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Habitabilidade e lutas pelo o direito a moradia.pdf

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HABITABILIDADE E LUTAS PELO DIREITO A MORADIA
1
 
Ana Paula de Oliveira Vilaça (1); Luis de la Mora (2); 
(1) Mestranda Universidade Federal do Rio Grande do Norte, ana.vilaca@uol.com.br 
(2) Prof. Dr. Universidade Federal de Pernambuco, luis_de_la_mora@hotmail.com 
RESUMO 
A comunicação procura refletir sobre a situação habitacional e urbanística de 421 áreas pobres da 
cidade do Recife, as quais congregam 43,36% dos habitantes, em 40.92% dos domicílios, ocupando 
15,26% da área do município, para denunciar a gravidade do problema posto pelas precárias condições 
de habitabilidade, desta e da maioria das cidades brasileiras, caracterizadas pela heterogeneidade 
urbanística, segregação espacial e exclusão social. 
Num segundo momento, passamos a definir o conceito de habitabilidade, que não se limita apenas às 
condições físicas da unidade habitacional em si, mas a partir de uma visão ampla e integrada de suas 
várias dimensões e componentes, inclui a segurança da posse da terra, o traçado e a morfologia do 
assentamento, a infra-estrutura, os serviços públicos e equipamentos comunitários, e as condições de 
acesso e mobilidade. 
Nesse quadro complexo, marcado pelas desigualdades, emergem os movimentos sociais, como 
manifestação dos excluídos do mercado de trabalho e conseqüentemente do mercado imobiliário, e ao 
mesmo tempo excluídos das políticas urbanas e habitacionais. 
Finalmente, discutimos a relação dialética entre a lógica do capital (mercado imobiliário), a lógica do 
poder (políticas públicas) e a lógica da organização e mobilização popular para inserir-se na “cidade 
para todos” proposta pelas recentes conferências das cidades. 
Palavras-chave: segregação espacial, exclusão social, habitabilidade, movimentos sociais. 
1. INTRODUÇÃO 
Se observarmos o quadro atual das cidades brasileiras, verificamos que a maioria delas são formadas 
por partes radicalmente heterogêneas e constituídas por conjuntos de segmentos sociais distintos, onde 
os ricos vivem isolados por imensos muros, grades e segurança própria, enquanto os pobres vivem 
segregados e marginalizados em áreas inundáveis, nas encostas dos morros, longe da infra-estrutura e 
do alcance dos equipamentos urbanos e comunitários, ou seja, nas áreas precárias e, até o momento, 
não cobiçadas pelo mercado imobiliário. Esses espaços de assentamentos precários marginalizados e 
excluídos se relacionam com a cidade formal, dos que comandam e participam da sociedade, ora de 
forma complementar, através do comércio e dos serviços, ora despertando conflitos de ordem urbana, 
social, gerencial e estética. 
Vale destacar que, no Brasil, o crescimento urbano bem como o desenvolvimento econômico e social 
sempre ocorreram associados à inclusão econômica subalterna e a exclusão social, especialmente com 
o fim da escravatura e a transformação do antigo escravo em trabalhador livre, mas agudamente pobre, 
no final do século XIX, quando as cidades começaram a ganhar nova dimensão e surgiu, de fato, o 
problema da habitação. VILLAÇA (1986) assinala que o que entendemos hoje por problema da 
habitação surgiu com o “homem livre” produzido pelo capitalismo e por suas configurações históricas, 
inclusive pelas especificidades da luta de classes que sob ele ocorrem. Segundo o autor, com o 
desenvolvimento do capitalismo e dos bens necessários para atender às necessidades humanas, a 
habitação começou a assumir a forma de mercadoria. 
