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30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 1/27 Tamanho da fonte: O Verso e Reverso, Ano XXII 2008/1 Número 49 PORTAL DE REVISTAS PÁGINA INICIAL DA REVISTA SOBRE ACESSO CADASTRO BUSCA EDIÇÃO ATUAL EDIÇÕES ANTERIORES O QUE É RSS? UNISINOS SITE OFICIAL SUBMISSÕES Página inicial da revista > Ano XXII 2008/1 Número 49 > BorgesTeixeira Artigo A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan The ''new'' woman: the feminine stereotype represented in Nova/Cosmopolitan Nincia Ribas Borges Teixeira1 Maristela S. Valério2 Introdução s meios de comunicação agem como ferramentas de representação social, ou seja, através da análise de determinado jornal ou revista de qualquer época podemos ter uma idéia geral de como se comporta uma sociedade naquele período. Neles estão presentes seus costumes, sua ideologia, seus hábitos, forma de vida e costumes. Dentro dessa perspectiva, as revistas femininas são importantes fontes de pesquisa para quem quer estudar a evolução da mulher dentro da sociedade. Essas revistas agem como espelhos do comportamento feminino e também como incentivadoras de mudanças de comportamento. Devese considerar que os meios de comunicação trabalham com uma representação, com uma visão do mundo que pode ou não corresponder à realidade. Neste artigo, pretendese definir o modelo de mulher representada na revista Nova/Cosmopolitan nas décadas de setenta e nos dias atuais. A opção por esse corpus se deu por a revista estar presente no país desde a década de setenta e por ser uma das primeiras a tratar de assuntos polêmicos e a quebrar tabus sobre o comportamento feminino. Para isso, foram analisados exemplares da revista Nova das décadas de 1970 e de 2000, dos quais foram selecionados os editoriais das edições de julho de 1976 e outro de janeiro de 2007. Esses textos 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 2/27 foram escolhidos por trazerem uma amostra da forma como é retratada a mulher na revista nessas duas épocas. Outro motivo da opção pelos editoriais foi por eles se configurarem em uma conversa entre as editoras da revista e a leitora, mostrando assim, a posição do meio de comunicação em relação a assuntos veiculados ao universo feminino. Primeiramente, o trabalho apresenta uma discussão presente nos estudos sobre a imprensa feminina, sobre ela ser ou não considerada jornalismo. Em seguida são demonstrados conceitos sobre o gênero editorial. No próximo tópico, realizase um apanhado da história da imprensa feminina e da revista Nova/Cosmopolitan. Mais adiante é feito um recorte da história da mulher, dos estudos femininos, do movimento feminista e conceitos de representação social. Por fim, realizase a análise dos textos selecionados, comparando as duas edições e levando em consideração o contexto histórico em que foram produzidos. Imprensa feminina: jornalismo, serviço ou entretenimento? Muito se discute sobre os parâmetros utilizados para que um gênero seja ou não considerado jornalismo. Por isso, antes de falar da revista feminina e suas implicações dentro da sociedade, é necessário que se realize uma discussão a respeito dela enquanto gênero jornalístico. Afinal de contas, a imprensa feminina deve ou não ser considerada jornalismo? De acordo com Dulcília Schroeder Buitoni (1990), jornalista e pesquisadora da ECAUSP, a imprensa feminina é considerada, por aqueles que nela trabalham, como jornalismo de amenidades, esclarecimento, serviço, entretenimento. Nela, ao contrário dos jornais diários, trabalhase com a “novidade”. São os mesmos assuntos, beleza, moda, relacionamento, casa, comportamento tratados de uma forma diferenciada, que podem ter uma relação com os fatos noticiados nos jornais, mas não são pautados por eles. Para Elcias Lustosa (1996), jornalista e professor de jornalismo, a notícia jornalística é definida por quatro elementos essenciais: clareza, objetividade, concisão e precisão. Segundo ele a notícia é um fato que pode ser do interesse de uma maioria. Notícia é o relato de um fenômeno social, presumivelmente de interesse coletivo ou de um grupo 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 3/27 expressivo de pessoas. Devemos enfatizar que a notícia não é a exata tradução da realidade, pois como já alertava Frase Bond, “notícia não é um acontecimento, ainda que assombroso, mas a narração desse acontecimento (Lustosa, 1996, p. 19). Se partirmos dessa idéia, inseriremos o conceito de jornalismo especializado e, dentro dele, o jornalismo de revista. Enquanto o jornal diário escreve para uma platéia heterogênea e precisa satisfazer essa maioria, as revistas privilegiam um público específico e, por isso, por falar diretamente a um determinado grupo, produz uma sensação de proximidade com o leitor. Segundo Marília Scalzo (2004), jornalista e professora do curso de jornalismo da Editora Abril: Não é à toa que leitores gostam de andar abraçados às suas revistas ou de andar com elas à mostra para que todos vejam que eles pertencem a este ou àquele grupo. Por isso não se pode nunca esquecer: quem define o que é uma revista, antes de tudo, é o seu leitor (Scalzo, 2004, p. 12). Além da especialização, outro fato que diferencia a revista do jornal é a validade de suas informações. O jornal trata da notícia em si, narra os fatos de forma objetiva, não se atém aos detalhes. Nele é necessária uma constante recuperação da notícia, pois mesmo que se tenha falado no assunto anteriormente, sempre existe aquele leitor que ainda não leu sobre o assunto. Já na revista, segundo Lustosa (1996), o principal é a interpretação dos fatos. Não há a preocupação com a construção de um lide ou de se falar de forma tão objetiva. A matéria da revista é geralmente uma reportagem descompromissada com o factual e com os acontecimentos rotineiros, objetivando muito mais uma interpretação dos fatos e a análise de suas conseqüências, pois raramente pode ou procura oferecer novidades no sentido do que é assegurado pelas emissoras de televisão, de rádio e pelos jornais (Lustosa, 1996, p. 104). No âmbito das revistas femininas, essas diferenças são ainda maiores. Nelas, o factual, a notícia em si, é deixada de lado, ou serve apenas como um 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 4/27 pretexto para se falar de determinados assuntos. Segundo Buitoni (1990), isso acontece devido ao caráter das editorias presentes nesse tipo de veículo de comunicação, como, por exemplo, moda, beleza, culinária, decoração. Elas podem até aceitar ligação com o factual, mas não são por ele determinadas.Além disso, a própria linguagem utilizada nas revistas femininas é um fator de diferenciação destas em relação aos jornais impressos. Enquanto nesses os princípios adotados são os da clareza, objetividade e impessoalidade, nas revistas femininas prevalece o tom de conversa com as leitoras. De acordo com a pesquisadora Mônica dos Santos de Souza Melo (2006), na revista feminina, o enunciador não se esconde, não se apaga atrás da notícia, como apregoam os manuais de jornalismo, pelo contrário, ele faz questão de se mostrar como um amigo íntimo da leitora, que quer e pode ajudála a resolver seus problemas. Para criar essa sensação de proximidade, as revistas utilizam a linguagem coloquial, empregando gírias e estrangeirismos, bordões, metáforas e outros recursos da linguagem. O uso do pronome pessoal “você” e os verbos, na forma imperativa, fazem com que