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História, imagem e narrativas 
No 16,  abril/2013 ‐ ISSN 1808‐9895 ‐ http://www.historiaimagem.com.br 
 
1 
 
In Taverna Quando Sumus: 
A taberna medieval como espaço de prazer e poder 
 
 
 
 
Profa. Ms. Luciana de Campos 
GEIEM/UFPB/NEMIS1 
fadacelta@yahoo.com.br 
 
Quando estamos na taberna 
Bebem todos sem lei. 
(Amatoria Potatoria. Lusori 177 – fol. 88b) 
 
 
Resumo: A taberna medieval foi apresentada na literatura – nas canções e poemas dos goliardos, nas Canções de 
Gesta e, também nos Fabliaux – como um espaço de prazer. Esse espaço voltado principalmente para o consumo 
de bebidas – cerveja, vinho e sidra – acompanhada por porções de comidas simples como pães, carnes salgadas e 
sopas, existiu não somente como lugar de prazer e lazer, mas também, foi um local seguro para o descanso de 
comerciantes, viajantes e peregrinos oferecendo pouso, comida, bebida e diversão. Analisando algumas canções 
da obra Amatoria potatoria Lusoria, (século XIII) selecionamos o trecho In Taberna que nos mostra o cotidiano 
de uma taberna medieval. Nosso intuito nesse artigo é analisar a taberna como espaço de prazer e descanso e sua 
representação na literatura medieval e sua reapropriação pela literatura contemporânea. 
 
 
Palavras-Chave: Taberna Medieval – Literatura Medieval – Vinho – Espaço de Prazer Goliardos - Cotidiano. 
 
 
 
 
 
 
 
 
                                                            
1 Mestre em História pela UNESP-Franca/SP, membro do Grupo Interdisciplinar de Estudos Medievais da UFPB 
e coordenadora do Núcleo de Estudos de Mitologias, NEMIS. 
História, imagem e narrativas 
No 16,  abril/2013 ‐ ISSN 1808‐9895 ‐ http://www.historiaimagem.com.br 
 
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I. Introdução. 
 
Nunc est bibendum (Horárico, Odes, 1,37,1) 
 
A taberna medieval sempre foi representada em narrativas literárias medievais, canções 
e filmes, como um espaço reservado para o consumo de bebidas alcoolicas e comidas para 
companhá-las, onde mulheres, - muitas vezes não tão belas como as apresentadas pelo cinema 
– eram as encarregadas de servir a bebida aos sedentos e, em alguns casos, era também um 
lugar seguro para que viajantes e peregirnos pudessem descansar das suas jornadas. A taberna 
sempre foi um espaço reservado ao prazer. Fosse esse o prazer de apreciar uma bebida – um 
caneco de vinho, cerveja ou sidra – para matar a sede ou então embebedar-se e simplesmente 
sentir as dores e as delicias da embriaguez, ou descansar e deleitar-se com palha espalhada no 
chão para repousar o corpo depois de horas de viagem. 
Essa taberna que nos é apresentada tanto pelo cinema como pela televisão nos filmes e 
séries ambientadas tanto na Antiguidade como na Idade Média, geralmente são mostradas 
como lugares escuros, sujos, que não oferecem bebidas de boa qualidade e são frequentadas 
por pessoas que não seria recomendado encontar-se com elas em alguma rua durante a noite. 
Essa imagem da taberna que povoa o nosso imaginário muitas vezes não corresponde às 
descrições que, tanto a literatura como a iconografia medieval nos apresentam desses lugares 
destinados ao prazer de comer, beber, divertir-se e, às vezes descansar e, que, sob o seu teto 
acolhia a nobreza, os comerciantes, os peregirnos e os camponeses. 
 O mundo da taberna para nós, do século XXI que, muitas vezes observamos a Idade 
Média – seja pela televisão, cinema, literatura ou música - como um lugar mítico, onde reina 
absoluta a aventura, onde castelos, batalhas e as tabernas convivem em um conjunto 
harmonioso, e guerreiros e cavaleiros habitam esses espaços dividindo-os com belas mulheres 
que são gentis damas, destemidas guerreiras ou lindas ceifeiras de trigo, é na maioria das 
vezes uma construção mas, que pode nos apresentar determinados aspectos de como esses 
estabelecimentos funcionavam. 
 Os frequentadores das tabernas foram descritos na poesia composta pelos goliardos, 
jovens estudantes que, em plena Idade Média Central, durante a chamada Renascença do 
século XII reuniam-se nos núcleos urbanos que floresciam em torno das Universidades 
