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UNIVERSIDADE POTIGUAR – UnP PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA – NEaD Direito Comercial e Legislação Societária Livro-texto EaD Natal/RN 2011 F383d Ferreira, Marciane Zimmermann. Direito comercial e legislação societária / Marciane Zimmermann Ferreira, Bruno Bianchini. – Natal: Edunp, 2011. 340p. : il. ; 20 X 28 cm Ebook – Livro eletrônico disponível on-line. ISBN 978-85-8257-000-5 1. Cultura organizacional. I. Bianchini, Bruno. II. Título. RN/UnP/SIB CDU 347.7 DIRIGENTES DA UNIVERSIDADE POTIGUAR – UnP Reitoria Sâmela Soraya Gomes de Oliveira Pró-Reitoria de Graduação e Ação Comunitária Sandra Amaral de Araújo Pró-Reitoria de Pesquisa, Extensão e Pós-Graduação Aarão Lyra NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA DA UNIVERSIDADE POTIGUAR – UnP Coordenação Geral Barney Silveira Arruda Coordenação Acadêmica Luciana Lopes Xavier Coordenação Pedagógica Edilene Cândido da Silva Design Instrucional Priscilla Carla Silveira Menezes Coordenação de Produção de Recursos Didáticos Michelle Cristine Mazzetto Betti Revisão de Linguagem e Estrutura em EaD Priscilla Carla Silveira Menezes Thalyta Mabel Nobre Barbosa Úrsula Andréa de Araújo Silva Gravação e Edição de Vídeos Daniel Rizzi Coordenação de Logística Helionara Lucena Nunes Supervisão de Logística (Mossoró) Fábio Pereira da Silva Apoio Acadêmico Flávia Helena Miranda de Araújo Thalyta Mabel Nobre Barbosa Úrsula Andréa de Araújo Silva Assistente Administrativo Eliane Ferreira de Santana Gibson Marcelo Galvão de Sousa Miriam Flávia Medeiros de Araújo Ricardo Luiz Quirino da Silva Marciane Zimmermann Ferreira Bruno Bianchini Direito Comercial e Legislação Societária 1a Edição Natal/RN 2011 EQUIPE DE PRODUÇÃO DE RECURSOS DIDÁTICOS Organização Luciana Lopes Xavier Michelle Cristine Mazzetto Betti Coordenação de Produção de Recursos Didáticos Michelle Cristine Mazzetto Betti Revisão de Linguagem e Estrutura em EaD Thalyta Mabel Nobre Barbosa Ilustração do Mascote Lucio Masaaki Matsuno EQUIPE DE PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO Delinea - Tecnologia Educacional Coordenação Pedagógica Margarete Lazzaris Kleis Coordenação de Editoração Charlie Anderson Olsen Larissa Kleis Pereira Coordenação de Revisão Gramatical e Normativa Simone Regina Dias Eduard Marquardt Revisão Gramatical e Normativa Jacqueline Iensen Diagramação Alexandre Alves de Freitas Noronha Ilustrações Alexandre Beck Marciane ZiMMerMann Ferreira Olá! Meu nome é Marciane, sou graduada em Direito, mestre em Ciência Jurídica, advogada desde 1997 e docente desde 2000. Iniciei minha carreira docente na Universidade do Vale do Itajaí (Univali), mas também já ministrei disciplinas na Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) e Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Se você quiser saber mais sobre a minha vida acadêmica, sugiro acessar meu currículo no CNPq (http://lattes. cnpq.br/7893611475180800). Agora estou assumindo o compromisso de ser a professora conteudista na disciplina de Direito comercial e Legislação Societária. Espero que você aproveite essa disciplina e que, ao final dela, seja capaz de identificar, analisar, interpretar e aplicar a legislação vigente na solução dos problemas contábeis. Bons estudos! BrUnO BiancHini E eu sou o Bruno, responsável pela autoria do capítulo 7. Sou formado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com pós-graduação pela Universidade Anhanguera (UNIDERP) de São Paulo. Tenho minha carreira voltada para o serviço público, sendo que atuei como professor da rede municipal de ensino, assim como também da rede privada. Como servidor público no cargo de técnico judiciário, trabalhei junto à Justiça Estadual e à Justiça Federal de Santa Catarina. Apesar das grandes dificuldades encontradas pelo caminho, minha última conquista foi a aprovação no concurso público para o cargo de Procurador Federal de 2ª Categoria da Advocacia-Geral da União no ano de 2010. Pois bem, perceba que você também pode conquistar todos os seus sonhos. Basta acreditar e lutar com persistência. CO N H EC EN D O O A U TO R DireiTO cOMerciaL e LeGiSLaÇÃO SOcieTÁria O início de uma disciplina é cercado por expectativas. Você provavelmente deve estar pensando: Por que será que tenho que estudar Direito? Eu posso lhe adiantar que há uma relação muito próxima entre o Direito e a Contabilidade. Já faz tempo que o profissional da área contábil era meramente um registrador de números. Nos dias atuais, ele precisa saber aplicar os dispositivos legais, especialmente aqueles concernentes ao direito tributário, trabalhista, previdenciário, financeiro e comercial. Nesta disciplina você terá uma noção sobre as normas que regulam a atividade empresarial desde os atos constitutivos de criação da sociedade até o tratamento a ser adotado em casos de falência e recuperação judicial e extrajudicial. Também tratarei nos capítulos seguintes conteúdos que irão, possivelmente, integrar a sua futura rotina diária, como, por exemplo, responsabilidade civil do contador, contratos mercantis e títulos de crédito. Espero que você adquira conhecimentos suficientes para orientar os seus futuros clientes a tomar a decisão mais apropriada. A disciplina está dividida em oito capítulos, cujos temas são os seguintes: Teoria geral do Direito Empresarial; a atividade empresarial; as sociedades empresariais (este dividido em dois capítulos dada a abrangência e importância do conteúdo); a falência, recuperação judicial e extrajudicial das sociedades empresariais; a responsabilidade civil do contador; noções gerais de contratos mercantis; títulos de crédito. Direito Comercial e Legislação Societária é uma disciplina bastante abrangente, entretanto tenho certeza que você irá gostar desta matéria, pois os assuntos abordados aqui permeiam o dia a dia dos Contabilistas. Vamos estudar? CO N H EC EN D O A D IS CI PL IN A SU M Á RI OCapítulo 1 - Teoria geral do direito comercial ........................................... 