
parte, o importante é ressalt ar que é da garant ia do acesso à just iça, da 
garant ia ao acesso à jur isdição prevista no inciso XXXV do art igo 5º da 
Const ituição Federal, que advém o direito fundamental à efet ividade 
processual. Segundo CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO 41, tem-se no 
disposit ivo em comento o “pr incíp io-síntese e objet ivo final” do acesso à 
just iça. Já, conforme acentua CÍNTIA TERESINHA BURHALDE MUA 42: 
 
39 SCHÖNKE, Adol fo. Derecho Procesal Civi l . Barcelona: Bosch , 1950, p.49. 
40 ASSIS, Araken de. Cumulação de Ações . 4 .ed. São Paulo: Revista dos Tr ibunais, 
2002, p.52. 
41 DINAMARCO, Cândido Rangel . Insti tuições de Direito Processual Ci vi l . 5 .ed. 
r ev. e a tual. , São Paulo: Malheiros, 2005, v. I , p.134 e 267. 
42 MUA, Cín t ia Teresinha Burhalde. Acesso material à jurisdição: da legit imidade 
ministerial na defesa dos indi viduais homogêneos . 2006. Disser tação (Mestrado) – 
PUCRS, p.12. 
 22 
“Ontológica e finalist icamente, o acesso universal à just iça visa à 
produção de resultados individual e socialmente justos ”. 
A tutela jur isdicional deve ser prestada dentro de um pra zo 
razoável, como determina do pela Emenda Const ituciona l nº 45/2004, 
com a introdução do inciso LXXVIII ao art igo 5º da Const ituição 
Federal 43. A so lução do processo em prazo razoável é o que se busca 
encontrar : um ponto de equilíbr io entre os ideais de segurança e 
celer idade 44. No Brasil, o pr incípio da razoável duração do processo fo i 
inser ido por força da Emenda Const itucional nº 45 e fo i elevado à 
garant ia const itucional em que pese tal pr incípio estar consubstanciado 
no nosso sistema jur ídico desde 1973, no próprio Código de Processo 
Civil, mais precisamente no inciso II doart igo 125 45. 
Seja como for, o direito à prestação jur isdicional tempest iva 46 e 
célere não pode ser visto apenas como um direito a uma prestação fát ica. 
O direito à tutela jur isdic ional tempest iva e célere exige a técnica 
processual adequada, a inst ituição de um procedimento capaz de 
viabilizar a part icipação e, por fim, a própria resposta jur isdic ional. 
Logo, vê-se que o direito à tutela jur isdicional tempest iva e cé lere 
pressupõe a consideração dos direitos de part icipação e de edição de 
técnicas processuais adequadas e idôneas e, também, pressupõe a 
obtenção de uma prestação por parte do Estado- juiz. O dever de 
prestação que se consubstancia em dever de proteção por parte do 
Estado-juiz 47 se mater ializa no momento em que há a pro lação da decisão 
 
