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TEXTO 3: HOBSBAWM, E. Da Revolução Industrial Inglesa ao Imperialismo A origem da Revolução Industrial – Capítulo 2 Primeiramente, a Revolução Industrial (Rev.Ind.) não foi uma mera aceleração do crescimento econômico, mas uma aceleração de crescimento em virtude da transformação econômica e social. Ao fim do séc. XVIII essa transformação ocorreu numa economia capitalista e através dela. A industrialização capitalista exige uma análise um pouco diferente da não-capitalista, pois explicar porque a busca do lucro privado levou à transformação tecnológica. Em segundo lugar, a revolução britânica foi a primeira na história, mas, não significa que ela haja começado do zero, ou que não se possam apontar fases anteriores de rápido desenvolvimento industrial e tecnológico. Por ser a primeira, é diferente em vários aspectos das revoluções industriais subseqüentes. Não pode ser explicada somente com base nos fatores externos, como imitação de técnicas mais avançadas, importação de capital e outros. As rev. posteriores usaram da experiência, do exemplo e dos recursos britânicos, enquanto que este pouco usufruiu dos outros países. A rev. britânica foi precedida por, no mínimo 200 anos de desenvolvimento econômico razoavelmente contínuo, que lançou seus alicerces e que a preparou para a industrialização. A Rev. Ind. nao pode ser explicada somente em termos britânicos, já que esta economia faz parte da “economia européia”. A Grã Bretanha fazia parte de uma ampla rede de relacionamentos econômicos, conectado com várias áreas “adiantadas” que possuíam industrialização potencial, áreas de “economia dependente” e também economias estrangeiras não envolvidas significativamente com a Europa. Economias dependentes eram as colônias formais, pontos de comércio e dominação e regiões especializadas economicamente para atender as áreas “adiantadas”. O mundo “adiantado” estava ligado ao mundo dependente pela divisão da atividade econômica: um lado urbanizado e o outro zonas produzindo e exportando produtos agrícolas ou matérias-primas. Essa relação é denominada de sistema de fluxos econômicos: de comércio, de pagamentos internacionais, de transferência de capital, de migração, etc. A economia européia já mostrava fortes sinais de expansão e desenvolvimento econômico, e ela, a partir do séc. XVI, tendia a dividir-se em unidades político- economicas independentes e concorrentes, como a Grã Bretanha e a França que possuíam suas estruturas econômicas e sociais, além de setores e regiões adiantados e dependentes. A origem da Rev. Ind. não deve ser explicada somente em termos de clima, geografia, mudança biológica na população e outros fatores exógenos, esses fatores que compõe os recursos naturais disponíveis não atuam por si sós, mas dentro de um dado quadro econômico, social e institucional, além disso, necessitam de fácil acesso ao mar, ou seja, baratos e viáveis meios de transportes. Explicações para a Rev. Ind. em termos de “acidentes históricos” também devem ser rejeitadas, já que os descobrimentos ultramarinos dos sécs. XV e XVI não bastam para explicar a industrialização, assim como a “revolução cientifica” do séc. XVII. Tampouco a Reforma Protestante pode ser um meio de explicar a Rev. Ind., como também os fatores políticos são rejeitados para tal função, mesmo estes incentivando e favorecendo a busca do lucro acima dos outros objetivos. A rejeição de explicações simplistas não significa que estas não possuam sua devida importância, somente atribuem a elas uma escala relativa de valores. No séc. XVIII, as principais pré-condições para a industrialização da Grã- Bretanha já existiam, no ano de 1750 era duvido a existência de um campesinato dono de terras em grandes partes da Inglaterra e de uma agricultura de subsistência. Nesse momento, já não havia mais dificuldade para a transferência de homens de atividades não industriais paras as industriais, além disso, o país acumulara capitais e tinha dimensões suficientes para permitir investimentos nos equipamentos necessários à transformação econômica. E possui uma parcela desses equipamentos estava em mãos de homens dispostos a investir no processo econômico. Desse modo, não havia escassez de capital, relativa ou absoluta, o país não era uma simples economia de mercado, mas sim um único mercado nacional com setor manufatureiro extensivo e bastante desenvolvido, assim como a estrutura comercial. Outro