a leitora sintase recebendo conselhos ou conversando com uma velha amiga. Para a pesquisadora Viviane Herbale (2006), as revistas femininas dispõem de algumas técnicas para simular essa proximidade com a leitora, tratandoa como uma irmã mais velha ou como amiga experiente. Para isso elas utilizamse, além de um léxico informal, narrativas confessionais, em primeira pessoa. As revistas, tanto as femininas quanto outras especializadas, servem também como forma de entretenimento. Segundo Scalzo (2004), estudando a histórias das revistas podese perceber que sua primeira vocação não era a notícia, mas sim o entretenimento e a educação. Por isso, a autora considera a tensão entre jornalismo e entretenimento, dentro do meio revista, sem sentido. “Há espaço para as duas coisas, desde que se perceba, é claro, os limites e possibilidades de cada área, sem querer misturar uma com a outra” (Scalzo, 2004, p. 52). Segundo Buitoni (1990), as revistas femininas podem ser classificadas como jornalismo de serviço, pois trazem informações que têm uma ligação direta com a vida da leitora, falam sobre assuntos que afetam a vida dela no cotidiano. O jornalismo de serviço é marcado nas revistas femininas por suas tradicionais editorias, moda, 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 5/27 beleza, comportamento, culinária, decoração, etiqueta, que trazem informações relacionadas à vida das leitoras, formas de facilitar seu diaadia. Por isso, podemos afirmar que, apesar de não trazerem notícias propriamente ditas, as revistas femininas podem ser consideradas jornalismo. Apesar de não conterem informações na forma clássica, elas trazem informações que influenciam o comportamento de seu público diretamente. Misturadas ao entretenimento e falando com um público direcionado e específico, essas informações são repassadas de forma leve e direta, através de uma linguagem peculiar. Editorial: o espelho das revistas A linha editorial seguida por um meio de comunicação, ou seja, as opiniões, a postura diante dos acontecimentos, dos fenômenos sociais, aquilo que, como pregam as regras dos manuais de jornalismo, não deve transparecer nos textos jornalísticos, tornase assunto para os editoriais. O editorial é um texto curto, presente, geralmente, nas primeiras páginas do jornal ou revista, que tece um comentário a respeito de um determinado tema, na maioria das vezes um assunto polêmico, analisado pelas matérias que se seguem ou algum fato de importância durante aquele período de tempo. Pode ser caracterizado como uma conversa entre o veículo e o leitor. Através dele podemos conhecer a posição do jornal ou revista a respeito dos mais variados assuntos. Algumas vezes pode trazer um resumo daquilo que o leitor irá encontrar nas páginas seguintes. José Marques de Melo (1985) divide os gêneros jornalísticos em opinativos e informativos. Dentro dessa classificação podemos destacar o editorial. Para Melo (1985), o editorial “é um gênero jornalístico que expressa a opinião oficial da empresa diante dos fatos de maior repercussão no momento”. A opinião expressa nele não diz necessariamente respeito a uma pessoa, já que na maioria das vezes não é assinado, mas de um conjunto de pessoas relacionadas ao meio de comunicação em questão. Para Beltrão (1980), a finalidade do editorial é aconselhar e dirigir as opiniões dos leitores. Por isso a importância de se ler o editorial quando se quer saber o que está impresso nas páginas de um veículo de comunicação. Para o jornalista Miguel Urbano Rodrigues (2005), o editorial deve conter as expressões mais importantes das tensões e fenômenos da 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 6/27 sociedade, aquilo que é importante para a vida dos leitores. Pessoalmente, penso que a personalidade editorial resulta de uma soma de componentes unidas por fios de interdependência: as opções temáticas, a unidade de estilo e linguagem, a coerência ideológica, a mundividência da história e da aventura cultural, a firmeza na sustentação das posições defendidas, a capacidade autocrítica, o rigor informativo, a sensibilidade para a captação do essencial, e sobretudo a solidez da ponte que liga o editorial ao jornal de que é parte (Rodrigues 2005. Disponível:resistir.info). De acordo com Rodrigues (2005), o editorial deve conter o pensamento e o agir de um jornal, não a opinião de pessoas específicas dentro da redação. Para isso, aconselha que o editorial seja escrito por diversas pessoas, que se revezem em sua escrita durante a semana e incorporem o espírito do veículo de comunicação, de tal modo que, ao ler o texto, o leitor não perceba que diferentes pessoas o escreveram naquele período de tempo. Sendo de execução individual, o editorial apareceme como resultante de uma idéia coletiva, de uma atmosfera, de uma síntese harmoniosa de estilos e pessoas diferenciadas sem os quais não existiria aquele corpo vivo autônomo, vocacionado para falar com o leitor e inspirarlhe confiança. (Rodrigues 2005. Disponível:resistir.info). Melo (1985) classifica e aponta cinco características do gênero editorial. Segundo ele, um editorial deve conter impessoalidade, mostrar que o texto não é uma opinião pessoal, mas de várias pessoas que fazem parte da empresa; plasticidade, pois,de acordo com ele, não devem ser estáticos, mas ter uma continuidade; condensabilidade, ou seja, ser claro e breve, obedecendo ao ritmo da sociedade de consumo de informação atual e topicalidade, o editorialista deve escolher apenas um assunto específico para ser comentado. Rodrigues (2005) coloca que a principal característica que o editorialista deve ter em mente ao iniciar seu texto é a importância do tema. Ao escolher um tema significativo para o editorial, o autor do texto não ficará sem assunto 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 7/27 por um bom tempo, poisele não se esgotará em apenas uma página, podendo ser retomado nas próximas edições. A escolha do tema, para Rodrigues (2005), deve estar relacionada com o que está sendo noticiado no corpo do jornal. Segundo ele, a interação entre as matérias, as manchetes, as reportagens e o editorial faz com que o veículo ganhe um ar de interação, confere ao jornal aquela imagem de ser vivo e coerente. As revistas femininas diferem muito do jornalismo tradicional. As diferenças não estão presentes somente nos temas que ela trata, mas também no seu formato. O que é regra para um jornal diário, pode não se adequar quando se trata da imprensa feminina. Em relação aos editoriais, essa diferença também pode ser percebida, se compararmos as fórmulas e definições apresentadas por pesquisadores da área de comunicação com os textos escolhidos para este trabalho. Em primeiro lugar, eles não tratam de temas noticiosos da atualidade. Geralmente versam sobre situações do diaadia da mulher, ou falam sobre a produção da edição da revista. Para a pesquisadora Adriana Braga (2005), nas revistas femininas o processo organizacional é transformado em discurso. Neste movimento, as revistas tornam “notícia” o seu próprio processo produtivo, tematizando, por exemplo, a produção das fotografias para a capa. Outra diferença é que nas revistas femininas o editorial é, na maioria das vezes, assinado, mostrando assim, de quem é a voz que fala ao leitor. No caso dos escolhidos para esse trabalho, quem assina os textos são as editoras de redação da revista nas diferentes épocas, as quais falam com a mulher de forma direta e