131.1 Contextualizando ........................................................................................................... 131.2 Conhecendo a teoria ..................................................................................................... 13 1.2.1 Breve histórico ...................................................................................................... 13 1.2.2 Objeto ..................................................................................................................... 19 1.2.3 Conceito .................................................................................................................. 19 1.2.4 Princípios gerais do direito empresarial ...................................................... 21 1.2.5 Conceito de empresário .................................................................................... 28 1.3 Aplicando a teoria na prática ..................................................................................... 39 1.4 Para saber mais ............................................................................................................... 40 1.5 Relembrando ................................................................................................................... 41 1.6 Testando os seus conhecimentos ............................................................................. 41 Onde encontrar ...................................................................................................................... 43 Capítulo 2 - Da atividade empresarial....................................................... 47 2.1 Contextualizando ........................................................................................................... 47 2.2 Conhecendo a teoria ..................................................................................................... 48 2.2.1 Empresário individual......................................................................................... 48 2.2.2 Micro e pequena empresa ................................................................................ 52 2.2.3 Registro de empresa ........................................................................................... 56 2.2.4 Nome empresarial ............................................................................................... 66 2.2.5 Estabelecimento empresarial .......................................................................... 70 2.2.6 Escrituração ............................................................................................................ 77 2.3 Aplicando a teoria na prática ..................................................................................... 81 2.4 Para saber mais ............................................................................................................... 82 2.5 Relembrando ................................................................................................................... 82 2.6 Testando os seus conhecimentos ............................................................................. 83 Onde encontrar ...................................................................................................................... 84 Capítulo 3 - Das sociedades empresariais - parte 1 .................................. 89 3.1 Contextualizando ........................................................................................................... 89 3.2 Conhecendo a teoria ..................................................................................................... 90 3.2.1 Regime jurídico da sociedade empresária .................................................. 90 3.2.2 Sociedades contratuais menores .................................................................109 3.2.3 Sociedade limitada ............................................................................................120 3.3 Aplicando a teoria na prática ...................................................................................124 3.4 Para saber mais .............................................................................................................125 3.5 Relembrando .................................................................................................................126 3.6 Testando os seus conhecimentos ...........................................................................127 Onde encontrar ....................................................................................................................129 Capítulo 4 - Das sociedades empresariais – parte 2 ............................... 