43
 Ar t. 5º . ( . . . ) LXXVIII – a todos, no âmbito judi cia l e administ ra t ivo, são 
assegurados a r azoável duração do processo e os meio s que garantam a celer idade de 
sua tr amitação. 
44 ZANFERDINI, Flávia de Almeida Montingel l i . Prazo Razoá vel – Direi to à 
Prestação Jur isdicional sem Dilações Indevidas. Revista Síntese de Direito Civi l e 
Processual Civi l , n .22, pp.14-29, mar . -abr. 2003. 
45Art . 125. O juiz di r igir á o processo conforme as disposi ções dest e Código, 
compet indo-lhe: ( . . . ) II – velar pela r ápida solução do l i t ígio. 
46 Ensina DIEGO FERNANDES ESTEVEZ que “a duração razoável do processo 
apresen ta dupla face: a duração oferecida pel o Est ado e a duração a ser r ecebida pel o 
jur isdicionado” (ESTEVEZ, Diego Fernandes. Duração razoável do pr ocesso e 
recursos extraordinári os . Dispon ível em: <ht tp/www.tex.pro. br >. Acesso em: 20 
set . 2006). 
47 Já diz ia HANS KELSEN: “A função denominada jurisdição é mui to mais 
const i tut iva , cr iadora de dir ei to, na verdadeira acepção da palavra . Pois exist e uma 
si tuação de fa to concreta , l igada a uma específi ca conseqüência jur ídica , e t oda essa 
r elação é cr iada pela sen tença judicia l . Assim, com o ambas as si tuações de fa to sã o 
l igadas nas r elações do geral pela lei , assim deverão estar unidas, na r elação do 
 23 
judic ial a respeito dos direitos fundamentais. Portanto, o direito à tutela 
jur isdicional célere, tempest iva e efet iva (sem perder sua caracter íst ica 
de direito de iguais oportunidades de acesso à just iça a todos os sujeitos 
do processo) é direito fundamental previsto na Carta Magna Brasile ira 48. 
De outra banda, calha refer ir que a morosidade da prestação 
jur isdicional se contrapõe à efet ividade pretendida pela parte na so lução 
do conflito de interesses. A demora dos ritos processuais, ao lado da 
t ramit ação delongada dos fe itos, acaba por conduzir as partes à 
autocomposição extrajudicia l, à renúncia ou até mesmo à desistência da 
pretensão resist ida. Portanto, se por um lado, com es sas t rês situações 
elencadas, tem-se o desafogamento do Poder Judiciár io, por outro lado 
tem-se a insat isfação das partes envo lvidas no conflito de interesses ante 
a demora da so lução da lide. Entrementes, não há como so lucionar a 
mazela da de longa dos processo s ut ilizando-se de mecanismos puer is , 
como as reformas processuais. Nesse sent ido, a lição de ARAKEN DE 
ASSIS 49 é permeada de lucidez: “O pr incipal malefíc io de pretender a 
erradicação do problema da demora por intermédio das reformas 
processuais consiste em eleger so lução simplista e rumo equivocado ” . A 
so lução não está somente em fazer “refo rmas processuais” que almeje m 
maior celer idade nos processos. Entende -se que a so lução talvez esteja 
em melhor aparelhamento do Poder Judiciár io: contratação de 
func ionár ios melhor qualificados; maior número de computadores para os 
serventuár ios da just iça ; intensificação de concursos públicos ; ampliação 
do número de varas judicia is, etc. 
A morosidade jur isdicional prejudica tanto autor quanto réu, não 
vingando, portanto, as teses de MARINONI 50, para quem “o dano que é 
imposto àquele que reivindica o bem e o benefício que é gerado à parte 
 
individual , pela sen tença individual” (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito . 
3 .ed. Tradução de J. Cretel la Jr e Agnes Cretel la . São Paulo: Revista dos Tr ibunais, 
2003, p.106). 
48 ASSIS, Araken de. Duração razoável do processo e r eformas da lei processual 
civi l . In: FUX, Luiz; NERY JÚNIOR, Nelson ; WAMBIER, Teresa Ar ruda Alvim. 
Processo e Consti tuição – Estudos e m H omenagem ao Pr ofessor José Carlos 
Barbosa Moreira . São Paulo: Revi sta dos Tr ibunais, 2006, p.195. 
49 Idem, ibidem, p .197. 
50 MARINONI, Luís Gui lherme. Tutela Antecipatória e Julgamento Antecipado . 
Parte incontroversa da de manda . 5 .ed. Sã o Paulo: Revista dos Tr ibunais, 2002, 
p.226. 
 24 
que o mantém indevidamente no seu patrimônio são proporcionais à 
demora da just iça” , e de ATHOS CARNEIRO 51, para quem: “O decorrer 
do tempo, destart e, imp lica ônus, uma possibilidade (probabilidade, não 
raro a certeza) de preju ízo ao demandante, que postula a alteração do 
status quo”. Ora, a demora processual prejudica o autor que não vê sua 
pretensão sat isfeita, mas também “beneficia o autor que não tem razão” 52 
e que ins iste em demandar. Por outro lado, a demora do poder judiciár io 
também prejudica o réu , que se vê fo rçado a part icipar da relação 
jur ídica processual. Diga-se de passagem, que sobre a morosidade 
jur isdicional, DARCI RIBEIRO 53 já afirmou: 
Quando a par te busca a sa t isfaçã o do seu direi to via 
processo, há um espaço de tempo inel iminável en tre o in ício e 
o fim dessa r eal ização, pois é no processo que os sujei tos 
prat icarão os seus a tos processuais tenden tes a formar 
gradualmen te a convicçã o d o juiz . Esse espaço de tempo é qu e 
é o cerne de minhas preocupações. O tempo que é 
inel iminável , senão dimensionado, dist r ibuído en tre autor e 
r éu, é abominável , por causar in just iças, pois segundo um a 
máxima de Rui Barbosa a just iça tardia cor responde à 
verdadeira denegação de just iça . 
Constata-se, portanto, que a morosidade jur isdicional tem o condão 
de deter iorar a efet ividade processual pretendida por ambas as partes 
constantes da relação jur ídica processual dentro do Estado Democrát ico 
de Direito , po is, como diz ARAKEN DE ASSIS 54, “em qualquer 
circunstânc ia, o processo cont inua dialét ico, mostrando -se inadmissíve l 
comprimi- lo , a ponto de t ransformar a just iça e m a lgo instantâneo e 
automát ico” . Diga-se que a morosidade jur isdicional não é uma 
exclusividade do sistema processual pátr io . Na Argent ina, por exemplo, 
este péssimo fenômeno também acontece. AUGUSTO MÁRIO 
MORELLO 55 refere que: 
 
