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Capítulo IV - ERRO

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Capítulo IV 
DOS DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO 
Introdução 
A declaração de vontade é elemento estrutural ou requisito de existência do negócio jurídico. Para que este seja válido, todavia, é necessário que a vontade seja manifestada livre e espontaneamente. Pode acontecer, no entanto, que ocorra algum defeito na sua formação ou na sua declaração, em prejuízo do próprio declarante, de terceiro ou da ordem pública. 
Este capítulo trata das hipóteses em que a vontade se manifesta com algum vício que torne o negócio anulável. Nele o Código Civil brasileiro menciona e regula seis defeitos: erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude contra credores. No art. 171, II, diz ser anulável o negócio jurídico que contenha tais vícios. 
Dispõe o art. 178 do Código Civil: “É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: I — no caso de coação, do dia em que ela cessar; II — no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico”. 
Os referidos defeitos, exceto a fraude contra credores, são chamados de vícios do consentimento porque provocam uma manifestação de vontade não correspondente com o íntimo e verdadeiro querer do agente. Criam uma divergência, um conflito entre a vontade manifestada e a real intenção de quem a exteriorizou.
 A fraude contra credores não conduz a um descompasso entre o íntimo querer do agente e a sua declaração. Mas é exteriorizada com a intenção de prejudicar terceiros. Por essa razão é considerada vício social. 
A simulação, que é igualmente chamada de vício social, porque objetiva iludir terceiros ou violar a lei, constava também deste capítulo, no Código Civil de 1916. O novo, entretanto, trouxe uma relevante alteração nessa parte, disciplinando-a no capítulo que cuida da invalidade do negócio jurídico. O art. 167 do referido diploma declara nulo o negócio jurídico simulado, subsistindo porém o dissimulado, se válido for na substância e na forma. 
Defeitos do negócio jurídico são, pois, as imperfeições que nele podem surgir, decorrentes de anomalias na formação da vontade ou na sua declaração 
 2. Erro ou ignorância 
2.1. Conceito
 O erro consiste em uma falsa representação da realidade. Nessa modalidade de vício do consentimento o agente engana-se sozinho. Quando é induzido em erro pelo outro contratante ou por terceiro, caracteriza-se o dolo.
 Poucas são as ações anulatórias ajuizadas com base no erro, porque difícil se torna penetrar no íntimo do autor para descobrir o que se passou em sua mente no momento da celebração do negócio. Por isso, são mais comuns as ações fundadas no dolo, pois o induzimento pode ser comprovado e aferido objetivamente. 
O Código equiparou os efeitos do erro à ignorância. Erro é a ideia falsa da realidade. Ignorância é o completo desconhecimento da realidade. Nesta, a mente está in albis; naquele, o que nela está registrado é falso. Num e noutro caso, o agente é levado a praticar o ato ou a realizar o negócio que não celebraria por certo, ou que praticaria em circunstâncias diversas, se estivesse devidamente esclarecido.
 2.2. Espécies 
O erro apresenta-se sob várias modalidades. Algumas são importantes para o direito, porque invalidantes dos atos e negócios jurídicos. Outras mostram-se irrelevantes, acidentais, não o 457/643 contaminando. A mais importante classificação é a que o divide em substancial e acidental. 
2.2.1. Erro substancial e erro acidental
 Não é qualquer espécie de erro que torna anulável o negócio jurídico. Para tanto, segundo a doutrina tradicional, deve ser substancial, escusável e real. A escusabilidade do erro, no entanto, tem sido hodiernamente substituída pelo princípio da cognoscibilidade. 
Erro substancial ou essencial é o que recai sobre circunstâncias e aspectos relevantes do negócio. Há de ser a causa determinante, ou seja, se conhecida a realidade o negócio não seria celebrado. 
Segundo Francisco Amaral, erro essencial, também dito substancial, “é aquele de tal importância que, sem ele, o ato não se realizaria. Se o agente conhecesse a verdade, não manifestaria vontade de concluir o negócio jurídico. Diz-se, por isso, essencial, porque tem para o agente importância determinante, isto é, se não existisse, não se praticaria o ato”.