 
1
 http://www.clacs04.org/tem_por.htm. Nome do Evento: claCS 04/ ENTAC 04, São Paulo, 
julho 2004 
 
A exclusão econômica e social de grande parte da população, frente ao processo de produção do 
espaço urbano fortemente regulado pela lógica do mercado, tem impossibilitado o acesso de grandes 
contingentes populacionais à produção formal da cidade. A intensa invasão de terras urbanas no 
Brasil, que se vincula diretamente ao processo de urbanização do país, é uma questão estrutural, 
institucionalizada pelo mercado imobiliário excludente e pela ausência de políticas urbanas e 
habitacionais adequadas. No centro dessa problemática, está a questão da valorização fundiária e 
imobiliária, que define quem se apropria dos ganhos imobiliários e quem tem direito à cidade. 
Os obstáculos ao mercado habitacional formal constituídos pelo acentuado nível de pobreza e a 
política habitacional incapaz de atender as demandas crescentes da população, impedem, do ponto de 
vista dos gestores, um desenvolvimento urbano adequado e sustentável e estimula a produção de 
irregularidades. Porém, vale destacar também as funestas conseqüências para os próprios excluídos, 
que são obrigadas a viver em péssimas condições de habitabilidade, ou seja, em situações de 
precariedade e insegurança da posse, insalubridade e desconforto, além da violência e da 
promiscuidade decorrente da alta densidade residencial. 
Diante do quadro acima descrito, ressaltamos que esses assentamentos precários se multiplicaram nas 
várias cidades do país durante todo o século XX, através da solução de casa própria, empreendida 
pelos próprios moradores, que resolveu em grande parte o déficit de novas habitações surgido com a 
urbanização acelerada. Em função do grande número e da consolidação dessas ocupações, buscamos 
discutir as condições de habitabilidade dos assentamentos precários, bem como o papel dos 
movimentos sociais nesse processo, focalizando o caso da cidade do Recife. 
2. OS ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS NO RECIFE 
A cidade do Recife ocupa uma área de 220 km2, formada de subáreas com características próprias, 
que se distribuem da seguinte forma, 67,43% da superfície da cidade é formada por ambiente de 
morros de pequena elevação, 23,26% de ambiente de planície aluvionar e 9,31% de ambiente aquático. 
A cidade possui uma população urbana de 1.422. 905 habitantes, sem apresentar nenhuma zona rural, 
estando dividida em seis Regiões Político-Administrativas denominadas: RPA1 – Centro , RPA2 – 
Norte, RPA3 – Noroeste, RPA4 – Oeste, RPA5 – Sudoeste e RPA6 – Sul, que compreende os 93 
bairros da cidade. (PREFEITURA DO RECIFE;FUNDAJ, 2001). 
O processo de urbanização se fez por aterros nas áreas de maré e nas terras procedentes dos latifúndios 
originários dos antigos engenhos de açúcar, onde as terras planas e secas adquiriram maior valor 
imobiliário, enquanto os baixios sujeitos a inundações e os terrenos dos morros que circundam a 
cidade passaram a ser ocupados pela população mais pobre. A estrutura urbana moldada pela 
economia açucareira – com a concentração de terras nas mãos de poucas famílias – e o fato de ser o 
Recife uma cidade situada entre o oceano, os rios e os alagados, tem favorecido o surgimento de 
conflitos de propriedade que acompanham desde o início o crescimento da cidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 01 – Vista geral da ocupação da cidade do Recife 
 
Dessa forma, o cenário urbano atual do Recife é caracterizado por fronteiras tênues entre áreas de alto 
valor de marcado, com padrões nobres de edificações e serviços de infra-estrutura, e assentamentos 
populares com casas precárias e tecido urbano tortuoso, sem infra-estrutura adequada, cujo contexto de 
contrastes nos dá a idéia da presença de dois mundos num só lugar. A cidade é então marcada por 
acentuadas desigualdades nas condições de moradia e de acesso a bens e serviços de consumo 
coletivo. Parcelas significativas da população, mais de 40%, residem em áreas com condições 
precárias de habitabilidade, que se estendem no centro e na periferia, nos morros e nas planícies. Hoje, 
no Recife, nenhum ponto está a mais de 1,2 Km destes assentamentos. 