nascentes da Europa Central (LOYN, 1990, p.169). Estes jovens universitários medievias 
compunham em latim poesias e canções cuja temática era a celebração da alegria, da vida e, 
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acima de tudo do prazer, fosse ele o sexual, o advindo da apreciação da boa literatura, da boa 
cozinha e, acima de tudo o prazer proporcionado pelo vinho. Os Fabliaux, pequenas fábulas 
satiricas escritas entre os séculos XII e XIV tambem são um bom exemplo do funcionamento 
das tabernas. Os seus frequentadores, as aventuras e infortúnios vividos por estes e, 
principalmente, essas pequenas narrativas nos expoem o que havia de mais baixo no ser 
humano, pois o maior intuito desses textos é fazer rir ao levantar as tunicas das mulheres e 
dos clérigos e, claro vê-los entregar-se às delícias proporcionadas pelo álcool na meia-luz de 
uma taberna. 
 As descrições que encontramos na literatura medieval das tabernas são muitas vezes 
de espaços mal frequentados onde mercenários, prostitutas, ladrões e jogadores compulsivos 
encontram um refúgio seguro e sentem-se entre iguais, é um espaço onde é possível ser 
marginal e deixar que as paixões se aflorem sem o medo da punição. E, é nesse espaço onde a 
literatura de cunho satírico vai explorar a convivencia no mesmo local, entre os clérigos que 
desejam extravasar seus mais secretos sonhos – sejam eles eróticos ou poéticos – como estão 
bem retratados na poesia goliarda, onde a mulher, que vive no recato e na submissão sentem-
se senhora absoluta podendo fazer o que bem entende com quem escolher. A taberna 
constitui-se em um lugar, onde todos são filhos de Baco e todos são iguais perante o vinho, a 
cerveja e sidra a a única lei é entregar-se ao deleite. Mas, é erroneo pensarmos nas tabernas 
medievais apenas como um lugar de prazer e de descanso para aqueles marginalizados, é 
preciso olhar para esse espaço como um local destinado a abrigar também os nobres e 
oferecer-lhes comida, bebida e, quiçá companhia, de excelente qualidade. O nosso imaginário 
está povoado por esta imagem de falta de sofisticação das tabernas, mas é a própria 
iconografia Medieval que vai nos mostrar como esses estabelecimentos podiam também ser 
sofisticados e oferecer aos seus frequentadores as mais finas iguarias acompanhadas pelos 
melhores vinhos. 
 Um outro aspecto relevante para o estudo das tabernas medievais é a questão da 
administração que, em alguns casos era controlada pela própria Igreja que via nesses locais 
uma excelente fonte de rendimentos mesmo conscia que ali seriam cometidos inumeros 
pecados. 
 Conhecer esse espaço dedicado ao prazer de comer, de beber, de descansar e, divertir-
se é o nosso intuito ao longo das páginas que se seguirão. Nossas fontes para essa análise 
serão, além da rica iconografia medieval que nos apresenta como os homens dos séculos XIV 
e XV representavam as suas tabernas e os seus frequentadores, a poesia escrita pelos 
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goliardos, assíduos frequentadores e entusiastas das tabernas fossem elas sofisticadas ou não ; 
as pequenas fábulas medievais que nos revelam aspectos interessantes não só do cotidiano das 
tabernas mas nos fazem rir e refletir acerca do cotidiano dos seus frequentadores. E, além da 
utilização das fontes de época também iremos recorrer à fontes contemporâneas – tanto 
literárias como televisivas e cinematográficas – que nos apresentam as reinterpretações desses 
lugares que nos remetem ao clima de aventura e paixão proporcionado pela Idade Média. 
 Inciamos, portanto, a nossa jornada pelas tabernas medievais. Ao analisarmos a 
literatura e a iconografia nos será possível decodificar como esses espaços foram essenciaispara o desenvolvimento do comércio e a difusão de ideias, todas colocadas no mesmo cadinho 
de prazer. E, da mesma forma que Tyrion convida o Irmão Yoren para percorrerem todas as 
mais finas estalagens da Muralha até Porto Real,2 nós aceitamos esse mesmo convite 
passando por lugares não tão sofisiticados mas que nos proporcionará o conhecimento desses 
espaços medievais que nos fascinam até hoje. 
 