pessoal. Prevalece o tom de conversa entre a editora e a leitora, de forma intimista, mais atenuada do que nas matérias que seguem no interior da revista. A editorialista coloca suas impressões e até cita exemplos de seu cotidiano para exemplificar algumas situações. Escrever para mulheres: a história da imprensa feminina A primeira revista feminina de que se tem notícia surgiu na Inglaterra, em 1693. Lady’s Mercury (Mercúrio das Senhoras) trazia pauta variada e, mais tarde, foi copiada por todo o mundo. Nessa época, as revistas desse estilo traziam uma fórmula editorial voltada aos afazeres domésticos, às novidades da moda, algumas traziam até moldes de roupas e bordados, grande novidade que se popularizou e teve grande importância na homogeneização das vestimentas e diminuição das 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 8/27 diferenças entre a classe operária e burguesa entre os séculos XIX e XX. No Brasil, a pioneira foi a carioca O Espelho Diamantino, periódico de política, literatura, belas artes, teatro e modas dedicado às senhoras brasileiras, que trazia textos didáticos e leves sobre política nacional e internacional, trechos de romances estrangeiros, críticas de literatura, música e artes, notícias sobre moda, além de crônicas e anedotas. Segundo Scalzo (2004), as revistas femininas foram aparecendo no Brasil aos poucos, a maioria delas escritas por homens. Também existiram as escritas por feministas preocupadas com sua condição social, mas foram poucas e tiveram vida curta. Atualmente, o mercado editorial feminino ocupa o segundo lugar na venda de revistas, perdendo apenas para as revistas de informações. Um fator importante que merece destaque é a diferença entre imprensa feminina e feminista. Segundo Buitoni (1990), a imprensa feminina é aquela escrita para o público feminino, já a feminista, embora seja voltada para o mesmo público, diferese por se basear na defesa dos direitos das mulheres. Na década de 50, surge uma novidade que fez grande sucesso por muito tempo: as fotonovelas, histórias recheadas de romantismo que encantavam as leitoras. Nessa época, as revistas reproduziam os modelos sociais, não tentavam mudar a condição da mulher. Foi apenas a partir de 1963 que o jornalismo feminino começou a mudar no Brasil e essa mudança se deve à jornalista e psicóloga Carmen da Silva, colunista da revista Cláudia. Sua coluna “A arte de ser mulher” quebrou tabus tratando de assuntos que eram silenciados, como machismo, solidão, trabalho, alienação, sexo. A representação da mulher nos meios de comunicação Os meios de comunicação atuam como veículos de representação social. Segundo João Carlos Cattelan, uma representação social é um conhecimento social, constituído por uma forma de ler o mundo. É a forma com que um objeto é visto por sujeitos sóciohistóricos, é a concepção de sujeitos que se posicionam frente a outros, que representam e são representados de maneira diferente. Para Chartier (1990, p. 25), “práticas e representações pressupõem usos e funções diferenciais dos mesmos objetos, leituras plurais de indivíduos, grupos e da sociedade sobre os 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 9/27 mesmos fenômenos e os variados argumentos possíveis”. Para ele, o conceito de representação permite designar realidades essenciais: em primeiro lugar, as representações coletivas que incorporam nos indivíduos as divisões de mundo (as classificações) e que organizam os esquemas de percepção e avaliação, a partir dos quais se orientam o julgamento e a ação. A seguir, também, designamse as formas de exibição do ser social ou do poder político, tais como se dão a ver pela imagem, pelo rito, pela estilização da vida, por sinais, pela arte. Assim, as imagens apresentam ou reapresentam (na modalidade do tempo), ou substituem (na modalidade do espaço), as situações de interação entre os indivíduos e as relações que as articulam às determinações longínquas, às vezes invisíveis, que tornam possível sua realização. Recuperar as imagens produzidas pela mídia, buscar traços e gestos esquecidos, marcas perdidas, significa reconstituir as representações dessa sociedade. Por meio da representação, fundamse os paradigmas do espaço, do tempo, da compreensão da matéria, do signo, da representação, das linguagens, do discurso e do conhecimento. A representação é uma forma de se fazer apresentar o objeto da materialidade crua do mundo, para inserilo na trama do signo, da palavra e, assim, outra vez apresentálo. A representação é da ordem do sígnico ou simbólico, do real possível e do imaginário. A representação envolve uma relação ambígua entre ausência e presença. Ela é a presentificação de um ausente, que dá a ver uma imagem mental ou visual e, por sua vez, suporta uma imagem discursiva. Ela, pois, enuncia um outro distante no espaço e no tempo, estabelecendo uma relação de correspondência entre ser ausente e ser presente que se distancia do mimetismo puro e simples. Ou seja, as representações do mundo social não são o reflexo do real, nem a ele se opõem de forma antitética, numa contraposição comum entre imaginário e realidade concreta. Ocorre, no ato de tornar presente, a construção de um sentido ou de uma cadeia de significações que permite a identificação. Representar, portanto,tem o caráter de anunciar, “pôrse no lugar de”, estabelecendo uma semelhança que permita a identificação e reco¬nhecimento do representante com o representado. Por outro lado, as representações do mundo social não se medem por critérios de veracidade ou autenticidade, e sim pela capacidade de mobilização que proporcionam ou pela credibilidade que oferecem. Podese dizer que o discurso que emana da mídia 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 10/27 comporta, também, a preocupação com a verossimilhança. Esse discurso não seria, pois, o avesso do real, mas outra forma de captálo, em que os limites de criação e fantasia são mais amplos que aqueles permitidos ao historiador, por exemplo. Uma representação social é, então, uma visão do mundo. Levando em consideração que os meios de comunicação trabalham com representações, a realidade presente neles é apenas uma versão do real, feita a partir de um ponto de vista dentro da sociedade. Por isso, não podemos considerar, por exemplo, que a mulher representada na revista Nova corresponda exatamente ao perfil de suas leitoras. Para Swain, A televisão, as novelas, os romances, as revistas em quadrinhos, as revistas em geral, os jornais, a internet, etc., em seu espaço de recepção e interação, veiculam representações sobre as mulheres, os homens, a sociedade. Imagens e textos compõem um mosaico que integra a maneira de se perceber o mundo e o desenho de sua positividade (Swain, 2001. Disponível: ojs.c3sl.ufpr.br). Ao representar a figura feminina, constróise, projetase e estabilizase a identidade social, em processos definidos histórica e culturalmente. As práticas sociais de representação vigentes de uma certa época se cristalizam em formas textuais. É possível associar as representações às ordens de discurso a que estão genealogicamente relacionadas e, também, a outros discursos que circulam na sociedade. As práticas discursivas, além de sua dimensão constitutiva na construção social da realidade, constituem também ação social. O ato de representar reconstrói e reinterpreta o mundo e, por meio do trabalho de substituição do real pela imagem posta, ser representado é sempre