51 CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação de tutela . Rio de Janeiro: Forense, 
2005, p.3. 
52 ASSIS, Araken de. Duração razoável do processo e r eformas da lei processual 
civi l . In: FUX, Luiz; NERY JÚNIOR, Nelson ; WAMBIER, Teresa Ar ruda Alvim. 
Processo e Consti tuição – Estudos e m H omenagem ao Pr ofessor José Carlos 
Barbosa Moreira . São Paulo: Revi sta dos Tr ibunais, 2006, p.197. 
 
53 RIBEIRO, Darci Guimarães. A instrumental idade do processo e o pr incípio da 
verossimilhança com o decor rência do dueprocess of law. Revista da Ajuri s, n .60, 
p.271, mar . 1994. 
54 Idem, ibidem, p .197. 
55 MORELLO, August o Már io. Anticipación de La Tutela . La Pla ta: Librer ía Editora 
Pla tense, 1996, p.16. 
 25 
[ . . . ] la velocidad de la soci edad, queremos decir , de sus 
problemas, confl ict os, tensiones, si tuaciones subjet iva s 
necesi tadas de tutela jur isdicci onal efect i va , es mucho ma yor 
que las r espuestas que puede ofrecer el t iempo de la just i cia , 
el que consume en cualesquiera de sus desarrol los, tanto e l 
cansino y con con t inuas a largaderas hor izon tales y ver t icales, 
mastodón t ico pr oceso ordinario como el “apretado” proces o 
urgente – por caso – el amparo. El convencimien to de la gen te 
es que la soluci ón deber ía llegar mucho an tes de l o que 
normalmen te (a cuatro o cinco años vi sta) l lega. Que hay una 
disfunci onal fr actura en tre el t iempo y costo que consume el 
l i t igar y la adecuada, opor tuna y út i l prestación en que e l 
servici o r equer ido debía haber se prestado. 
No tópico, MAURO CAPPELLETTI e BRYANT GARTH 56, 
apontam: 
Em muitos países, as par tes que buscam uma soluçã o 
judicia l precisam esperar dois ou t r ês anos, ou mais, por uma 
decisã o exeqüí vel . Os efei tos dessa delonga, especia lmen te se 
considerados os índices de in flaçã o, podem ser devastadores . 
Ela aumenta os cust os para as par tes e pressiona os 
economicamente fr acos a abandonar suas causas, ou a acei tar 
acordos por valores mui to in fer iores àqueles a que ter iam 
direi to. 
Enfim, a razoável duração do processo é necessár ia
 
para que haja 
a maturação da dialét ica ali encontrada: analisa -se s íntese e ant ítese 
t razidas pelo autor e pelo réu. No desenvo lvimento do curso do processo , 
é permit ido o direito de defesa, o contraditório e a oportunidade de 
produção provas, mot ivo pelo qual, obviamente, o processo não pode ser 
reso lvido de imediato e instantaneamente, consoante alhures defendeu 
ARAKEN DE ASSIS 57. 
Por derradeiro, fina lizamos este tópico inicial asseverando que no 
mesmo fo i demonstrada a ínt ima relação entre efet ividade da tutela 
jur isdicional e celer idade processual, aduzindo-se que efet ividade e 
celer idade estão lado a lado e trabalham mutuamente pela mantença da 
ordem social, po is onde há grupo social, inevit avelmente, há d ireito 58. 
 