fator importante e que facilitou foram os transportes e as comunicações serem baratos, já que nenhuma parte do país era 112 km do mar e menos de algum curso de água navegável. Os problemas tecnológicos do começo da Rev. Ind. eram simples e não exigiam homens com qualificações especializadas. A maior parte das inovações técnicas e dos estabelecimentos produtivos precisavam de pouco investimento inicial e sua expansão podia ser financiada pelo acúmulo de lucros. Sendo assim, o desenvolvimento industrial achava-se dentro das possibilidades de um grande número de pequenos empresários e artesãos. E os obstáculos que surgiam no caminho da industrialização britânica foram de fácil superação, já que existiam as condições sociais econômicas fundamentais para isso, sendo bem simples e barata o tipo de industrialização verificado no séc. XVIII. E observando o desenvolvimento de uma industrialização embasada na iniciativa privada, a lógica freqüente é que a iniciativa privada opte automaticamente para a inovação, mas isso não é o que de fato ocorre. A iniciativa privada só tende para o lucro. Então, como surgiram na Grã-Bretanha do séc. XVIII as condições que levaram os homens de negócios a revolucionarem a produção? Há duas correntes que buscam explicar isso, a primeira salienta a importância do mercado interno, que era o maior escoadouro para os produtos do país; a segunda realça o mercado externo(exportação) que também era muito dinâmico e seguro. Portanto, ambas correntes eram essenciais, cada um a seu modo, como também um terceiro fator, o governo. Com relação ao mercado interno, este podia crescer de 4 maneiras importantes: crescimento populacional, que cria mais consumidores; transferência de pessoas, das rendas não-remuneradas para rendas monetárias, cria mais clientes; aumento da renda per capita, cria melhores clientes; advendo de bens produzidos industrialmente, em substituição a formas antigas de manufaturas ou importações. Uma característica importante verificada na população da Grã-Bretanha foi a duplicação desta em 50 ou 60 anos depois de 1780, voltando a duplicar nos 60 anos entre 1841 e 1901. Após o início real da Rev. Ind., as taxas de saldo fisiológico natural das principais regiões mostraram tendência para se igualarem e elas só possuem relevância na medida em que esclarecessem até que ponto o aumento populacional foi causa ou conseqüência de fatores econômicos. E quais foram os efeitos econômicos dessas mudanças? Mais gente significa mão-de-obra em maior quantidade e mais barata, na Inglaterra do séc. XVIII a força de trabalho em crescimento ajudou a industrialização devido a economia já ter uma característica dinâmica. Não se sabe ao certo qual a real importância dos transportes para o desenvolvimento industrial, não resta duvida de que o estímulo foi dado pelo mercado interno e pela crescente procura de alimentos e combustíveis. A diferença nos custos de transporte era tão acentuada que valia a pena realizar investimentos no setor. O carvão vegetal cresceu com o aumento das lareiras urbanas, e o ferro refletiu na procura por panelas, pregos, fogões, etc. A base pré industrial da indústria de carvão era muito mais sólida que a da indústria deferro. Em 1720 o consumo de ferro na Grã-Bretanha foi inferior a 50.000 t, e em 1788, quando a Rev. Ind. já ia bem adiantada, não foi superior a 100.000 t, sendo que a verdadeira Rev. Ind. para o ferro e o carvão foi na era das estradas de ferro abrindo um mercado de massa, tanto para bens de consumo como de capital. A grande vantagem do mercado interno pré-industrial era sua dimensão e sua constância, que favoreceu o crescimento econômico e estava disponível para proteger as atividades de exportação contra as flutuações e os colapsos súbitos que era o preço que pagavam por um maior dinamismo. O mercado interno socorreu na década de 1780, quando ocorreram a guerra civil e Revolução Americana e também nas guerras napoleônicas, além de proporcionar amplos fundamentos para uma economia industrial generalizada. As atividades de exportação atuavam em condições muito diferentes, muito mais revolucionárias, apresentavam violentas flutuações e no longo prazo se expandiam muito mais e com maior rapidez que o mercado interno. Entre 1700 e 1750 as atividades do mercado interno aumentaram em 7% e as exportações em 76%; entre 1750 e 1770 em 7% e 80% respectivamente. A produção de algodão era vinculada essencialmente ao comércio