 
 
Figura 1: La taberna, XVe siècle Paris, BnF, Département des manuscrits, Français 1460 fol. 111v 
Esta é uma taberna localizada provavelmente à beira da estrada e que dava preferência no atendimento a 
ricos viajantes e nobres caçadores. Há a presença de um homem acompanhado de um galgo, cão de caça 
dos nobres. E a placa apresenta o desenho de um pássaro informando a todos que ali se serve carnes de 
aves e, portanto é algo destinado aos mais abastados. 
 
 
 
 
                                                            
2 Personagens da obra literária “As crônicas de gelo e fogo” de George R.R. Martin 
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II. In Taberna : a taberna como espaço de beber, comer e ter prazer. 
 
A taberna ou taverna como também pode ser grafada, é um palavra de origem grega que 
significa abrigo, e, a sua origem como um estabelecimento que oferece além de bebiba, 
comida, pouso e diversão, remete à Mesopotamia, mais especificamente aos sumérios. Nas 
tabernas sumérias, sob a proteção de Inanna consumia-se a cerveja e encontrava-se a alegria, 
mulheres solteiras, prostitutas e música. (LEICK, 2003, p.82). Já as tabernas do mundo 
mediterrâneo antigo – as gregas e romanas – não serviam a cerveja aos seus frequentadores, 
ali, o vinho era a bebida por excelência, esse, sendo de boa ou má qualidade era consumido 
em grandes quantidades. Na Antiguidade Clássica as tabernas além de servirem como locais 
para o consumo de bebidas e comida também eram importantes pontos para a coleta de 
impostos e o comércio em geral, mas, durante a época das grandes invasões bárbaras estas se 
tornaram muito raras. (PEYER, 1998, p. 441). Na Grécia, desde os tempos pós-homericos as 
estalagens ou albergues eram lugares dedicados a oferecer abrigo e alimento aos estrangeiros, 
e, partir do século V a.C. esses estabelecimentos passaram também a abrigar os comerciantes 
e, assim transformarem-se em entrepostos. (PEYER, 1998, p.438). Mas em toda a Grécia esse 
negócio se espande e passa, além de vender vinho, carne assada, oferecer pouso e estrebarias 
para que os animais dos viajantes também pudessem receber cuidados. Essas tabernas 
popularizam-se por volta do ano 400 a.C. e eram mais comuns nas zonas portuárias e nas 
polis que dedicavam-se ao comércio, em locais de peregrinação bem como nas estradas. 
(PEYER, 1998, p. 439). Durante o Império Romano os lugares que vendiam vinho e 
ofereciam comida, pouso e companhia receberam várias denominações e, muitas delas são 
usadas até hoje, como por exemplo, bodega. Também eram utilizados os termos taberna, 
caupona e popina. Essas tabernas espalhavam-se por todo o Império e nada mais eram do que 
uma cozinha com uma sala grande com mesas onde era servida a bebida e a comida sempre 
muito simples: pão, sopa e um pouco de carne assada que ficava em uma gamela sobre a mesa 
e todos podiam se servir de pequenas porções sobre grossas fatias de pão. No mundo Antigo 
as tabernas eram conhecidas por abrigarem malfeitores, ladrões, prostitutas e sempre estarem 
localizadas em bairros mais pobres, principalmente proximos aos portos e estradas. Os mais 
abastados não frequentavam esses lugares pois, contavam com as leis da hospitalidade sempre 
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respeitadas entre os pares cujas bolsas eram igualmente pesadas. Os ricos sentiam-se 
obrigados a recorrerem a estes estabelecimentos mal afamados somente em casos de viagens 
distantes isto aconecia somente quando não encontravam a villa de algum patrício para 
hospedá-los. (PEYER, 1998, p. 439). 
A taberna medieval que também recebia o nome de estalagem ou albergue, pois, apesar 
dos significados distintos que os vocábulos recebem hoje, no medievo todas elas recebiam a 
mesma conotação: um lugar apropriado para o consumo de bebidas alcoolicas sem moderação 
alguma, comer algo simples, jogar, conversar, divertir-se, descansar da viagem para poder 
segui-la e cuidar dos animais de montaria. Mas nem sempre as tabernas funcionavam dessa 
maneira. Logo após a queda do Império Romano elas tornaram-se muito escassas, foi, ao 
longo da Alta Idade Média (séculos V a X) que elas passaram a surgir em grande número por 
toda a Europa Ocidental. Criadas e controladas tanto pelos mosteiros como pelas grandes 
casas senhoriais, nos nascentes núcleos urbanos, nos portos, estradas e locais de peregrinação, 
as tabernas alto medievias não serviam apenas para vender vinho e cerveja e, ocasionalmente 
a sidra que havia sido muito comum na época carolíngia (MONTANARI, 1998, p.287), mas 
eram importantes postos de arrecadação de impostos e de venda de gêneros de primeira 
necessidade sendo utilizadas também como locais de descanso. A taberna medieval quase em 
nada difere da taberna da Antiguidade, sendo que a sua utilidade continuava a mesma. 
Mas esses estabelecimentos que sempre estiveram voltados exclusivamente à venda de 
bebidas e à diversão durante o século XIV passaram a ter outro papel em alguns locais da 
Europa, especialemente na Noruega. Com as leis da hospitalidade em vigor os camponeses 
eram obrigados a receber em suas casas todo e qualquer viajante que necessitasse de estadia 
sendo obrigados a oferecer – na maioria das vezes, – tudo o que possuiam para prover o 
conforto do hóspede e não serem pagos por isso. Mas, em 1335 o rei da Noruega ordenou que 
fossem criadas tabernas em todo o reino, não somente com o intuito de hospedar os viajantes 
e comercializar bebidas e comidas mas, também, funcionar como mercados e postos de 
arrecadação de impostos, aliviando assim a vida dos camponeses que desobrigavam-se de 
hospedar os nobres sem receber nada por isso. (PEYER, 1998, p. 442). Mais do que aliviar os 
camponeses do fardo da hospedagem gratuita e deixa-la como exclusividade da nobreza, a 
criação das tabernas ao longo das estradas e de pequenas povoações proporcionou o 
desenvolvimentos desses locais transformando muitos deles em cidades. E, é nesse momento 
que a taberna medieval passa ser sinonmo também do que muito mais tarde seriam os hotéis. 
O que começou como local de descanso para os viajantes, e de diversão para os menos 
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abstados, foi o inicio de um próspero comércio responsável pelo desenvolvimento de 
inúmeras regiões. 
Essas tabernas criadas com o intuito de oferecer pouso e abrigo aos viajantes e 
funcionar como um pequeno mercado passou a ser um negócio muito lucrativo e, assim, 
administrá-la tornou-se um direito que aguçou a cobiça de muitos senhores e também de 
alguns monastérios e, apesar destes condenarem a ingestão excessiva de álcool, o jogo e a 
prostituição, não condenavam os lucros gerados por esse comércio. O antro de ladrões, 
jogadores, prostitutas e bêbados passou a ser controlado pela nobreza e pela Igreja que 
entregava a sua administração a uma figura que possuia uma reputação tão dúbia como o local 
que admnistrava: o taberneiro. Esse profissional que, como as outras profissões ligadas à 
alimentação medieval como o açougueiro e o padeiro eram consideradas pela Igreja uma 
ocupação “vil”, no sentido de que ela era pouco ou nada digna se comparada função do 
ferreiro, do monge ou do cavaleiro (DESPORTES, 1998, p. 423). 
 
 
 
Figura 2: El servicio de mesa, Histoire de Renaud de Montauban Paris, BnF,Arsenal, Ms 5072 Res. 
Esse serviço de mesa apresentado no manuscrito apresenta o serviço de uma rica taberna destinada a 
atender nobres, comerciantes e clérigos ricos. A mesa possui uma tolha que confere requinte ao ambiente 
e combina com a riqueza dos jarros, copos e pratos. As pessoas também estão ricamente vestidas. Este 
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estabelecimento localizava-se provavelmente em um bairro rico do núcleo urbano e mostrava o quão bem 
freqüentado o lugar era. Atentar para a pequena placa com um cisne desenhado indicando a sofisticação e 
a excelência da comida e da bebida servida no local. 
 
