Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
SOCIEDADE E EDUCAÇÃO EM MAX WEBER Ana Célia Furtado Orsano de Sousa – Mestrado em Educação/UFPI Marcelino de Oliveira Fonteles – Mestrado em Educação/UFPI Oscarina Maria da Silva – NIEPSEF/UFPI Weber não elaborou de forma sistemática uma teoria pedagógica ou uma teoria da educação. Porém é possível selecionar, a partir de algumas de suas categorias, elementos que podem contribuir para uma compreensão, tanto do processo pedagógico, quanto do sistema educacional e de suas expectativas dentro da sociedade capitalista. Veremos inicialmente elementos de sua abordagem que vamos eleger para os aspectos pedagógicos. Particularmente no que concerne a sua distinção entre as duas vocações: o Político e o Cientista e à sua concepção compreensiva de interpretação da realidade social. Em seguida trataremos da relação entre a racionalidade do modo capitalista, o mercado, suas exigências de especializações, sua crescente burocratização, a impessoalidade e as conseqüências deste modo para a educação e a sociedade, sem esquecermos a racionalidade em relação a valores, onde o indivíduo se conduz baseado conscientemente em valores que lhe são caros e que norteiam, também, sua atividade educacional e suas ações em seu meio sócia. RACIONALIDADE, DESENCANTAMENTO E PEDAGOGIA No que respeita à pedagogia, Weber faz uma distinção clara entre o político e o cientista, deixando os julgamentos de valor para o primeiro e os julgamentos de fato para o segundo. Essa questão vai conduzi-lo em suas investigações à percepção do processo de racionalização, de desencantamento do mundo moderno. Isto significa a eliminação da magia como técnica de salvação do mundo e sua substituição pelo processo de racionalidade, que considera tudo no mundo como sendo regido por leis que a ciência pode conhecer e a técnica ou especialização científica dominar. Essa concepção despreza a intervenção do ‘sobrenatural’ no processo de evolução da sociedade, mas, segundo Weber, deixa o mundo sem um sentido. Ou seja, o desencantamento do mundo, a racionalidade, desvenda o mundo mas lhe toma o sentido. Mesmo considerando, através de seus estudos de compreensão da realidade, que o processo de racionalização desencanta o mundo e subtrai o sentido mágico do mesmo, Weber vai afirmar que não convém ao cientista social e ao professor, que deve se comportar como cientista, qualquer motivação ideológica. Cabe ao verdadeiro educador primar pela objetividade do conhecimento nas ciências e evitar posicionamentos valorativos. Isto no que se refere ao processo educativo formal. Weber considera imprescindível uma estreita separação entre o saber empírico e o juízo de valor. É preciso distinguir o conhecimento do “ser” do “dever ser”. Pois um e outro não coincidem. O ser social produz e deve produzir juízos de valor a partir de uma concepção de mundo. Porém a ciência experimental nunca poderá ter como tarefa a descoberta de normas e ideais de caráter imperativo, de onde pudessem deduzir-se algumas receitas para a práxis. Não se precisa porém furtar-se aos juízos de valor. E a crítica não pode deter-se nos mesmos. Sabemos que a análise reflexiva que diga respeito aos elementos últimos da atividade humana, está em princípio, ligada as categorias dos “fins e dos meios”. E para qualquer estudo cientifico da sociedade, é importante a questão da conveniência dos meios face aos fins dados. E nisso perpassam valores. Porém deve-se agir com a maior objetividade possível, para evitar proselitismo e doutrinamento. Esta questão é complexa para as ciências sociais, já que todo fim carrega valores, ou seja, é subjetivo. Portanto entrar no mérito do melhor e mais adequado meio que conduz a determinado fim, e se este é ou não adequado à situação histórica referida, pressupõe a humildade do limite, da impossibilidade de se avaliar objetivamente tal questão, já que tanto meios como fins estão completamente permeados pelos valores culturais de cada pessoa ou grupo e dos interesses em jogo. Mas Weber afirma que, ...dentro dos respectivos limites do saber, somos capazes de determinar quais os meios adequados ou não para nos conduzir ao fim proposto, podemos também calcular as possibilidades de alcançar, em