 
56 CAPPE LLETTI, Mauro; GARTH, Br yan t . Acesso à justiça . Tradução de El len 
Gracie Nor th fleet . Por to Alegre: Sergio Anton io Fabr is, r eimp. 2002, p.20. 
57 Idem, ibidem, p .197. 
58 Ressal ta PONTES DE MIRANDA que: “O direi to brota , est ende -se, en raíza -se, a té 
aos vest ígios, condensando em si probl emas de outras ciências, abr indo en tre os 
povos, com ser a supremacia da socied ade coext ensiva à sua ação, as franças de seus 
in st itutos” (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcan t i . À margem do direito. 
Ensaio de psic ologia jurídica . Campinas: Booksel ler , 2002, p.19). 
 26 
Esclarece PONTES DE MIRANDA 59: “Onde há grupo social, sociedade, 
há Direito: o jur ídico entra no espaço social, porque é processus , e sem 
ele não poder iam exist ir as comunidades, como, sem a interação do 
organismo com o meio, não po deriam persist ir os seres vivos ” . 
 
 
2 – JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL 
 
2.1 Conceito de Jurisdição Constitucional 
 
Jur isdição const itucional é o inst rumento de concreção da Le i 
Fundamental, que tem por fito a realização efet iva do regime 
democrát ico ; o respeito e a aplicação dos direitos fundamentais. No 
tópico, HANS KELSEN 60 entende que “a garant ia const itucional da 
Const ituição – a jur isdição const itucional – é um elemento do sistema de 
medidas técnicas que têm por fim garant ir o exercíc io regular das 
funções estatais” . Enquanto que para LENIO LUIZ STRECK 61, jur isd ição 
const itucional é a base para a existência e para a so lidificação do Estado 
Democrát ico de Direito . 
 
 
2.2 Histórico da Jurisdição Constitucional 
 
Mister salientar que, em Atenas, uma ação cr imina l denominada 
graphé paranomón , que poder ia ser promovida por qualquer cidadão 
maior de 30 anos perante a Assembléia Ateniense, é inegavelmente o 
nascedouro do que ho je entendemos por controle de const itucionalidade. 
 
59 PONTES DE MIRANDA, Francisco Ca valcan t i. Sistema de c iência posit i va do 
direito . 2 .ed. Rio de Janeiro: Borsoi , 1972, t . I, p.158. 
60 KELSEN, Hans. Jurisdição Consti tuci onal . São Paulo: Mar t ins Fon tes, 2003, 
p.123. 
61 “. . . enquanto a Const i tuição é o fundamento de val idade (super ior ) do ordenamento 
e consubstanciadora da pr ópr ia at ividade pol í t ico-esta ta l , a jur isdição const i tucional 
passa a ser a condição de possi bi l idade do Estado Democrát ico de Direi to. Por tan to, 
o sign ificado de Const i tuição depende do processo hermenêut ico que desvendará o 
con teúdo do seu text o. . .” (STRECK. Len io Luiz . Jurisdição Consti tuci onal e 
Hermenêutica . 2 .ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.13 -14). 
 27 
SYLVIO CLEMENTE MOTTA FILHO e WILLIAM DOUGLAS 62 
acentuam que: 
Seguros indícios a testam que no sécul o IV a . C. , em 
Atenas foi in st i tuído o graphé paranomom (argüição de 
const i tucional idade), de forma que todos os cidadãos 
tornavam-se r esponsáveis pela def esa das leis e da 
Const i tuição. 
Pelo exposto até então, percebe-se que a civilização grega fo i a 
grande matr iarca da const ituição e da jur isdição const ituciona l 
democrát ica. Já na civilização romana, não houve a ocorrência de algu m 
inst ituto jur ídico assemelhado ao graphé paranomom grego. Logo, a 
Const ituição era t raduzida mediante decretos prolatados pelo Imperador, 
ressaltando-se que tais decretos não eram discut idos ou contestados 
pelos cidadãos romanos 63. 
De qualquer sorte, Roma preconizou, na histór ia, uma gama de 
operadores jur íd icos vo ltados à pro fissionalização e desenvo ltura do 
direito 64. Com a queda do Impér io Romano do Ocidente, houve a 
incorporação do direito romano ao direito dos povos bárbaros que 
invadiram a Europa. Aliás, no tópico, anota FRANZ WIAKER 65, 
acertadamente: 
O mundo h istór ico da jur isprudência cr iadora e do 
ant igo dir ei to imper ia l já desaparecera antes do início da a l ta 
Idade Média . A ci ência das escolas jur ídicas ( . . . ) perdera -se 
nos ter r i tór ios do impér io do Ociden te mais tardar no sécu l o 
V. 
 
