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MTDI I - 2007/08 - Produto Interno 26 Produto interno, externo e misto de vectores A noção de produto interno (ou escalar) de vectores foi introduzida no ensino secundário, para vectores com duas ou três coordenadass. Neste capítulo generaliza-se esta noção. Os espaços Rn No ensino secundário foram estudados vectores no plano, da forma (x; y); e no espaço, da forma (x; y; z) : Denomina-se por espaço R2 o conjunto dos vectores no plano e por espaço R3 o conjunto dos vectores no espaço. Embora se perca a interpretação geométrica, é fácil generalizar estas de nições a dimensões maiores e de nir o espaço Rn, para qualquer n 2 N: Rn = f(x1; x2; :::; xn) : x1; x2; :::; xn 2 Rg Os elementos de Rn designam-se genericamente por vectores e as de nições de soma de vectores e de produto de um número real por um vector decorrem naturalmente das de nições análogas no plano e no espaço. Exemplos: 1. Espaço R4 = f(x1; x2; x3; x4) : x1; x2; x3; x4 2 Rg 2. (�1; 0; 3; 1; 6) é um vector do espaço R5: 3. Soma de vectores: (1; 2; 3; 4; 5; 6) + (6; 5; 4; 3; 2; 1) = (7; 7; 7; 7; 7; 7) 4. Produto de um numero real por um vector: Para � 2 R, � (�1; 0; 3; 1; 6) = (��; 0; 3�; �; 6�) Produto interno euclidiano O produto interno ou escalar de dois vectores u e v em R2 ou R3 foi de nido pela expressão: u � v = kuk kvk cos] (u:v) : Esta expressão pressupõe que se pode medir o comprimento dos vectores e a amplitude do ângulo por eles formado. Quando a dimensão aumenta e se perde a interpretação geométrica dos vectores, essas medições não são possíveis. Para generalizar a de nição de produto interno aos outros espaços Rn utiliza-se a expressão, também já conhecida, do produto escalar usando as coordenadas dos vectores. No caso do espaço R2, por exemplo, sendo u = (u1; u2) e v = (v1; v2) dois vectores o produto interno é: (u1; u2) � (v1; v2) = u1v1 + u2v2 Assim, se u = (u1; u2; : : : ; un) e v = (v1; v2; : : : ; vn) são vectores de Rn, o produto interno euclidiano (ou usual) u � v1 é de nido por u � v = u1v1 + u2v2 + � � �+ unvn 1Para o produto interno de dois vectores u e v também se usam a notações ujv e hu; vi : MTDI I - 2007/08 - Produto Interno 27 Exemplo: Em R5; (1; 2; 3; 4; 5) � (5; 4; 3; 2; 1) = 1� 5 + 2� 4 + 3� 3 + 4� 2 + 5� 1 = 35: A partir da de nição obtêm-se sem di culdade as seguintes propriedades: Propriedades: Se u; v; w são vectores de Rn e � 2 R, então: 1. u � v = v � u. 2. u � (v + w) = u � v + u � w: 3. 8� 2 R; (�u) � v = � (u � v) = u � (�v) : 4. u � u � 0 e u � u = 0 se e só se u = (0; 0; : : : ; 0). Nota: Pode-se de nir produto interno de uma forma ainda mais geral, como sendo qualquer aplicação que a um par de vectores faça corresponder um número real e satisfaça as quatro propriedades enunciadas. Um exemplo é o produto interno euclidiano com pesos que se de ne, para vectores de Rn; u = (u1; u2; : : : ; un) e v = (v1; v2; : : : ; vn), e sendo k1;k2; : : : ; kn números reais positivos, pela fórmula: u � v = k1u1v1 + k2u2v2 + � � �+ knunvn: Norma