geral, determinado fim com o auxílio de determinados meios ao nosso alcance. E, por conseguinte, com base na situação histórica, podemos criticar indiretamente o próprio propósito como praticamente aceitável ou inaceitável, segundo as condições dadas (1979:15-16). O autor acrescenta ainda que, ... proporcionamos ao sujeito actuante a possibilidade de confrontar as conseqüências desejadas e não desejadas da sua actuação, e de responder à pergunta: quanto custa a consecução do fim proposto no que se refere ao sacrifício previsível de outros valores? Dado que na imensa maioria dos casos, todo o fim proposto “custa”ou pelo menos pode custar algo, ninguém, por pouco que proceda com uma consciência responsável, poderá deixar de pôr em confronto o fim a alcançar e as conseqüências da sua actuação. Possibilitar este confronto é uma das funções essenciais da crítica técnica. (...)Contudo levar tais confrontos até uma decisão já não constitui realmente uma tarefa possível para a ciência, mas antes para a pessoa dotada de vontade. Esta confronta e escolhe os valores em causa segundo a sua própria consciência e a sua própria concepção de mundo. Por certo que a ciência pode ajuda-la a perceber que qualquer acto e também, segundo as circunstâncias, a ausência de um acto, significam, pelas suas conseqüências, tomar o partido de determinados valores (1979:16). Esta colocação é coerente com as análises de Weber no seu livro: Duas Vocações: O Político e o Cientista , onde, o autor afirma que a ciência pode demonstrar os prós e os contras de certas decisões dentro de um determinado contexto histórico. Mas que a escolha diz respeito apenas à pessoa ou ao político. Neste aspecto, tanto Paulo Freire, quanto Karl Marx afirmam que não se pode dissociar a prática da teoria e que todo ato educativo é um ato político, portanto um ato imbuído de posicionamento, decisões e valores. É preciso, para estes dois autores, combinar o profissional com o cidadão, ainda que se deva evitar o proselitismo político. Weber quer separar o profissional do cidadão da prática pedagógica, mas isso é muito difícil, porque na prática profissional de cada professor ou pesquisador das ciências sociais perpassam valores a partir do lugar que cada um ocupa. Weber considera que ajudar a pessoa a tomar consciência dos padrões que se manifestam no juízo de valor é o máximo que a crítica pode realizar sem entrar no campo da especulação. A questão da escolha do que deve ser representa um juízo de valor que cabe apenas ao sujeito definir e que depende do seu querer, da sua consciência e não do saber científico. Weber afirma em Sobre a teoria das ciências sociais (1979:17), Uma ciência empírica não está apta a ensinar a ninguém aquilo que “deve”, mas sim e apenas o que “pode” e – em certas circunstâncias – o que “quer” fazer”. “È certo que, no campo das nossas ciências, as concepções pessoais do mundo costumam intervir ininterruptamente na argumentação científica, continuamente a confundindo e levando a avaliar de diferentes modos o peso dos argumentos científicos, inclusivamente na resultado diminui esfera do estabelecimento de relações causais simples conforme o ou incrementa as possibilidades dos ideais pessoais, isto é, a possibilidade de querer algo determinado”. Ou seja, o querer aplicar os juízos de valor ao mundo exterior representa uma crença nos valores. E emitir juízo sobre a validade de tais valores é uma questão de fé e, provavelmente, do pensamento especulativo.Mas não é objeto de uma ciência empírica da forma como Weber pretende praticá-la. Para a ciência social empreendida por Weber não comporta a tarefa de estabelecer um princípio para a sociedade e consolidá-lo como verdadeiro, para poder deduzir a partir dele e de forma unívoca as normas para a solução dos problemas particulares da práxis. Mas é importante ressaltar que apontar as possibilidades e os limites e possíveis conseqüências de determinadas ações, dado um diagnóstico, já é um posicionamento que, ainda que tenha como base dados objetivos, carrega ampla subjetividade. Mesmo que se considere, como Weber, que o destino de nossa civilização é ter que saber que não podemos deduzir o sentido dos acontecimentos mundiais a partir dos resultados do