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Semiologia Cardiovascular Ciclo Cardíaco por Cássio Martins Introdução A função básica do coração é garantir a perfusão sanguínea dos tecidos periféricos e o aporte sanguíneo para os alvéolos de modo a permitir a troca gasosa. Essa função é realizada através da ejeção de volumes de sangue na grande e na pequena circulação, respectivamente. Portanto é aceitável dizer que o coração é uma “bomba”, que ao se contrair “bombeia” o sangue para a periferia, e ao relaxar se enche novamente de volume. Essas duas fases, de contração e relaxamento, chamados de sístole e diástole, respectivamente, são consideradas as duas fases magnas do cíclo cardíaco, sendo depois subdividas em outras subfases. Torna-se mandatório, portanto, o entendimento desse funcionamento, uma vez que todo o racicínio fisiopatológico e semiológico do exame cardiovascular se baseia na compreensão do ciclo cardíaco. A Origem do Estímulo Antes de tudo, cabe uma breve revisão sobre a origem dessa contração cardíaca. As células cardíacas tem a capacidade de gerar o seu próprio estímulo (automatismo), que nasce no nó sinusal, percorrre um caminho pelo feixe de Bachman feixes internodais até o nó atrioventricular, e daí para o feixe de Hiss e fibras de Purkinje para estimular o músculo cardíaco e levar à contração do músculo cardíaco gerando a sístole mecânica. Sístole A sístole é o período decorrido desde o fechamento das valvas atrioventriculares (B1) até o fechamento das valvas semilunares (B2). É dividida em fases de pré – ejeção e ejeção. A primeira é subdividida em Q – B1 e Contração Isovolumétrica. A segunda é subdividida em Ejeção Rápida, Ejeção Lenta e Protodiástole. Q – B1 Portanto, a primeira fase é Q – B1, que corresponde ao tempo decorrido da ativação elétrica ventricular até a contração mecânica desse mesmo ventrículo. Não possui significado clínico, uma vez que não pode ser evidenciado à beira do leito, mas se medido pode trazer informações à cerca de algumas patologias, por exempo: Q – B1 diminuído está presente no bloqueio de ramo esquerdo e na estenose mitral. PC Realce PC Realce PC Realce PC Realce PC Realce PC Realce PC Realce PC Realce PC Realce Contração Isovolumétrica Após a ativação e o início da contração, a pressão dentro do ventrículo começa a subir e logo ultrapassa a pressão existente no átrio, ocasionando o fechamento da valva atrioventricular. Nesse momento a pressão no ventrículo ainda é menor que aquela registrada nos vasos da base, de forma que as valvas semilunares ainda estão fechadas. Ao final da contração isovolumétrica a pressão dentro do ventrículo supera aquela nos vasos da base e as valvas semilunares se abrem, dando início à ejeção so sangue. Essa abertura das valvas aórtica e pulmonar normalmente não é audível, mas em casos de valvas anatomicamente alteradas (Estenose aórtica ou pulmonar), pode- se ouvir um ruído de alta frequência chamado do click de ejeção nesse momento. Então, a contração isovolumétrica é o período decorrido desde o fechamento das valvas atrioventriculares até a abertura das valvas semilunares. Nessa fase ocorre o maior gasto de ATP no ciclo, e gera-se um gradiente de pressão responsável pela ejeção do sangue para a grande e pequena circulação. Ejeção Rápida Após a abertura das valvas semilunares, o sangue é rapidamente ejetado para os vasos da base, reduzindo igualmente rápido o volume ventricular. Sabe-se que cerca de 2/3 do volume diatólico final é lançado na circulação nessa fase. Ejeção Lenta O volume reduzido nos ventrículos leva à uma queda na pressão ventricular, ao mesmo tempo em que a pressão dentro dos vasos da base aumenta pelo volume crescente de sangue que é ejetado. Isso leva à uma queda na velocidade e na quantidade de sangue que é ejetado, de modo que nessa fase, menos de 1/3 do volume diastólico final é lançado na circulação. Protodiástole Nessa fase, os ventrículos já estão iniciando o seu relaxamento, de modo que a pressão dentro dos mesmos pode se tornar até levemente menor que a pressão dentro dos vasos da base. Contudo ainda existe um pequeno fluxo de sangue para dentro desses vasos, isso se dá pelo impulso da massa de sangue que vinha sendo ejetada e ainda possui energia suficiente para gerar um fluxo, por menor que seja. Ao final da protodiástole a pressão dentro dos vasos da base é grande o suficiente para fechar as valvas semilunares, e dessa maneira dar fim à sístole. O fechamento da valva aórtica é representada na curva de pressão aórtica como um entalhe na mesma, chamado de incisura dicrótica. Diástole A diástole é o período entendido entre o fechamento das valvas semilunares (B2) até o fechamento das atrioventriculares (B1). É dividida em Relaxamento Isovolumétrico e fase de Enchimento, que se subdivide em Rápido, Lento, e Ativo (Contração Atrial). Relaxamento Isovolumétrico O ventrículo está agora em relaxamento, e com as valvas semilunares e atrioventriculares fechadas. Nessa fase, a pressão dentro do ventrículo reduz progressivamente, até o ponto em que se torna menor que a pressão dentro dos átrios, causando a abertura das valvas atrioventriculares e a passagem de sangue para a cavidade ventricular. Nessa fase, os átrios estão terminando de se encher de sangue, o que é essencial para a garantia de um volume diatólico final adequado, e consequentemente, de um débito cardíaco suficiente. Tambem nessa fase, cria-se um gradiente de pressão entre os átrios e ventrículos, essencial para a sucção diatólica dos mesmos. O tempo de relaxamento isovolumétrico (TRIV) é uma medida obtida pelo ecocardiograma que pode expressar algumas alterações patológicas da função cardíaca diastólica. Quando aumentado, expressa doença restritiva, como por exemplo uma cardiomiopatia isquêmica. O TRIV dura até 90ms, sendo considerado aumentado quando supera essa marca. Então, o relaxamento isovolumétrico é o período que compreende o tempo desde o fechamento das valvas semilunares até a abertura da valvas atrioventriculares. Essas mesmas são inaudíveis, em condições normais. Contudo, quando anatomicamente alteradas (Estenose mitral ou tricúspide), ausculta-se um ruído de alta frequência quando se abrem chamado de estalido de abertura. Enchimento Rápido Com o relaxamento progressivo dos ventrículos e o enchimento dos átrios, a pressão dentro destes últimos supera a aquela dentro da cavidade ventricular e as valvas atrioventriculares se abrem. Na Ejeção rápida a maior parte do sangue dos átrios passa para o ventrículo, cerca de 50%. Isso acontece por que o gradiente pressórico átrio-ventrículo é muito grande. Normalmente, essa fase é silenciosa. Mas quando um ventrículo dilatado recebe um volume de sangue maior do que o normal, gera-se um impacto que dá origem à um som de baixa frequência chamado de terceira bulha cardíaca (B3). Essa bulha acessória tambem pode estar presente fisiologicamente em indivíduos jovens. Quando patológica, geralmente expressa sobrecarga de volume do ventrículo afetado. Enchimento Lento Nessa fase, os ventrículos possuem maior volume e portanto maior pressão, de modo a diminuir o gradiente pressórico átrio-ventrículo. Isso leva a uma menor velocidade de enchimento ventricular. Somente 30% da capacidade dos ventrículos é preenchida. Enchimento Ativo (Contração Atrial) Nesse momento os átrios são despolarizados e entram em sístole para preencher os 20% restantes da capacidade ventricular. Pode-se observar um aumento na curvade pressão e volume dos ventrículos, que vinham em uma medida constante desde o enchimento lento. Normalmente, essa fase é silenciosa. Contudo, em alguns indivíduos jovens normais e em algumas situações patológicas, a contração atrial contra um ventriculo com pressão aumentada leva ao choque de um volume de sangue contra as paredes desse ventrículo, gerando um som de baixa frequência chamado de quarta bulha cardíaca (B4). Quando auscultada, a B4 geralmente indica sobrecarga de pressão do ventrículo acometido. Após a contração atrial, ocorre o estímulo e a contração do ventrículo, que entra em sístole novamente, reiniciando o ciclo cardíaco. A figura abaixo resume as curvas de pressão atrial, ventricular, aórtica, a curva de volume ventricular, associando-as ao traçado eletrocardiográfico e às bulhas cardíacas. Bibliografia • Semiologia Cardiovascular; Couto, A., A.; Nani, E.; Mesquita, E., T.; Pinheiro, L., A., F.; Filho, L., J., M., R.; Bruno, W.; editora Atheneu • Tratado de Semiologia Médica; Swartz, M., H.; editora Saunders elsevier • Tratado de Doenças Cardiovasculares; Braunwald; oitava edição; editora Saunders elsevier • Medicina Interna; Harrison; décima sétima edição; editora Artmed • Semiologia Médica; Mário Lopes; terceira edição; editora Atheneu Semiologia Cardiivascular Pulso Jugular Venoso por Cássio Martins Introdução Pulso venoso é a onda de volume, expressa clinicamente na veia jugular, que representa o retorno venoso para o coração direito. Tem grande importância clínica, pois expressa toda a dinâmica de funcionamento do ventrículo e átrio direito, além de fornecer outras informações a respeito de outros locais, como a circulação pulmonar por exemplo. Desa forma, pode-se dizer que o pulso arterial está para a ejeção ventricular esquerda assim como o pulso venoso