 Acidental é o erro que se opõe ao substancial, porque se refere a circunstâncias de somenos importância e que não acarretam efetivo prejuízo, ou seja, a qualidades secundárias do objeto ou da pessoa. Se conhecida a realidade, mesmo assim o negócio seria realizado. 
O art. 143 do Código Civil é expresso no sentido de que “o erro de cálculo apenas autoriza a retificação da declaração de vontade”. Não há, nesse caso, propriamente um vício na manifestação da vontade, mas uma distorção em sua transmissão, que pode ser corrigida. 
Erro de cálculo, na definição de Massimo Bianca, citado por Renan Lotufo, é “o erro na elaboração aritmética dos dados do objeto do negócio (errore di calcolo è solo l’errore nella elaborazione aritimetica dei dati esattamente assunti in contrato)”. Cita o mestre italiano o exemplo em que a parte fixa o preço da venda com base na quantia unitária e computa, de forma inexata, o preço global. 
 O Código de 2002 nesse ponto inova, permitindo a retificação da declaração de vontade em caso de mero erro de cálculo, quando as duas partes têm conhecimento do exato valor do negócio.
 2.2.1.1. Características do erro substancial
 Foi dito que substancial é o erro sobre circunstâncias e aspectos relevantes do negócio. Não quis o legislador deixar, no entanto, que essas circunstâncias e aspectos relevantes constituíssem conceitos vagos, a serem definidos por livre interpretação do juiz, preferindo especificá-los. Enuncia, com efeito, o art. 139 do Código Civil: 
“Art. 139. O erro é substancial quando: 
I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais;
 II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante;
 III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico”. 
O erro substancial pode ser, portanto: 
Erro sobre a natureza do negócio (error in negotio) — O erro que interessa à natureza do negócio é aquele em que uma das partes manifesta a sua vontade pretendendo e supondo celebrar determinado negócio jurídico e, na verdade, realiza outro diferente (p. ex., quer alugar e escreve vender). É erro sobre a categoria jurídica. Pretende o agente praticar um ato e pratica outro. 
Nessa espécie de erro ocorre, segundo Pontes de Miranda, divergência quanto à espécie de negócio, no que cada um manifestou. Há discrepância entre o significado objetivo do ato e o significado que lhe atribuiu, subjetivamente, o manifestante: o consenso sobre o conteúdo do negócio é somente aparente, porque se funda em erro . 
Exemplos clássicos são os da pessoa que empresta uma coisa e a outra entende que houve doação; do alienante, que transfere o bem a título de venda, e o adquirente o recebe como doação; da 459/643 pessoa que quer alugar e a outra parte supõe tratar-se de venda a prazo.
 b) Erro sobre o objeto principal da declaração (error in corpore) — É o que incide sobre a identidade do objeto. A manifestação da vontade recai sobre objeto diverso daquele que o agente tinha em mente. Exemplos: o do comprador, que acredita esteja a adquirir um terreno que supõe valorizado, pois situado em rua importante, mas que, na verdade, tem pouco valor, porque localizado em rua do mesmo nome, porém de um pequeno vilarejo; o da pessoa que adquire um quadro de um aprendiz, supondo tratar-se de tela de um pintor famoso; ou, ainda, o do indivíduo que se propõe a alugar a sua casa da cidade e o outro contratante entende tratar-se de sua casa de campo.
 c) Erro sobre alguma das qualidades essenciais do objeto principal (error in substantia ou error in qualitate)— Ocorre quando o motivo determinante do negócio é a suposição de que o objeto possui determinada qualidade que, posteriormente, se verifica inexistir. Neste caso, o erro não recai sobre a identidade do objeto, que é o mesmo que se encontrava no pensamento do agente. Todavia, não tem as qualidades que este reputava essenciais e que influíram em sua decisão de realizar o negócio. 