seu estudo, por muito completo que este seja; mas, pelo contrário, que devemos ser capazes de o criar por nós próprios, que as concepções do mundo nunca poderão ser produto de um saber empírico progressivo, e que, por conseguinte, os ideais supremos que mais intensamente agem sobre nós, apenas se concretizam, em todos os tempos, graças à luta com outros ideais, que são tão sagrados para os outros como os nossos o são para nós. Isto não invalida o que se afirmou anteriormente. Weber considera que é inócuo buscar um meio termo entre os vários valores para chegar a um padrão consensual dos mesmos. Isto, segundo ele, só levaria à exacerbação do dogmatismo. E se distanciaria cada vez mais do caráter científico da ciência social empírica. Segundo o autor, há grande diferença entre a argumentação que se dirige ao nosso sentimento e à nossa capacidade de alcançar fins concretos e aquela que se dirige à nossa consciência, onde se põe em dúvida a validade de normas éticas, ou ainda aquela que apela para a nossa capacidade e necessidade de ordenar racionalmente a realidade empírica, com a pretensão de estabelecer a validade de uma verdade da experiência. É evidente que, no campo das ciências sociais, qualquer demonstração científica metodologicamente correta, se pretende haver alcançado a sua finalidade, deverá ser reconhecida como correta por qualquer cidadão com um certo grau de escolaridade em qualquer país do mundo. Pelo menos deve ter este objetivo, ainda que não consiga realizá-lo plenamente. Diante deste quadro, qual seria o papel do professor? De acordo com Alonso Bezerra de Carvalho (1997), na concepção de Weber, O verdadeiro professor, se quiser manter a sua “integridade intelectual”, há de separar uas situações. Por um lado, “apresentar os fatos, determinar as suas relações matemáticas e lógicas, ou a estrutura interna dos valores culturais”, ou seja, as conexões causais concretas dos fatos (compreender o sentido das ações sociais) e, por outro, responder a perguntas sobre o valor da cultura e seus conteúdos individuais e à questão de como devemos agir na comunidade cultural e nas associações políticas. Isto é, distinguir com o máximo rigor conhecimento empírico (de fatos) e juízo de valor, pois sempre que o homem de ciência introduz seu julgamento pessoal de valor, cessa a plena compreensão e exposição dos fatos. Eis os limites a que um professor deveria obedecer enquanto ministra uma aula. Mas essa postura não deve ser mantida em relação aos políticos. A estes comportam os julgamentos e os valores para a tomada de decisão e a realização de suas ações. Porém o papel do político e o papel do professor ou cientista são distintos. Nas palavras de Weber (2001:54) “A ciência é uma vocação organizada em disciplinas especiais a serviço de uma autoclarificação e de um conhecimento de fatos inter-relacionados”. A contribuição da ciência e do professor e pesquisador para a vida prática e pessoal, segundo Weber, é, essencialmente, buscar compreender o sentido dos fenômenos e das ações sociais. Cada um, a partir de sua compreensão dos fenômenos, situados no contexto histórico, deverá tomar as medidas necessárias para a boa condução de suas ações. E deve levar em conta não um ideal último, mas o que as condições reais permitem. Neste sentido a ética que Weber percebe é muito mais pragmática do que idealista. É a ética da responsabilidade, em vez da ética baseada em princípios ou fins últimos. O que é levado em conta nesta ética da responsabilidade, com relação à tomada de decisão, são as condições reais em que ocorrem os fenômenos e as alternativas concretas, no sentido de se ponderarem e analisarem os ganhos e as perdas de todos os envolvidos. Trata-se evidentemente de uma maneira pragmática de ver a realidade. Pode-se dizer que é uma moral racionalizada. CAPITALISMO, RACIONALIDADE, BUROCRACIA E EDUCAÇÃO Essa racionalização Weber vai perceber mais ainda na análise do capitalismo. Aqui Weber discorda de Marx. Este considerava o capitalismo um modo de produção com tendências anárquicas e irracionais. Weber compreende esse sistema como uma forma universal de modernização e a expressão mais elevada de racionalização do homem ocidental. Para Weber, o que predomina na sociedade