está para o enchimento ventricular direito. Como examinar o Pulso Venoso ? A veia de escolha para se examinar o pulso venoso é a veia jugular interna direita, que pode ser observada na margem anterior do esternocleidomastóideo ou no trígono formado pela articulação esternoclavicular, ramo esternal do esternocleidomastóideo e ramo clavicular do mesmo músculo. A veia jugular externa não deve ser a primeira escolha para o exame, pois possui vávulas no seu interior e não está em coluna reta com o átrio direito como está a jugular interna. Contudo, pela dificuldade de visualização desta última, e pela facilidade de acesso da jugular externa, esta é a veia examinada na maioria das vezes na prática clínica. O paciente deve estar deitado em decúbito dorsal, com a cabeceira da cama elevada à 45 graus. A distância vertical da porção mais alta pulsante da veia para o ângulo de Louis é a pressão venosa do paciente em centímetros de água, que não deve ser maior que 3 ou 5. Causas de Pressão Venosa Aumentada Existem inúmeras causas de aumento da pressão venosa central, sendo alguma delas fisiológicas, como o ato de falar, ou o exercício físico. Contudo, existem causas que refletem patologias, tanto de origem cardíaca, como uma insuficiência ou estenose tricúspide, tamponamento cardíaco ou pericardite constrictiva, como de origem não cardíaca, como no pneumotórax, enfisema, tosse e hipertensão arterial pulmonar. Um fato interessante que deve despertar a atenção do examinador é a presença de uma jugular túrgida mas sem pulsações, que na maioria das vezes está relacionada com uma falta de comunicação do átrio direito com o sistema jugular, sendo que as causas mais comuns são a formação de um trombo dentro da veia cava superior ou uma compressão extrínseca, mais comumente por um tumor mediastinal. Diferenças entre o Pulso carotídeo e o venoso Se o examinador quando à beira do leito ficar em dúvida se o que ele está vendo é um pulso venoso ou o pulso carotídeo, pode-se observar algumas características que permitem diferenciar os dois. As mesmas são resumidas na tabela abaixo. Outra manobra que permite a diferenciação entre os dois pulsos é a pesquisa do Refluxo Hepatojugular. Ela consiste na compressão do hipocôndrio direito do paciente por pelo menos 10 segundos, gerando um aumento da turgência ou da coluna de sangue na jugular do mesmo. Esse sinal além de ser útil para tal diferenciação, é bem específico de insuficiência ventricular direita. Morfologia do Pulso Venoso O pulso venoso completo é formado por três ondas positivas, chamadas de ondas “a”, “c” e “v”, e duas deflexões negativas, chamados colapsos “x” e “y”. Sendo que normalmente a onda “a “ é a maior onda positiva e o colapso “x” é a maior deflexão negativa. A ondas do pulso venoso correspondem à curva de pressão do átrio direito e estão demonstradas na figura abaixo. Onda “a”: corresponde à sístole atrial; se localiza logo antes de B1. Onda “c”: corresponde ao abaulamento da valva tricúspide em diração ao átrio direito durante a sístole ventricular; sendo tambem atribuída à uma contaminação pelo pulso carotídeo. Colapso “x”: também conhecido como colapso sistólico do pulso venoso; é causado pela diástole atrial, assim como pelo deslocamento do plano valvar tricúspide para baixo em direção à ponta do coração durante o relaxamento isovolumétrico ventricular. Onda “v”: é resultado da chegada do sangue no átrio direito, causando um aumento da pressão do mesmo, levando à formação de uma onda positiva; se localiza próximo à B2. Colapso “y”: resulta da saída de sangue do átrio direito para o ventrículo direito no momento do enchimento rápido; diferentemente do colapso “x”, o colapso “y” é diastólico. Alterações do Pulso Venoso Jugular Onda “a” Gigante: É resultado da contração atrial vigorosa frente à uma pressão diastólica muito aumentada do ventrículo, ou por causa de alguma obstrução à passagem de sangue para o mesmo. Observa-se uma onda de amplitude aumentada regularmente, próximo de B1. As principais causas são: Hipertensão Arterial Pulmonar; Estenose tricúpide; Hipertofia de VD; Mixoma em AD que obstrua o orifício valvar; e Estenose pulmonar. Curva azul na figura. Duração aumentada: Não identificável clinicamente, somente com o auxílio do flebograma jugular. Indica hipertrofia de AD. A duração da onda é maior, pois o tempo de despolarização do átrio é maior. Ausente: Presente na fibrilação atrial, onde não há contração efetiva dos átrios. Curva verde na figura. Em “Canhão”: Resulta da contração atrial contra uma valva tricúspide ainda fechada. É tipicamente encontrada no BAV de 3˚ grau, onde o átrio, ao bater assincronicamente com o ventrículo, se contrai no mesmo instante que este último, gerando a onda “a” em “canhão”. Esta onda é observada exatamente junto de B1 e de maneira irregular, ou seja, não está presente a todo ciclo (como visto na figura abaixo), difentemente da onda “a” gigante. Colapso “x” Como depende do relaxamento atrial, pode desaparecer na fibrilação atrial. Além disso, está frequentemente diminuído na Insuficiência tricúspide, sendo substituído por uma onda positiva. Isso pode ser explicado pela incapacidade valvar de impedir o fluxo retrógrado de sangue para o AD gerando um grande volume e pressão positiva nessa fase, que normalmente deveria apresentar um queda da pressão. Onda “v”: A onda “v” apresenta-se aumentada nos casos em que o AD recebe volumes muito grandes de sangue durante o seu enchimento. Isso é bem nítido na Insuficiência Tricúspide, onde a onda “v” pode ser chamada de “gigante”.Nessa mesma situação, quando ocorre coexistência de um desaparecimento do colapso “x” (como visto anteriormente) com essa onde “v” gigante, pode-se dizer que o pulso jugular adquire uma morfologia “c v”, onde observa-se um pulso sistólico ou ventricularizado. Outra causa de onde “v” aumentada é a Comunicação Interatrial, onde o shunt esquerda- direita gera um volume maior para o AD. Colapso “y” Profundo: Está presente tipicamente nas doenças que restringem o relaxamento ventricular, sendo muito frequente nos casos de pericardite constritiva. Nessa patologia, o enchimento ventricular ocorre de maneira abrupta, levando à uma “sucção” do volume sanguíneo presente no AD na fase de enchimento rápido. Contudo, pela restrição mecância, esse ventrículo não consegue mais acomodar volume, de modo que o colapso “y” volta rapidamente para a linha de base. Dessa forma se observa uma depressão profunda e rápida na jugular do paciente. Tambem é encontrado no derrame pericárdico sob tensão e em algumas miocardiopativas restritivas. É mostrado na figura abaixo. Diminuído: Essa alteração é consequência de um enchimento ventricular reduzido seja por obstrução valvar, como presente na Estenose tricúspide, ou seja por uma restrição, quase que total, diastólica, comopresente no Tamponamento cardíaco ou grave Hipertrofia de VD. Sinal de Kussmaul O sinal de Kussmaul consiste no aumento da turgência jugular, ou das pulsações venosas durante a inspiração. Em situações fisiológicas, sabe-se que a inspiração diminui a pressão intra-torácica e, portanto, aumenta o retorno venoso, de modo que reduz as pulsações ou o grau de turgência jugular. Em situações de limitação do enchimento ventricular, como a pericardite constritiva ou o tamponamento cardíaco, esse volume que chega ao átrio não é passado para o ventrículo e se acumula no átrio direito e consequentemente no sistema jugular, gerando um aumento das pulsações no mesmo. Esse sinal tambem pode estar presente no DPOC. Bibliografia • Semiologia Cardiovascular; Couto, A., A.; Nani, E.; Mesquita, E., T.; Pinheiro, L., A., F.; Filho, L., J., M., R.; Bruno, W.; editora Atheneu • Tratado de Semiologia Médica; Swartz, M., H.; editora Saunders elsevier • Tratado de Doenças Cardiovasculares; Braunwald; oitava edição; editora Saunders elsevier • Medicina Interna; Harrison; décima sétima edição; editora Artmed • Semiologia Médica; Mário Lopes; terceira edição; editora Atheneu Semiologia Cardiovascular Ausculta Normal e Bulhas – Fonese e Desdobramentos por Cássio Martins Ausculta Normal Introdução A ausculta cardíaca é parte fundamental não somente do exame cardiovascular, mas também do exame clínico geral. Através dela, é possível realizar o diagnóstico, e muitas vezes, avaliar a gravidade da enfermidade apresentada pelo paciente. Contudo, cabe a observação de que a ausculta somente é parte de um exame muito mais amplo, que engloba a anamnese e a avaliação dos diversos outros sistemas presentes no organismo humano. Através da ausculta do coração, pode-se indentificar sons originados do mesmo, que serão classificados de acordo comdiversos parâmetros, dentre os quais estão: frequência; localização no ciclo cardíaco; melhor foco de ausculta e irradiação; duração; etc. Para o reconhecimento e entendimento adequado desses sons, é preciso que médico e pacientes estejam em um ambiente adequado para o exame, que inclui um ambiente agradável (sem barulho; com privacidade para o paciente), uma posição confortável para o paciente e para o médico, e uma relação médico- paciente consistente. De maneira geral, a ausculta é realizada com o paciente em decúbito dorsal, mas isso é constantemente alterado de acordo com o objetivo do examinador, que