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AMANDINO TEIXEIRA NUNES JUNIOR PRINCípIOS CONSTITUCIONAIS ELEITORAIS O uestão relevante que se coloca hoje na doutrina jurí-dica refere-se aos princípios, impondo-se evidenciar,preliminarmente, o que se entende por princípio. __ Robert Alexy afirma que os princípios "são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida pos- sível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes".! São mandados de otimização que podem ser satisfeitos em graus variados a partir das possibilidades jurídicas e fáticas. Como espécies de normas, os princípios não devem ser confundidos com regras. Estas contêm determinações espe- cíficas, que devem, ou não, ser satisfeitas. Salienta o autor que, "se uma regra vale, então, deve-se fazer exatamerÚe aquilo que ela exige; nem mais, nem menos. Regras contêm, portanto, determinações no âmbito daquilo que é fática e juridicamente possível".2A aplicação dos princípios se faz pela ponderação, ao passo que a das regral', pela subsunção. Nessa perspectiva, Luis Roberto Barroso assinala que os princípios constitucionais são o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados básicos e seus fins. De forma sumária, os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui. 3 Observa o autor que "a dogmática moderna avaliza o entendimento de que as normas jurídicas, em geral, e as normas constitucionais, em particular, podem ser enqua- dradas em duas categorias diversas: as normas-princípio e as normas-disposição".4 Assim, as normas-princípio (ou simplesmente princípios) distinguem-se das normas-disposição (também referidas como regras) pelo seu maior grau de abstração e por sua posição mais destacada dentro do ordenamento. São formu- ladas de maneira vaga e indeterminada, constituindo espaços livrespara a complementação e desenvolvimento do sistema, podendo concretizar-se em um sem-número de hipóteses. Por sua vez, as normas-disposição apresentam um grau de abstração reduzido, e têm eficácia restrita às situações específicas às quais se destinam. No chamado pós-Positivismo, não há mais questiona- mento sobre a normatividade dos princípios, que assumem a função de normas jurídicas, identificando valores ou fins e revelando um conteúdo axiológico ou uma decisão polí- tica. Têm eficácia direta (incidência imediata sobre o caso), eficácia interpretativa (dando o sentido e o alcance do sig- nificado das normas) e eficácia negativa (afastando a apli- cação de normas em desconformidade com seu comando). Na seara do Direito Eleitoral, quatro princípios merecem destaque: (i)princípio da autonomia dos partidos; (ii)prin- cípio da igualdade (ou da isonomia) da disputa eleitoral; (iii) princípio da moralidade eleitoral; e (iv) princípio da anualidade (ou da anterioridade) da lei eleitoral. 62 REVISTA JURíDICA CONSULEX - ANO XVI- N° 372 -15 DE JULHO/2012 O princípio da autonomia dos partidos está expressa- mente consagrado no texto constitucional. Com efeito, a Constituição, no seu art. 17,dispõe sobre os partidos políticos como instrumentos necessários e importantes para preser- vação do Estado Democrático de Direito, afirmando a liber- dade de criação, fusão, incorporação e extinção dos partidos políticos e conferindo-lhes a função de assegurar, resguar- dados a soberania nacional, o regime democrático e o plu- ripartidarismo, a autenticidade do sistema representativo e, de defender os direitos fundamentais da pessoa humana. O art. 17,§1°,assegura aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funciona- mento, e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.5 Note-se que a autonomia partidária, deferida constitu- cionalmente, imuniza o partido político da interferência do legislador ordinário, mas não o imuniza totalmente contra a atuação normativa do Legislativo, desde que compatível com os parâmetros e limites estabelecidos pela Constituição. Por sua vez, o princípio da igualdade (ou da isonomia) da disputa eleitoral está consagrado no art. 5°, caput, da Cons- tituição, que determina que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". Assinala José Jairo Gomes que o princípio em tela adquire especial relevo no Direito Eleitoral, já que rege diversas situ- ações. Basta lembrar que os concorrentes a cargos político- -eletivos devem contar com