131 4.1 Contextualizando .........................................................................................................131 4.2 Conhecendo a teoria ...................................................................................................132 4.2.1 Da sociedade anônima ...................................................................................132 4.2.2 Da sociedade de economia mista ................................................................158 4.2.3 Das sociedades em comandita por ações .................................................161 4.3 Aplicando a teoria na prática ...................................................................................162 4.4 Para saber mais ......................................................................................................................................163 4.5 Relembrando ..........................................................................................................................................164 4.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................165 Onde encontrar .............................................................................................................................................166 Capítulo 5 - Da falência, recuperação judicial e extrajudicial das sociedades empresariais ...............................................................................................169 5.1 Contextualizando ..................................................................................................................................169 5.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................170 5.2.1 Breve histórico .............................................................................................................................170 5.2.2 Da insolvência empresarial......................................................................................................173 5.2.3 Disposições comuns à recuperação e à falência..............................................................183 5.2.4 Administrador judicial, comitê de credores e assembleia geral de credores ........185 5.2.5 Créditos...........................................................................................................................................190 5.2.6 Recuperação extrajudicial........................................................................................................194 5.2.7 Recuperação judicial ..................................................................................................................196 5.2.8 Falência ...........................................................................................................................................200 5.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................204 5.4 Para saber mais ......................................................................................................................................205 5.5 Relembrando ..........................................................................................................................................206 5.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................207 Onde encontrar .............................................................................................................................................208 Capítulo 6 - Da responsabilidade civil do contador ...................................................211 6.1 Contextualizando ..................................................................................................................................211 6.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................212 6.2.1 Aspectos gerais da responsabilidade civil .........................................................................212 6.2.2 Responsabilidade civil do contador frente ao CDC ........................................................224 6.2.3 Responsabilidade civil, administrativa e penal do contabilista ................................227 6.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................240 6.4 Para saber mais ......................................................................................................................................241 6.5 Relembrando ..........................................................................................................................................2416.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................243 Onde encontrar .............................................................................................................................................244 Capítulo 7 - Noções gerais de contratos mercantis ....................................................249 7.1 Contextualizando ..................................................................................................................................249 7.