Exemplo clássico é o mencionado no Código de Justiniano, uma das fontes do direito romano, que se refere à pessoa que adquire candelabros prateados, mas de material inferior, julgando serem de prata; ou o da pessoa que adquire um quadro por alto preço, na persuasão de se tratar de original quando não passa de cópia; ou, ainda, do indivíduo que compra um relógio dourado, mas apenas folheado a ouro, como se fosse de ouro maciço.
 d) Erro quanto à identidade ou à qualidade da pessoa a quem se refere a declaração de vontade (error in persona) — Concerne aos negócios jurídicos intuitu personae. Pode referir-se tanto à identidade quanto às qualidades da pessoa. Exige-se, no entanto, para ser invalidante, que tenha influído na declaração de vontade “de modo relevante” (CC, art. 139, II, segunda parte). Exemplo: doação ou deixa testamentária a pessoa que o doador supõe, 460/643 equivocadamente, ser seu filho natural ou, ainda, a que lhe salvou a vida; casamento de uma jovem de boa formação com indivíduo que vem a saber depois ser um desclassificado. 
Essa modalidade de erro pode ocorrer em relação ao destinatário da manifestação de vontade como também ao beneficiário. Tem especial importância no casamento e nas liberalidades, como na doação e no testamento, e nos negócios onerosos celebrados intuitu personae, bem como naqueles fundados na confiança, como no mandato, na prestação de serviços e no contrato de sociedade. 
Entretanto, o erro quanto à identidade somente é considerado essencial quando não se tem como apurar quem seja, realmente, a pessoa ou coisa a que se refere a manifestação de vontade. Segundo dispõe o art. 142, “o erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a declaração de vontade, não viciará o negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada”. No direito das sucessões há regra semelhante (art. 1.903).
 Trata-se de erro acidental ou sanável. Por exemplo, o doador ou testador beneficia o seu sobrinho Antônio. Na realidade, não tem nenhum sobrinho com esse nome. Apura-se, porém, que tem um afilhado de nome Antônio, a quem sempre chamou de sobrinho. Ou, ainda, o autor da liberalidade se refere ao seu objeto, denominando-o quadro, quando em realidade é uma escultura. Trata-se de dispositivo legal que complementa o art. 138, segundo o qual a anulação de um negócio só é admissível em caso de erro substancial. 
e) Erro de direito (error juris) — É o falso conhecimento, ignorância ou interpretação errônea da norma jurídica aplicável à situação concreta. Segundo Caio Mário, é o que se dá “quando o agente emite a declaração de vontade no pressuposto falso de que procede segundo o preceito legal”.
 Todos os exemplos de erro até aqui fornecidos são de erro de fato, que recai sobre qualquer elemento ou circunstância do negócio jurídico, como objeto, pessoa, qualidade. O Código de 1916, conforme diz Clóvis Beviláqua, apenas se referia ao erro de fato, pois 461/643 ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece (ignorantia legis neminem excusat). No entanto, malgrado alguma divergência existente, o erro de direito era admitido como substancial quando fosse o motivo principal do negócio jurídico e não houvesse a intenção, por parte do agente, de descumprir a lei.
 Na realidade, o art. 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro diz que a alegação de ignorância da lei não é admitida quando apresentada como justificativa para o seu descumprimento. Significa dizer, inversamente, que pode ser arguida se não houver esse propósito. 
Atente-se para o comentário de Washington de Barros Monteiro: “Efetivamente, não obstante a omissão do Código e a objeção de Clóvis, o erro de direito foi acolhido pelo direito pátrio. A quase unanimidade dos autores, apoiados pela jurisprudência, o admite. Medite-se realmente neste exemplo de Andrea Torrente: acredito que uma pessoa é estrangeira, pois ignoro a legislação sobre cidadania e nacionalidade. Invocando o erro de direito, não estarei procurando subtrair-me ao comando legislativo, à força imperativa da norma; apenas buscarei demonstrar um extravio verificado no processo formativo da minha vontade”. Depois de afirmar que tal orientação é universal e predominante na atualidade jurídica brasileira, conclui o saudoso civilista que “o erro de direito, como o de fato, desde que afete a manifestação da vontade, na sua essência, vicia o consentimento”13. Desse modo, “não se levará, portanto, em conta error juris quando se almejar suspender a eficácia legal, para livrar-se das consequências de sua inobservância; mas, se se tiver por escopo evitar efeito de ato negocial, cuja formação teve interferência de vontade viciada por aquele erro, nada impedirá que se o alegue” . 