as mesmas oportunidades, res- salvadas as situações previstas em lei - que têm em conta o resguardo de outros valores - e as naturais desigualdades que entre eles se verificam.6 Disto decorre a necessidade da regulação das campanhas eleitorais, do controle da propaganda eleitoral, da neutrali- dade dos Poderes Públicos, da vedação ao abuso do poder político ou econômico, e da imparcialidade dos meios de comunicação social. Já o princípio da moralidade eleitoral está inscrito no art. 14,§9°, da Constituição. Observa José Jairo Gomes que esse princípio conduz a ética para dentro do jogo político. Significa dizer que o mandato obtido por meio de práticas ilícitas, antiéticas, imorais, não goza de legitimidade. Mais que isso, implica que o mandato político deve ser sempre conquistado e exercido dentro dos padrões éticos aceitos pela civilização.7 Asociedade brasileira clama, a cada dia, a defesa da ética na política, razão pela qual revela-se fundamental a proteção do princípio da moralidade eleitoral, consubstanciada em lei complementar que tenha por escopo a possibilidade de decretação da inelegibilidade daqueles que não guardam as condições necessárias, a partir da análise das suas vidas pregressas, para o exercício de cargos ou funções públicas, conforme prevê o referido art. 14, §9°, do texto constitucional. Em face do atual panorama principiológico, a eficácia e a efetividade do princípio da moralidade eleitoral estão sendo exigidas com o máximo de intensidade no âmbito dos fenômenos eleitorais, a começar com a postura a ser adotada pelos candidatos a cargos eletivos. Veja-se, a pro- pósito, o movimento recente pela aprovação da chamada Lei da Ficha Limpa. Por fim, o princípio da anualidade (ou da anterioridade) eleitoral está preconizado no art. 16da Constituição, segundo o qual "a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência". Aduz José Jairo Gomes que o princípio em comento tem em vista impedir mudanças casuísticas na legislação elei- toral que possam surpreender os participantes do certame que se avizinha, beneficiando ou prejudicando candidatos. Também visa propiciar estabilidade e segurança jurídica acerca das normas a serem observadas. a Note-se que o art. 16,ao submeter a alteração legal do pro- cesso eleitoral ao princípio da anualidade, torna-se verdadeira cláusula pétrea. Assim, quaisquer restrições a esse princípio, trazidas no bojo de uma reforma constitucional, apenas serão válidas na medida em que não afetem ou anulem o exercício dos direitos fundamentais que conformam a cida- dania política. Em síntese conclusiva, convém assinalar que em toda ati- vidade jurídica, inclusive a eleitoral, o profissional do Direito deve estar atento à importância e à primazia dos princípios, mormente os constitucionais, que são, precisamente, a sín- tese dos valores principais da ordem jurídica e a pedra angular do sistema normativo. Todos têm o dever de lutar pela correta aplicaçãO, eficácia e concretização dos princípios, tendo em vista a preservação da previsibilidade das normas, da esta- bilidade democrática e da segurança jurídica. AConstituição Federalpermite, a partir de seus disposi- tivos sistematicamente compreendidos, identificar quatro princípios estruturantes do Direito Eleitoral, os quais se desenvolvem em imposições, limites e proibições ao legis- lador, ao juiz, aos partidos políticos, aos candidatos e elei- tores, éom vistas à realização de eleições legítimas, isonô- micas, "limpas" e justas. 11 NOTAS 1 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 90-91. 2 Ibid., p. 90-91. 3 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 147. 4 Ibid., p. 147. S Saliente-se que, em face do princípio da autonomia partidária, torna-se incompetente a Justiça Eleitoral para julgar matéria interna corporis dos partidos políticos (cf.TSE - Consulta nO1.2S1-DF, Pleno, ReI. Min. Carlos Ayres Britto). 6 GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. São Paulo: Atlas, 201 1, p. 49. 7 Ibid., p. 48-49. 8 GOMES, José Jairo. Op. cit., p. 206. AMANDINO TEIXEIRA NUNES JUNIOR é Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).Professor Universitário e Consultor Le9islativo da Câmara dos Deputados. 0800 708 1008 www.consulex.com.br « ()CI)Wa:: t-,°w....• ~ co~-CO
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