poder realizar o exame como paciente sentado, em decúbito semi- lateral esquerdo e até de cócoras. Cada modificação de posição tem uma influência sobre determinados sons cardíacos, o que será abordado adiante. O Exame A ausculta será realizada após a devida inspeção e palpação do precórdio, os quais trarão muitas informações que auxiliarão o correto entendimento dos fenômenos auscultatórios. A ausculta pode ser feita de maneira direta, com o examinador posicionando o pavilhão auricular no tórax do paciente. Esse método é menos utilizado depois do advento do estetoscópio, através do qual se realiza a ausculta indireta. O estetoscópio possui três componentes básicos (mostrados na figura abaixo): peças auriculares; sistema de tubos; e as peças torácicas. Estas últimas se dividem em diafragma, útil para a ausculta de sons agudos (alta frequência), ou seja, da maioria dos sons cardíacos, e a outra parte é a campânula, usada para a ausculta dos sons mais graves (baixa frequência), representados pelas bulhas acessórias (B3 e B4) e o ruflar diatólico da estenose mitral. Em posse do estetoscópio, pode-se começar a ausculta. Mas onde auscultar ? Para direcionar o exame físico, existem áreas onde fenômenos originados de determinadas estruturas do coração são melhor percebidas. Estes são os focos de ausculta. Portanto, o foco aórtico é o local no precórdio onde os fenômenos originados da valva aórtica são melhor auscultados, e isso se repete para os demais focos. O focos clássicos estão mostrados na figura abaixo (juntos de outros), sendo eles: Foco Aórtico (valva aórtica): segundo espaço intercostal na linha paraesternal direita. Foco Pulmonar (valva pulmonar): segundo espaço intercostal na linha paraesternal esquerda. Foco aórtico acessório (melhor local para ausculta da Insuficiência Aórtica): terceiro espaço intercostalna linha paraesternal esquerda. Foco tricúspide (valva tricúspide): borda esternal esquerda inferior Foco mitral (valva mitral): quinto espaço intercostal na linha hemiclavicular esquerda. Contudo, além desses focos clássicos, recomenda-se a ausculta de outras áreas como o pescoço e a fúrcula esternal (irradiação do sopro da estenose aórtica), as regiões infraclaviculares (sopro da Persintência do canal arterial), região axilar (sopro de Colececil), entre outras. Além disso, pode e deve-se auscultar toda a área próximo do foco de ausculta, pois devido a variações anatômicas indivíduais, os sons cardíacos podem ser melhor audíveis nessas áreas. Sabendo-se os locais onde posicionar o estetoscópio pode-se iniciar a ausculta, e para evitar que o examinador se esqueça de algum dado do exame, recomenda-se que o mesmo tenha uma rotina, que permita a avaliação das diversas informações que o exame apresenta. A melhor rotina será aquela criada pelo próprio examinador, contudo que não esqueça de nenhum passo. A Metodologia do Exame O examinador pode começar pelos focos da base do coração (aórtico e pulmonar) ou pelos do ápice cardíaco (mitral e tricúspide), contanto que não deixe de exminar nenhum dos focos. O primeiro passo após posicionar o estetoscópio no tórax do paciente é identificar o que é a primeira bulha (fechamento da valvas atrioventriculares) e o que é a segunda bulha (fechamento das semilunares). A melhor forma para tal é palpar a artéria carótida do paciente ao mesmo tempo que ausculta-o. A bulha que coincide com o pulso da artéria é a B1. Outra forma de fazer essa diferenciação, que requer mais experiência por parte do examinador, é avaliar a característica auscultatória de B1, que é um som mais suave e prolongado, como uma batida de surdo (“Tum”), e de B2, que é um som mais seco (“Tá”). Após identificar esses sons, pode-se identificar asístole auscultatória, que é o período entre B1e B2, e a diástole auscultatória, que compreende o espaço entre B2 e B1. Realizado esse passo, o examinador está apto a localizar qualquer som dentro do ciclo cardíaco, o que essencial para a correta compreensão do mesmo. A partir desse momento o examinador deve-se perguntar: 1. O ritmo é regular ? 2. Como estão as Bulhas ? Hiper ou Hipofonéticas ? Desdobradas ? Apresenta B3 ou B4 ? 3. Como está a sístole ? Tem Sopro ? Click ? Atrito ? 4. Como está a diástole ? Tem Sopro ? Estalido ? Atrito ? Importante lembrar que esse é um roteiro resumido do que o examinador pode encontrar na ausculta cardíaca e funciona somente para o mesmo não deixar os dados mais básicos passarem despercebidos. Além de que, como dito anteriormente, a mehor rotina é aquela criada pelo próprio examinador, desde que ela não deixe de contemplar nenhuma parte do exame. Manobras Auxiliares Muitas vezes, o examinador ficará em dúvida ao auscultar um determinado som cardíaco, de modo que não consiga diferencia-lo de um outro som, ou que seja necessário amplificar esse som auscultado. Para tal, o profissional lança mão da ausculta dinâmica, que se caracteriza pelo uso de diversas manobras como mudança de posição ou respiração para melhorar a acurácia do exame. A principais manobras são: Inspiração profunda: quando o paciente inspira, a pressão intra-torácica diminui, o que aumenta o retorno venoso e consequentemente aumenta o volume no lado direito do coração, por isso, essa manobra amplifica os fenômenos oriundos destas câmaras cardíacas, por exemplo na Insuficiência tricúspide. Müller: uma variante da inspiração profunda, onde o paciente irá inspirar mas com o dedo indicador de uma das mãos na boca e a outra mão “tapando”o nariz. Será como se o paciente estivesse “chupando o dedo”. O resultado é o mesmo que o da inspiração, com a vantagem de se eliminar os ruídos respiratórios. É particulamente indicada nos pacientes com a respiração muito ruidosa. Valsalva: é o contrário da inspriração profunda, onde o paciente fará uma expiração com a glote fechada ou contra algum obstáculo que impeça a saída de ar dos pulmões, como a mão do próprio paciente. Nesse caso, a pressão intratóracia aumenta e diminui o retorno venoso, o que diminui o volume em todas a cavidades do coração. Essa manobra diminui a intensidade de todos os sopros do coração, mas aumenta o sopro da cardiomiopatia hipertrófica e antecipa o click e prolonga o sopro do prolapso mitral. Essas alterações serão explicadas melhor nas aulas de Estenose Aórtica e Insuficiência Mitral. Essa manobra é contra-indicada no paciente com Síndrome coronariana ou Insuficiência Cardíaca. Mudança de posição do paciente de deitado para ortostático ou de cócoras para em pé: ambas as manobras reduzem o retorno venoso e portanto diminuem todos o sopros do coração, com excessão do sopro da cardiomiopatia hipertrófica e do prolapso mitral, que irão sofrer a mesma influência da manobra de Valsalva. Mudança de posição do paciente de em pé para cócoras: causa aumento do retorno venoso, aumentando o volume em todas as cavidades cardíacas, o que acentua ou não altera todos os sopros do coração, mas diminui o sopro da cardiomiopatia hipertrófica e atrasa o click e o sopro do prolapso mitral. Elevação passiva dos membros inferiores do paciente: aumenta o retorno venoso para o lado direito do coração, de modo que amplifica o fenômenos oriundos dessas câmaras. Por aumentar o volume no ventrículo esquerdo, essa manobra causa a diminuição no sopro da cardiomiopatia hipertrófica. Exercício isométrico: caracterizado pelo handgrip; pede-se para o paciente cerrar os punhos fortemente, isso aumenta a resistência vascular periférica, o que aumenta os sopros gerados no lado esquerdo do coração, com excessão do sopro da estenose aórtica. Isso explica-se pelo fato do aumento da pré-carga, diminuir a saída de sangue do ventrículo esquerdo, de modo que diminui a intensidade do sopro da estenose aórtica. Está contra-indicado na doença coronariana. Execício isotônico: caracterizado pela repetição de um exercício, como fazer polichinelos; isso aumenta o fluxo sanguíneo, o que aumenta os sopros originados do lado esquerdo do coração. Utilização de drogas vasoativas: caracteriza-se pelo uso de drogas vasoconstrictoras ou vasodilatadoras para estudo dos respectivos efeitos. Devido à insegurança da administração dessas drogas nos paciente e pela efetividade dos outros métodos, são muito pouco utilizadas. Primeira Bulha A primeira bulha (B1) é um som de curta duração originado do fechamento das valvas atrioventriculares, mitral (M1) e tricúspide (T1). É melhor percebida com o paciente em decúbito dorsal, com o diafragma do estetoscópio nos focos mitral e tricúspide. Como dito anteriormente, é identificada por ser a bulha que coincide com o pulso carotídeo. Desdobramento Fisiológico de B1 Normalmente, a valva mitral fecha-se antes da valva tricúspide. Contudo esse intervalo é muito pequeno e o ouvido humano não consegue perceber, de modo que M1 e T1 geram um mesmo som, tipicamente representado como um “Tum”. Em algumas pessoas, esse intervalo é um pouco maior e os dois componentes de B1 conseguem ser auscultados, gerando um som tipicamente representado por um “Trum”. Isso não reflete morbidade, é somente uma variante do normal. Esse desdobramento somente é auscultado no foco tricúspide, porque esse é o único foco onde é possível ouvir T1, em todos os demais focos o som de M1, por ser muito mais alto, ofusca T1. Hiperfonese de B1 Quando