O novo Código Civil acolheu esse entendimento, considerando substancial o erro quando, “sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negó- cio jurídico” (art. 139, III). Exemplo: pessoa que contrata a importação de determinada mercadoria ignorando existir lei que proíbe tal importação. Como tal ignorância foi a causa determinante 462/643 do ato, pode ser alegada para anular o contrato, sem com isso se pretender que a lei seja descumprida. 
2.2.1.2. Erro substancial e vício redibitório 
Cumpre distinguir erro sobre as qualidades essenciais do objeto de vícios redibitórios, disciplinados nos arts. 441 a 446 do Código Civil. Embora a teoria dos vícios redibitórios se assente na existência de um erro e guarde semelhança com este quanto às qualidades essenciais do objeto, não se confundem os dois institutos. 
O vício redibitório é erro objetivo sobre a coisa, que contém um defeito oculto. O seu fundamento é a obrigação que a lei impõe a todo alienante, nos contratos comutativos, de garantir ao adquirente o uso da coisa. Provado o defeito oculto, não facilmente perceptível, cabem as ações edilícias (redibitória e quanti minoris ou estimatória), respectivamente para rescindir o contrato ou pedir abatimento do preço, sendo decadencial e exíguo o prazo para a sua propositura (trinta dias, se se tratar de bem móvel, e um ano, se for imóvel). 
O Código de Defesa do Consumidor estabelece o prazo de trinta dias, para os casos de vícios aparentes em produto não durável; e de noventa dias, em produto durável, contados a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços. Em se tratando de vícios ocultos, os prazos são os mesmos, mas a sua contagem somente se inicia no momento em que ficarem evidenciados (art. 26 e parágrafos). 
O erro quanto às qualidades essenciais do objeto é subjetivo, pois reside na manifestação da vontade. Dá ensejo ao ajuizamento de ação anulatória, sendo de quatro anos o prazo decadencial. Se alguém adquire um relógio que funciona perfeitamente, mas não é de ouro, como o adquirente supunha (e somente por essa circunstância o adquiriu), trata-se de erro quanto à qualidade essencial do objeto. Se, no entanto, o relógio é mesmo de ouro mas não funciona em razão do defeito de uma peça interna, a hipótese é de vício redibitório. 
2.2.2. Erro escusável 
Erro escusável é o erro justificável, desculpável, exatamente o contrário de erro grosseiro ou inescusável, de erro decorrente do não emprego da diligência ordinária. 
Dispõe o art. 138 do Código Civil: 
“Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio”. 
Ao considerar anulável o erro “que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal,em face das circunstâncias do negó- cio”, o novo diploma explicitou a necessidade de que o erro seja escusável, adotando um padrão abstrato, o do homem médio (homo medius), para a aferição da escusabilidade.
 Adotou, assim, o critério de comparar a conduta do agente com a da média das pessoas, malgrado a jurisprudência dominante à época da promulgação do novo estatuto civil preferisse o critério do caso concreto, considerando, em cada hipótese levada aos tribunais, as condições pessoais (de desenvolvimento mental, cultural, profissional etc.) de quem alega o erro. Por este último critério, pode o juiz considerar escusável, por exemplo, a alegação de erro quanto à natureza do negócio (v. g., celebração de contrato de compra e venda julgando tratar-se de doação) feita por uma pessoa rústica e analfabeta e, por outro lado, considerá-la inescusável, injustificável, quando feita por um advogado. 