euclidiana Usando a de nição de produto interno em Rn podem também ser generalizadas as noções de norma de vectores e de distância entre dois vectores. Sejam u = (u1; u2 : : : ; un) e v = (v1; v2; : : : ; vn) vectores de Rn: De ne-se: 1. Norma euclidiana de u, kuk = pu � u = p u21 + u 2 2 + � � �+ u2n. 2. Distância entre os vectores u e v; d (u; v) = ku� vk = k(u1 � v1; u2 � v2; : : : ; un � vn)k. Exemplo: Em R5 : k(1; 2; 3; 4; 5)k =p(1; 2; 3; 4; 5) � (1; 2; 3; 4; 5) = p12 + 22 + 32 + 42 + 52 = p55 d ((1; 2; 3; 4; 5) ; (5; 4; 3; 2; 1)) = k(1; 2; 3; 4; 5)� (5; 4; 3; 2; 1)k = k(�4;�2; 0; 2; 4)k = p40 Propriedades: Sejam u e v vectores de Rn e � 2 R, então: 1. kuk � 0 e kuk = 0 se e só se u = (0; 0; : : : ; 0) : 2. d (u; v) � 0 e d (u; v) = 0 se e só se u = v: 3. k�uk = j�j kuk : 4. ku+ vk � kuk+ kvk (desigualdade triangular). 5. ju � vj � kuk kvk (desigualdade de Cauchy-Schwarz2). 2Augustin Louis Cauchy, matemático francês (1789-1857). Hermann Amandus Schwarz, matemático alemão (1843-1921) MTDI I - 2007/08 - Produto Interno 28 Ângulo de dois vectores A noção de ângulo entre dois vectores pode também ser generalizada a vectores de Rn, usando a desigualdade de Cauchy-Schwarz. Através desta desigualdade, tem-se, para u e v não nulos, ju � vj � kuk kvk , , ju � vjkuk kvk � 1 , , �1 � u � vkuk kvk � 1: (1) Como é sabido, se � é um ângulo cuja medida varia entre 0 e �, então cos � percorre todos os valores entre �1 e 1. Este facto e as desigualdades (1) permitem a seguinte de nição: Ângulo de dois vectores não nulos u e v; ] (u; v) ; é o ângulo �; 0 � � � �; tal que cos � = u � v kuk kvk ; isto é, o ângulo tal que cos] (u; v) = u � vkuk kvk (2) Esta era a de nição já conhecida anteriormente para ângulo entre vectores de R2 ou de R3. De (2) obtém-se também a fórmula, já conhecida, para o produto interno de dois vectores: u � v = kuk kvk cos] (u; v) : Exemplo: Em R5 : cos] � (1; 1; 1; 0; 1) ; � �1;�1;�1; p 6; 0 �� = = (1; 1; 1; 0; 1) � ��1;�1;�1;p6; 0� k(1; 1; 1; 0; 1)k ��1;�1;�1;p6; 0� = = �3p 4 p 9 = �1 2 O ângulo � cujo co-seno é �1 2 e tal que 0 � � � � é � = 2 3 �: Assim, ] � (1; 1; 1; 0; 1) ; � �1;�1;�1; p 6; 0 �� = 2 3 �: Ortogonalidade O cálculo do ângulo de dois vectores permite determinar quais os vectores de Rn que são ortogonais, isto é, quais os vectores que formam entre si um ângulo de � 2 : Da igualdade (2) veri ca-se que se u e v são dois vectores não nulos então cos] (u; v) = 0 se e só se u � v = 0: Isto motiva a seguinte de nição: De nição: Dois vectores u e v de Rn dizem-se ortogonais se u � v = 0: MTDI I - 2007/08 - Produto Interno 29 Nota: De acordo com a de nição o vector nulo é ortogonal a qualquer vector pois u � (0; 0; : : : ; 0) = 0;8u 2 Rn: Exemplos: Em R4 os vectores u = (2; 1;�3; 4) e v = (2;�12;�4; 1) são ortogonais pois (2; 1;�3;�4) � (2;�12;�4; 1) = 0: A noção de ortogonalidade permite generalizar o teorema de Pitágoras ao espaço Rn: Teorema (Pitágoras): Se u e v são vectores ortogonais de Rn; então ku+ vk2 = kuk2 + kvk2 : Demonstração: ku+ vk2 = = (u+ v) � (u+ v) = = (u � u) + (u � v)| {z } =0 + (v � u)| {z } =0 + (v � v) = = kuk2 + kvk2 Conjuntos ortogonais e ortonormados de vectores Um conjunto de vectores de Rn diz-se ortogonal se os vectores do conjunto forem ortogonais dois a dois. Um conjunto ortogonal diz-se ortonormado se a norma de cada vector do conjunto é 1. Se nenhum dos vectores de um conjunto ortogonal é o vector nulo, pode-se obter um conjunto ortonormado efectuando o produto de cada vector pelo inverso da sua norma, dado que, 8v 2 Rnn f(0; 0; : : : ; 0)g ; 1kvkv = ���� 1kvk ���� kvk = 1kvk kvk = 1; A este processo de multiplicar um vector pelo inverso da norma chama-se normalização do vector v: Exemplos: 1. O conjunto de vectores f(0; 1; 0) ; (1; 0; 1) ; (1; 0;�1)g é ortogonal, pois (0; 1; 0) � (1; 0; 1) = 0; (0; 1; 0) � (1; 0;�1) = 0 e (1; 0; 1) � (1; 0;�1) = 0: MTDI I - 2007/08 - Produto Interno 30 2. Para obter um conjunto ortonormado a partir do conjunto do exemplo 1, basta nor- malizar os vectores. Como k(0; 1; 0)k = 1; k(1; 0; 1)k = p 2 e k(1; 0;�1)k = p 2 o conjunto � (0; 1; 0) ; 1p 2 (1; 0; 1) ; 1p 2 (1; 0;�1) � é ortonormado. 3. Um referencial ortonormado é um referencial no qual os vectores que o constituem formam um conjunto ortonormado. Determinantes de ordem 2 e 3. O determinante de uma matriz quadrada é um número real obtido a partir da soma de determinados produtos de elementos da matriz. Descreve-se aqui apenas como se calculam determinantes de matrizes de ordem 2 e 3. Ordem 2: Se A = " a11 a12 a21 a22 # ; então o seu determinante édetA = a11a22 � a12a21 Exemplo: det " 1 2 3 4 # = 1� 4� 2� 3 = �2 Ordem 3: Se A = 264 a11 a12 a13a21 a22 a23 a31 a32 a33 375 ; então o seu determinante é detA = a11a22a33 + a12a23a31 + a13a21a32 � a11a23a32 � a12a21a33 � a13a22a31: Nota: Como se pode observar, o determinante de ordem três é uma soma de seis parcelas, três afectadas do sinal positivo e três do sinal negativo. Cada parcela é o produto de três entradas da matriz, situadas em linhas e colunas diferentes. Para calcular estes produtos e o sinal de que são afectados, costuma utilizar-se uma regra prática, conhecida como regra de Sarrus3: 1- Repetem-se as duas primeiras colunas da matriz ao lado da terceira:264 a11 a12 a13a21 a22 a23 a31 a32 a33 375 a11 a12a21 a22 a31 a32 3Pierre Frederic Sarrus (1798 - 1861) foi professor na universidade francesa de Strasbourg. A regra de Sarrus foi provavelmente escrita no ano de 1833. MTDI I - 2007/08 - Produto Interno 31 2 - Os produtos afectados com o sinal + obtêm-se multiplicando os elementos que se situam ao longo de cada uma das linhas do esquema seguinte: a11a22a33; a12a23a31 e a13a21a32 3 - Os produtos afectados com sinal � obtêm-se multiplicando os elementos que se situam ao longo de cada uma das linhas do esquema seguinte: a13a22a31, a11a23a32 e a12a21a33 Exemplo: Cálculo do determinante da matriz 264 1 2 34 5 6 7 8 9 375 Parcelas com sinal + : 1� 5� 9; 2� 6� 7 e 3� 4� 8 Parcelas com sinal � : 3� 5� 7; 1� 6� 8 e 2� 4� 9 det 264 1 2 34 5 6 7 8 9 375 = 1� 5� 9 + 2� 6� 7 + 3� 4� 8� 3� 