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................250 7.2.1 Teoria geral dos contratos mercantis ...................................................................................250 7.2.2 Compra e venda mercantil ......................................................................................................255 7.2.3 Mandato mercantil .....................................................................................................................257 7.2.4 Comissão mercantil ....................................................................................................................259 7.2.5 Cartão de crédito ........................................................................................................................260 7.2.6 Faturização (factoring) ...............................................................................................................262 7.2.7 Arrendamento mercantil (leasing) ........................................................................................264 7.2.8 Alienação fiduciária ....................................................................................................................267 7.2.9 Franquia (franchising) ................................................................................................................272 7.2.10 Representação comercial ......................................................................................................274 7.2.11 Contratos bancários.................................................................................................................276 7.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................279 7.4 Para saber mais ......................................................................................................................................279 7.5 Relembrando ..........................................................................................................................................280 7.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................281 Onde encontrar .............................................................................................................................................282 Capítulo 8 - Título de crédito ........................................................................................285 8.1 Contextualizando ..................................................................................................................................285 8.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................286 8.2.1 Teoria geral dos títulos de crédito .........................................................................................286 8.2.2 Letra de câmbio ...........................................................................................................................295 8.2.3 Nota promissória .........................................................................................................................302 8.2.4 Cheque............................................................................................................................................305 8.2.5 Duplicata ........................................................................................................................................313 8.2.6 Outros títulos de crédito ..........................................................................................................320 8.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................323 8.4 Para saber mais ......................................................................................................................................324 8.5 Relembrando ..........................................................................................................................................325 8.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................327 Onde encontrar .............................................................................................................................................328 Referências .................................................................................................................. 332 Capítulo 1 13 Direito Comercial e Legislação Societária Teoria Geral do direiTo ComerCial CAPÍTULO 1 1.1 contextualizando Para iniciar o assunto, farei uma breve viagem histórica, pois você só compreenderá o estágio atual do Direito Comercial se souber como ele se desenvolveu. Posteriormente individualizarei o objeto, informarei seu conceito e os princípios gerais que o regulam. Por fim, irei discorrer sobre o empresário. Estas informações iniciais são fundamentais para a sua boa formação. O Direito Comercial é fruto de uma gradual evolução histórica. Você precisa conhecer todas as nuances que o envolvem para compreender seu conteúdo. Ao final deste capítulo, você estará apto a: • conceituar o Direito Comercial; • compreender os princípios gerais da atividade empresarial; • distinguir pessoa física de pessoa jurídica; • individualizar o empresário; • identificar os impedimentos para a realização de uma sociedade. 1.2 conhecendo a teoria 1.2.1 Breve histórico O Direito Comercial como um ramo autônomo surgiu na Idade Média, entretanto, é possível vislumbrar em sociedades mais antigas as regras que regulavam o comércio. As primeiras regras de Direito Comercial teriam surgido em decorrência da prática da permuta do que era produzido em excesso. Capítulo 1 14 Direito Comercial e Legislação Societária Para prover sua subsistência, ou mesmo seu bem-estar, o homem primitivo teria praticado trocas com seus semelhantes pertencentes a outros clãs. Entretanto, alerta Dower (2005), que essas trocas eram bastante restritas e o possuidor nem sempre encontrava alguém disposto a trocar o que ele tinha pelo o que necessitava, na qualidade e quantidade desejada. Agregado a isso, havia ainda o problema do cálculo do valor dos bens a serem trocados que foi solucionado com a criação da moeda. Num primeiro momento, os cereais (trigo e cevada) e os metais (prata e ouro) passaram a ser utilizados