A adoção, pelo novo Código, de um padrão abstrato, o do homo medius, para a aferição da escusabilidade, mereceu a procedente crítica de Lamartine Corrêa: “Esse critério traz consigo toda a gama de artificialismo própria dos padrões abstratos e, no fundo, estabelece contradição com o critério concreto da mensuração da coação consagrada pelo Código Civil (de 1916), art. 99, e mantido pelo Anteprojeto, art. 152”. 
O Código Civil de 1916 não dispunha sobre a escusabilidade do erro pelo fato de o legislador considerar implícito tal elemento 464/643 no próprio conceito de erro. Observa Silvio Rodrigues que, malgrado o Projeto Clóvis Beviláqua não contivesse tal requisito, o seu eminente autor, não obstante, condicionava, em suas obras, a alegabilidade do erro à circunstância de ele ser escusável. E arremata o mestre paulista: “A omissão de referido pressuposto na lei decorre do fato de o legislador entender que ele se encontra implí- cito no conceito de erro, sendo, portanto, supérfluo insistir”.
 O Código Civil italiano adotou o princípio da recognoscibilidade (riconoscibilità), sujeitando a eficácia invalidante do erro não só à sua relevância, mas também ao fato de ser reconhecível pela outra parte (art. 1.492). Segue a mesma linha o Código Civil português (art. 247º).
 Malgrado o entendimento manifestado por alguns autores18 no sentido de que o novo Código Civil brasileiro acolheu, em face da redação dada ao retrotranscrito art. 138, nitidamente o sistema italiano, sendo elemento do erro capaz de gerar anulação a cognoscibilidade pela outra parte, afirma Moreira Alves que tal acolhimento não ocorreu, esclarecendo que a Comissão Elaborada e Revisora do Anteprojeto de 1972 chegou a rejeitar proposta para a adoção do aludido sistema. 
Acrescenta, em seguida, o renomado professor que o equí- voco em que incidiram alguns doutrinadores se deve a erro datilográfico na publicação do art. 137 e parágrafo único do Anteprojeto de 1972, correspondente ao art. 138 do novo Código, somente mais tarde corrigido. 
Conclui o citado mestre: “O art. 136, diversamente do que pareceu a alguns, não adotou — como adotava o Anteprojeto parcial originário — o critério da cognoscibilidade do erro pela outra parte, como se verifica no Código italiano (art. 1.428), seguido, nesse ponto, pelo Código Civil português de 1967 (art. 247º). De fato, ao estabelecer o citado dispositivo que são anuláveis os negó- cios jurídicos quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio, essa pessoa é a parte que erra. Explicitou-se, portanto, a necessidade de que o erro seja 465/643 escusável, adotando-se um padrão abstrato — o vir medius — para a aferição da escusabilidade” . 
Esse assunto, no entanto, é polêmico. O próprio Moreira Alves mudou, posteriormente, de opinião, afirmando que a redação do citado art. 138 do novo diploma exige, para a configuração do erro, a cognoscibilidade e não a escusabilidade. Reconheceu, porém, que a intenção da Comissão Elaboradora e Revisora era, com a redação final do dispositivo, afastar-se da cognoscibilidade e exigir a escusabilidade como requisito essencial do erro. Mas, apesar da intenção, a mencionada redação final não corresponde ao que se pretendia dizer. 
Na realidade, a redação é defeituosa, em virtude de diversos erros datilográficos mencionados por Moreira Alves, não permitindo afirmar, com segurança, ter o novo Código adotado o critério da cognoscibilidade. Segundo José Fernando Simão, que resume a opinião de diversos autores, “o Código exigiu apenas a cognoscibilidade e não a escusabilidade como requisito do erro, já que, tendo adotado a teoria da confiança, calcada na boa-fé objetiva e na eticidade, o negócio deve ser mantido, se gerou justa expectativa no declaratário, sendo que tal expectativa merece proteção jurídica. A adoção da cognoscibilidade como requisito se comprova pela dicção dos artigos 148 e 155, que, ao tratarem do dolo e da coação provinda de terceiros, seguem a mesma principiologia: o negócio só é anulável se o vício era conhecido ou poderia ser reconhecido pelo contratante beneficiado”. 