mediatizado pelo discurso que o constrói, muitas vezes a realidade da coisa confundese com a deformação figurada desta realidade, no sentido de desfazer o baralhamento entre causas e efeitos. Mulheres na linha do tempo: uma história Analisando a história da humanidade, podemos perceber que as mulheres sempre ficaram em segundo plano. Quando se trata do relato da história, elas dificilmente aparecem. Foi somente a partir da década de setenta, junto com a eclosão 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 11/27 dos movimentos feministas por todo o mundo, que alguns estudiosos começaram a perceber que as mulheres não apareciam nos estudos históricos. Iniciaramse, então, correntes que procuraram recuperar a história da mulher dentro da sociedade. Mais tarde, esses estudos começaram a percorrer outras áreas das ciências humanas, como a literatura, por exemplo. A história das mulheres mudou. Em seus objetos, em seus pontos de vista. Partiu de uma história do corpo e dos papéis desempenhados na vida privada para chegar a uma história das mulheres no espaço público da cidade, do trabalho, da política, da guerra, da criação. Partiu de uma história das mulheres vítimas para chegar a uma história das mulheres ativas, nas múltiplas interações que provocam a mudança (Perrot, 2007, p. 15). A partir disso, foi possível perceber que papel da mulher, durante muito tempo, foi voltado apenas ao ambiente privado. Eram mães, esposas, filhas, que tinham sua importância relegada ao último plano. Criase, então, a imagem da mulher em dois opostos extremos, ao mesmo tempo em que são submissas, podem ser perigosas, pois qualquer ato mais ousado é uma forma de desafiar a ordem estabelecida dentro da sociedade patriarcal. Isso fica claro principalmente nas representações que a literatura faz das mulheres através dos séculos. A história da literatura traz imagens contraditórias como as da Nossa Senhora, da mulher idealizada, da bruxa, da jovem inocente, da sedutora, da mãe dedicada ou da femme fatale. A diversidade das imagens estereotípicas, porém, se junta numa estrutura dualista: elas dividem o feminino numa forma idealizada e demoníaca. Até há pouco tempo atrás, a maioria das mulheres recebia uma educação voltada apenas para os afazeres domésticos, não tendo acesso à cultura e às informações. Não tinham direito ao voto e não podiam trabalhar fora de casa. Além disso, era preciso que se mantivesse casta, para isso sendo vigiada durante a vida toda, primeiramente pelo pai, e, mais 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 12/27 tarde, pelo marido, na falta deste, pelos filhos. (Reisner, 1999. Disponível: www.quintocoiote.com). A grande mudança veio com as I e II Guerra Mundial, com os maridos nas frentes de batalha, as mulheres precisaram tomar frente aos negócios e do sustento da casa. Com a consolidação do capitalismo, os direitos trabalhistas das mulheres foram revistos e estas passaram a disputar os postos de trabalho, antes exclusivos dos homens. Começou então a luta pelos direitos da mulher, de igualdade trabalhista, que mais tarde acabou abrangendo também outros campos. Surge então um movimento denominado feminismo. O feminismo, segundo Branca Moreira Alves & Jaqueline Pitanguy (1985), traduzse por um processo que teve suas raízes fincadas no passado e se construiu no cotidiano, sem ter um ponto determinado de chegada. O feminismo busca repensar e recriar a identidade de um sexo sob uma ótica em que o indivíduo, seja ele homem ou mulher, não tenha que adaptarse a modelos hierarquizados, e onde as qualidades ‘femininas’ ou ‘masculinas’ sejam atributos do ser humano em sua globalidade (Alves e Pitanguy, 1985, p. 9). As principais bandeiras levantadas pelas primeiras feministas eram a do trabalho e a do direito ao voto, por isso, elas foram chamadas de sufragistas. Embora pregassem a liberdade feminina, essa liberdade ficava apenas no setor público. Questões como a sexualidade ficaram de fora das discussões. No Brasil da década de setenta, os brasileiros viviam o contexto da ditadura militar. Censura, repressão às manifestações populares e a qualquer possível crítica ao governo, faziam parte do diaadia da sociedade setentista. Ao mesmo tempo, ocorria a consolidação do capitalismo, com o apoio dos militares ao investimento de capitais estrangeiros no país. O movimento feminista da época mudava de foco. Alguns dos direitos femininos tão reivindicados já tinham sido atendidos, pelo menos na teoria. A mulher já podia votar, já tinha mais autonomia dentro dasrelações de trabalho e direito à educação. Isso se deu devido à abertura de novas vagas no mercado de trabalho, aumento das necessidades de consumo e das conquistas e reivindicações dos movimentos feministas internacionais. Mas a grande mudança que ainda 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 13/27 não havia acontecido era na mente dessas mulheres. A grande luta nesse momento era contra a mentalidade tradicional, que ainda não estava acostumada com as “modernidades” femininas da época e ainda acreditava que as mulheres deviam ficar relegadas ao ambiente doméstico. A década de 70 é considerada pelas feministas como de grandes vitórias e da chegada ao poder. As revistas femininas agiam nessa época como incentivadoras desse comportamento dito moderno. De acordo com Herbale (2004), estudos sobre revistas femininas mostram as contradições presentes em seu discurso, ora incentivam e apóiam atitudes progressistas e transgressoras das mulheres, ora sugerem restrições e punições para quem infringir as regras da sociedade. No Brasil da década de setenta, em meio à mentalidade tradicional o país se modernizava. Novos costumes e idéias de liberdade eram apresentadas e recebidas com curiosidade e desconfiança. A revista Nova, então, agia como uma incentivadora das mulheres na conquista de sua liberdade, principalmente sexual e emocional. Para Lima (2003), “no torvelinho dessas mudanças, emerge, no Brasil, uma novidade no discurso dos periódicos destinados a mulheres de classe média: a otimização do trabalho fora das cercanias domésticas e o sexo prazeroso como assunto a ser tratado por elas.” Da década de setenta até os dias atuais, muitas mudanças podem ser percebidas em relação às mulheres. Em apenas trinta anos, concretizaram se conquistas que não foram obtidas durante séculos. A luta pela igualdade no trabalho já está estabelecida, pelo menos na teoria, há algum tempo. O número de mulheres nas universidades é cada vez maior. A luta pela liberdade sexual também não é mais uma preocupação das feministas. Ao contrário, o que preocupa as defensoras dos direitos femininos atualmente é a banalização da sexualidade feminina. Não se discute mais o direito da mulher em relação ao seu corpo, o que preocupa é a mulher ter se tornado um objeto em prol da publicidade. Apesar da proliferação dos textos e imagens no murmúrio contínuo e inesgotável do cotidiano ocidental, a apropriação social do discurso se dá em diferentes instâncias discursivas, lugares de fala, posições de autoridade que legitimam ou excluem, delimitam ou expandem as hierarquias e os valores definidores de sentido e de 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 14/27 lugares sociais, na Ordem do Discurso, na economia de um imaginário em que se pode detectar a hegemonia das representações tradicionais e naturalizadas de gênero (Swain, 2001. Disponível em: www.letras.ufrj.br). Atualmente, não são mais