Segundo dados do Censo 2000, o Recife possui 376.022 domicílios particulares permanentes,sendo 
88% com abastecimento d’água ligado a rede geral, 97% possuem banheiro ou sanitário e 96% tem o 
lixo coletado. No que se refere ao esgotamento sanitário, 43% dos domicílios estão ligados à rede 
geral de esgoto ou pluvial, enquanto 15% possuem fossa séptica. Em se tratando da renda, em 53% do 
total de domicílios a pessoa responsável pelo domicílio recebe até dois salários mínimos. 
O Cadastro de Áreas Pobres da Cidade do Recife (2001)
2 
identificou 421 assentamentos pobres na 
cidade, com um total de 659. 076 pessoas e 154.158 domicílios, com uma densidade demográfica 
bastante alta. O diagnóstico das áreas pobres do Recife mostra que as condições de moradia da 
população de baixa renda, de modo geral, estão muito aquém dos padrões desejáveis, não somente do 
ponto de vista das necessidades individuais, isto é, das unidades habitacionais em si, mas também das 
carências coletivas, ou seja, das condições básicas de infra-estrutura das áreas onde se localizam as 
habitações em que vive essa população. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 02 – Mapeamento das áreas pobres da cidade do Recife 
 
2 PCR-URB/UFPE-FADE. Cadastro de Áreas Pobres da Cidade do Recife, 1998.In: PREFEITURA DO RECIFE;FUNDAJ, 
2001 
 
Quadro 01 – Precariedade Habitacional da cidade do Recife 
 ÁREAS POBRES 
(Cadastro 1998) 
RECIFE (Dados 
Censo 2000) 
% DAS ÁREAS POBRES EM 
RELAÇÃO AO RECIFE 
ÁREA (ha) 3357,14 22000 15,25% 
POPULAÇÃO (hab) 659.076 1.422. 905 46,31% 
DOMICÍLIOS (unid) 154.158 376.022 41,00% 
DENSIDADE (hab/ha) 196,32 64,64 ------- 
Fonte: PREFEITURA DO RECIFE; FUNDAJ, 2001 
Em relação a topografia, os assentamentos pobres se distribuem da seguinte forma: 143 (33,97%) 
assentamentos ocupando 1933,54ha (57,59%) de áreas de morros, 243 (57,72%) assentamentos 
ocupando 1254,55há (37,37%) de planície e 35 (8,31%) assentamentos ocupando 169,05há (5,04%) 
de alagados. Muito embora os morros sejam preponderantes em termos de hectares, eles não o são 
quando a referência é o número de assentamentos, o que leva à conclusão de que a pobreza se encontra 
mais concentrada na planície. Quase 70% desses assentamentos apresentam algum tipo de risco 
relacionado à topografia da área onde se encontram localizados, aparecendo o desabamento e a 
inundação como os fatores de risco predominantes. (PREFEITURA DO RECIFE;FUNDAJ, 2001). 
 
Figura 03 - Expansão sobre encosta de morro, no Vasco da Gama, Buriti. 
Fonte: Programa Viva o Morro, 2003. 
Com relação ao tempo de existência, dos 421 assentamentos pobres existentes, 380 (90,26%) tem mais 
de 10 anos de existência, já se encontrando, portanto, consolidados no tempo e com uma história 
sendo construída a cada dia. Os demais tem entre 5 e 10 anos, 36 (8,55%), e somente 5 áreas (1,19%) 
têm até 5 anos de existência. No que se refere à renda familiar, constata-se o predomínio de 296 áreas 
(70,31%) com faixa de rendimento entre 1 e 2 salários mínimos, verificando-se ainda 49 áreas 
(11,64%) com renda familiar inferior a 1 salário mínimo. Esses dados indicam a dimensão da pobreza 
em que se encontra a população das áreas pobres do Recife. (PREFEITURA DO RECIFE;FUNDAJ, 
2001). 