A tendência é no sentido da prevalência dessa orientação, em razão do grande número de adesões à tese e do Enunciado n. 12 da Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho de Justiça Federal, do seguinte teor: “Na sistemática do art. 138, é irrelevante ser ou não escusável o erro, porque o dispositivo adota o princípio da confiança”. Já há, inclusive, precedente jurisprudencial, como se pode verificar:
 “O Código Civil de 2002 afastou o critério da escusabilidade, cujo exame se dava sobre o próprio emissor da vontade, trazendo para a disciplina o princípio da confiança, cujo critério aferidor 466/643 passou a ser o destinatário da manifestação da vontade que, mesmo percebendo que a autora estava em erro, silenciou ao invés de adverti-la”. 
Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça, em acórdão de 19 de agosto de 2010, proclamou: “O erro que enseja a anulação de negócio jurídico, além de essencial, deve ser inescusável, decorrente da falsa representação da realidade própria do homem mediano, perdoável, no mais das vezes, pelo desconhecimento natural das circunstâncias e particularidades do negócio jurídico. Vale dizer, para ser escusável o erro deve ser de tal monta que qualquer pessoa de inteligência mediana o cometeria”. 
2.2.3. Erro real 
O erro, para invalidar o negócio, deve ser também real, isto é, efetivo, causador de prejuízo concreto para o interessado. Não basta, pois, ser substancial e cognoscível. Deve ainda ser real, isto é, tangível, palpável, importando efetivo prejuízo para o interessado (non fatetur qui errat). 
Assim, por exemplo, o ano de fabricação do veículo adquirido (2005, em vez de 2009) é substancial e real, porque, se o adquirente tivesse conhecimento da realidade, não o teria comprado. Tendo-o adquirido, sofreu grande prejuízo. 
No entanto, se o erro dissesse respeito somente à cor do veículo (preto, em vez de azul-escuro, p. ex.), seria acidental, porque irrelevante para a definição do preço, e não tornaria o negó- cio anulável. 
2.2.4. Erro obstativo ou impróprio 
Erro obstativo ou impróprio é o de relevância exacerbada, que apresenta uma profunda divergência entre as partes, impedindo que o negócio jurídico venha a se formar. É, portanto, o que obsta a sua formação e, destarte, inviabiliza a sua existência. 
As doutrinas alemã, francesa e italiana consideram tão grave o error in negotio e o error in corpore, que recaem, respectivamente, sobre a natureza do negócio (o agente quer alugar e escreve vender) e sobre o objeto principal da declaração (supõe adquirir imóvel localizado em região central e compra um situado na periferia), que os denominam erro-obstáculo, obstativo ou impróprio (erreur obstacle, errore ostativo), porque impedem o consentimento. Não haveria vontade negocial, uma vez que tal desconformidade faria a manifestação apenas aparente, motivo pelo qual não se poderia considerá-la como existente.
 Oart. 119 do BGB, todavia, atribui-lhe o efeito de tornar nulo o ato, em vez de inexistente. 
Consoante a lição de Santoro-Passarelli, o erro-obstáculo se traduz num vício da vontade do ato, excluindo a consciência do significado do próprio ato, de tal forma que este não é determinado, como deveria sê-lo, por uma vontade consciente. Ainda se consubstanciaria o erro-obstáculo, segundo o civilista italiano, se a vontade negocial falta efetivamente, ou porque é diversa na sua integridade (troca de uma declaração por outra) ou em um dos elementos que servem para individualizar o negócio concreto: objeto, pessoa, causa e modalidade. Conclui afirmando que o erro obstativo é sempre um erro de identidade. 
O direito brasileiro não distingue o erro obstativo do erro ví- cio do consentimento. O error in negotio e o error in corpore são espécies de erro substancial, que tornam anulável o negócio jurídico, como vícios do consentimento. Considera-se o erro, qualquer que seja a hipótese (in negotio, in corpore, in substantia, in persona ou juris), vício de consentimento e causa de anulabilidade do negócio jurídico. 