Administrando e obtendo lucros em um local destinado ao prazer e ao convívio dos 
mais variados tipos humanos, como já foi citado acima, o taberneiro sempre nos foi 
apresentado – seja na literatura medieval ou mesmo contemporânea e nas representações 
cinematográficas ou mesmo televisivas - como alguém muito mal-humorado, atendendo os 
frequentadores da taverna com rispidez e sempre propenso a receber subornos e, por algumas 
moedas, proteger ou delatar alegremente seus amigos. Essa imagem apresentada pela arte 
corresponde às descriçoes medievais. A Autobiografia, de Guiberto de Nogent resalta duas 
características essênciais aos taberneiros: primeiro a sua situação financeira privilegiada e, 
segundo, a sua sempre constate má-vontade. (DESPORTES, 1998, p. 423). Esses 
profissionais da comida e da bebida como são chamados por Françoise Desportes, são 
responsáveis pelo fornecimento de comida, bebeida e companhia para as pessoas que 
habitavam as cidades medievais principalmente durante a Idade Média Central (séculos XI - 
XIII). Aos ricos clérigos e aos mercadores que iam de cidade em cidade sempre tinham 
disponíveis boas acomodações, bom vinho e comida fresca e quente além, é claro, de boa 
companhia para aquecer o leito e uma estrebaria para abrigar seus animais de montaria e 
carga. E, oferecia aos pobres clérigos, aos chefes de família camponeses e aos servidores dos 
nobres, bebidas e comidas para saciar a sede e a fome e, assim,assegurar o complemento 
alimentar que não era possível retirar da terra. 
Grupos tão heterogêneos como clérigos ricos e camponeses são acolhidos sob o mesmo 
teto, procurando a mesma coisa: comida e bebeida, mais especificamente, vinho e carne. O 
mesmo espaço é ocupado por pessoas que pertenciam a grupos sociais distintos mas eram 
possuidores das mesmas necessidades e também dos mesmos desejos. Mais do que apenas 
saciar a sede e a fome e descansar, homens – ricos e pobres – e, ocasionalmente mulheres que 
se colocavam em marcha nas comitivas de comerciantes e nobres procuram ali um alento para 
os males cotidianos e um momento de prazer quando levavam aos lábios uma caneca de 
vinho, cerveja ou sidra e uma fatia de pão com nacos de carne assada. 
O mesmo espaço é dividido por pessoas diferentes com bolsas com muito ou nenhum 
peso que procuravam conforto para as aflições do corpo, como a fome e a sede e também para 
os outros males como a pobreza ou então, simplesmente a busca por companhia para rir, 
beber, jogar e amar. Essa taverna que vemos descrita na literatura medieval tanto em verso 
como em prosa e que é revisitada constantemente pela literatura ao longo dos séculos, pelas 
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artes plásticas e que ganhou um novo fôlego com a ascensão do cinema que a romantizou 
transformando-sa em um local de encontro e ladrões ques são apresentados como heróis e de 
prostitutas que são “ladies”. Ainda representadas nas páginas e nas telas como um lugar 
pouco iluminado, cheio de fumaça onde há música alegre, risos e danças, de repente alguém 
se enfurece, puxa uma adaga e, assim inicia-se uma briga onde alguns são feridos ou mortos, 
o lugar é parcialmente destruído e, logo em seguida todos voltam a rir como se ali nada 
tivesse ocorrido. É esse espaço de prazer que para os olhos contemporaneos tão bem 
caracteriza a Idade Média e povoa o nosso imaginário como um local especial onde todos são 
iguais perante o vinho. 
 
 
III. Quid agatur in taberna: quem vai à taberna ? 
 
Como um estabelecimento dedicado à saciar as necessidades mais básicas do ser 
humano - comer, beber e descansar – a taberna também passa a ser um local destinado ao 
lazer. O conjunto de canções escritos entre os séculos XII e XIII por poetas errantes e 
estudantes universitários intitulado Carmina Burana nos apresenta um perfil dos 
frequentadores das tabernas na Idade Média Central. Essas canções satirizam a ordem e os 
modos de viver impostos pela Igreja e enaltecem o amor, a natureza, a juventude e, é claro o 
vinho. (LOYN, 1990, p. 75 – 76). Essas canções que se tornaram populares graças ao 
goliardos poetas e cantores que perembulavam pelas cidades e vendiam sua arte em troca de 
pouso, comida e, principalmente vinho, pregavam o amor à liberdade, o prazer de viver e 
mostravam a efemiridade da vida e, por essa razão sua poesia apresentava a alegria de gozar o 
presente pois a Fortuna é mútavel como a Lua e, se está vivo hoje pode não estar daqui a 
segundos. (FORTUNA IMPERATRIX MUNDI – Seria 1 – fol.1). Como compunham em 
Latim os goliardos eram muito influenciados por poetas e autores latinos, principalmente 
pelos autores, como Horácio que fez da festa, da alegria e, principalmente do vinho o eixo 
central de sua obra. (TRINGALI, 1995, p. 23) 
Para os goliardos que conseguiam sobreviver graças ao que ganhavam com suas 
canções entoadas nas tavernas, este espaço tornou-se não só o centro das composições, mas a 
taverna vista como espaço de prazer foi a grande musa desses poetas. Assim como Horácio 
fez no século I a. C. os goliardos também elegeram a vida e, principalmente, a vida dedicada 
ao prazer e ao vinho na taverna o tema dessa poesia que sobreviveu graças a um copista 
anônimo do século XII, provavelmente na abadia de Benediktbeurer, na Baviera. (LOYN, 
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1990, p, 75 -76). A sobrevivência dessa obra poética é reveladora do modus vivendi não só 
desses poetas mas de todos aqueles que frequentavam as tabernas e lá buscavam mais do que 
comida e bebida, buscavam acima de tudo o prazer proporcionado pelo alcool em um espaço 
que porporcionava a conviência. 
A Seria CLXXII – fol. 84 é o numero do manuscrito onde se encontra a composição 
intitulada In Taberna (Na Taberna). Uma composição anônima bem como os outros poemas 
que fazem parte da Carmia Burana, nos apresenta os frequentadores da taberna e a visão de 
mundo de cada um, inclusive dando voz a um cisne que foi assado e agora vai ser 
deliciosamente devorado. 
O poema Eu sou o abade ( Ego sum abbas, Amatoria. Potatoria. Lusoria 196 –fol. 97b) 
vai apresentar como um abade mais propenso aos prazeres da carne do que aos deveres do 
espírito, a sua profunda ligação com o prazer proporcionado pelo vinho e pela convivência na 
taberna. 
 