O padrão construtivo das áreas pobres é, de modo geral, bastante precário, no entanto, a tipologia 
construtiva predominante, é a alvenaria, que aparece em 89,31% do total de assentamentos. Em 
seguida, estão 9,74% dos assentamentos com predomínio de restos de materiais, 0,71% com 
predomínio de madeira e 0,24% com predomínio da taipa. Em se tratando da infra-estrutura, chama 
atenção os dados referentes ao esgotamento sanitário e à drenagem, onde 92,16% das áreas pobres não 
possuem rede de esgoto e em 40,86% a ausência de drenagem é total. (PREFEITURA DO 
RECIFE;FUNDAJ, 2001). 
Diante desse quadro, o Recife tem se destacado a nível nacional com propostas inovadoras na 
intervenção de áreas pobres, uma vez que, desde o início da década de 80, institucionaliza grande parte 
de suas áreas pobres como Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS e, posteriormente, cria o Plano 
 
de Regularização das ZEIS – PREZEIS, que se torna um instrumento de planejamento e participação 
popular de referência. No entanto, o levantamento da produção habitacional na última década mostra 
que os resultados e os impactos ainda são inexpressivos, mesmo nas áreas ZEIS, que foram os espaços 
privilegiados pelas intervenções. 
3. DISCUTINDO AS CONDIÇÕES DE HABITABILIDADE 
A dualidade entre a cidade formal x cidade informal é uma constante na maioria de nossas cidades. 
GORDILHO-SOUZA (2000:15), ao tratar da relação pobreza/urbanização, define segregação como 
“separação da população no espaço habitacional por classes sociais relacionadas à renda, em 
localizações distintas, com características físico-ambientais diferenciadas”, e conceitua exclusão 
como “privação do direito dos benefícios urbanos individuais e coletivos”, os quais se revelam nas 
cidades brasileiras através de espaços segmentados para cidadãos e não-cidadãos, construídos de 
forma aleatória, deficiente e desassistidos pelo poder público. Tais espaços constituídos pelos 
assentamentos populares são caracterizados pela sua precariedade que se expressa pela ocupação 
desordenada das habitações, ocupação de áreas de risco (áreas inundáveis, encostas...), carência de 
infra-estrutura física, equipamentos urbanos insuficientes, irregularidade do assentamento quanto à 
propriedade do solo e/ou quanto às condições de uso e ocupação do solo previstas nas legislações, 
predação ambiental, desemprego, pobreza, violência e proliferação de doenças. 
Assim, é possível perceber nas nossas cidades, cuja reprodução do espaço segue a lógica capitalista, a 
existência desses dois fenômenos: a segregação espacial e a exclusão social, que determinam 
diferentes condições de habitabilidade e de acesso às benfeitorias urbanas. Diante desse contexto, 
buscamos discutir o que entendemos por condições de habitabilidade a fim de se compreender o 
problema habitacional de uma forma mais ampla e integrada, e que a partir daí, sejam elaboradas 
propostas mais abrangentes e que garantam a sustentabilidade das iniciativas. 
Primeiramente, acreditamos que as condições de habitabilidade se referem não apenas às questões 
relacionadas à unidade habitacional em si, mas à configuração urbana, de posse da terra, de oferta de 
infra-estrutura, equipamentos comunitários e serviços públicos, condições de higiene e salubridade 
bem como de acesso e mobilidade que envolvem todos os tipos de assentamentos precários. 
Procuraremos a seguir apresentar algumas indicações e/ou recomendações para cada um desses 
aspectos apresentem soluções adequadas e sustentáveis. 