ultramarino, sendo cada grama importada dos trópicos ou sub-trópicos e os produtos tinham de ser vendidos no exterior. O potencial extraordinário das atividades de exportação não dependiam da modesta taxa de crescimento “natural” da procura interna de qualquer país. E criar a ilusão de crescimento rápido era através de dois meios: conquista de mercados de exportação a uma série de outros países e a destruição da concorrência interna dentro de determinados países, por meios políticos ou semipolíticos da guerra e colonização. Assim, o país que concentrasse os mercados de exportação de outros povos, ou monopolizasse os mercados de exportação de grande parte do mundo podia expandir suas exportações a um ritmo que tornava a Rev. Ind. viável. O terceiro fator importante que contribuiu para a Rev. Ind. foi o governo estar disposto a empreender a guerra e a colonização em benefício dos manufatureiros britânicos, sendo assim a Grã-Bretanha estava disposta a subordinar toda a política externa a objetivos econômicos. Na guerra, as metas eram comerciais e navais. Por fim, a política britânica no séc. XVIII era de agressividade sistemática, em períodos de guerra a Grã-Bretanha encontrava- se na defensiva e o resultado dessa postura foi o triunfo obtido: o virtual monopólio, entre as potências européias, de colônias externas e o virtual monopólio de poder naval em escala mundial. A própria guerra, ao mutilar os principais competidores da Grã-Bretanha na Europa, fazia expandir as exportações. Resumidamente, os três principais setores da demanda do industrialismo foram: as exportações, apoiados pelo auxílio sistemático e agressivo do governo, proporcionaram e construíram (junto com a produção têxtil de algodão) o “setor básico” da industrialização. Além disso, conduziram a melhoria do transporte marítimo; o mercado interno proporcionou a base geral para uma economia industrializada em grande escala e incentivou grandes melhorias no transporte terrestre, importante base para carvão e inovações tecnológicas; governo dava apoio sistemático ao comércio e aos manufatureiros, bem como incentivos para inovação técnica e o desenvolvimento de indústrias de bens de capital. Não havia duvidas de que a primeira potencial industrial seria a Grã-Bretanha, porque os holandeses se dedicavam à confortável atividade tradicional (exploração da estrutura comercial e financeira e de suas colônias) e os franceses não tinham condições para recupera o terreno que havia perdido com a grande depressão econômica do séc. XVII. E a Rev. Ind. ocorreu no séc. XVIII pelo fato de toda a evolução da economia em geral, que a Grã-Bretanha fazia parte, para áreas “avançadas” da Europa e suas relações com as economias dependentes coloniais e semi-coloniais, os parceiros comercias marginais e regiões não envolvidas no sistema europeu de fluxos econômicos. O novo relacionamento entre as áreas “avançadas” e o resto do mundo,após a grande depressão econômica do séc. XVII, tendia a intensificar e alargar os fluxos de comércio. Na Europa, o surgimento de um mercado para produtos ultramarinos de uso cotidiano, mercado este que podia expandir-se ao se tornarem esses produtos disponíveis em maior quantidade e a preço menor; no exterior a criação de sistemas econômicos para produção desses bens (plantations mantidas por escravos); e a conquista de colônias destinadas a servir aos interesses de seus proprietários. A expansão geral do comércio no séc. XVIII foi bastante expressiva, em que todos os países, mas a expansão do comércio relacionada com o sistema colonial foi nada menos que espetacular. Essa vasta e crescente circulação de bens não servia apenas para trazer à Europa novas necessidades bem como o estímulo de produzir no país os artigos importados. Mais que isso, tais produtos proporcionavam um horizonte ilimitado de vendas e lucros para mercadores e fabricantes. E foram os britânicos que , com sua política e força, tanto quanto por sua iniciativa e seu espírito criador, capturaram esses mercados. A economia industrial britânica desenvolveu-se a partir do comércio e, sobretudo do comércio com o mudo subdesenvolvido. Durante todo o séc. XIX seria mantido esse padrão histórico: o comércio e a navegação mantinham o balanço de pagamentos, enquanto a troca de produtos primários ultramarinos por produtos manufaturados britânicos representava a base da economia internacional.
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