62 MOTTA FILHO, Syl vi o Cl emente da; DOUGLAS, Wil l iam. Contr ole de 
Consti tuci onal idade – uma abordagem teór ica e jur isprudencia l . 3.ed. Ri o de 
Janeiro: Impetus, 2004, p.34. 
63 Explicam SYLVIO MOTTA FILHO e WILLIAM DOUGLAS: “. . . que o Senado 
romano, era , a bem da verdade, o verdadeiro guardião da Const i tuição e das leis, 
zelando pela sua escr i ta obedi ência e prom ovendo a r evogaçã o de disposi t ivos qu e 
inobservassem as r egras esta tuídas pela Const i tuição” ( Ibidem , p .34). 
64 Esclarece ÁLVARO CRUZ que: “Roma desenvol veu um corpo de operadores 
jur ídicos profissi onais como não se t inha visto anter iormen te em qualquer par te do 
mundo. Desenvol veu também o model o acus at ór io, pel o qual o pretor organ izavao 
processo de forma admin istr a tiva , deixando l ivremente às par tes a condução do 
mesmo, inclusive na formulação de a tos probatór ios. Perante o pretor as par tes 
defin iam os l imites da l ide. Em caso de l i t i s contestat io o processo era encaminhado 
para o julgamento por mei o de um iudex ( ju iz) . Construiu, en fim, um edifíci o 
jur ídico que vir ia , mais tarde, servir de base para a grande maior ia dos ordenamentos 
jur ídicos do mundo ociden ta l (CRUZ, Álva ro Ricardo de Souza. Jurisdição 
Consti tuci onal Democrática . Belo Hor izon te: Del Rey, 2004, p.38). 
65 WIACKER, Franz. História de direito privado moderno . Traduzido por A.M. 
Botelho Hespanha. 2. ed. Lisboa: Calouest e Gulbenkian , 1967, p. 25. 
 28 
Assim, após a queda do Impér io Romano do Ocidente e o 
encampamento do direito romano pelos povos bárbaros invasores, 
adentramos na seara do direito moderno. Na Inglaterra, Lord Cook, em 
meados de 1633, começa a fazer opo sição à falt a de limites de poderes 
do Parlamento , t razendo à baila as pr imeiras idéias do que mais tarde se 
t ransformou no movimento do Const itucionalismo. Nos Estados Unidos 
da América, James Ot is, seguindo os ensinamentos de Lord Cook, 
encampa a idéia de limitar os poderes do Parlamento. O advento da 
Const ituição Americana de 1787 preconiza o nascedouro do judicial 
review. Quando da leitura do art igo VI, n 2º, da Const ituição norte-
amer icana, pode aver iguar -se o a seguir disposto: 
Artigo VI, n º 2 – Esta Const ituição, as leis dos Estados 
Unidos di tadas em vir tude dela e todos os t r a tados cel ebrados 
ou que se celebrarem sob a autor idade dos Estados un idos 
const i tuir ão a lei suprema do país; e os juízes em cada Estado 
estarão sujei tos a ela , ficando sem efei t o qualquer disposiçã o 
em con trário na Const i tuição e nas leis de qualquer dos 
Estados. 
Portanto, a Const ituição norte -amer icana preconizou o que a 
jur isprudência daquele país consagrou: o controle de const itucionalidade 
repressivo judicia l. A pr imeira noção de preponderância jur isdic ional, 
at ravés do controle de const itucionalidade difuso e concreto, adveio do 
fundamentado no caso “Marbury v. Madison”, do ano de 1803, ret ratado 
pelo “Chie f Just ice” da Corte Suprema Americana , John Marshall. 
 
 
2.2.1 O normativismo kelseniano e a jurisdição constitucional 
 
A part ir da publicação da obra Teoria Pura do Direito , fo i 
concebida uma visão normat ivista do direito , ou seja, uma visão que 
t inha por especificidade e fundamentação a norma in concreto 66. Segundo 
 