Em relação a unidade habitacional, o material de construção deve ser durável e resistente, o número 
mínimo de cômodos deve ser quarto, sala, banheiro e cozinha, as divisórias internas devem garantir 
privacidade, as instalações elétricas e hidráulicas devem ser bem instaladas e seguras, e deve-se 
garantir ainda uma boa ventilação e iluminação. 
No que se refere à configuração urbana consideramos como princípio básico a permanência da 
população nas suas áreas de origem, buscando manter as características do parcelamento e da estrutura 
fundiária, bem como respeitar as estruturas físicas das edificações existentes, para que se possa, a 
partir daí, elaborar projetos de intervenção específicos para essas áreas.Trata-se de intervir sobre uma 
realidade estética de uma paisagem em que a ocupação original não foi orientada por um projeto 
técnico, “resultando em uma qualidade espacial específica, social e historicamente construída”. 
(BUENO,2000). O estudo e identificação das configurações espaciais distintas; a leitura e análise dos 
padrões de ocupação segundo a sua decomposição em elementos analíticos tais como a forma urbana e 
os tipos construídos; e a análise das relações entre os edifícios e o lote permite a elaboração de 
projetos mais sustentáveis e adequados à realidade local. 
A fim de se promover a regularização jurídica da posse da terra em áreas ocupadas pela população de 
baixa renda devem ser utilizados três instrumentos, de acordo com cada caso: Usucapião para áreas 
particulares, com posse ininterrupta e sem oposição de no mínimo 5 anos, com área máxima de 250m
2
, 
não sendo proprietário de outro imóvel urbano ou rural e sendo utilizada para fins de moradia; a 
Concessão de Uso Especial para fins de moradia, no caso de terras públicas e a CDRU – Concessão do 
direito real de uso, aplicável a terrenos públicos ou particulares, de caráter gratuito ou oneroso, para 
fins de urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra ou outra utilização de interesse social. 
A oferta de infra-estrutura deve estar baseada em projetos elaborados especificamente para a realidade 
dos assentamentos precários, com preocupações de custo, qualidade, cobertura e sobretudo de 
manutenção, de modo que contemple: rede de água, rede de esgoto, rede de drenagem, rede viária, 
pavimentação, rede elétrica e rede telefônica. 
Os serviços públicos devem ser ofertados de maneira eficiente e eficaz, sobretudo com qualidade e 
regularidade, dentre os quais destacamos: coleta e tratamento do lixo, inclusive com a possibilidade de 
implementação de programas de coleta seletiva;limpeza pública e varrição, eliminação de vetores, 
através, de vacinação e fumacé, por exemplo; programas preventivos de saúde como os de agentes de 
Sáude da Família; Iluminação Pública em todas as ruas e áreas de convivência, Segurança Pública e 
Correios. 
Os equipamentos comunitários visam incentivar e promover a sociabiliade da comunidade, 
minimizando inclusive problemas relacionados às drogas e violência, e assim devem ser definidos de 
acordo com os anseios e as potencialidades locais, dentre os quais ressaltamos: creches, escolas, 
centros profissionalizantes, centros comunitários, Postos de Saúde, Postos de Segurança Comunitária, 
praças, parques, campos de futebol e Ponto de ônibus. Esses equipamentos possibilitam uma maior 
convivência entre as pessoas, bem como uma maior integração dos assentamentos precários com as 
áreas vizinhas. 
As boas condições de higiene e salubridade devem ser buscadas através de algumas medidas que 
visem tornar a área drenada, saneada, sem lama nem poças d’água, sem poeira, sem esgoto à céu 
aberto, sem mosquitos e ratos, onde as redes de água e esgoto, drenagem, coleta de lixo, limpeza 
pública e o combate aos vetores funcionem adequadamente. 