na fixação dos preços. As pesquisas arqueológicas revelam que nos Códigos: de Ur-Nammu (ca. 2100 a.C.); de Eshnunna (ca. 1.930 a.C.); de Lispt-Ishtar (ca. 1.870 a.C.); de Hammurabi (ca. 1.770 a.C.) os cereais e os metais eram empregados na fixação penas e pagamentos. No Código de Hammurabi também é possível vislumbrar regras primitivas que versam sobre créditos e os contratos: agrícola, de empréstimo a juros, de depósito, de sociedade e de comissão (ALBEGARIA, 2011). Khammu-rabi foi rei da Babilônia no século 16 a.C. e governou uma confederação de cidades- estado. No final do seu reinado, construiu uma “estela” em diorito, no qual ele é retratado e mandou escrever 21 colunas,com 282 cláusulas que ficaram conhecidas como Código de Hammurabi. Fonte: <http://www.dhnet.org.br/direitos/ anthist/hamurabi.htm> SAIBA QUE Posteriormente, os autores destacam a importância das relações de troca entre troianos, egípcios, cretenses, sírios, fenícios, cartagineses e babilônios. Entretanto, nenhum destes povos preocupou-se em formar um corpo sistematizado da matéria, muito embora haja “[...] menção à Lex Rhodia de Iactu, lei romana de inspiração fenícia, que cuidava do alijamento” (MAMEDE, 2007, p.16). No que se refere aos romanos, Requião (2003) destaca que inicialmente eles não praticavam atividades mercantis porque consideravam indignas. Capítulo 1 15 Direito Comercial e Legislação Societária Estas atividades eram praticadas por estrangeiros, judeus e escravos e reguladas pelo Jus Gentium, direito das gentes – aplicado a todos que não eram cidadãos romanos. Mais tarde, os senadores e os patrícios começaram a burlar a lei que os proibia de exercer atividade mercantil. Nascia uma espécie de capitalismo mercantil romano, que foi esmagado pela invasão dos povos bárbaros e pelo fracionamento territorial. Começa então a fase feudal, onde predomina o direito local, fortemente influenciado pelo direito romano e pelo direito canônico. Com o desenvolvimento do comércio marítimo no Mediterrâneo, as cidades que ficavam as suas margens, como Gênova, Pisa, Florença e Veneza tornam-se importantes centros comerciais. Os senhores feudais deixam seus feudos sob supervisão de seus servos e migram para as cidades. Lá se associam aos donos dos navios firmando contratos de comenda, ou seja, financiam as expedições arriscando apenas o dinheiro que investiam, todavia, lucravam com as transações que eram realizadas. Posteriormente, a comenda também foi empregada nas negociações terrestres (MARTINS, 2007). Assim, percebe-se que na Idade Média o comércio era itinerante, ou seja, os comerciantes levavam suas mercadorias de uma cidade à outra. Com o tempo os comerciantes passaram a se reunirem em dias certos e em determinadas cidades para fazerem as vendas dos seus produtos, donde surgem as feiras. Vendo que as feiras eram um negócio promissor o Estado passa a estimulá-las, impor impostos e criar normas regulando seu funcionamento (MARTINS, 2007). Figura 1 – Feiras medievais Fonte: <www.europetravel.gr> Capítulo 1 16 Direito Comercial e Legislação Societária Para resistir às adversidades os comerciantes se reúnem e formam as chamadas corporações de ofício. As corporações tinham funções políticas, executivas e judiciais, além de leis e patrimônio próprio, constituído pela contribuição dos associados e por taxas extraordinárias e pedágios. Ao ingressar na corporação de ofício o comerciante se sujeitava às normas estabelecidas por sua classe. Assim, o Direito Comercial surge como o direito fechado, costumeiro, internacional e corporativista. Conforme Martins (2007) Direito Comercial é o conjunto de regras jurídicas que regulam as atividades das empresas e dos empresários comerciais, bem como os atos considerados comerciais, mesmo que esses atos não se relacionem com as atividades das empresas. Com a expansão comercial e o mercantilismo, o Estado passa a intervir na formação das corporações e as normas de Direito Comercial passam a ser ditadas pelo monarca. Surgem codificações por toda Europa. No Direito marítimo destaque para a Navigation Act, de Cromwell, de 1651 e para o Ordennance sur le Commerce de Mer, de 1681, ambas do Rei Luís XIV. No Direito terrestre destaque para o Ordennance sur le Commerce de Terre, de 1673, também chamado de Código Savary o qual influenciaria Napoleão quando da edição do Código comercial. Figura 2 – Quadro de Claude Lorrain que representa um porto de mar francês de 1638 Fonte: <www.ibiblio.org> Capítulo 1 17 Direito Comercial e Legislação Societária Luís XIV, rei da França de 1643 a 1715, foi símbolo da monarquia absolutista e provocou uma série de guerras entre 1667 e 1697 a fim de estender as fronteiras da França tomando terras do Sacro Império Germânico, e depois, de 1701-1714, para assegurar o trono espanhol para seu neto. Fonte: <www.cobra.pages.nom.br> SAIBA QUE Afirma Negrão (2005) que, a partir do século 18, as feiras começam a declinar, possivelmente em virtude das taxas fixadas pelos governos locais. Todavia, as feiras originam importantes institutos como: câmbio, título de crédito, bancos e bolsas (locais de encontro entre banqueiros, mercadores, cambistas, negociantes, corretores, entre outros). As bolsas, por sua vez, dão origem ao mercado financeiro e acionário e aos jogos da bolsa. Também surge o contrato de seguro, as ideias de marca e identificação do local de origem do produto, as sociedades de capital e indústria, as sociedades em nome