a primeira bulha possui sua intensidade maior do que quando auscultada normalmente, ou seja, quando ela está mais “alta”, diz-se que está hiperfonética. As principais causas para da hiperfonese de B1 se dividem em causas extra-cardíacas e causas cardíacas. Extra-cardíacas: atuam facilitando a transmissão do som gerado no coração até o tórax do paciente. Portanto se resumem basicamente ao diâmetro ântero- posterior do tórax do doente. De modo que crianças e adultos muito magros podem ter a primeira bulha aumentada ao exame físico. Cardíacas: diversas são as causas cardíacas que levam à hiperfonese de B1, dentre elas cabe destacar: Síndromes hipercinéticas: uma vez que os sons gerados no coração são oriundos da aceleração e desaceleração do sangue e das estruturas cardíacas, situações em que esses componentes estão atuando com velocidade aumentada geram sons mais altos. Basicamente, as vávulas AV fecham com uma velocidade muito grande gerando uma B1 hiperfonética. Sobrecarga de Pressão: situações em que o ventrículo está submetido à uma pressão muito grande (Estenose aórtica e HAS de longa data) fazem com que este responda se hipertrofiando, de modo a gerar uma contração mais forte. Essa contratilidade aumentada faz com que a valva se feche mais rápido e gera uma bulha hiperfonética. Estenose mitral: a limitação do fluxo do átrio para o ventrículo gera um acúmulo de sangue no primeiro, o que aumenta a pressão dentro do mesmo. Dessa forma, na diástole, a pressão no átrio é muito maior do que no ventrículo, deixando a valva mais aberta. Conforme a pressão no ventrículo aumenta (pelo acúmulo de sangue e contração ventricular) a valva atrioventricular, que deveria ir fechando em situações fisiológicas, se mantém aberta porque a pressão no átrio é muito grande. Dessa forma, quando o ventrículo finalmente supera a pressão reinante no átrio, a valva ainda está muito aberta e fecha dessa posiçãomais aberta, gerando um som mais intenso, que é uma B1 hiperfonética. Além disso, a valva anatomicamente alterada, por si só, é fator que gera hiperfonese de B1. Conforme a doença progride e surge calcificação, levando a imobilização da valva, essa intensidade diminui podendo chegar até a hipofonese. Intervalo PR curto: a valva atrioventricular não se fecha de uma posição totalmente aberta para uma posição totalmente fechada. Conforme ela fecha, no meio do caminho, ela dá uma “paradinha” e termina de se fechar a partir dessa posição. Portanto, fisiologicamente, a valva se fecha de uma posição menos aberta quando comparada com o início da diástole. Nas situações com intervalo PR curto no eletrocardiograma, como nas taquiarritmias, a contração do ventrículo é tão rápida que não dará tempo de valva dar essa “paradinha” e ela fechará de uma posição mais aberta, gerando uma B1 hiperfonética. Outro fato que contribui para a hiperfonese, é que como o PR é curto, o ventrículo inicia a sua contração no momento em que o átrio ainda está terminando a sua contração, e portanto está mantendo essa valva atrioventricular mais aberta. Hipofonese de B1 Quando a primeira bulha encontra-se com sua intensidade menor do que o normal, diz-se que ela está hipofonética. As causas de B1 hipofonética também se dividem em cardíacas e extra-cardíacas. Extra-cardíacas: atuam dificultando a transmissão dos sons cardíacos para o tórax do paciente. Os principais exemplos são o aumento do diâmetro ântero-posterior do tórax, observado no DPOC, e o Derrame Pericárdico, onde o líquido no interior do saco pericárdico atua como uma barreira para a transmissão dos sons gerados no coração. Cardíacos: Também são diversas as causas de hipofonese de B1, mas pode- se destacar: Insuficiência Cardíaca: conforme a função ventricular entra em falência, a contratilidade fica menor e a velocidade de fechamento das valvas é menor, gerando uma B1 hipofonética. Síndrome Isquêmica: possui a mesma explicação que a anterior, ou seja, menor contratilidade miocárdica. Estenose mitral grave: quando a estenose mitral evolui para calcificação dos folhetos valvares, ela gera uma imobilidade dos mesmos, que passam a gerar uma B1 hipofonética. Isso é sinal de gravidade na doença. Intervalo PR longo: ao contrário do que acontece com o intervalo PR curto, a valva atrioventricular tem tempo de sobra para dar a “paradinha” e assumir uma posição mais fechada para fechar, de modo que irá gerar uma B1 hipofonética. Além disso, o longo espaço entre a contração atrial e a contração ventricular permite que o ventriculo se contraia quando o átrio já relaxou e diminui a pressão dentro dessa cavidade, de modo a não segurar mais essa valva em uma posição mais aberta. Desdobramento Patológico de B1 O desdobramento de B1 é patológico quando o intervalo entre o fechamento de T1 e M1 é muito grande e gera dois sons muito separados, além de estarem associados à alguma morbidade por parte do paciente. O principal mecanismo que gera o desdobramento de B1 é o atraso no fechamento de T1, sendo a principal causa o Bloqueio de ramo direito do Feixe de Hiss. É fácil entender a razão, uma vez que nessa patologia o estímulo demora mais para chegar ao ventrículo direito, que começará sua contração mais tardiamente, ocasionando o fechamento mais tardio da valva tricúspide. Outras causas são mecânicas, sendo possível citar a Comunicação Interatrial e a Anomalia de Ebstein. Diagnóstico diferencial O desdobramento amplo de B1 pode ser confundido com outros sons que acontecem no ciclo cardíaco próximo da primeira bulha. Dentre eles, pode-se destacar a quarta bulha (B4) e o click de ejeção tanto da valva aórtica como da pulmonar. A principais diferenças entre esses sons são destacadas no quadro abaixo. Desdobramento de B1 B4 Click de Ejeção Palpável Não Sim Não Peça do Estetoscópio Diafragma Campânula Diafragma Foco de Ausculta FT FM FA ou FP Resultado com a posição ereta Não se altera Diminui Aumenta Lembrar de levar em consiração outros dados do exame clínico !!! Segunda Bulha A segunda bulha cardíaca (B2) é um som de curta duração, que é gerado pelo fechamento das valvas semilunares, aórtica (A2) e pulmonar (P2). É usualmente examinada com o paciente em decúbito dorsal, mas muitas vezes precisa-se examiná- la com o paciente sentado, por exemplo para avaliaçãode desdobramentos e do sopro da insuficiência aórtica. Para o exame, usa-se o diafragma do estetoscópio posicionado nos focos aórtco (A2) e pulmonar (P2). Ao exame, ela é a bulha que não coincide como impulso do pulso carotídeo. Normalmente, a ausculta de B2 no foco aórtico (A2) gera um som de maior intensidade do que quando ausculta-se B2 nofoco pulmonar (P2), ou seja, o componente aórtico de B2 é normalmente mais intenso que o componente pulmonar, daí retira-se a “regra” A2>P2. Isso se explica porque as pressões que a valva aórtica suporta são muito maiores que aquelas presentes no lado pulmonar. Quando no exame encontra-se P2>A2 significa que a circulação pulmonar encontra-se com uma pressão muito aumentada, caracterizando um quadro de Hipertensão Arterial Pulmonar. Desdobramento Fisiológico de B2 A segunda bulha cardíaca normalmente encontra-se como um som seco e único, tipicamente caracterizado como um “Tá”. Ele é único, porque apesar de a valva aórtica fechar-se antes da pulmonar, esse intervalo não é captado pela audição humana. Contudo, em algumas pessoas sem doença cardíaca, esse intervalo pode estar um pouco aumentado, a ponto de ser possível auscultar ambos os componentes de B2 no exame. Esse fenômeno recebe o nome de Desdobramento Fisiológico, e é reconhecido tipicamente, na ausculta, como um “Tra”. O desdobramento fisiológico possui uma característica própria, que é a de aparecer ou aumentar com a inspiração e desaparecer ou diminuir com a expiração. Isso acontece porque na inspiração, a pressão intratorácica diminui e leva à um aumento no retorno venoso, o que aumenta o volume de sangue no ventrículo direito, levando o mesmo a demorar mais para ejetar todo o seu débito, de modo a atrasar o fechamento da valva pulmonar, levando ao aparecimento do desdobramento à ausculta. Portanto, tipicamente, o desdobramento fisiológico é aquele que aparece com a inspiração e desaparece com a expiração, podendo estar presente nessas duas fases. Mas quando coloca-se o paciente sentado ou em pé, ele tipicamente desaparece na expiração. De modo que um paciente com desdobramento de B2 que, quando deitado, aparece na expiração e, quando sentado ou em pé, desaparece na expiração, pode-se dizer que ele tem um desdobramento fisiológico. Por último, cabe dizer que a ausculta desse desdobramento e dos demais desdobramentos que serão discutidos daqui pra frente será realizada no foco pulmonar, pois esse é o único foco onde ausculta-se P2 , uma vez que em todos os outros focos ausculta-se somente A2 em função de sua maior intensidade. Hiperfonese de B2 Quando a segunda bulha cardíaca encontra-se com intensidade aumentada, diz-se que B2 está hiperfonética. As causas, assim como em B1, são de origem cardíacas e extra-cardíacas. Extra-cardíacas: atuam, assim como em B1, facilitando a transmissão do som. Representado pelo tórax de crianças e de indivíduos magras. Cardíacas: são várias as causas, mas pode-se destacar: Hipertensão Arterial Pulmonar: aumenta a intensidade