5� 7� 1� 6� 8� 2� 4� 9 = 0 MTDI I - 2007/08 - Produto Interno 32 Produto externo e produto misto O produto externo e o produto misto de vectores apenas se calculam em espaços a três dimensões. Ao longo desta secção todos os vectores considerados são vectores do espaço R3: De nição de produto externo Se u = (u1; u2; u3) e v = (v1; v2; v3) são vectores de R3 então o produto externo de u e v é o vector: u� v = (u2v3 � u3v2;�u1v3 + u3v1; u1v2 � u2v1) ou, em linguagem de determinantes, u� v = det " u2 u3 v2 v3 # ;� det " u1 u3 v1 v3 # ; det " u1 u2 v1 v2 #! Exemplo: Se u = (1; 2; 3) e v = (4; 5; 6) u� v = = det " 2 3 5 6 # ;� det " 1 3 4 6 # ; det " 2 3 5 6 #! = = (�3; 6;�3) Veri ca-se que (�3; 6;�3) � (1; 2; 3) = 0 e (�3; 6;�3) � (4; 5; 6) = 0; ou seja, o vector u� v é ortogonal ao vector u e ao vector v: Esta propriedade é geral e é uma das propriedades que se enunciam de seguida. Propriedades do produto externo Sejam u; v; w 2 R3 e k 2 R. 1. Se existe � 2 R tal que u = �v ou v = �u, u� v = (0; 0; 0) : 2. Em particular, u� u = (0; 0; 0) e u� (0; 0; 0) = (0; 0; 0)� u = (0; 0; 0) : 3. (u� v) � u = 0 (u� v é ortogonal a u). 4. (u� v) � v = 0 (u� v é ortogonal a v). 5. ku� vk = kuk kvksen] (u; v) : 6. Se u = (u1; u2; u3), v = (v1; v2; v3) e u� v = (z1; z2; z3) então det 264 u1 u2 u3v1 v2 v3 z1 z2 z3 375 > 0: 7. u� v = � (v � u) : 8. u� (v + w) = (u� v) + (u� w) : 9. (u+ v)� w = (u� w) + (v � w) : 10. k (u� v) = (ku)� v = u� (kv) : MTDI I - 2007/08 - Produto Interno 33 De nição de produto misto Se u; v; w 2 R3; então o produto misto de u; v e w é u � (v � w) : O produto misto de três vectores é um número real que pode ser calculado, sendo u = (u1; u2; u3) ; v = (v1; v2; v3) e w = (w1; w2; w3), por: u � (v � w) = det 264 u1 u2 u3v1 v2 v3 w1 w2 w3 375 Propriedades do produto misto Sendo u; v; w 2 R3; então 1. u � (v � w) = 0 se e só se um dos vectores u; v ou w é combinação dos outros. (por exemplo, se u = (1; 2; 3) ; v = (1; 0; 1) e w = (1; 4; 5) ; então u � (v � w) = 0; pois (1; 4; 5) = 2 (1; 2; 3)� (1; 0; 1) = 2u� v) 2. u �(v � w) = (u� v) �w (no produto misto as operações podem ser trocadas, mantendo a ordem dos vectores) Aplicações do produto externo e produto misto 1. O produto externo pode ser utilizado sempre que se pretenda encontrar, em R3, um vector que seja simultaneamente ortogonal a dois vectores dados (que sejam linearmente independentes). 2. É sabido que equação de um plano com a direcção de dois vectores dados u; v e que passe pela origem é da forma ax+ by + cz = 0 em que (a; b; c) é um vector ortogonal a u e a v: Para encontrar essa equação pode-se considerar para (a; b; c) o vector u� v: Exemplo: De acordo com o exemplo da página 32, a equação do plano com a direcção dos vectores u = (1; 2; 3) e v = (4; 5; 6) e que passa na origem pode ser �3x+ 6y � 3z = 0 3. A área do paralelogramo de nido por dois vectores u e v é dada por ku� vk : 4. O volume do paralelipípedo de nido por três vectores u; v e w é dado por ju � (v � w)j :
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