coletivo, as sociedades em comandita e as sociedades por ações. Figura 3 – Máquina a vapor Fonte: <www.brasilescola.com> A Revolução Industrial Inglesa e a Revolução Francesa produziram significativas mudanças no século 18. O liberalismo econômico é uma delas. Os ideais de liberdade e igualdade da revolução Francesa serviram para limitar o poder estatal e abrir a possibilidade para que qualquer indivíduo pudesse Capítulo 1 18 Direito Comercial e Legislação Societária livremente produzir e comercializar sem a necessidade de estar filiado a uma corporação, ou seja, o Direito Comercial deixa de ser um direito do comerciante para ser um direito fundado na prática de atos do comércio. O marco desta transformação é o Code de Commerce, ou Código de Napoleônico, de 1808. Com o referido Código o Direito Comercial deixou de ser um direito subjetivo, voltado para proteção do comerciante e, passou a ser um direito que regula os atos de comércio, ou seja, comerciante era quem praticava atos de comércio. O referido código inspirou legislações de todo o mundo. O Código Comercial brasileiro, datado de 25 de junho de 1850, por exemplo, teve forte influência. Em seu texto, comerciante é definido como aquele que pratica com habitualidade e profissionalismo atos de comércio. Entretanto, com o passar do tempo, a teoria dos atos do comércio se revelou ineficiente para delimitar o objeto do Direito Comercial, pois algumas atividades, como a prestação de serviço, que era regulada pelo Direito civil e não pelo Direito Comercial. Surge então, na Itália, em 1942, a chamada Teoria da Empresa, decorrente da entrada em vigor do Codice Civile. Esta nova teoria pretende alcançar aquelas atividades que não se encaixavam na Teoria do Ato do Comércio. Esta teoria unificou o Direito civil e o Direito Comercial. Desde então, toda a atividade econômica organizada para produção ou circulação de bens ou serviços está submetida às normas de Direito Comercial. No Brasil a Teoria da Empresa foi definitivamente incorporada com a entrada em vigor do Código Civil de 2002 que revogou a primeira parte do Código Comercial Brasileiro de 1850. O Código Civil brasileiro possui 2046 artigos e divide-se em Parte Geral e Especial. A Parte Geral é composta por três livros: I – Das Pessoas; II – Dos Bens; III – Dos Fatos Jurídicos. A Parte Especial, por sua vez, é composta por cinco livros: I – Do Direito das Obrigações; II – Do Direito de Empresa; III – Do Direito das Coisas; IV – Do Direito de Família; V – Do Direito das Sucessões. Há ainda um Livro Complementar contendo as disposições finais e transitórias. Capítulo 1 19 Direito Comercial e Legislação Societária As normas fundamentais do Direito comercial estão inseridas no Livro II da partes Especial, denominado do direito de empresa, que é composto por 229 artigos (do artigoao 1195). Entretanto, temas importantes como sociedades por ações, falência, recuperação judicial e extrajudicial, títulos de crédito não estão disciplinados no Código Civil de 2002, mas em legislação especial, conforme apresentarei a você ao longo da disciplina. 1.2.2 Objeto Você precisa ter claro que o Direito Comercial tem como objeto de estudo, a “atividade econômica organizada de fornecimento de bens ou serviços”, ou seja, a própria empresa (CC, art. 966, caput). De acordo com Coelho (2005, p.4) o objeto de estudo do Direito Comercial “[...] é o estudo dos meios socialmente estruturados de superação dos conflitos de interesses envolvendo empresários ou relacionados às empresas que exploram”. Ressalto que, de acordo com o mesmo autor, a atividade do empresário articula quatro fatores de produção. São eles: capital, mão de obra, insumo e tecnologia. Em outras palavras, o exercício da atividade empresarial exige a aplicação de recursos financeiros, o emprego de mão de obra, a utilização de materiais e o emprego da tecnologia, aqui entendida como o conjunto de conhecimentos específicos sobre o produto ou serviço. 1.2.3 conceito Preciso destacar que a terminologia adotada pelo Código Civil de 2002, Direito de empresa, provocou certa discussão sobre a terminologia que deveria ser adotada. Alguns autores e universidades alteraram a nomenclatura Direito Comercial para Direito de empresa, entretanto, outras continuam a empregar a nomenclatura Direito Comercial. Em defesa da nomenclatura Direito comercial, sustenta Martins (2007, p.15) que o Direito de empresa: [...] não se trata de um Direito novo, mas de novas formas empregadas pelo Direito Comercial, para melhor amparar o desenvolvimento do comércio. Consistindo a empresa em um organismo subordinado ao empresário, apesar de este dela fazer parte, como objeto de direito não poderá ter regras próprias a regulá-la independentemente. O chamado Direito das Empresas, quando se refere às empresas comerciais, é o mesmo Direito Comercial. Capítulo 1 20 Direito Comercial e Legislação Societária Entretanto, atualmente poucos são aqueles que permanecem empregando a expressão comerciante. Você já percebeu que aos poucos ela vem sendo substituída pela palavra empresário? A meu ver isso ocorreu em função da nomenclatura utilizada pelo Código Civil. Hoje há uma clara tendência na substituição da nomenclatura Direito Comercial por Direito de empresa. Destaco que, não obstante esta pequena diferenciação quanto à nomenclatura utilizada, o certo é que o Código Civil de 2002 superou a antiga Teoria dos Atos do Comércio e inseriu no Brasil, definitivamente, a