Como assinala Caio Mário, “a doutrina legal brasileira, desacolhendo a distinção, equipara-os, por lhe parecer que o erro sobre a natureza do negócio ou sobre a identidade do objeto (erro obstativo) traduz, em última análise, uma declaração volitiva, cujo resultado jurídico difere do efetivo querer do agente, mas que nem por isto deixa de ser uma declaração de vontade” . 
2.3. O falso motivo 
O art. 140 do Código Civil, que cuida do chamado “erro sobre os motivos”, prescreve:
 “Art. 140. O falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante”. 
O novo Código corrige, assim, a impropriedade do art. 90 do diploma de 1916, substituindo falsa causa por falso motivo. O motivo do negócio, ou seja, as razões psicológicas que levam a pessoa a realizá-lo, não precisa ser mencionado pelas partes. 
Motivos são as ideias, as razões subjetivas, interiores, consideradas acidentais e sem relevância para a apreciação da validade do negócio. Em uma compra e venda, por exemplo, os motivos podem ser diversos: a necessidade de alienação, investimento, edificação de moradia etc. São estranhos ao direito e não precisam ser mencionados. 
O erro quanto ao objetivo colimado não vicia, em regra, o negócio jurídico, a não ser quando nele figurar expressamente, integrando-o, como sua razão essencial ou determinante, como preceitua o art. 140 supratranscrito. Nesse caso, passam à condição de elementos essenciais do negócio. O mencionado dispositivo legal permite, portanto, que as partes promovam o erro acidental a erro relevante. Os casos mais comuns são de liberalidades, com expressa declaração do motivo determinante (filiação, parentesco, p. ex.), que entretanto se revelam, posteriormente, falsos, ou de venda de fundo de comércio tendo como motivo determinante a perspectiva de numerosa freguesia, que posteriormente se verifica ser falso. 
Se uma pessoa faz uma doação a outra, porque é informada de que o donatário é seu filho, a quem não conhecia, ou é a pessoa que lhe salvou a vida, e posteriormente descobre que tais fatos não são verdadeiros, a doação poderá ser anulada somente na hipótese de os referidos motivos terem sido expressamente declarados no instrumento como razão determinante. Se não o foram, não poderá ser 469/643 invalidada. Não se admite em face da dicção do citado art. 140, a anulação de negócio jurídico pela manifestação tácita da vontade. 
2.4. Transmissão errônea da vontade
 O Código Civil equipara o erro à transmissão defeituosa da vontade. Dispõe, efetivamente, o art. 141:
 “Art. 141. A transmissão errônea da vontade por meios interpostos é anulável nos mesmos casos em que o é a declaração direta”. 
Se o declarante não se encontra na presença do declaratório e se vale de interposta pessoa (mensageiro, núncio) ou de um meio de comunicação (fax, telégrafo, e-mail etc.) e a transmissão da vontade, nesses casos, não se faz com fidelidade, estabelecendo-se uma divergência entre o querido e o que foi transmitido erroneamente (mensagem truncada), caracteriza-se o vício que propicia a anulação do negócio. 
Segundo Carvalho Santos, essa regra só se aplica quando a diferença entre a declaração emitida e a comunicada seja procedente de mero acaso ou de algum equívoco, não incidindo na hipótese em que o intermediário intencionalmente comunica à outra parte uma declaração diversa da que lhe foi confiada. Neste caso, a parte que escolheu o emissário fica responsável pelos prejuízos que tenha causado à outra por sua negligência na escolha feita, ressalvada a possibilidade de o mensageiro responder em face daquele que o elegeu. 
Silvio Rodrigues entende que, se a vontade foi mal transmitida pelo mensageiro, há que se apurar se houve culpa in eligendo ou mesmo in vigilando do emitente da declaração. Se afirmativa a resposta, não pode tal erro infirmar o ato, por ser inescusável.