No que se refere ao acesso e à mobilidade, deve-se evitar a necessidade de percursos longos, onde se 
precise caminhar no máximo 10 minutos, sobretudo por conta das crianças e idosos. O transporte 
coletivo deve ser priorizado e devem ser observadas algumas condições: o ponto de ônibus deve ficar 
próximo a comunidade e deve ser protegido das intempéries, a freqüência das linhas deve ser 
adequada a demanda, devem ser assegurados conforto, rapidez e segurança nos transportes, bem como 
o preço das passagens devem ser compatíveis com os rendimentos da população. Além do transporte 
coletivo, podem ser incentivados outros meios de transporte, como a bicicleta. 
Como vimos, o acesso da população a adequadas condições de habitabilidade é mediado pelo acesso 
ao Mercado de Trabalho, ao Mercado Imobiliário e ao Mercado Político, bem como pela atuação das 
Políticas Urbanas e Habitacionais, onde fatores como dinheiro, prestígio, educação e 
profissionalização acabam favorecendo e beneficiando às camadas privilegiadas, restando apenas a 
união e a luta para as classes mais pobres como possibilidades de se alcançar as condições de 
habitabilidade tão almejadas. 
4. EXLUSÃO SOCIAL E MOVIMENTOS SOCIAIS 
O quadro descrito acima, caracteriza com todo seu rigor as manifestações de exclusão social 
conseqüências do modelo de desenvolvimento adotado no Brasil desde os primórdios da sua formação 
social, econômica e política. 
A exclusão econômica, decorrente de altas taxas de desemprego e de subemprego e da baixa 
remuneração, contribui de forma essencial para a conformação de um cenário de exclusão social ou 
ainda de espoliação urbana que Kowarick define como “o somatório de extorsões que se opera 
através da inexistência ou precariedade de serviços de consumo coletivo que se apresentam como 
socialmente necessários em relação aos níveis de subsistência e que agudizam ainda mais a 
dilapidação que se realiza no âmbito das relações de trabalho.” (KOWARICK,1979:59). 
Essas manifestações de exclusão social se expressam de diferentes maneiras: na falta de acesso e 
pouca permanência na escola de enormes contingentes da população, agravada ainda pela má 
qualidade do ensino básico oferecido nas redes públicas; nas condições de saúde, decorrentes da má 
alimentação e das condições de higiene precárias, acentuadas pela ausência de serviços preventivos 
eficazes e pelo precário funcionamento dos serviços básicos de saúde. É fácil relacionar as precárias 
condições de higiene à inexistência ou mal funcionamento dos serviços relativos aos saneamento: 
infra-estrutura de abastecimento d’água, drenagem, coleta de esgoto e lixo, além do combate aos 
vetores transmissores de doenças. 
As condições de habitabilidade descritas na primeira parte desta comunicação descrevem com toda 
clareza as condições subhumanas as quais estão condenados os habitantes pobres das nossas cidades. 
Nesta situação, como conseqüência de processos de reflexão crítica da prática, espontânea ou 
estimulada por agentes de conscientização, é que emergem os movimentos sociais na esfera da 
reprodução e do consumo, para encontrar formas de sobrevivência dentro da cidade excludente. Para 
nós, os movimentos sociais surgem quando uma determinada categoria social toma consciência de 
alguns aspectos da sua situação de espoliação e organiza seus componentes para lutar visando a 
preservação ou conquista de um direito reconhecido como legítimo e justo por eles
3
 
São varias as formas como a Sociedade Civil se relaciona com o Estado, como por exmplo, através da 
eleição dos governantes, aqueles que por um determinado período dirigirão dos destinos da cidade, do 
estado ou do país, e através do pagamento de impostos, fonte de recursos para colocar em movimento 
a maquina administrativa e promover políticas públicas em beneficio dos contribuintes, que são 
também eleitores. Quando a população que elegeu e que paga impostos espera serviços públicos que 
não chegam na quantidade e principalmente na qualidade requerida para assegurar uma vida digna 
para os habitantes, surge assim uma outra forma de relação: alguns membros da sociedade mais 
esclarecidos, refletindo sobre suas precárias condições de existência resolvem organizar-se e 
mobilizar-se para exigir serviços de educação, saúde, cultura, lazer, justiça, segurança e 
principalmente acesso à cidade: acesso ao solo urbano, à uma casa com as condições mínimas de 
segurança, conforto e higiene, ao transporte público para permitir o acesso ao trabalho, escola ou 
locais de abastecimento. 