Sou o abade 
Sou o abade da Cocanha, 
Meu concílio é com os bebedores, 
E quero pertencer à seita de Décio3 
E quem me procurar de manhã na taberna, 
A noite será deixado nu, e assim despojado de suas vestes gritará : 
Ai de mim ! Ai de mim ! 
Que fizeste, execrável sorte ? 
Nos tomastes da vida 
Todos os prazeres ! 
Haha ! 
 
O abade apresenta-se como pertencente a ordem Cucaniensis, uma ordem imaginária 
em que beber, comer, jogar em demasia não é nehum pecado mas sim uma grande virtude. 
Essa palavra Cucaniensis nos remete a uma outra palavra medieval, Cocanha, que aparece em 
um poema goliardo de 1164 que denomina como lider de um grupo de beberrões de abbas 
Cucaniensis, ou seja, o abade da Cocanha. (FRANCO JUNIOR, 1998, p. 25). A Cocanha 
descrita como um país imaginário nadamais é do que um protesto contra todos os limites e 
                                                            
3 São Décio é um santo fictício e patrono dos jogadores. 
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punições impostos pelo cristianismo, como estudado por Jacqques LeGoff (FRANCO 
JUNIOR, 1998, p. 8). 
 Como o abade pertence a uma ordem localizada em um país onde não há pecado e, 
comer, beber e jogar são as maiores virtudes ele faz da taberna o seu local de pregação. Ali 
o abade cucaniensis, não está preocupado como os demais abades – franciscanos ou 
beneditinos – em salvar almas e, fazer do corpo um templo divino, usando para isso, muitas 
vezes a mortificação da carne – ele prega pela canção e pelo jogo que a verdadeira essencia 
do homem está no riso, na diversão e, acima de tudo na embriaguez. 
Elegendo o seu concílio ao lado de experientes cléricos que estão aos serviços do vinho 
– e, consequentemnte do prazer - nas tabernas, o abade da Cocanha convida a todos para com 
ele beber e entregar-se ao jogo, buscando ali somente o prazer de divertir-se mesmo que todo 
esse prazer cobre o preço de todas as moedas e até da roupa que veste aquele que se entrega 
ao culto ministrado pelo abade. A taberna que é apresentada como um templo de prazer e 
devasidão não pode ser somente descrita dessa forma. As tabernas localizadas nas estradas e 
nos bairros pobres ou que congregava os artesãos com as ocupações mais vis como 
açougueiros, pedreiros, sapateiros, carregadores e marinheiros eram realmente lugares 
frequentados também por ladrões o que fazia do local não somente um « templo » dedicado 
ao prazer de beber, comer, cantar e jogar mas de um antro de malfeitores. Mas, se pensarmos 
nas taberna localizadas nas ruas de comérico de especiarias, sedas e outro produtos vindo do 
Oriente nos núcleos urbanos dedicados ao comércio, encontraremos estabelcimentos mais 
sofisticados e, consequentemente frequentados por uma clientela diferenciada, formada por 
cavaleiros, ricos comerciantes e, em certas ocasiões até nobres. Fosse para comprar ou 
negociar os produtos em questão ou então em deslocamento, os mais abastados também 
usufruiam dos serviços das tabernas e, estas ofereciam um serviço mai sofiscado com um 
vinho e comidas de melhor qualidade. Essa presença dos nobres nas tabernas também é 
marcada principalmente pela comida servida pelos taberneiros aos nobres frequentadores. São 
servidas carnes assadas, principalmente as de aves que por voarem muito alto alcançando os 
céus são o alimento essencial à dieta do nobres da sociedade medieval, pois acreditava-se que 
estes estariam, graças a sua alta posção social mais proximos do céu e, consequenemente de 
Deus. (BIRLOUEZ, 2009, p.8) 
A poesia goliarda também vai utilizar como tema a alimentação e a frequencia dos 
nobres nas tabernas apresentando o sentimento de um cisne que está prestes a ser devorado. O 
cisne por ser uma ave de aparência belíssima que consegue alçar voos muitos altos simboliza 
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a alimentação dos nobres – bellatores e oratores – um alimento que mais do que deleitar 
demonstra poder tanto de quem o come como de quem o serve. (BIRLOUEZ, 2009, p.81) 
 O poema Um dia morei no lago (Amatoria. Portatoria. Lusoria 92 – fol.53b mostra o 
« desespero » de um cisne que se lembra de quando morava no lago e agora se apavora com o 
ranger de dentes famintos que se aproxiam de sua nobre e tenra carne assada. 
 
Um dia morei no lago 
 
Um dia morei no lago, 
Um dia fui belo, 
Quando eu era um cisne. 
Ai de mim, ai de mim ! 
Agora negro 
E completamente assado ! 
Gira e gira o assador ; 
Estou queimando completamente na pira : 
O homem agora me serve. 
Ai de mim, ai de mim ! 
Agora repouso em um prato, e não posso mais voar, 
Vejo dentes rangendo : 
Ai de mim, ai de mim ! 
 