os homens ou os valores sociais que oprimem as mulheres. A opressão se dá de outras formas, como as duplas jornadas de trabalho. Mulheres e homens continuam a assumir os lugares destinados a cada um dos sexos, no qual as mulheres voltamse para a maternidade e para casa e os homens para o público e a vida social. De acordo com Maria Inês Ghilardi Lucena (2002), a imagem da mulher tem se modificado com o passar do tempo, mas o ideal de domesticidade ainda permanece. Essa mulher tem agora a possibilidade de pedir ajuda ao homem nas tarefas diárias, mas sua responsabilidade só aumentou, pois tem que dar conta de seu papel tradicional e também do novo. Além disso, a beleza, ideal desejada pelas mulheres em todas as épocas, impõe modelos de perfeição cada vez mais difíceis de serem alcançados. Os meios de comunicação e a publicidade são responsáveis por divulgar e impor esses modelos. A beleza não é mais natural, mas sim, algo que pode ser comprado. Se a mulher tem que ser bela, deve ser principalmente para ter sempre ao seu lado um companheiro (namorado, marido, amante). Tradicionalmente, ela apenas tornavase atraente para ser conquistada. Agora, ela é quem conquista, num jogo de sedução em que é possível ousar, mas nem sempre se convém. A imagem de moça comportada está dando lugar à de mulher liberada. De conquistada a conquistadora (Ghilardi Lucena, 2002.). As contradições percebidas na condição da mulher na atualidade podem ser percebidas quando analisamos a representação de sua imagem nos meios de comunicação. Ao mesmo tempo em que querem colocar a mulher como ser independente, livre das antigas amarras, acabam recaindo num discurso que prova que as mudanças talvez não tenham sido incorporadas como se pensa. Para McRobbie (2003), isso demonstra sinais da presença do pósfeminismo, que implica a co existência de valores neoconservadores em 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 15/27 relação a gênero, sexualidade e vida familiar, com processos de liberação em relação à escolha e à diversidade nas relações domésticas, sexuais e de parentesco. Também abarca a existência do feminismo como algo que foi em algum momento transformado em uma forma de senso comum gramsciano, enquanto também foi ferozmente repudiado, quase odiado (MCROBBIE, 2003) O ‘levar em conta’ permite uma ampla desconstrução das políticas feministas e o descrédito das manifestações ocasionais para sua renovação. A Cosmopolitan e o novo modelo de mulher A primeira revista a tratar de forma direta de temas polêmicos para sua época surgiu no país em 1973. Percebendo uma lacuna no mercado editorial para o público de mulheres entre vinte e trinta anos, a editora Abril lança a revista Nova. Filiada à rede Cosmopolitan, Nova, segundo dados da própria Abril, foi mudando à medida que a sociedade se transformou. No começo, falar de sexo era tabu e a revista teve o papel de desmistificar o tema, trazendo à tona a sexualidade da mulher, assunto proibido na época. De acordo com a pesquisadora Luisa Guimarães Lima, a linha editorial da revista Nova imitava a tendência temática das revistas dessa época. Em 1970, incorporando todos os “avanços”, começa a despontar um novo “tipo” de representação da mulher nas páginas dedicadas ao público feminino: a “liberada e a marginal” (Buitoni, op. cit.). Buitoni caracteriza a década como frutífera para a venda do assuntosexo na produção editorial da época. Revistas masculinas e femininas teriam o tema como um diferencial de potencialidade de consumo das suas páginas. Antenados com a revolução sexual, que modernizava as relações de gênero nos Estados Unidos e na Europa, esses periódicos tentavam transpor as novidades de relacionamento para o solo brasileiro, a despeito de em alguns momentos elas serem incompatíveis com o que era corrente em matériade experiência nacional (Lima, 2003. Disponível em reposcom.portcom.intercom.org.br. A própria história da Cosmopolitan explica sua vocação editorial. A revista foi inventada por uma secretária, Helen Gurley Brown, autora do livro Sex and the Single Girl (O Sexo e as Solteiras). O 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 16/27 livro fez tanto sucesso que, em 1962, a autora procurou um editor para propor uma revista que falasse sobre os mesmos temas: carreira profissional, independência, relacionamentos. A Cosmopolitan foi a primeira revista que começou a tratar a mulher como indivíduo, sendo que as outras publicações a colocavam sempre como dona de casa e esposa. Ela, também, mostrou que os interesses e preocupações das mulheres em todas as partes do mundo são parecidos, prova disso foi que a revista espalhouse por diversos países. De acordo com a pesquisadora Luísa Guimarães Lima, a Cosmopolitan foi lançada nos Estados Unidos num cenário de pós guerra, no qual a maioria das mulheres trabalhava fora. A mentalidade dessas mulheres estava em transformação e, por isso, os anseios de emancipação mostravamse presentes na revista. Hoje, segundo a editora Abril, a Cosmopolitan tem quarenta e sete edições diferentes, em 23 idiomas, que circulam por mais de 100 países e fala com aproximadamente 36 milhões de mulheres em todo o mundo por mês. No Brasil, sua tiragem é de 400 mil exemplares mensais. Na época de seu lançamento, foi realizada uma pesquisa de público e percebeuse que havia mais aceitação por um nome brasileiro, por isso a Cosmopolitan virou Nova/Cosmopolitan. Segundo o atendimento ao leitor da Abril, a maior parcela de suas leitoras são solteiras e estão na faixa dos 18 aos 49 anos. Por isso, prevalecem nas matérias as temáticas relacionadas ao namoro, como etiqueta sexual no primeiro encontro, paquera, namoro, idéias para apimentar a relação. Segundo a Abril, Nova retrata uma mulher em busca de autoconhecimento, da afirmação no trabalho e da satisfação sexual. É aquela mulher que quer crescer em todos os sentidos, trocando experiências afetivas e explorando seu potencial como mulher e profissional. A “nova” mulher em diferentes épocas Ao compararmos as edições de julho de 1976 e de janeiro de 2007, percebemos que quanto ao formato da revista, as mudanças não foram tão significativas. É claro que devemos levar em consideração o avanço tecnológico da imprensa, mas em relação à estrutura em que os temas são distribuídos pela revista as mudanças foram poucas. Ela é basicamente a mesma, com algumas seções que permanecem iguais, mudando apenas o título. Por exemplo, seções em que as leitoras podem expressar suas opiniões sobre a revista se mantêm, em 1976 com o nome de “Você e Nova” 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 17/27 e, atualmente, com “Opinião Livre”. Colunas nas quais são feitas críticas e sugestões de livros e cd ´s (discos), filmes, também, continuam presentes. O tradicional horóscopo marca sua presença nesses trinta anos de existência da revista. Cuidados com a beleza, dicas de moda, de saúde, artigos contendo relatos de problemas do diaa dia, fotos e entrevistas com famosos, até uma consulta com um psicólogo, na década de setenta, chamada “O divã do analista” e, atualmente, “Terapia de cinco minutos”. Nas matérias maiores, de duas páginas ou mais, estão temas mostrados e analisados de forma mais completa, que tratam de assuntos que variam de sexo e comportamento à saúde e esportes. Na edição de julho de 1976, a revista traz nove matérias sobre comportamento, variando entre sexo, psicologia, solidão e até uma enquete sobre a importância