de P2 por aumento da pressão no interior do vaso gerando umamaior velocidade no fechamento das valvas, levando à hiperfonese. Conforme descrito anteriormente, o exame físico mostrará P2>A2. Hipertensão Arterial Sistêmica: aumenta a intensidade de A2 pelo mesmo mecanismo descrito acima. Podendo tambem contibuir o fato de que uma hipertensão de longa data pode gerar algum grau de dilatação da aorta, o que aproxima a artéria da parede torácica, contibuindo para a hiperfonese. Aneurisma de Aorta ascendente: independente da causa (endocardite, sífilis, HAS, Marfan), o mecanismo é a aproximação da aorta da parede torácica. Estados Hipercinéticos: nesses estados o débito encontra-se muito aumentado, o que gera um volume ejetado muito grande no vaso, que passa a apresentar uma maior pressão no seu interior e se distende mais, quando esse vaso regride, ele volta com uma velocidade muito alta e leva à um fechamento mais rápido da valva, gerando uma hiperfonese. Hipofonese de B2 Quando a segunda bulha cardíaca encontra-se com sua intensidade diminuída, diz que B2 está hipofonética. As causas também se dividem em cardíacas e extra- cardíacas. Estas últimas são exatamente iguais àquelas comentadas no tópico “Hipofonese de B1” e portanto não serão comentadas aqui. Cardíacas: são diversas as causas, merecendo destaque: Falência miocárdica: na insuficiência cardíaca sistólica, o débito cardíaco encontra-se muito diminuído, de modo que menos sangue chega a aorta, ocupando menos espaço, originando uma baixa pressão no interior desse vaso, o que faz com que a valva aórtica se feche mais lentamente e assim causa uma B2 hipofonética. O ventrículo em falência tambem se relaxa mais lentamente, de modo que o sangue volta mais lentamente para a fechar a valva aórtica, que se fecha mais lentamente. Síndrome Isquêmica aguda: é basicamente o mesmo mecanismo do descrito acima, causado pela isquemia que leva à uma disfunção miocárdica. Estenose Aórtica ou Pulmonar: a própria calcificação da valva em função da doença pode levar à imobilidade da mesma, levando à hipofonese. Além disso, a limitação da passagem do fluxo gera um volume dentro do vaso menor, que contrinui para uma menor pressão e fechamento mais lento da valva, levando à hipofonese. Insuficiência Aórtica ou Pulmonar: B2 é oriunda do fechamento das valvas semilunares, logo se elas não fecharem corretamente a B2 será hipofonética. Desdobramentos Patológicos Como dito anteriormente, existem situações em que A2 e P2 fecham-se muito distantes um do outro originando uma situação chamada de desdobramento. Este pode ser fisiológico, como já discutimos anteriormente, e pode ser patológico e estar associado à alguma patologia cardíaca. Vamos estudar os principais desdobramentos patológicos. Desdobramento Amplo de B2 Este ocorre por qualquer patologia que atrase o fechamento do componente pulmonar ou adiante o fechamento do componente aórtico. Caracteriza-se por ser um desdobramento presente tanto na inspiração (onde ele aumenta) como na expiração (onde ele diminui), e não desaparece nem com o paciente sentado ou em pé, o que auxilia muito na diferenciação do desdobramento fisiológico. Apresenta causas elétricas, destacando-se o Bloqueio de Ramo Direito do Feixe de Hiss, que irá atrasar a contração do ventrículo direito, atrasando o fechamento da valva pulmonar. Mas também apresenta causas mecânicas, como a Insuficiência Mitral, que encurta a sístole do VE, antecipando o fechamento da valva aórtica. Outras causas são Estenose Pulmonar, Embolia Pulmonar e Insuficiência de VD, todas cursando com prolongamento do tempo de ejeção do VD, atrasando o fechamento da valva pulmonar. Desdobramento Fixo de B2 Este desdobramento ocorre por um atraso no fechamento da valva pulmonar, mas apresenta uma característica que o distingue de todos os outros que é o fato de não se alterar com a respiração. Ele está tipicamente presente na Comunicação Interatrial (CIA). Nessa situação, durante a inspiração ocorre aumento do retorno venoso, levando a um maior volume no VD e consequentemente maior tempo de ejeção. Na expiração, quando esse volume de VD deveria diminuir, ele se mantem alto, porque agora o AD está recebendo sangue do AE, por um shunt esquerda-direita, o que mantem o volume do VD alto, mantendo o atraso de fechamento da valva pulmonar. Desdobramento Paradoxal de B2 Este desdobramento ocorre quando alguma doença cardíaca antecipa o fechamento da valva pulmonar, ou atrasa o fechamento da valva aórtica. De modo que, quando o paciente inspirar fundo, o componente pulmonar se atrasa (como já explicado anteriormente) e se junta ao aórtico, levando o desdobramento à desaparecer. Portanto, ele recebe esse nome, porque na inspiração, quando ele deveria aumentar, ele diminui ou (mais comumente) desaparece. Apresenta causas elétricas, como o Bloqueio de Ramo Esquerdo do Feixe de Hiss, que atrasa a contração do VE, atrasando o fechamento da valva aórtica, ou a presença de Marca- Passo de VD, que irá estimular antes o VD, levando ao fechamento precoce da valva pulmonar. Mas também possui causas mecânicas, como a Estenose Aórtica, HAS com comprometimento miocárdico e as demais cardiomiopatias, todas apresentando um tempo de ejeção aumentado – seja por obstrução fluxo, seja por disfunção miocárdica- o que atrasa o fechamento da valva aórtica. Diagnóstico diferencial Os desdobramentos de B2 podem ser confundidos com outros sons de curta duração que acontecem no ciclo cardíaco próximos de B2, como a terciera bulha (B3) e o estalido de abertura. Os principais elementos usados para a diferenciação entre eles estão listados na tabela abaixo. Desdobramento de B2 B3 Estalido de abertura Palpável Não Sim Pode ser Foco de ausculta FP FM Difuso Peça do estetoscópio Diafragma Campânula Diafragma Inspiração Aparece ou acentua Não se altera Não se altera Sonoridade Igual à B2 Suave e abafada Agudo, seco Bibliografia • Semiologia Cardiovascular; Couto, A., A.; Nani, E.; Mesquita, E., T.; Pinheiro, L., A., F.; Filho, L., J., M., R.; Bruno, W.; editora Atheneu • Tratado de Semiologia Médica; Swartz, M., H.; editora Saunders elsevier • Tratado de Doenças Cardiovasculares; Braunwald; oitava edição; editora Saunders elsevier • Medicina Interna; Harrison; décima sétima edição; editora Artmed • Semiologia Médica; Mário Lopes; terceira edição; editora Atheneu Semiologia Cardiovascular B3, B4, Cliques, Estalidos e Atrito Pericárdico Por Gustavo Amarante 1 – Bulhas Acessórias (B3 e B4) A) Revisão do Ciclo Cardíaco e Posição das Bulhas Para entender as bulhas acessórias, primeiramente precisamos localizá-las no ciclo cardíaco. Portanto, vamos fazer uma breve revisão do ciclo. A figura abaixo foi desenhada expondo diversos componentes que podem ser localizados no ciclo cardíaco. Mas para melhor entendimento devemos analisá-la por partes. Dê atenção, inicialmente, às curvas de pressão arterial (parte superior da figura) onde estão representadas as curvas da aorta, do ventrículo e do átrio. Veja que o ciclo inicia-se pelo fechamento das válvas atrioventriculares (mitral e tricúspede) o que corresponde ao início da contração ventricular. Nesse momento a contração ventricular isovolumétrica, ou seja, sem ejeção de sangue, é responsável pelo grande aumento da pressão intraventricular. Essa pressão eleva-se até que se atinja a pressão da aorta, quando abre a sua valva e o sangue começa a ser ejetado. Agora, com a ejeção do sangue, a pressão no ventriculo sobe de maneira menos brusca e começa a diminuiraté que seja menor que a pressão aórtica, ocorrendo o fechamento da sua valva. Nesse momento tanto a valva aortica quando a mitral estão fechadas e o ventrículo passa a relaxar, o que leva à brusca redução da sua pressão. Quando a pressão ventricular estiver mais baixa que a do átrio, a valva atrioventricular abrirá e o sangue que estava no átrio passará a encher o ventrículo. O enchimento ventricular ocorre em 3 fases : enchimento rápido, enchimento lento e contração atrial, nessa ordem. Após revisada essa parte do ciclo cardíaco, devemos lembrar da posição das bulhas. A primeira bulha ocorre pelo fechamento das valvas atrioventriculares, ou seja, é um ruído que define o início da sístole (sendo, portanto, um som sistólico). Já a segunda bulha ocorre pelo fechamento das valvas semilunares, evento que delimita o início da diástole ventricular. Além disso, podemos ter outras 2 bulhas acessórias às principais. São elas: terceira e quarta bulhas. Ambas são ruídos DIASTÓLICOS, ou seja, encontram-se entre a B1 e a B2 no ciclo cardíaco. A diferença em relação ao momento do ciclo em que aparecem, é que a B3 ocorre na proto-diástole (após B2) e a B4 na pré-sistole (antes da B1). Veremos a seguir como isso é importante no diagnóstico estetoacústico das bulhas acessórias. B) Terceira Bulha Cardíaca (B3) 1) FISIOPATOGÊNESE A terceira bulha pode ser fisiológica ou patológica (quando há cardiopatia associada). Em ambos os casos ela ocorre na mesma fase do ciclo – o enchimento rápido. Essa fase é a primeira fase de enchimento ventricular, que ocorre logo após a abertura das valvas atrioventriculares. Ela torna-se audível e presente quando o sangue proveniente do enchimento rápido vibra na parede do ventrículo. Vamos entender quando ocorre essa vibração. Ocorre em crianças e adultos jovens. Devido à proximidade do coração com a parede torácica, e à Maior velocidade do sangue na fase de enchimento ventricular o Isso ocorre pelo fato do coração desses indivíduos apresentar um maior gradiente de pressão entre átrio e ventrículo, o que culmina na passagem mais veloz de sangue para este. Importante: o A B3 fisiológica é melhor audível com o indivíduo em decúbito lateral esquerdo. o É característico o seu desaparecimento quando o paciente está de pé ou sentado. Caso continue presente, deve-se pensar em cardiopatia. Ocorre pela vibração do sangue proveniente da fase de enchimento rápido em uma parede ventricular dilatada por hipertrofia excêntrica. Veja abaixo a diferença entre uma hipertrofia concêntrica e excêntrica, e como surge esta última. 