A ave que outrora voava livre agora está presa às garras de um assador e prestes a ser 
devorada e, nesse momento recorda-se do lago em que morava e, lamenta-se de sua sorte. 
Nobres e cléricos ricos frequentavam as tabernas sempre nos melhores lugares dos núcleos 
urbanos e lhes eram servidos sempre o melhor vinho e as melhores iguarias. A cerveja e a 
sidra sempre ocuparam um lugar secundário à mesa da nobreza e, portanto não eram 
consumidas por estes quando precisavam hospedar-se ou fazer uma refeição nas tabernas. Por 
sua vez, o taberneiro, que administrava muitas vezes um establecimento à beira da estrada e 
acolhia viajantes das mais variadas categorias mantinha em seus estoques bons vinhos e, 
também boas carnes para servir aqueles que necessitavam desse tipo de produtos fazendo 
crescer assim o número de tabernas, hospedarias, estalagens ou albergues que durante a 
Antiguidade e a Idade Média eram praticamente sinonimas e, consequentemente aumentram 
também o número de estabelecimentos que se dividiam entre aqueles muito bons destinados 
aos nobres, aqueles que atendiam aos comerciantes e viajantes e pessoas não tão abastadas e 
aqueles que possuím uma péssima reputação e não era recomendável frequenta-lo. (PEYER, 
1998, P. 442) 
Os goliardos poetas pobres e errantes praticantes da « vagabundagem intelectual » (LE 
GOFF, 1989 p. 37), retrataram em suas composições os prazeres mais simples que se pode 
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encontrar em uma taberna e mostraram pelos cantos de refrões de fácil memorização mas nem 
por isso menos complexos, a simplicidade e a efemirdade da vida terrena. (LOYN, 1989, P. 
169). Ao celebrarem o culto ao vinho e ao prazer de se embriagarem, celebravam a vida em 
um esapço dedicado ao prazer : a taberna. Ali, goliardos, sacerdotes da Cocanha, jogadores, 
ladrões, prostitutas, nobres e clérgicos são todos súditos de Baco e de Vênus em busca de 
comida e bebida de boa ou má qualidade e, sob esse teto todos sentem-se felizes, não 
pensando na morte ou nas dores que são imediatamente amenizadas – e, porque, não 
apagadas ? – à ingestão dos primeiros goles do néctar das uvas. No momento em que os risos 
são mais altos, a música está mais alegre e que as canecas se batem com mais força o abade 
Cocaniense sabe que ali todas as almas estão salvas e chegaram com certeza ao Paraíso. 
 
 
 
Figura 3: Las saunas, Le livre de Valère Maxime, XVe siècle Paris, BnF, Arsenal, manuscrit 5196 fol. 
372. 
As casas de banho que também funcionavam como prostíbulos não deixavam de oferecer aos seus 
freqüentadores uma rica mesa. Muitos desses estabelecimentos funcionavam junto às tabernas e, de suas 
cozinhas saiam a comida e a bebida para complementar o prazer de estar tendo prazer. 
 
 
 
 
IV. In taberna quando sumus : o que se faz enquanto se está na taberna 
 
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O poema goliardo In taberna quando sumus (Amatoria. Potatoria. Lusoria 177 – 
fol.88b) que pode ser trazudido como « Quando estamos na taberna » nos apresenta como se 
comportam e o que fazem os seus frequentadores além de, é claro beber e se divertir : 
 
Quando estamos na taberna 
Quando estamos na taberna, 
Não pensamos na morte, 
corremos a jogar, 
o que nos faz sempre suar. 
O que se passa na taberna, 
Onde o dinheiro é hospedeiro, 
Podeis querer saber, 
Escutai pois o que eu digo. 
Uns jogam, uns bebem 
Uns vivem licensiosamente. 
Mas dos que jogam, 
Uns ficam em pêlo, 
Uns ganham aqui suas roupas, 
Uns se vestem com sacos. 
Aqui ninguem teme a morte, 
Mas todos jogam por Baco : 
Primeiro ao mercador de vinho 
é que bebem os libertinos ; 
uma vez aos prisioneiros, 
depois bebem três vezes aos vivos, 
quatro a todos os cristãos, 
cinco aos fiéis defuntos, 
seis às irmãs perdidas,sete aos guardas florestais, 
oito aos irmãos desgarrados, 
nove aos monges errantes, 
dez aos brigões, 
doze aos penitentes, 
treze aos viajantes. 
Tanto aos Papa quanto ao rei, 
Bebem todos sem lei. 
 