ou não de oficializar um casamento. Quando comparada à edição de 2007, podemos perceber que aumentaram as matérias e colunas que têm o sexo como a principal temática. Outra observação importante são as colunas “Para ele ler” e “Adoro ser solteira”, a primeira destinada a maridos e namorados, trazendo dicas sobre como agir com suas parceiras para um relacionamento tranqüilo e feliz para ela. A segunda é destinada para mulheres que não têm namorado; traz dicas de programas para o fim de semana, vantagens de não ter compromisso com ninguém, amizade e temas afins. As matérias de comportamento, contando somente as que têm duas páginas ou mais, somam doze e tratam quase dos mesmos temas que há trinta anos: namoro, sexo, relacionamentos sociais, saúde e beleza. Os dois editoriais escolhidos para a análise foram selecionados por falarem de temas relacionados ao perfil da mulher representado pela revista nas duas épocas. O ponto de vista da revista é, nos dois editoriais, personalizado pelas vozes das editoras de redação, Fátima Ali, em 1976, e Cynthia Greyner, em 2007. Na década de 70, enquanto o assunto sexo ainda é tabu, a revista é considerada pelas leitoras como uma amiga, que ouve e entende seus problemas. “Você fala de sexo com alguém? Discute, faz perguntas?” (Nova, 1976, p. 4). Assim, começa o editorial de Fátima Ali, editora de redação. Dessa forma ela já começa seu texto criando um vínculo com a leitora, tratandoa por “você”, como se tivesse intimidade com ela. E a postura de amiga fica bem clara quando ela fala: “Porque sexo é decididamente assunto proibido, e mesmo a mais íntima amiga deixa de manter um diálogo aberto quando sexo entra na 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 18/27 conversa” (Nova, 1976, p. 4). Nesse momento, a argumentação utilizada faz a mulher ter a sensação de que a revista é sua melhor amiga, pois ela tem coragem de falar de um tema tão complicado, e esclarecer suas dúvidas. A mulher, geralmente, sozinha em sua preocupação a respeito do tema sexo, não se sente mais sozinha, pois tem a revista para ouvila e entendêla. Por isso, em cada número, Nova se propõe a falar com você de maneira franca e aberta, esclarecendo dúvidas, mostrando que você não é a única no mundo com esses problemas, ajudando você a entender melhor a situação em que se encontra, para que você mesma busque uma saída (Nova, 1976, p. 4). Ao mesmo tempo em que a revista se coloca como alguém que auxilia, ela também dá autonomia e liberdade para essa mulher. Ajuda, dá dicas, mas deixa livre para que a leitora faça aquilo que considerar mais adequado. A revista deseja ser para as leitoras, uma amiga. Essa estratégia é muito utilizada pelas revistas femininas para conquistar seu público. Por meio de assuntos cotidianos e ao mesmo tempo polêmicos, ela cria um vínculo de amizade com a leitora. Para isso, Fátima Ali escreve como se estivesse dando um conselho, olhando diretamente para os olhos de surpresa ou compreensão dessa mulher, o que deixa bem claro no seguinte trecho: Muitas leitoras nos escrevem dizendo que gostam da linguagem de NOVA, que têm a impressãode que estamos conversando com elas. Bem, essa é uma das principais características dos textos que publicamos, e representam o resultado do trabalho e esforço dos nossos editores, que fazem de tudo para conversar com você nos artigos (Nova, 1976, p. 4). A edição do mês de julho de 1976 traz duas matérias sobre sexo. A primeira “Lua de Mel, sem Segredos, Sem Mistérios”, fala sobre os mitos das primeiras noites após o casamento. Se considerarmos o contexto da década de setenta, em que a virgindade ainda era um tabu, podemos entender a preocupação em se esclarecer à noiva a importância desse acontecimento. Como o próprio editorial afirma, pouco se falava de sexo entre mulheres e os livros e revistas que podiam ser esclarecedores eram escassos. Por isso, a maioria das mulheres casavase virgem e 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 19/27 acreditando em histórias fantasiosas sobre essa primeira noite. A editora acrescenta sobre esse assunto que “supervalorizamos a importância dessa noite, mas tomamos muito poucas providências para que ela dê certo” (Nova, 1976, p. 4). A segunda matéria comentada por Fátima Ali é “Sexo: Prazer ou obrigação”. Sobre essa matéria, a editora coloca que para muitas mulheres o sexo é encarado como uma “obrigação de esposa”, assim como cuidar dos filhos ou fazer compras. Podemos perceber que o sexo, é aqui, veiculado diretamente ao casamento, instituição social responsável por legalizálo. Não é colocada, em toda a revista, matéria em que o discurso incentive as mulheres a manterem relações sexuais fora do casamento. A única vez em que essa situação aparece é na coluna “Divã do Analista”, em que uma jovem pede auxílio à psicóloga, pois se sente culpada em ter mantido relações com o namorado e não quer ser considerada pela família como “uma moça livre”. Podemos observar que a vocação da revista Nova, de ter o sexo como tema principal de suas edições, confirmase desde os primeiros anos de sua existência no Brasil. O editorial dessa edição, que pode ser considerado um resumo das matérias nela veiculada, mostra que as matérias mais importantes versam sobre o assunto. O que se observa, no entanto, nessas matérias é que elas têm um foco maior nos aspectos científicos do sexo, com ênfase na parte fisiológica, tudo devidamente embasado em pesquisas e descobertas científicas. Há também uma profusão de técnicas de como melhorar o prazer – aqui, com a intenção de impressionar o parceiro. No entanto, notase uma preocupação em passar a idéia de que o sexo é parte de uma relação duradoura, com base na crença de que o sexo pode trazer, perpetuar ou mesmo revitalizar o amor. Fátima Ali afirma que “o que queremos mesmo é conversar muito com você e ajudála a não se sentir tão só”, mostrando que o problema enfrentado por essas mulheres era recorrente entre a maioria das leitoras e, mais uma vez, coloca a revista como uma espécie de psicóloga, que poderia ajudar essas mulheres. Outro tema comentado é sobre a publicação do “Guia Prático para você entender o noticiário político”. Segundo Ali é grande a dificuldade das mulheres em entenderem as matérias sobre política publicadas nos jornais. 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 20/27 Sei que muitas desejam se manter atualizadas com respeito à política. Mas sei também da dificuldade que encontram em entender as palavras tão difíceis do noticiário dos jornais e das revistas. (...) Como queremos que você seja uma mulher atualizada, estamos tentando dar uma mãozinha, publicando o ‘Guia Prático para você entender o noticiário político’(Nova, 1976, p. 4) A mulher há pouco tempo havia saído, ou ainda nem havia saído do mundo privado para ter contato com o chamado “mundo dos homens”, por isso, sentia necessidade em estar interada dos assuntos considerados masculinos, como política, economia e generalidades. Dessa forma, havia certa dificuldade em entender do que tratavam essas matérias. Nesse ponto podemos perceber a contradição no discurso da revista. Ao mesmo tempo em que tenta ajudar a mulher a se interar de termos ditos “difíceis”, assume que ela ainda não tem capacidade para entender determinados assuntos, provando a dificuldade desta em viver nesse mundo controverso, no qual se exigia que ela fosse também um pouco “homem”, ou seja, soubesse determinadas coisas, fosse mais