5. LUTAS URBANAS PELA CONQUISTA DE CONDIÇÕES DIGNAS DE 
HABITABILIDAE 
Nas nossas cidades, a forma natural de acesso ao solo urbano e a moradia dá-se através do mercado 
imobiliário onde a oferta de terrenos e de unidades residenciais se encontram com a demanda 
constituída pelos compradores dotados de capital próprio ou muito mais freqüentemente de crédito.Acontece que os custos da produção do espaço habitável são dados pelos custos dos terrenos, dos 
materiais de construção, das máquinas, da tecnologia, da mão de obra, dos juros do capital empregado, 
dos impostos e da taxa de lucros, entre outros fatores. 
Os números e a capacidade dos compradores, considerada demanda solvável, decorrem do potencial 
de gerar renda no mercado de trabalho. A população dotada de capacidades e principalmente 
oportunidades radicalmente heterogêneas enfrenta o mercado de produção e trabalho também de forma 
muito diversificada. Como conseqüência, um grande número de pessoas não consegue ingressar no 
mercado de trabalho formal e vão aumentar o exército de desempregados e trabalhadores eventuais, 
sempre sub-remunerados. 
Aqueles que superam, de alguma maneira, essa primeira barreira vão enfrentar o mercado imobiliário 
onde encontrarão facilidades ou dificuldades para ingressar nele. Os que conseguem, atingem 
finalmente o sonho almejado: ter acesso formal à cidade, os que não, continuarão fora do mercado 
imobiliário utilizando-se das mais diversas formas alternativas. 
De forma similar a este processo de acesso ao espaço urbano e a moradia, gerido e configurado pela 
lógica da acumulação do capital via maximização de lucros e minimização de custos e 
conseqüentemente de qualidade, do outro lado temos a vertente do acesso ao solo urbano e à moradia 
via a política pública habitacional. 
Analogamente à via de acesso através do mercado de trabalho e imobiliário, nesta outra via, antes de 
enfrentar os critérios de seleção de cada programa habitacional, os habitantes tem que superar um 
mercado preliminar: o mercado político, que assim como o mercado de trabalho, inclui ou exclui os 
grupos dependendo do perfil político do governante em turno. Tem governos que priorizam as 
políticas urbanas e habitacionais de inclusão social mais que outros. E mesmo aqueles que facultam o 
acesso dos excluídos aos programas habitacionais, tem comportamentos diferenciados: uns utilizam 
critérios e procedimentos mais democráticos, transparentes e justos na hora de selecionar candidatos, e 
outros continuam a utilizar critérios e procedimentos clientelistas e eleitoreiros. 
Assim pela via da política urbana e habitacional termos como resultado que alguns terão acesso à 
cidade, ao solo urbano e a moradia, e outros, infelizmente a maioria, irão juntar-se ao contingente dos 
 
3
 DE LA MORA, Luis. “Os movimentos sociais na formação do espaço urbano recifense” In: RESENDE et al. 
Recife que estória é essa? Recife: Fundação de Cultura da Cidade do Recife, 1987. 
excluídos do mercado de trabalho. 
Resta uma terceira via. Uma via síntese entre as duas anteriores. A via que exige a organização e a 
mobilização de grupos de sem-teto, para conquistar o direito à cidade. Esta terceira via é constituída 
pelos excluídos do mercado de capital e do mercado de poder. No entanto, confrontam tanto o capital 
quanto o poder. As ocupações urbanas quebram a legalidade do código civil, do direito à propriedade, 
mesmo atribuindo um grande valor à propriedade, tanto é que estão lutando para ter acesso a ela. 