capitalista, além da divisão em classes sociais e do mercado, é a racionalização, o prestígio social e as associações de prestígio ou de status dentro das classes. E, para compreender as relações que ocorrem na sociedade capitalista e no sistema educacional, Weber cria uma de suas categorias fundamentais, que é a categoria ação social. Esta é definida como a atitude do sujeito cujo sentido é relacionado ao comportamento dos outros. Para interpretar as ações sociais, Weber utiliza o chamado método compreensivo que objetiva compreender o sentido que as ações de um indivíduo contêm e como essas ações se orientam pelo comportamento dos outros. Weber classifica as ações sociais em três tipos: ação tradicional, aquela que se baseia nos costumes e nas tradições; ação afetiva, a que se define por afetos e sentimentos; ação racional. Esta se subdivide em duas: ação racional com relação a valores, guiada pela crença consciente em algo que o indivíduo valoriza; ação racional com relação a fins, baseada no planejamento, no cálculo racional que coloca fins e organiza os meios necessários para sua realização. Para exemplificar este tipo de ação, observe um aluno que vai fazer o concurso vestibular. Sua ação é social, pois o vestibular é significativo para a sociedade e para o aluno. O aluno escolhe o curso para o qual vai concorrer orientando-se pela ação de outros concorrentes. A questão é como o aluno orienta sua ação para escolher curso A ou B. Ele pode escolher Jornalismo porque gosta de comunicar-se, de conhecer pessoas e tem talento para escrever. É um curso que lhe dará prazer. Nesse caso, a escolha é de acordo com a ação afetiva. Porém ele pode escolher Direito porque já é tradicional na família fazer este curso. Por exemplo, seu bisavô, seu avô e seu pai fizeram Direito e todos na sua família consideram que essa tradição deve ser mantida. Nesse caso, sua ação será tradicional. Outra possibilidade é escolher o curso porque considera que aquele é o curso que, de fato, tem valor. Por exemplo, escolher Medicina porque é um curso que presta muitos serviços à sociedade e que todos valorizam. É uma profissão que dá status. Sua ação será racional com relação a valores. Ou pode escolher Computação, para ser programador, porque hoje essa é uma das profissões que dá mais dinheiro para quem sabe aproveitar as oportunidades. E seu objetivo é ganhar dinheiro. Nesse caso, sua ação será racional com relação a fins. Estas ações não acontecem em ‘estado puro’, dissociadas umas das outras. Uma mesma ação pode ter mais de um sentido. Porém, no capitalismo, as ações predominantes tendem a ser aquelas que são orientadas com relação a fins. Mas não implica dizer que se reduz a este sentido. Do pontode vista metodológico, pode-se inferir que comporta ao estudante e ao professor ou pesquisador, na compreensão dos fenômenos sociais, buscar perceber as motivações, os sentidos das ações sociais que contribuíram para que tal fato ocorresse de uma determinada forma. Para aprofundar-se na compreensão dos fatos sociais, Weber criou, além da categoria ação social, outra categoria, denominada de tipos ideais. Trata-se de uma construção teórica abstrata a partir dos casos particulares analisados. O conceito, ou tipo ideal é previamente construído e testado, depois aplicado a diferentes situações em que dado fenômeno possa ter ocorrido. O tipo ideal não é um modelo perfeito a ser buscado pelas formações sociais históricas nem mesmo qualquer realidade observável. É um instrumento de análise científica, numa construção do pensamento que permite conceituar fenômenos e formações sociais e identificar na realidade observada suas manifestações. Permite ainda comparar tais manifestações. Uma dimensão qualquer da ação humana admite a construção de vários tipos, sem que nunca se esgote a complexidade infinita da realidade. Por essa razão, nenhum dos tipos construídos deve ser considerado mais que um instrumento limitado e provisório de investigação. A expressão “ideal” demonstra que os tipos sociológicos só existem no plano das idéias, não na realidade. Os tipos ideais não constituem mais do que hipóteses de interpretação que devem ser confirmadas ou desmentidas pela interpretação causal ou pela observação