liberal em relação a sua sexualidade. Apesar de trazer à mulher um pouco mais de independência, a revista mostra, ainda, a dificuldade dessa relação. Por meio do editorial podemos perceber que os principais temas que preocupavam a mulher representada em Nova da década de setenta eram, primeiramente, o sexo, sua desmistificação, a quebra dos tabus e a busca pelo prazer sexual feminino dentro do casamento e, também, a transição do mundo doméstico para o universo público, a mulher dando os primeiros passos, ainda cambaleantes no mundo do trabalho. Dessa forma, é possível afirmar que a revista passa a assumir um papel muito importante para a nova sociedade, na medida em que de um lado pode informar, divertir ou orientar, e por outro lado, reforçar preconceitos e estereótipos preexistentes em nossa cultura que influenciarão os relacionamentos e/ou ajudarão a estabelecer novos padrões. A mídia, então, promove imagens positivas, facilitando mudanças estruturais na sociedade. É interessante observar, igualmente, que a veiculação de mensagens contraditórias, muitas vezes em um mesmo veículo, amplia não só a ambivalência como também a diferença de expectativas entre homens e mulheres. Em 2007, a relação da mulher com o mundo é diferente. Decidida, mais firme em relação à sua sexualidade, a revista Nova deseja passar a imagem de uma mulher independente, sem tabus 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 21/27 em relação ao sexo, com boa situação financeira dona de sua vida e suas decisões. O editorial de janeiro de 2007 traz como título “Os princípios sagrados da mulher de Nova”. São trinta e sete dicas de como deve agir e como é esta mulher, que tem sua identidade diretamente ligada com a revista. “Esta é a nossa edição número 400! Para comemorar, decidi escrever esta ‘bíblia’. Em 2007, toda mulher de Nova jura...” (Nova, 2007, p. 8). Os mandamentos dessa bíblia variam sobre relacionamentos pessoais, profissão, sexo e auto estima. Enquanto a mulher da década de setenta tinha receios a respeito de conversar sobre sexo, a mulher de hoje, de acordo com a representação da revista, sabe exigir seu prazer e não tem vergonha disso. Apesar disso, parece que essa mulher talvez tenha ainda algumas restrições sobre o assunto. Isso aparece na dica número dez desse editorial: “Ter direito de falar de sexo, pensarem sexo, desejar sexo e, claro, fazer muito sexo” (Nova, 2007, p. 8). Ao analisar um pouco melhor essa frase e o conteúdo da revista em si, podemos perceber que a Nova apresenta um estereótipo de mulher independente, que vive sua sexualidade ao máximo sem ter vergonha ou receios de fazer aquilo que bem entende. Isso não significa que esse estereótipo seja o de suas leitoras. É preciso lembrar que a revista trabalha com representações e, por isso, a mulher representada na revista pode não corresponder exatamente ao estereótipo de suas leitoras. Prova disso são os depoimentos deixados num site de relacionamentos da internet, onde existem algumas comunidades destinadas às leitoras da revista. Algumas delas reclamam que a revista tem muitas matérias falando sobre sexo e, principalmente, da palavra “sexo” estar estampada na capa da revista diversas vezes, o que, segundo elas, causa constrangimento quando a assinatura chega a seu prédio, ou quando vão às bancas comprar a revista. A segunda dica da bíblia de Nova mostra a disparidade do discurso da revista, a mulher que exige seu espaço e expõe sua independência, retoma os discursos que tanto condena. Ela mostrase submissa ao homem, esforçandose para agradálo. A segunda dica da bíblia de Nova já mostra isso, “Caprichar nas idéias para deixar o namorado louquinho e receber muitos agradecimentos depois...” (Nova, 2007, p. 8). Agradar ao homem. Este parece ser o objetivo da “mulher de Nova”. E isso fica claro nas matérias da revista, onde aparecem muitas dicas, 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 22/27 principalmente relacionadas ao sexo, de como satisfazer o parceiro. Nos mandamentos seis e sete, outra contradição. Enquanto o número seis incentiva a mulher a ser financeiramente independente, “dona do próprio nariz”, dizendo que deve pagar suas próprias contas, o número sete indica: “Deixar que ele pague o restaurante, o barzinho, o motel.” Outra prova de que as mudanças não foram tão grandes assim. Esse item mostra que apesar da mulher tentar essa independência, algumas atitudes cavalheirescas ainda são valorizadas. A mulher busca a independência financeira, mas quando se trata do relacionamento homem/mulher, a relação de dependência deve ser mantida, ressaltando os papéis do homem como provedor e da mulher como submissa. O direito ao prazer sexual entra em questão para essa mulher dos anos 2000, como as mulheres da década de setenta, ela ainda levanta bandeiras sobre o assunto. “Ter direito a (pelo menos) um orgasmo por seção” (Nova, 2007, p. 8). Essa frase prova que, mesmo com tantas mudanças, o prazer ainda é algo que precisa ser exigido pela mulher. A grande diferença é que agora o prazer não depende mais de ser casada ou não. A mulher tem maior liberdade em ter relações com namorados ou com outros homens, segundo a revista, com menos tabus. Ao contrário da mulher da década de setenta, que muitas vezes encarava o sexo como obrigação, em que a mulher precisava ficar casada com um homem com quem não tinha uma vida sexual prazerosa por conveniências sociais, a mulher atual sabe exigir seu prazer. Outra mudança é que a “mulher de Nova”, hoje em dia, tem mais possibilidades de provar, em busca de um homem que se encaixe mais com seus anseios sexuais, profissionais e de personalidade. “Beijar muitos, sem culpa, até achar os lábios certos” (Nova, 2007, p. 8), “Ter direito a um homem com pegada” (Nova, 2007, p. 8). Esse direito à escolha é uma novidade quando comparada a algumas atrás. Uma grande mudança que podemos perceber é que a mulher se tornou mais independente. Atualmente, ela não precisa mais estar vinculada a um homem para se sentir realizada, tanto que a grande parte, ou melhor, todos os mandamentos, são destinados à mulher solteira, que tem namorado ou não. Podemos perceber, também, que a maioria dessas mulheres trabalha, e são responsáveis pelos seus gastos. Assim, muitas das dicas da “bíblia de Nova”, são relacionadas ao trabalho e ao dinheiro. “Ser craque em renegociar dívidas” (Nova, 2007, p. 8), “Não ficar parada 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 23/27 esperando o trabalho dos sonhos, o salário que pediu a Deus” (Nova, 2007, p. 8), “Ser reconhecida no trabalho” (Nova, 2007, p. 8). A relação com o sexo oposto parece ser de tensão. A “mulher de Nova” acredita que tem o controle do relacionamento e por isso sentese segura para “fingir” que é submissa ao homem. Ou ela tenta explicar sua submissão fingindo que é dona da situação? “Usar a sabedoria feminina para driblar a crise masculina” (Nova, 2007, p. 8). Os papéis parecem se inverter, a mulher, normalmente a protagonista das crises, entra aqui como a apaziguadora dos conflitos, utilizando a “sabedoria feminina”. Essa “sabedoria” pode ser, nada mais nada menos, do que a velha submissão. Para acalmar o parceiro a mulher utiliza a mesma tática que talvez fosse conhecida das mulheres de outros tempos, deixar de lado aquilo que pensa em favor de um relacionamento pacífico. “Ser reconhecida profissionalmente” (Nova, 2007, p. 8). A procura por ser reconhecida na profissão, mostra a