 2.5. Convalescimento do erro 
O art. 144 do Código Civil de 2002, à semelhança dos Códigos italiano (art. 1.432) e português (art. 248º), inovando, dispõe:
 “Art. 144. O erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa, a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na conformidade da vontade real do manifestante”. 
Tal oferta afasta o prejuízo do que se enganou, deixando o erro de ser real e, portanto, anulável. Objetiva o referido diploma dar a máxima efetividade à consecução do negócio jurídico, concedendo às partes a oportunidade de executá-lo. Trata-se de aplicação do princípio da conservação dos atos e negócios jurídicos, segundo o qual não há nulidade sem prejuízo (pas de nullité sans grief).
 Maria Helena Diniz fornece o seguinte exemplo: “João pensa que comprou o lote n. 2 da quadra A, quando, na verdade, adquiriu o n. 2 da quadra B. Trata-se de erro substancial, mas antes de anular o negócio o vendedor entrega-lhe o lote n. 2 da quadra A, não havendo assim qualquer dano a João. O negócio será válido, pois foi possível a sua execução de acordo com a vontade real. Se tal execução não fosse possível, de nada adiantaria a boa vontade do vendedor”. 
2.6. Interesse negativo 
Questão pouco comentada, quando se estuda o erro, é a relativa ao interesse negativo, que decorre do fato de o vendedor verse surpreendido com uma ação anulatória, julgada procedente, com os consectários da sucumbência, sem que tenha concorrido para o erro do outro contratante — o que se configura injusto, máxime já tendo dado destinação ao numerário recebido. 
O Código alemão prevê, para esses casos, que a doutrina chama de interesse negativo, uma compensação para o contratante que não concorreu para o erro (art. 122). O Código Civil brasileiro não prevê a hipótese, mas ela decorre dos princípios gerais de direito, especialmente o que protege a boa-fé. 
 A propósito, preleciona Pontes de Miranda: “Tratando-se de anulação por erro, por exemplo, é preciso atender-se a que o outro figurante (ainda o que se incluiu no público, como se dá na promessa de recompensa) pode ter confiado na validade da manifestação de vontade, e assim tem a técnica jurídica de atender à situação em que se colocou o que teve prejuízo por confiar (daí chamar-se interesse de confiança, Vertrauensin-teresse, ou interesse negativo)”.
 Acrescenta o notável jurista que a consciência jurídica assenta que o interesse negativo “há de ser indenizado, estando legitimado à ação de reparação o destinatário da manifestação de vontade receptícia, ou da comunicação de conhecimento”. Na mesma linha, assinala Sílvio de Salvo Venosa que “anulação por erro redunda em situação toda especial, ou seja, a responsabilidade é exatamente daquele que pede a anulação do negócio, já que é o único responsável por sua má destinação. Seria sumamente injusto que o declaratório que não errou, nem concorreu para o erro do declarante, arcasse com duplo prejuízo, duplo castigo: a anulação do negócio e a absorção do prejuízo pelas importânciasa serem pagas ou devolvidas, conforme o caso, além dos ônus da sucumbência processual. Devem, portanto, os juízes atentar para essa importante particularidade ao decretar a anulação do negócio por erro”. 
A solução só poderá ser de ordem jurisprudencial, pois a emenda de n. 176 apresentada ao Projeto de Código Civil na Câmara dos Deputados, que propunha que o erro substancial, além de acarretar a anulação do negócio jurídico, desse margem à indenização por parte do declarante, foi atacada pelo relatório da Comissão Revisora, com a observação de que o sistema seguido pelo Projeto visa a proteger melhor o terceiro de boa-fé, tomando como padrão para aferir a escusabilidade do erro a figura do homem médio. 
Acrescentou-se, por outro lado, que “o sistema adotado pela emenda implica, ainda que o erro não seja culposo, a responsabilidade por parte de quem errou, embora acarrete, sempre, a anulabilidade. Ora, tendo em vista a segurança e a estabilidade dos negócios jurídicos, parece superior o sistema do Projeto, que torna mais difícil a anulação”.

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