Confrontam também a ordem mantida pelo poder público, não sendo raros os atos de violência nos 
enfrentamentos com a polícia. Mas por outro lado, organizam outra ordem para assegurar o sucesso e a 
sustentabilidade da ocupação. As decisões tomadas coletivamente constituem regra sagrada respeitada 
por todos. A unidade do movimento, o respeito ao acordado entre eles constitui a garantia da 
permanência no local. 
A lógica da primeira via é fundada no lucro e na capacidade de compra dos clientes. A lógica da 
segunda via é fundada na legitimação do poder público e na capacidade do povo de se fazer ouvir. Ao 
passo que a lógica da terceira via é fundada na união, na organização, na persistência e na luta para 
conquistar um lugar numa cidade para todos. 
6. MUDANÇAS DE PARADIGMAS NAS POLÍTICAS URBANA E 
HABITACIONAL 
Nesse contexto de confronto e luta entre interesses hegemônicos do capital e do Estado legitimador da 
exclusão social de um lado e os excluídos do mercado de trabalho e do poder de outro, os atuais 
paradigmas das Políticas Urbanas e Habitacionais registram sinais de mudança. 
As políticas excludentes do ponto de vista econômico e político desenvolveram ao longo dos tempos 
ações de erradicação das sub-habitações: mocambos, cortiços, casebres, etc. As políticas de 
desfavelização, implantadas desde a primeira metade do século XX no Brasil, tiveram sua origem no 
higienismo que, pretendendo erradicar as doenças, combatia os seus focos. Assim, o mocambo, o 
casebre, a favela eram considerados focos de doenças (físicas e sociais) e conseqüentemente deveriam 
ser erradicados (com seus habitantes dentro deles). Erradicava-se a favela e o favelado. 
Felizmente, o ideário urbanístico excludente e segregador começou a mudar nas últimas décadas do 
século XX com o surgimento de uma nova maneira de perceber e interpretar a cidade. A política 
urbana e habitacional que começa a consolidar-se fundamenta-se nos princípios da inclusão social, da 
agregação dos diferentes no espaço urbano e da construção da cidadania. Destacamos, nesse sentido, o 
papel fundamental dos movimentos sociais pois acreditamos que padrões de habitabilidade mais 
elevados só serão alcançados quando a população conseguir desenvolver canais de reivindicações 
vigorosos e autônomos, tanto no que se refere às condições de trabalho como de melhorias urbanas. 
Nesta nova perspectiva, a cidade é o locus no qual as pessoas exercitam sua cidadania, sua 
humanidade e sua dignidade. A cidade é um meio, as pessoas são o fim, as pessoas são o foco de 
atenção. A cidade deve ser construída e preservada de tal forma que permita oferecer condições dignas 
de habitabilidade para todos os seus habitantes bem como inclusão econômica, social, cultural e 
política. Assim procedendo, caminharemos no sentido de podermos construir uma cidade para todos. 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
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desmanchando consensos. Rio de Janeiro: Vozes, 2000. 
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São Paulo. 
DE LA MORA, Luis. “Os movimentos sociais na formação do espaço urbano recifense” In: 
RESENDE et al. Recife que estória é essa?Recife: Fundação de Cultura da Cidade do Recife, 1987. 
GORDILHO-SOUZA, Ângela. Limites do Habitar: segregação e exclusão na configuração urbana 
contemporânea de Salvador e perspectivas no final do século XX. Salvador: EDUFBA, 2000. 
KOWARICK, Lúcio. A espoliação urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. 
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que estória é essa?. Resende, Antonio Paulo, et alii. Fundação de Cultura da Cidade do Recife, 1987. 
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Prefeitura do Recife; FUNDAJ, 2001. 
VILLAÇA, Flávio. O que todo cidadão precisa saber sobre Habitação. São Paulo: Global, 1986.

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