2) A HIPERTROFIA EXCÊNTRICA C) Quarta Bulha Cardíaca (B4) 1) FISIOPATOGÊNESE A quarta bulha, na maioria das vezes, é patológica. Exceto em situações como as síndromes hipercinéticas ou quando trata-se de um atleta. Tanto é verdade que, diz-se que, caso ausculte uma B4 em um indivíduo normal e ele não apresenta síndrome hipercinética ou não é atleta, com certeza há uma cardiopatia associada que não foi inicialmente diagnosticada. Diferente da terceira bulha, a B4 ocorre na última fase do enchimento ventricular – representada pela contração atrial. Essa fase é responsável por cerca de 20 a 30% do sangue ejetado para o ventrículo. Ocorre pela vibração do sangue durante a contração atrial em um ventrículo pouco complacente. A baixa complacência do ventrículo pode ocorrer em diversos processos, como na hipertrofia concêntrica, doenças infiltrativas do miocárdio, inflamações miocárdicas, infarto, etc. Porém, dentre essas, aquela que mais frequentemente leva ao aparecimento da quarta bulha é a HIPERTROFIA CONCÊNTRICA. Portanto, iremos abordar apenas essa causa (veja mais a frente). A B4 desaparece na fibrilação atrial (FA). Fato justificado pela sua patogênese – a bulha surge na fase de contração atrial (ausente na FA). Note a diferença de uma hipertrofia concêntrica (à esquerda) para uma hipertrofia excêntrica (à direita). 2) A HIPERTROFIA CONCÊNTRICA D) Características Gerais (B3 e B4) São ruídos de baixa frequência (grave); o Portanto são melhores vistos na palpação; o Na ausculta são melhores audíveis utilizando a campânula do estetoscópio, pois esta transmite melhor os sons de baixa frequência. São diastólicos (B3 é proto-diastólico e B4 é tele-diastólico ou pré-sistólico); Podem ser auscultadas tanto no foco mitral como tricúspide, sendo devido a alterações do ventrículo direito ou esquerdo; São melhores auscultadas em decúbito lateral esquerdo, por aproximar a ponta do coração da caixa torácica. 2 – Cliques e Estalidos São sons de alta frequência (agudos) – melhores audíveis com o diafragma do estetoscópio; Ocorrem próximos a B1 (cliques de ejeção) ou à B2 (estalidos de abertura); Surgem quando há estenose valvar; Desaparecem quando a valva calcifica ou torna-se imóvel. A) Como diferenciá-los de B3 e B4? 3 – Atrito Pericárdico Ocorre na pericardite aguda; Desaparece quando surgem grandes derrames pericárdicos ou quando a pericardite é crônica; É um ruído de alta frequência, áspero e raspante. Assemelha-se ao ranger de “couro novo”; É melhor audível com a flexão do tronco do paciente e utilizando o diafragma do estetoscópio pressionado sobre o tórax; Pode ser audível em qualquer área do precórdio, mas predomina-se no foco pulmonar e na borda esternal esquerda; Pode ter 3 componentes, quando o atrito é completo. Sendo eles: o Componente pré-sistólico o Componente sistólico. Este é o componente mais comum. o Componente proto-meso-diastólico. Este é o componente mais raro. Semiologia Cardiovascular Insuficiência Mitral Por Matheus Vieira Gonçalves 1- Etiologia O aparelho da valva mitral consiste dos folhetos valvares, da cordoalha tendínea, dos músculos papilares e do anel mitral. As anomalias de qualquer dessas estruturas podem provocar a regurgitação mitral (RM). As principais causas são o prolapso da valva mitral, doença cardíaca reumática, endocardite infecciosa, calcificação anular, cardiomiopatia e doença cardíaca isquêmica. A) Anomalias dos Folhetos Valvares A insuficiência mitral causada pela doença cardíaca reumática crônica é consequência de encurtamento, rigidez, deformidade e retração de uma ou ambas as cúspides valvares, associadas ao encurtamento e fusão da cordoalha tendinosa e dos músculos papilares. Quando falamos em endocardite infecciosa, a RM pode ser por perfuração das válvulas, pelas vegetações impedindo o fechamento dos folhetos ou, ainda, pela retração valvar durante a cicatrização do processo de endocardite. B) Anomalias do Anel Mitral Em situações normais, o anel mitral é flexível, e, portanto, a contração do ventrículo esquerdo provocará uma diminuição nessa circunferência, contribuindo de forma significativa para o fechamento valvar. A RM secundária à dilatação do anel mitral pode ocorrer em qualquer situação de dilatação do ventrículo esquerdo, sobretudo na cardiomiopatia dilatada. A calcificação degenerativa idiopática do anel mitral tem grande incidência na população, principalmenteidosa, sem grandes conseqüências funcionais. Quando tal calcificação é grave, no entanto, não há a constrição anelar correta e simultânea à contração do ventrículo, provocando a RM. Fatores de risco como a hipertensão, a diabetes e a hipercolesterolemia estão envolvidos no processo. Contudo, outros situações clínicas podem acelerar esse processo, como nos pacientes renais crônicos, com hiperparatireoidismo secundário, e nas síndromes de Marfan e de Hurler, que cursam também com dilatação do anel valvar. Com o contínuo depósito de cálcio, formam-se espículas calcificadas que podem se projetar para o interior do miocárdio ventricular esquerdo adjacente. Assim, pode haver imobilização da porção basal dos folhetos mitrais, agravando a RM que resulta da perda da função esfinctérica normal do anel valvar. Ainda, o depósito de cálcio pode se expandir para as artérias coronárias, para o sistema de condução, comprometendo a comunicação intraventricular e/ou atrioventricular, e em metade dos pacientes encontram-se calcificação aórtica associada, porém sem maiores repercussões. C) Cordoalha Tendínea Outra causa importante de RM consiste das alterações da cordoalha tendinosa. Seu alongamento e ruptura são as principais características encontradas no prolapso mitral. As cordoalhas podem apresentar anormalidades congênitas; a ruptura pode ser espontânea ou primária, por aumento na tensão mecânica ou por dilatação aguda do ventrículo; ou, ainda, ser conseqüente à endocardite infecciosa, trauma ou febre reumática. Vale constar que as cordoalhas do folheto posterior são mais acometidas que as do anterior. D) Músculos Papilares Por serem irrigados pela porção terminal do leito vascular coronariano, os músculos papilares são particularmente sensíveis à isquemia, podendo qualquer alteração nessa circulação causar disfunção dessa musculatura, principalmente quando a exposição à isquemia é prolongada. O músculo papilar posterior, irrigado pelo ramo descendente posterior da coronária direita se torna isquêmico e infarta mais frequentemente que o papilar ântero-lateral, que é irrigado pelos ramos diagonais da descendente anterior e frequentemente pelos ramos marginais da circunflexa esquerda. A isquemia em questão tem como principal causa a doença aterosclerótica coronariana, mas também pode ser em virtude de anemias graves e choques. Há uma disfunção regional do miocárdio do ventrículo esquerdo na base do músculo papilar, resultando em flacidez dos folhetos mitrais e em fechamento incompleto desses folhetos. A necrose do músculo papilar é complicação freqüente dos infartos, mas a ruptura total é um algo muito menos comum, porém altamente letal. E) Disfunção de Ventrículo Esquerdo A disfunção isquêmica do ventrículo esquerdo e a cardiomiopatia dilatada são fatores etiológicos importantes para o desenvolvimento da RM, sendo a segunda principal causa, logo após o prolapso. A dilatação do ventrículo esquerdo, qualquer que seja sua causa, incluindo a isquemia, pode alterar a relação espacial entre os músculos papilares e as cordas tendíneas e, portanto, resultar em RM funcional. A perspectiva para o paciente com RM isquêmica é substancialmente pior do que aquela observada na RM por outras causas, devido ao remodelamento associado do ventrículo e de sua disfunção sistólica. Também, nesse caso observamos o dano isquêmico à musculatura papilar e alterações no anel valvar, que contribuem ainda mais para agravar a RM. Importante notar que a RM ocorre em 20% dos pacientes com infarto agudo do miocárdio, indicando um pior prognóstico, mesmo quando em graus leves. A incidência e a gravidade da RM variam inversamente à fração de ejeção, e diretamente com a pressão diastólica final no ventrículo. 