passagem da mulher do universo privado para o público. Essa mudança ainda não foi aceita totalmente pela sociedade, pois ser reconhecida profissionalmente ainda é um direito pelo qual a “mulher de Nova” tem que lutar. O formato do texto do editorial utilizase de antíteses, o que prova a contradição presente no mundo feminino. Coloca uma mulher forte, mas ao mesmo tempo fraca, dando a entender que esta fraqueza seria uma opção da mulher: “ser forte nos momentos difíceis” (Nova, 2007, p. 8), “Ser fraca nos momentos difíceis” (Nova, 2007, p. 8), “Ir em frente” (Nova, 2007, p. 8), “Recuar quando for preciso” (Nova, 2007, p. 8), “Sofrer chorar, ir ao fundo do poço se não tiver mais jeito e surgir do outro lado como uma pessoa melhor, fortalecida e mais madura” (Nova, 2007, p. 8). A impressão que se tem é que a revista “sabe” que a mulher é frágil, que isso é de sua natureza, mas aconselha essa mulher a lutar contra si mesma e se fortalecer. A preocupação com a aparência também se faz presente no mandamento “Passar a quilômetros da dieta de alface e água” (Nova, 2007, p. 8). O trecho mostra a importância dada a beleza, que leva algumas mulheres a se submeterem a dietas perigosas para sua saúde. Numa sociedade em que o ideal de beleza é ser cada vez mais magra, quem não se encaixa nesses estereótipos sentese deslocada, pois a importância da imagem é supervalorizada. Ao mesmo tempo em que aconselha as mulheres dos perigos das dietas, a revista traz em suas páginas fotos de modelos, produzidas, com roupas 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 24/27 e maquiagens que evidenciam um corpo livre de gorduras ou qualquer imperfeição.Não se deve fazer dietas radicais, mas para ficar bonita, qualquer sacrifício é válido. “Ser a mais sexy, mais amada, a mais guerreira, a mais feliz” (Nova 2007), finaliza o editorial Cynthia Greiner. O último mandamento resume o que é ser uma “mulher de Nova”. A beleza vem em primeiro lugar. A mulher precisa ser sexy para ser amada, amada não só por um homem, mas para se sentir aceita no meio social. A beleza seria, então, a característica mais importante que uma mulher pode ter. Mas, graças aos avanços da medicina estética, se não nascer bonita, a mulher tem a condição de “se tornar bonita”. Nos dias atuais, com o advento das cirurgias plásticas, do avanço das indústrias de cosméticos, as mulheres não têm mais desculpas de se manterem feias. Principalmente se levarmos em consideração o público a que é destinada a revista, com um poder aquisitivo razoável. Depois disso ela precisa ser guerreira, lutar por aquilo que deseja, pois apesar de ser sexy e amada, ela precisa ir de encontro com sua natureza frágil e submissa, que não está de acordo com as mulheres da época em que ela vive. Caso consiga reunir essas três qualidades, ser sexy, amada e guerreira, a mulher conseguirá se sentir realizada e, assim, feliz. Conclusão As mulheres mudaram. Hoje em dia, os direitos tão defendidos, do trabalho, da independência, já foram conquistados. Mas, embora essas conquistas pareçam estar estabelecidas, a desigualdade ainda acompanha as mulheres. A diferença de salários, o espanto causado quando elas ocupam lugares tipicamente masculinos, as reclamações sobre a dupla jornada e tantas outras situações diárias mostram que a evolução ainda não chegou ao fim. O objetivo em comparar duas edições de um veículo de comunicação, voltado para o público feminino, de diferentes épocas, foi perceber as diferenças da imagem representada em cada uma das épocas. Nessas revistas, a relação de representação e pauta para os comportamentos das mulheres aparece de forma clara. Mas, ao mesmo tempo em que incentiva a mulher a tomar atitudes consideradas modernas, seu discurso ainda valoriza as antigas relações de poder e submissão entre homem mulher. Na década de setenta, a revista Nova traz uma imagem de mulher em conflito. Ao mesmo tempo em que as mudanças a empurravam para um comportamento mais independente, isso se choca com a mentalidade tradicional em que ela estava 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 25/27 inserida. A relação é difícil, a mulher não sabe se adota os novos comportamentos e é criticada socialmente ou se continua com seus valores e é chamada de ultrapassada. A revista então, ao invés de auxiliar a mulher, como deseja, acaba confundindo mais ainda o comportamento da mulher. Incentiva a liberação da sexualidade, mas a restringe ao universo do casamento, apóia o trabalho da mulher fora de casa, mas “admite” que ela ainda não é capaz de entender certas coisas do mundo masculino. Já nos anos 2000, apesar das conquistas já estarem estabelecidas, a revista traz a representação de uma mulher ainda insegura com sua situação, insegurança essa camuflada, transformada numa característica típica da natureza da mulher. Ela continua sendo um ser frágil, que precisa ser cuidada e que se esforça para agradar ao homem. Para isso, a revista traz conselhos e dicas, que vão de técnicas sexuais, até sacrifícios para alcançar uma forma física atraente, com o objetivo de conquistar o sexo oposto. Terminada a análise, percebemos que, apesar da revista Nova incentivar a liberdade e independência das mulheres, ela acaba reproduzindo o discurso de dependência e submissão. As contradições ficam evidentes quando analisamos o discurso presente nos editoriais da revista, textos estes caracterizados por mostrar claramente a posição da revista a respeito dos assuntos da atualidade. Percebemos, assim, que a mulher de Nova, ao contrário do que a revista busca colocar, é uma mulher em conflito, ao mesmo tempo em que deseja e luta por sua independência, reafirma antigos valores, considerados ultrapassados. NOTAS 1Níncia Cecília Ribas Borges Teixeira é doutora em Letras pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2005), mestre em Letras pela Universidade Estadual de Londrina. Pósdoutora pela UFRJ. É professora adjunta da Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO). Tem experiência na área de Letras e Comunicação Social, atua nas seguintes linhas de pesquisa: Genêro e Representação; Texto, Memória e Diferença Cultural. Tem trabalhos publicados nas Revistas da Anpoll, Vertentes, Publicatio, Terra Roxa e Outras Terras. Email: nincia@unicentro.br ou ninciaborgesteixeira@yahoo.com.br 2Jornalista e graduanda em LetrasLiteratura. REFERÊNCIAS BADINTER, E. 2005. Rumo equivocado: o feminismo e alguns destinos. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, p. 98174. 30/11/2015 A ''nova'' mulher: o estereótipo feminino representado na revista Nova/Cosmopolitan | BorgesTeixeira | Verso e Reverso http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/versoereverso/article/viewArticle/5758/5216 26/27 BELTRÃO, L. 1980. Jornalismo Opinativo. Porto Alegre, Sulina, 118 p. BRAGA, A. 2005. Corpo e agenda na revista feminina. Cadernos IHU Idéias, 40. Disponível: www.unisinos.br, acessado: 23/04/2007. BUITONI, D.S. 1990. Imprensa feminina. 2ª ed. São Paulo, Editora Ática, p 737. CATTELAN, J.C. Matrix!? In: R. BARONAS e M.R.GREGOLIN (Orgs.). Análise do Discurso: as materialidades d sentido, 2ª ed. São Paulo, Editora Claraluz, p. 8394. COELHO, M. 2002. A evolução do feminismo: subsídios para sua história. Curitiba, Imprensa Oficial do Paraná, 389p. CUNHA, M.F. 2001. Homens e Mulheres nos anos 1960/70: um modelo definido? História: Questões & Debates, 34: 201222. 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