Como já foi exposto ao longo do texto a taberna constitui-se em um local de lazer e, os 
goliardos já mostravam isso em seus poemas. O poema vai descrever as atividades que se 
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desenvolviam nesse lugar. Lá, não há espaço para tristeza, ou mesmo o trabalho pesado o que 
se deve fazer na taberna é exclusivamente ser uma epicurista. Do jogador ao Papa todos que 
estão ali devem divertir-se e, fazer dessa diversão um culto aos prazeres proporcionados pelo 
vinho. O poeta vai convidar o seu ouvinte/leitor a saber o que se passa ali e, ele nos explica 
que enquanto uns dedicam-se a aventura do jogo, outros bebem, outros ainda entregam-se aos 
prazeres carnais e, todos sem exceção, estão ali a serviço de Baco. O deus latino do vinho é 
constantemente evocado pelos poetas goliardos que viam nos antigos cultos a Baco presidido 
pelas bacantes não só uma comemeoração pela farta colheita de uvas e pelas boas safras de 
vinho ou uma celebração à vida, mas um retorno às bacanais onde o prazer o o 
comportamento licencioso possuíam um caráter sagrado.(VICTORIA, 1983, p. 25). Quando 
se está na taberna nada mais importa a não ser entregar-se ao prazer. 
Para quem está na taberna, a serviço de Baco não deve temer sequer a morte ou perder 
as vestimentas, pois sempre há sacos disponíveis que serão usados como se fossem as vestes 
mais ricas existentes. O prazer proporcionado pelos atos corpóreos – do mais simples, como 
comer e beber ao ato sexual que envolve o processo de sedução até o seu ápice - são 
fundamentais aos frequentadores das tabernas pois ali nesse espaço tudo se permite e, como 
um espaço sagrado dedicado a Baco e cujo sumo sacerdote é oriundo do país da Cocanha, 
onde prazer é sem limites, tudo é permitido. (FRANCO JÚNIOR, 1998, p, 30,31,32). 
Além de jogarem e beberem se faz necessário nesse ambiente brindes constantes a todos 
os frequentadores, estejam eles presentes ou não. Podemos interpretar o brinde realizado aqui 
como uma espécie de consagração tanto à bebida em si como o ato de ingerí-la. Como a morte 
não deve ser temida porque no momento da reunião em torno do vinho na taberna a vida é que 
deve ser lembrada e, quanto mais se bebe, mais vivos sentem-se. Começam por brindar o 
mercador/comerciante de vinho, personagem fundamental para que a celebração ocorra e 
brindam a ele, brindam aos libertinos pois o vinho é a sua inspiração. Segue-se a esses os 
prisioneiros pois estes não podem usufruir desse espaço de prazer e estão ausentes dessa 
celebração da vida e da liberdade. Os vivos que tanto desfrutam dessas alegrias são lembrados 
bem como os mortos que já participaram e, agora, encontram-se fora dessa celebração. Não 
são esquecidas também as mulheres, principalmente ! « as irmãs perdidas », aquelas que por 
um deslize já não podiam mais fazer parte de uma família dita de bem e, agora além de 
frequentarem e beberem fazem de um lugar de prazer, o seu local de trabalho proporcionando 
prazer e, por terem esse ofício são brindadas por aqueles que com elas dividem os leitos e as 
canecas. 
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Assim, como o país da Cocanha é uma utopia medieval da abundância : do sexo, da 
comida, da bebida e, principalmente do prazer de se ter tudo sem se esforçar-se, a taberna, 
pode ser interpretada como pedacinhos da Cocanha, onde o prazer reina absoluto com 
abundância de vinho mas, não de graça, aqui é necessário apenas algumas moedas e o mundo 
prazeroso da embriaguez receberá a todos com alegria. (FRANCO JUNIOR, 1998, p. 26). 
Na taberna, todos estão reunidos para beber e divertir-se do rei ao mais baixo clérigo , 
do senhor ao servo, todos reunidos em torno do vinho para encontrarem alento para a sede do 
corpo e encontrar a alegria da alma. Nobres e pobres encontram-se na taberna neste espaço 
dedicado à oferecer comida, bebida e repouso aos cansados e aos viajantes e, conceder a todos 
diversão. Neste espaço que desde a Antiguidade é dedicado ao prazer e atravessa os séculos 
retratada nas diversas manifestações artísticas, a taberna sempre vai ter essa conotação de um 
local de deleite. Por mais que tenham existido leis para regulamenta-las e também controlá-las 
já que sempre foi um negócio por demais lucrativo e esteve no alvo ds governantes, que tenha 
tido a má reputação de abrigar os mal-feitores e que o ofício de taberneiro não tenha sido 
reconhecido como um ofício de valor, a taberna sempre foi apresentada como um lugar onde 
reina a alegria. Na Idade Média as tabernas ocuparam os lugares dos campos, onde as 
bacantes celebravam os seus cultos cantando e dançando em honra a Baco. O local de culto 
sofreu uma transformação, os praticantes já haviam adotado outros deuses mas, no interior da 
taberna, sob a luz bruxuleante de tochas, com canecas a trasbordar de vinho, sidra e cerveja e 
música alegre todos voltam-se para aquele que fez do suco fermentado da vinha o grande 
alento para as dores do corpo e de alma. 
 
 
 
 
V. Considerações Finais. Qui nos rodunt confundantur et cum iutis non 
scribantur. 
 
O final do poema In taberna quando sumus (Amatoria. Potatoria. Lusoria 177 – fol.88b) 
que é a epígrafe para essa parte final de nosso artigo e nos diz que aqueles que nos difamam 
devem ter seus nomes riscados do livro dos justos, todos aqueles que maldizem os 
frequentadores das tabernas e que condenam os que lá buscam prazer na bebeida, na comida e 
na companhia das outras pessoas que a frequentam não merecem perdão. Esse espaço 
considerado por diversos textos literários como um antro de perdição em outros foi descrita 
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como um local seguro para o descanso de um longa jornada ou para o mereceido descanso 
depois de um dia de trabalho. As artes plásticas a representaram como um lugar onde reinava 
a alegria e não havia censuras para aqueles que lá refugiavam-se em busca do prazer 
proporcionado pelo alcool. 
 
 
 
 
Figura 4 e 5 : Recostituição de comida servida em tabernas européias: pão simples de farinha de trigo, 
pão de centeio com linguiça e queijo, caldo de ervilhas, carne cozida na cerveja preta amarga, acompanha de 
Sima (hidromel finlandês). Fotos : André Araújo de Oliveira, experimento reconstrucionista de Luciana de 
Campos. 
 