2- Fisiopatologia Uma vez que o orifício mitral regurgitante está em paralelo com a valva aórtica, a impedância para o esvaziamento ventricular é reduzida nos pacientes com RM, facilitando a saída de sangue durante a sístole, porém não completamente para a aorta. Estima-se que 50% do sangue é ejetado de volta ao átrio esquerdo antes da abertura da valva aórtica. O volume do fluxo da RM depende de uma combinação entre o tamanho instantâneo do orifício regurgitante e o gradiente de pressão entre o ventrículo e o átrio esquerdos. Assim, tanto o aumento da pré como da pós-carga, quanto a depressão da contratilidade e outras situações que aumentem o tamanho do ventrículo esquerdo, alargam o anel mitral e, desse modo, o orifício regurgitante. Por outro lado, quando o tamanho do ventrículo é diminuído por meio de inotrópicos positivos, diuréticos e, sobretudo, vasodilatadores, o tamanho do orifício regurgitante diminui e o volume regurgitado declina, diminuindo a altura da onda v da pressão atrial esquerda, e também a intensidade e duração do sopro sistólico. A) Compensação Ventricular Esquerda Inicialmente, o ventrículo esquerdo compensa a RM aguda pelo aumento da pré-carga, pelo princípio de Frank-Starling, se esvaziando mais completamente. Há elevação da pré-carga e a redução da pós-carga, que provocam o aumento do volume diastólico final e a redução do volume sistólico final, respectivamente, produzindo um aumento do volume sistólico total. Isso se reflete em um aumento da pressão no átrio esquerdo. Conforme o processo vai se tornando crônico, o estiramento das fibras miocárdicas, além de seu ponto ótimo de contração, impede o bombeamento anterógrado do sangue. Há hipertrofia excêntrica por sobrecarga de volume, mas que não é proporcional ao grau de dilatação ventricular, alargando o orifício regurgitante (“RM gera mais RM”). O volume diastólico final ventricular esquerdo aumenta mais e este, associado a uma massa ventricular ainda funcionante, irá aumentar o volume sistólico final, retornando a seus valores normais. O aumento atrial esquerdo agora acomoda o volume regurgitante em pressões menores. Essa compensação é razoavelmente mantida por anos em muitos pacientes, mas a ativação hormonal e pró-inflamatória e consequente sobrecarga hemodinâmica pode desequilbrar o sistema. Volume sistólico final, pré-carga e pós-carga se elevam, enquanto a fração de ejeção e o volume sistólico total declinam. B) Avaliação da Contratilidade Miocárdica na RM Considerando que os índices de contratilidade miocárdica da fase de ejeção se relacionam com a pós-carga de modo inverso, a RM aguda (pós-carga reduzida), cursa com elevação da fração de ejeção, do encurtamento fracionado e da velocidade de encurtamento circunferencial das fibras. Importante notar que apesar desse aumento, o débito cardíaco efetivo, ou seja, a saída de sangue pela aorta está diminuída. Assim, muitos pacientes desenvolvem sintomas por causa das pressões venosas pulmonares e atriais esquerdas elevadas, relacionadas ao volume regurgitante. Entretanto, outros pacientes só irão desenvolver sintomas relacionados a uma disfunção contrátil grave, com queda dos índices de contratilidade miocárdica, na descompensação da RM, em uma insuficiência cardíaca secundária. C) Hemodinâmica Em geral, o débito ventricular esquerdo total (somatório dos fluxos anterógrado e regurgitante) mantém-se elevado até os estágios finais da doença. A onda a de contração atrial do pulso de pressão atrial esquerda, não é, normalmente, tão acentuada na RM quanto é na estenose mitral, mas a onda v é, caracteristicamente, muito mais alta, por ser registrada durante a sístole ventricular, quando o átrio esquerdo está sendo preenchido com sangue das veias pulmonares e sangue do ventrículo esquerdo. A complacência do átrio esquerdo e do leito venoso pulmonar são determinantes, portanto, na hemodinâmica e no quadroclínico do paciente. Pacientes com complacência normal ou reduzida (RM aguda) possuem pequena dilatação do átrio, elevação marcante da pressão média dessa cavidade, e a congestão pulmonar é um sintoma importante. É observada grande onda v na pressão de pulso do átrio. Em contrapartida, pacientes com complacência significativamente elevada (RM grave de longa duração) apresentam grande dilatação do átrio e pressão, no máximo, discretamente elevada. Há pouca massa muscular, que perdeu lugar para tecido fibroso, que altera propriedades de condução da parede do átrio. Assim, estão quase sempre presentes a fibrilação atrial e o baixo débito cardíaco, pela alta complacência do átrio, que recebe grande parte da fração de ejeção do ventrículo. 3- Manifestações Clínicas A) Sintomas A natureza e a gravidade dos sintomas nos pacientes com RM crônica são decorrentes de uma combinação de fatores interrelacionados que incluem: Taxa de sua progressão Nível das pressões atrial esquerda, venosa e arterial pulmonar Presença de taquiarritmias atriais episódicas ou crônicas Presença de doença valvar, miocárdica ou arterial coronariana associada Os sintomas podem ocorrer com a função contrátil ventricular esquerda preservada em pacientes com RM crônica que possuem pressões venosas pulmonares bastante elevadas ou fibrilação atrial, com sintomatologia de hipertensão pulmonar. Em outros pacientes, os sintomas anunciam a descompensação ventricular esquerda, com sintomatologia de baixo débito cardíaco. B) Exame Físico A palpação do pulso arterial é útil na diferenciação da estenose aórtica da RM, já que ambas produzem um sopro sistólico que pode bem auscultado tanto na base do coração como no seu ápice. O batimento arterial carotídeo é rápido na RM grave e lento na estenose de aorta. Importante notar que espera-se o volume do pulso normal, a não ser na concomitância da insuficiência cardíaca, onde tal volume estará diminuído. O ritmo presente na RM aguda é sinusal, ao passo que observamos a fibrilação atrial na RM crônica, associada ao remodelamento atrial pela sobrecarga de volume e substituição do tecido muscular cardíaco por tecido fibroso, como já explicitado. Quando a RM crônica grave é gerada por um defeito nos folhetos valvares, a B1 produzida pelo fechamento da valva mitral é geralmente hipofonética. A presença de desdobramento de B2 amplo é comum, resultante de um encurtamento da ejeção do ventrículo esquerdo e da ocorrência mais precoce de A2, como conseqüência da redução na resistência à ejeção do VE. Em pacientes com RM que apresentam hipertensão pulmonar grave, a P2 é mais audível do que A2. O aumento anormal na taxa de fluxo através do orifício mitral durante a fase de enchimento rápido está frequentemente associado ao desenvolvimento de uma terceira bulha que não deve ser interpretada como uma característica de falência cardíaca nesses pacientes, e pode ser acompanhada por um ruflar diastólico breve. Essa B3, contudo, só se desenvolverá após a adaptação atrial ao maior volume de sangue, que se caracteriza por sua dilatação e menor contratilidade. Até isso acontecer, o ritmo em galope observado é com B4, bulha típica da RM aguda, já que o átrio repentinamente submetido à maiores pressões, contrai vigorosamente para combater essa sobrecarga de volume. O sopro sistólico é o achado físico mais expressivo, devendo ser diferenciado dos sopros da estenose aórtica, da regurgitação tricúspide e do defeito do septo ventricular. O sopro da RM grave se inicia imediatamente após a B1 hipofonética e se prolonga, podendo mascarar A2 devido à persistência da diferença pressórica entre o ventrículo e o átrio esquerdos mesmo após o fechamento da valva aórtica. É, portanto, um sopro de intensidade constante (regurgitação), holossistólico (RM crônica), e mais audível no ápice cardíaco com freqüente irradiação para a axila esquerda e para a região infraescapular esquerda. Deve-se atentar para a irradiação em direção ao esterno e área aórtica que pode ocorrer quando há acometimento do folheto posterior, especialmente comum no prolapso de valva mitral. Já quando há envolvimento do folheto anterior, pode haver irradiação para a coluna de forma ascendente. Existem situações em que o sopro sistólico pode ser de difícil ausculta, ou mesmo estar ausente, constituindo a chamada RM silenciosa. Pode ocorrer quando a RM é gerada por dilatação do ventrículo esquerdo, por infarto do miocárdio, e outras situações que cursam com hipotensão ou baixo débito cardíaco, ou em pacientes com enfisema, obesidade, deformidades da caixa torácica, próteses valvares cardíacas e gestantes. Assim, não podemos correlacionar a gravidade da RM com a intensidade de seu sopro. O sopro pode ser holossistólico, tele ou protossistólico. Quando se limita ao final da sístole, a regurgitação geralmente não é grave e pode ser secundária a um prolapso da valva mitral ou à disfunção do músculo papilar. São causas normalmente relacionadas a B1 normofonéticas, pois não ocorre o impedimento do fechamento inicial das cúspides da valva mitral. Sopros proto a mesossistólicos são típicos da RM aguda, pois com a regurgitação sobre um átrio de tamanho normal, a pressão desenvolvida neste impede maior volta do sangue, diminuindo a intensidade do sopro conforme se aproxima da diástole. Com a progressão da doença, há a tendência do sopro ocupar toda a sístole. O sopro holossistólico da RM varia pouco com a respiração. A adoção de postura ereta e a realização da manobra de Valsalva geralmente diminuem o sopro, enquanto o agachamento e o handgrip promovem seu aumento. Importante notar que no prolapso da valva mitral, o sopro diminui com o agachamento e aumenta com a postura ereta. 