estatística, ou seja, ele não se contenta em determinar o sentido subjetivo da ação, mas trata de verificar se tal sentido corresponde aos resultados efetivos da ação. Esta abstração metodológica é, segundo Weber, muito útil, no sentido de aproximar o indivíduo do conhecimento real, partindo de modelos elaborados artificialmente tendo como base a realidade existente. Exemplo de tipo ideal de burocrata, de acordo com Max Weber, o tipo ideal do burocrata seria o indivíduo que age em cooperação com outros, cujo ofício é separado de sua vida familiar e pessoal, regulamentado por mandatos e pela exigência de competência, conhecimento e perícia. Estas duas categorias, a ação social e os tipos ideais, combinadas com outras categorias, como o conceito de burocracia e o de racionalidade, vão perpassar boa parte das análises weberianas.. A racionalidade é outra categoria importante, tanto para a análise do capitalismo, como para perceber seus reflexos no sistema de educação. Diz Weber que a racionalidade faz parte do mundo ocidental desenvolvido e teve, na religião protestante, a sua consolidação, através de sua aplicação no desenvolvimento do capitalismo. O autor considera uma ação racional quando cumpre duas condições. A primeira é aquela que é orientada por um objetivo claramente formulado, ou para um conjunto de valores claramente estabelecidos e logicamente consistentes. Em segundo lugar, uma ação é racional quando os meios escolhidos para se atingir o objetivo são os mais adequados. Portanto, uma ação é racional quando é objetivamente bem adequada ao fim buscado pelo sujeito. E, neste caso, a racionalidade significa adequação dos meios aos fins. A ação racional é, portanto, aquela que utiliza meio adequado aos fins procurados. Um ator é irracional se buscar fins contraditórios e utilizar meios inadequados para atingi-los. Com o avanço do capitalismo e da ética protestante a racionalização da vida social e a crescente burocratização do aparato público de dominação política e dos aparatos próprios às grandes corporações capitalistas privadas, perpassam para todos os setores da organização social, inclusive para a educação. Ocorre um encadeamento entre a necessidade de especialização, burocratização e racionalização da vida social, onde vai predominar a ação racional relativa a fins, cuja meta é a ascensão social e a obtenção de status privado. Weber torna-se pessimista quando consegue perceber que a racionalidade capitalista reduz tudo à mera busca por riqueza e status. E não discorda de Marx, quando este diz que a tendência do capitalismo é transformar tudo em mercadoria. A própria educação passa a ser, na medida em que a sociedade se racionaliza, um fator de estratificação social, um meio de distinção, de obtenção de honras, de cargos, de poder e dinheiro., bem como uma exigência que se ajusta ao mercado. Não é de estranhar, portanto, o resultado de uma sondagem, realizada no ano de 2002, no Instituto Superior de Educação Santo Agostinho - ISA e na Associação de Ensino Superior do Piauí - AESPI, com trinta e oito estudantes dos cursos de Normal Superior e Tecnologia em Processamento de Dados , dos quais, trinta e três, ao serem indagados dos motivos que os levaram a escolher aqueles cursos, responderam que foi para atender ao mercado de trabalho ou ao prestígio profissional. Não foi outra a percepção de Weber da realidade da educação. Esta se volta para o treinamento de indivíduos que tenham de fato condições de operar novas funções, de administrar o Estado, as empresas de um modo racional. Um dos elementos essenciais na constituição do Estado moderno é a formação de uma administração burocrática em moldes racionais. Tal processo só ocorreu de modo completo no Ocidente, onde houve a substituição paulatina de um funcionalismo não especializado e resistente a regras rígidas por um funcionalismo treinado e politicamente orientado com bases em regulamentos racionais. A educação, para Weber, segundo Rodrigues (2001), é o modo pelo qual os homens – ou determinados tipos de homens em especial – são preparados para exercer as funções que a transformação causada pela racionalização da vida lhes colocou à disposição. Para o autor, Weber pensou a educação como um “pacote” de