 A literatura medieval como os Fabliaux sempre teve a taberna e seus tipicos 
frequentadores como um dos seus temas centrais, os goliardos escreveram seus poemas sob a 
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proteção do seu teto e, a taberna além de musa, foi também personagem. A Renascença, a 
Idade Moderna e, finalmente o mundo contemporâneo enxergaram - e ainda o fazem – a 
taberna como um local onde imperava o riso e o prazer que sempre esteve presente nas mais 
variadas composições musicais, na poesia e na prosa. Atualmente podemos observar como a 
Idade Média e, consequentemente a representação das suas tabernas estão presentes em várias 
produções cinematográficas e televisivas. O Pônei saltitante a taberna que servia boa cerveja 
em canecas de quase um litro nos foi apresentada na Literatura em A Sociedade do Anel de 
autoria de J.R.R. Tolkien e transposta para as telas por Peter Jackson com uma fiel 
reconstituição de um estabelecimento medieval e apresentava todo o clima de uma taberna 
com a sua típica, comida, bebida, música, iluminação e frequentadores. A série televisiva 
Game of Thrones, baseada na obra literáriaCrônicas de Gelo e Fogo de George R.R. Martin 
também apresentou a taberna como um local de descanso e prazer onde abriga sob o mesmo 
teto, nobres, cavaleiros e mercenários. Essas descrições contemporâneas acabam por reforçar 
o desejo de conhecer e reviver, mesmo que nas páginas de um livro e nas imagens do cinema 
e da televisão todo o clima, ora perigoso, ora delicioso mas sempre cercado pela aventura que 
estava presente nas tabernas medievais. 
 Hoje, a arte se encarrega de nos remeter até as tabernas, estalagens e albergues da 
Idade Média e nos apresenta como estes estabelecimentos funcionavam como um lugar de 
alento frente a todas as dificuldades que o período apresentava. 
 O nosso percurso termina aqui. Assim como Catelyn Stark se enche de satisfação ao 
ouvir o som de uma dúzia de espada cercarem Tyrion Lannister, nós terminamos também 
satisfeitos o nosso percurso pelo espaço de prazer das tabernas medievais concluindo que 
mais do que somente proporcionar prazer, esses locais foram inspiradores de canções, prosa e 
poesia e nos fascinam e nos servem como objeto de pesquisa que ainda requer muita atenção 
pois, infelizmente no Brasil, carecemos de estudos mais aprofundados nessa área tão 
interessante e profícua como a história da alimentação e a gastronomia histórica. 
 Resta-nos, agora fazer como Jon Snow : 
« (...) tirou o jarro de cerveja do parapeito exterior e encheu um corno. » (MARTIN, 
2011, p. 550). 
 
 
Agradecimentos: este artigo só foi possível graças a paciência e o entusiasmo do meu 
esposo Johnni e dos meus filhos Thor e Isolda que, por algum tempo viram com alegria toda a 
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casa entrar no clima de uma taberna Medieval. Ao prof. Dr. Johnni Langer (NEVE/UFMA) 
pela leitura cuidadosa, crítica e sugestões bibliográficas. Ao Prof. Dr. Sergio Alberto Feldman 
(UFES) pelo envio das imagens sobre alimentação medieval e ao apoio e carinho constantes. 
Aos integrantes do NEMIS, que ajudaram com as mensagens de entusiasmo pela delícia do 
tema tratado nesse artigo e pela vontade de provarem da comida do nosso querido Velho 
Urso. Ao André Araujo de Oliveira (UFMA/NEVE/NEMIS), ao Jack Franco de Sá 
(UFMA/NEMIS) e ao Paulo Neto (UFMA) por terem aceitado o convite de passar uma noite 
na taberna. 
 
VI. Bibliografia 
 
ANONIMO. Pequenas Fábulas Medievais. São Paulo: Martins Fontes, 1995. 
BIRLOUEZ, Eric. À la table des seigneurs, des moines et des paysans du Moyen Age. Paris : 
Editions Ouest-France, 2009. 
CORTONESI, Alfio. « Cultura de subsistência e mercado : alimentação rural e urbana na 
baixa Idade Média ». In: FLANDRIN, Jean-Louis, MONTANARI, Massimo. História da 
alimentação. São Paulo : Estação Liberdade, 1998, 6a. Edição. 
DESPORTES, Françoise. « Os ofícios da alimentação ». In: FLANDRIN, Jean-Louis, 
MONTANARI, Massimo. História da alimentação. São Paulo : Estação Liberdade, 
1998, 6a. Edição. 
FLANDRIN, Jean-Louis, MONTANARI, Massimo. História da alimentação. São Paulo : 
Estação Liberdade, 1998, 6a. Edição. 
FRANCO JUNIOR, Hilário. Cocanha. A história de um país imaginário. São Paulo : 
Companhia das Letras, 1998. 
LE GOFF, Jacques. Os intelectuais na Idade Média. Sâo Paulo : Brasiliense, 1988. 
LEICK, Gwendolyn. Mesopotâmia. A invenção da cidade. Rio de Janeiro : 2003. 
LOYN, H.R. Dicionário da Idade Média. Rio de Janeiro : Jorge Zahar Editor, 1990. 
MARTIN, George R.R. A Guerra dos Tronos. As Crônicas de Gelo e Fogo Livro Um. São 
Paulo : Leya, 2010. 
MONTANARI, Massimo. Comida como cultura. São Paulo : SENAC, 2008. 
MONTANARI, Massimo. « Estruturas de produção e sistemas alimentares ». In : 
FLANDRIN, Jean-Louis, MONTANARI, Massimo. História da alimentação. São 
Paulo : Estação Liberdade, 1998, 6a. Edição. 
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20 
 
MONTANARI, Massimo (org.) O mundo na cozinha. Historia, identidade, troca. São Paulo : 
Estação Liberdade/SENAC, 2009. 
PEYER, Hans Conrad. « Os primórdios da hotelaria na Europa ». In: FLANDRIN, Jean-
Louis, MONTANARI, Massimo. História da alimentação. São Paulo : Estação 
Liberdade, 1998, 6a. Edição. 
TRINGALI, Dante. Horácio o poeta da festa. Sâo Paulo: Musa Editora, 2003. 
TOLKIEN, J.R.R. O Senhor dos Anéis. Volume 1. A Sociedade do Anel. São Paulo : Martins 
Fontes, 1994. 
VICTORIA, Luiz A.P. Dicionário ilustrado da mitologia. Rio de Janeiro : Ediouro, 1984.

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