4- Síndrome do Prolapso da Valva Mitral A) Etiologia e Patologia A síndrome do PVM é uma das anomalias cardíacas mais freqüentes, atingindo 2,4% da população, sendo duas vezes mais freqüente em mulheres do que em homens, contudo sua gravidade é maior em homens idosos. O estalido sistólico característico e o sopro meso a telessistólico são critérios diagnósticos principais. O critério ecocardiográfico mais específico o deslocamento de um ou de ambos os folhetos da valva mitral em mais de 2 mm acima do plano do anel no eixo longitudinal. Outros critérios ecocardiográficos incluem espessamento difuso do folheto e redundância, comprimento e movimentação excessiva das cordas e evidencia de ruptura das cordas, somadas ao prolapso de segmentos dos folhetos. Com mais freqüência, o PVM ocorre como condição primária que não está associada a outras doenças e pode ser familial (transmitida por forma autossômica) ou não-familial. Síndrome do Prolapso da Valva Mitral Pacientes jovens (20-50 anos), predominantemente do sexo feminino, com estalido ou estalido-sopro no exame físico, folhetos finos com deslocamento sistólico no ECO, associado a pressão arterial baixa, hipotensão ortostática e palpitações, e com curso benigno Doença Mixomatosa da Valva Mitral Pacientes com mais idade (40-70 anos), predominantemente do sexo masculino, folhetos espessados e redundantes, sinais de regurgitação mitral, com alta probabilidade de doença progressiva que requer cirurgia da valva mitral Prolapso da Valva Mitral Secundária Síndrome de Marfan, Cardiomiopatia Hipertrófica, Síndrome de Ehlers-Danlos, e outras doenças do tecido conjuntivo Os achados da patologia incluem proliferação mixomatosa das cúspides da valva mitral, fibrose da superfície dos folhetos, diminuição da espessura e/ou prolongamento da cordoalha tendinosa e lesões ventriculares por atrito. Porém, em suma,a fisiopatologia do PVM consiste basicamente da proliferação mixomatosa, que pode se estender para o anel mitral e cordoalhas. B) Manifestações Clínicas A maioria dos pacientes com PVM é assintomática e assim permanece por toda a sua vida. Contudo, os pacientes podem se queixar de síncope, pré-síncope, palpitações, desconforto torácico e, quando a RM é grave, dos sintomas da diminuição da reserva cardíaca. O desconforto pode ser típico da angina, mas é com mais freqüência atípico por ser prolongado, não relacionado de forma evidente ao exercício e pontuado por curtas crises de grave dor em punhalada no ápice. Também, esse desconforto pode ser secundário à tensão anormal nos músculos papilares. Em geral, a pressão arterial é normal ou baixa e a hipotensão ortostática pode estar presente. Pacientes com PVM apresentam prevalência maior do que a esperada da síndrome das costas retas, escoliose e pectus excavatum. O achado mais importante é o estalido sistólico de refluxo, que ocorre pelo menos 0,14 segundos após B1. Este clique pode ser diferenciado do estalido sistólico de ejeção, pois ocorre após o início do pulso carotídeo sistólico. Ocasionalmente, múltiplos cliques meso e telessistólicos são audíveis, a maioria ao longo da borda esternal esquerda inferior. Acredita-se que os cliques sejam produzidos pela súbita tensão das cordas tendíneas alongadas e dos folhetos prolapsados. Os cliques são freqüente, mas não invariavelmente, seguidos por um sopro meso a telessistólico crescente que se continua com A2. Importante notar que, no PVM, a duração do sopro é, em geral, diretamente relacionada com a gravidade da RM. A valva mitral começa a sofrer prolapso quando a redução do volume do ventrículo esquerdo durante a sístole atinge um ponto crítico no qual os folhetos da valva não mais coaptam. Nesse instante, o estalido ocorre e o sopro se inicia. Assim, qualquer manobra que diminua o volume do VE, como a redução da impedância ao fluxo de saída do ventrículo esquerdo, uma redução do retorno venoso, a taquicardia ou o aumento da contratilidade miocárdica, resulta na ocorrência mais precoce do prolapso durante a sístole. Como conseqüência, o estalido e o início do sopro se aproximam de B1. Em situações extremas de gravidade, o prolapso pode ter início junto à sístole, sendo, portanto, o sopro holossistólico e não havendo o estalido, e sim, uma B1 hiperfonética. Desse modo, durante a fase de esforço da manobra de Valsalva e a súbita posição ereta temos um aumento da duração do sopro, enquanto com a súbita posição supina, elevação das pernas, agachamento, handgrip e a expiração diminuem essa duração. Quando o início do sopro é postergado, há diminuição de sua intensidade também, e vice-versa; exceto na manobra de Valsalva, em que a duração aumenta, porém a intensidade não se altera. A relevância dessa informação se dá no diagnóstico diferencial do sopro do PVM com o sopro da miocardiopatia hipertrófica, que é o único sopro que se intensifica com Valsalva. Outra importância do conhecimento da ausculta dinâmica do PVM é que nem sempre essa doença se acompanhará de alterações auscultatórias. Seus fenômenos estetacústicos são amplamente variáveis de uma consulta para a outra (por gestação, uso de betabloqueadores), e, às vezes, o sopro do PVM só é auscultado com as manobras que o intensificam. Para avaliar a DURAÇÃO do sopro RM PVM Valsalva Diminui Aumenta De Pé Diminui Aumenta Handgrip ou Agachamento Aumenta Diminui Posição supina Aumenta Diminui Semiologia Cardiovascular Estenose Aórtica Por Gustavo Amarante 1- Etiologia A obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo na maioria das vezes localiza- se na valva aórtica. Mas pode haver obstrução acima da valva (estenose aortica supravalvar) ou abaixo dela (estenose subvalvar). A) Estenose Aórtica Supravalvar A estenose aórtica supravalvar ocorre por formação de uma membrana logo acima da valva ou pela formação de uma prega constrictiva originada do espessamento e desorganização da camada média da aorta. A causa mais frequente de estenose supravalvar é a Síndrome de Williams. Nessa síndrome a alteração cardíaca está associada a sinais e sintomas sistêmicos: retardo no desenvolvimento psicomotor, hipercalcemia, náuseas, vômitos, constipação, cólicas, hiperacusia, voz rouca, dentes pequenos, personalidade expansiva, e uma fácies típica denominada “facies de duende”. Essa síndrome tem apenas um pequeno componente familiar, sendo na maioria das vezes por mutação esporádica. Além da Síndrome de Williams essa anomalia aórtica pode ser encontrada em uma apresentação familiar autossômica-dominante, em que não existe as características sistêmicas da síndrome. B) Estenose Subaórtica Essa alteração pode ocorrer basicamente por dois mecanismos. Um deles a existência de uma membrana fibrosa na via de saída do ventrículo esquerdo, de origem congênita. A outra forma ocorre na cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva. A cardiomiopatica hipertrófica (CMH) é a mais comum das doenças cardiovasculares genéticas e é uma importante causa de morte súbida em jovens. Ela é caracterizada por um ventrículo esquerdo espessado, porém não dilatado, na ausência de outras doenças capazes de produzir hipertrofia. Na CMH há espessamento predominante do septo interventricular. Esse evento associado ao fenômeno de movimento sistólico da valva mitral leva a uma obstrução da via de saída do VE. A valva mitral ao mover-se de encontro ao septo durante a sístole, provoca um estreitamento antes da valva aórtica. Esse movimento da mitral ocorre devido ao fluxo de sangue em alta velocidade que traciona os folhetos mitrais em direção ao septo (Efeito Venturi). Além disso, o movimento da mitral também pode levar a um leve regurgitamento. C) Estenose Aórtica Valvar A EA valvar possui três causas principais: Valva bicúspede congênita; Calcificação/Degeneração da valva normal e Doença Reumática Além dessas causas, a estenose da valva aórtica pode surgir em situações mais raras, como por exemplo na artrite reumatóide, por espessamento nodular, e na alcaptonúria. Atualmente, com o manejo correto da Doença Reumática, a principal causa de estenose aórtica é a valva aórtica bicúspede. A maior parte dos indivíduos que possuem essa alteração vão desenvolver estenose aórtica significativa e sintomática, com calcificação, somente após os 50 anos de idade. A degeneração valvar por calcificação pode ocorrer tanto em valvas bicúspedes como em valvas normais (tricúspedes). E essa é a principal causa de estenose aórtica nos adultos (calcificação valvar).Os fatores de risco para a calcificação valvar são os mesmos para a aterosclerose (idade, dislipidemia, tabagismo, hipertensão). Vale ressaltar que indivíduos com doença de Paget (alto turn over ósseo) apresentam alta prevalência dessa lesão. A EA reumática ocorre pela adesão e fusão das estruturas do anel valvar, levando a retração e enrijecimento dos bordos livres das cúspides. Na maioria das vezes as valvas reumáticas é regurgitante e estenótica, pois apresenta dificuldade no fechamento e na abertura, devido ao enrijecimento. De agora em diante vamos abordar principalmente a estenose aórtica VALVAR, e depois apresentaremos as principais diferenças semiológicas entre as três formas de estenose aórtica. 2 – Fisiopatologia – Estenose Aórtica Valvar O processo de estenose aórtica
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