conteúdos e de disposições voltados para o treinamento de indivíduos que tivessem de fato condições de operar essas novas funções, de “pilotar” o Estado, as empresas e a própria política de um modo “racional”. É a compreensão da educação, no capitalismo, como uma forma de treinar em vez de cultivar o intelecto. Sobre isso, afirma Weber que a racionalização e a burocratização alteraram radicalmente o modo de educar e o status que é o reconhecimento e o acesso a bens materiais por parte dos indivíduos que se submetem à educação sistemática. Então, educar no sentido de racionalização passou a ser fundamental para o Estado, porque precisa de um direito racional e de uma burocracia montada em moldes racionais. Por isso educar no sentido da racionalização também passou a ser fundamental para a empresa capitalista, por ela se pautar pela lógica do lucro, do cálculo de custo e benefícios e precisar de profissionais para isso. Mais que profissionais da empresa ou da administração pública, o capitalismo e o Estado capitalista forjaram um novo homem: um homem racional, tendencialmente livre de concepções mágicas, para o qual não existe mais lugar reservado à obediência, que não seja a obediência ao direito racional. Para este homem, o mundo perdeu o encantamento. Não é mais o mundo do sobrenatural e dos desígnios de Deus ou dos imperadores. É o mundo do império da lei da razão, que certamente não é o mesmo que educar, antes da grande transformação provocada pelo advento do capitalismo moderno. Para Rodrigues, Weber concebe a educação como um fator de estratificação social, um meio de distinção, de obtenção de honras, de busca de poder e de dinheiro Há um recuo da educação enquanto formação do homem, em favor de uma educação enquanto treinamento especializado e parcializado para habilitar o indivíduo a desempenhar certas tarefas. Baseado nisso, Weber afirmava que o capitalismo reduzia tudo, inclusive a educação, à mera busca por riquezamaterial e status, embora não negue a educação racional com relação a valores. Porém, dentro do mercado capitalista esta não é predominante, ainda que conviva ou sobreviva com a educação racional com relação a fins. Com a racionalização, a vida social e a crescente burocratização do aparato público de dominação política, e dos aparatos próprios às grandes corporações capitalistas privadas, a educação deixa de ter como meta a “qualidade da posição do homem na vida” - que é o sentido próprio da educação para Weber. Enquanto base dos sistemas de status, torna-se cada vez mais um preparo especializado com o objetivo de tornar o indivíduo um perito. Rodrigues fala também um pouco da melancolia que Weber tinha sobre os rumos da educação, mesma depressão intelectual que exprimia com relação aos descaminhos da liberdade humana sobre os desígnios da especialização, da burocratização e da racionalização da vida. Além de minimizar uma formação humanística de caráter mais integral, a educação “racionalizada” que é a pedagogia do treinamento, continua a ser usada como mecanismo de ascensão social e de obtenção de status privado. Neste sentido, a educação predominante nas sociedades dominadas pela lógica do mercado é a que é conduzida pela razão instrumental dos fins e estes estão subordinados à lógica do capitalismo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARVALHO, Alonso Bezerra de. Desencantamento do mundo e ação pedagógica em Max Weber. In.: GHIRALDELLI JR, Paulo e PRESTES, Nadja Hermann. FILOSOFIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO. Ano I, nº1, Marília – SP: MG Editora, 1997. RODRIGUES, Alberto Tosi. Sociologia da Educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. SOUSA, Jessé de. O malandro e o Protestante: a tese weberiana e a singularidade cultural brasileira, Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999. WEBER, Max. Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999. WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. 11. ed. São Paulo: Pioneira, 1996. WEBER, Max ; DURKHEIM, Émile. Socialismo. Rio de Janeiro: Relum-Dumara, 1993. WEBER, Max. Ciência e Política:duas vocações.São Paulo: Martin Claret, 2001. WEBER, Max. Sobre a Teoria das Ciências Sociais. Lisboa: Presença, 1979.
Compartilhar