66 Para KELSEN: “A ordem jur ídica de um Est ado é, assim, uma mistura h ierárquica 
de normas legais. Em forma bastan te simpl i ficada, apresen ta o seguin te r etr a to: o 
n ível mais baixo é compost o de normas individuais cr iadas pelos órgãos apl icadores 
do direi to, especia lmen te os t r ibunais. Essas normas individuais são dependen tes dos 
esta tutos, que sã o as normas gerais cr iadas pelo legislador , e das r egras do Direi to 
consuetudinár io, que fornecem o n ível super ior seguin te da ordem jur ídica . Esses 
esta tutos e r egras de dir ei to consuetudinário, por sua vez , dependem da Const i tuição, 
que forma o n ível mais elevado da ordem jur ídica considerada como sist ema de 
 29 
KELSEN 67, a Const ituição é o vért ice extremo de qualquer ordenamento 
jur ídico regrado dentro da democracia, acreditando, ainda, que a 
validade e a eficácia da norma são o corolár io do ordenamento jur ídico : 
( . . . ) Uma anál ise do pensamento jur ídico demonstra que 
os jur istas consideram vál ida uma Const i tuição apenas quando 
a ordem jur ídica nela fundamentada é efi caz . Este é o 
pr incípio da eficá cia . Que uma ordem jur ídica se ja efi caz 
sign ifica que os órgãos e su jei t os dessa ordem de um mod o 
geral , conduzem-se de acordo com as normas da ordem. 
No que tange ao controle de const it ucionalidade das leis, 
KELSEN o entendia como um feit io , uma maneira de proteção e de 
harmonia das funções jur ídicas, mediante inst rumentos que t inham o 
condão de rechaçar vícios de inconst itucio nalidade. KELSEN não 
concebe o controle de const itucionalidade como sendo um procedimento 
disponibilizado ao cidadão para a defesa de direitos fundamentais , e , 
sim, como uma forma de singela proteção da própria função jur ídica para 
que a mesma permaneça incó lume a vícios indesejáveis. Percebemos, 
assim, que KELSEN pr ima pe la int egr idade e pela pureza da ordem 
jur ídica, exclu indo-se da mesma quaisquer formas indesejáveis de 
inconst itucionalidade ou vio lação às regras const itucionais. 
 
 
2.2.2 Habermas e a teo ria discursiva na jurisdição constitucional: 
uma visão crítica 
 
A idéia balizadora da Teor ia Discursiva de Habermas é a 
argumentação racional e esclarecedora. Somente at ravés da adoção da 
argumentação construt iva pode-se part ir para a acessibilidade do 
discurso jur ídico 68. Fundamenta HABERMAS 69 que: 
 
normas posi t ivas” (KELSEN, Hans. O que é just iça? A just iça , o di r ei to e a pol í t ica 
no espelho da ciência . Tradução de Luís Car los Borges. Sã o Paulo: M ar t ins Fon tes, 
2001, p.216). 
67 Idem, ibidem , p .218. 
68 Segundo magistér io de ÁLVARO RICARDO DE SOUZA CRUZ: “A Teor ia 
Discursiva de Ha bermas (1997) procura construir uma fundamentação do Direi to que 
susten te a cor reção decisi onal por meio da ampliação de hor izon tes procedida pela 
Teor ia da Argumentação construída por Alexy (2001). Exatamente por isso, a busca 
de uma decisão cor reta passa pela construção de um ‘ideal de uma norma per fei ta’ e, 
por conseguin te, pel o exame do discur so de fundamentação/ just i fi caçã o d o 
 30 
Argumentos são r azões que r esgatam, sob condições do 
discur so, uma pretensão de val idade levan tada at ravés de a tos 
de fa la consta ta t ivos ou regulat ivos, movendo racionalmente 
os par t icipan tes da argumentação a ace i tar como vál idas 
proposi ções normat ivas ou descr i t ivas. Uma teor ia da 
argumentação que esclarece o papel e a construção de 
argumentos considera o jogo de argumentação sob o aspect o 
do produt o e oferece, no pi or dos casos, um pon to de par t ida 
para uma fundamentação dos passos da argumentação, que 
ul t rapassam uma just i fica ção in terna do direi to. 
A Teor ia Discursiva de Habermas 70 prega que os ju ízos 
normat ivos somente podem ser explicados at ravés de argumentos 
substanc iais: 
A cor reção de juízos normat ivos não pode ser expl icada 
no sen t ido de uma teor ia da verdade como cor respondência , 
pois di r ei tos sã o uma construção socia l que não pode ser 
h ipostasiada em fatos. “Cor reçã o” sign ifica acei tabi l idade 
r acional , apoiada em argumentos. Cer tamen te a val idade de 
um juízo é defin ida a par t ir do preench imen to das cond ições 
de val idade. No en tanto, para saber se estã o preench idas, não 
basta lançar mão de evidências empír icas dir etas ou de fa t os 
dados numa visão ideal : i sso só é possível a t ravés do discur s o 
– ou se ja , pelo caminho de uma fundamentação que se 
desenrola argumentat ivamente (gr i fo do autor ) . 
Portanto, para HABERMAS, a fundamentação das normas 
jur ídicas reside, então, nos argumentos que just ificam mot ivadamente

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