Teoria de Empresa. Em consequência disto, o Direito Comercial é conceituado por Martins (2005, p. 21) como “o conjunto de regras jurídicas que regulam as atividades das empresas e dos empresários comerciais, bem como os atos considerados comerciais, mesmo que esses atos não se relacionem com as atividades das empresas”. Alguns doutrinadores incluem como fontes do Direito Comercial a doutrina e a jurisprudência. Você sabe a diferença entre doutrina e jurisprudência? A doutrina consiste na interpretação dada pelos estudiosos às normas jurídicas, tem conotação crítica e orientadora. Enquanto a jurisprudência pode ser compreendida como as decisões reiteradas nos tribunais, ou melhor, consiste na aplicação da lei ao fato concreto de maneira reiterada. Fazzio Junior (2005, p. 36) muito embora faça uma advertência, embasado em Aristóteles, que as definições são perigosas, afirma que no Brasil o Direito Comercial pode ser definido como: “complexo normativo positivo, focaliza as relações jurídicas derivadas do exercício da atividade empresarial. Disciplina a solução de pendências entre empresários, bem como os institutos conexos à atividade econômica organizada de produção e circulação de bens”. Você também pode adotar este conceito de Direito Comercial: como conjunto de normas jurídicas que disciplina as atividades do empresário no que se refere ao “exercício da atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços” (CC, art.966, caput). Capítulo 1 21 Direito Comercial e Legislação Societária 1.2.4 Princípios gerais do direito empresarial O Direito Comercial tem como fontes a lei, os costumes, a analogia e os princípios gerais do Direito Comercial. Num Estado democrático de direito como o nosso não há sombra de dúvida que frente às diversas situações jurídicas, há sempre preponderância na aplicação da lei. A Constituição Federal de 1988, lei maior do nosso país, é precisa em afirmar que “Ninguém é obrigada a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei” (CF, art. 5°, II). A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é a atual lei fundamental e suprema do Brasil, servindo de parâmetro de validade a todas as demais espécies normativas, situando-se no topo do ordenamento jurídico. Foi a Constituição brasileira que mais sofreu emendas: 67 no total. SAIBA QUE Você precisa entender como lei: a própria Constituição Federal de 1988; o Código Civil de 2002; Código Comercial na parte não revogada; a legislação esparsa; as normas de Direito Comercial inseridas em outros diplomas legais, como o Código do Consumidor; as normas regulamentares emanadas da atividade estatal e os tratados e convenções internacionais (FAZZIO JUNIOR, 2005). O costume, por sua vez, “é prática uniforme, constante, pública e geral de determinado ato com a convicção de sua necessidade jurídica” (DINIZ, 2007, v. 1, p. 75). Para ser considerado um costume comercial é primordial o preenchimento dos seguintes requisitos: continuidade, uniformidade, conformidade legal e assentamento. A analogia “consiste em aplicar a um caso não previsto de modo direto ou específico por uma norma jurídica uma norma prevista para uma hipótese distinta, mas semelhante ao caso não contemplado” (DINIZ, 2007, v. 1, p. 71). Capítulo 1 22 Direito Comercial e Legislação Societária No Direito Penal, via de regra, não é admitido o emprego da analogia. SAIBA QUE Para explicar os princípios gerais do Direito Comercial, metanormas que invocam ideias superiores que regem o ordenamento, farei uso da classificação e dos ensinamentos de Mamede (2007), conforme segue: Livre iniciativa A livre iniciativa foi assegurada na Constituição Federal de 1988 e perfaz um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito (CF/88, art. 1°, IV). Posteriormente, ele reconhece a livre iniciativa como algo benéfico para a sociedade e que deve ser estimulado (MAMEDE, 2007). É o que se depreende da leitura dos artigos 5°, XIII e 170, parágrafo único da Constituição Federal de 1988, in verbis: Art. 5°[...] XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. [...] Art. 170 [...] Parágrafo único – é assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgão públicos, salvo nos casos previstos em lei. Desta forma, a Constituição de 1988 reconheceu a autonomia do individuo para explorar a atividade econômica empresarial privada, não podendo o Estado interferir no exercício destas atividades salvo como agente normativo de fiscalização, incentivo e planejamento (DINIZ, 2009). Você já deve ter concluído que a livre iniciativa é, portanto, limitada pelos princípios da soberania nacional; propriedade privada; função social Capítulo 1 23 Direito Comercial e Legislação Societária da propriedade; livre concorrência; defesa do consumidor; defesa do meio ambiente; redução das desigualdadesregionais e sociais; busca do pleno emprego e tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país (CF/88, at. 170, I ao IX). Liberdade de contratar A liberdade de contratar ou de negociar compreende a liberdade para desempenhar a atividade econômica, a liberdade obrigacional e a liberdade negocial. Ela está assegurada pela garantia constitucional de que “ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei” (CF/88, art. 5°, II). Assim, as partes podem contratar livremente, desde que o objeto seja lícito, não defeso em lei e que seja atendida a função social do contrato. O art. 425 do CC/2002 inclusive faculta às partes a possibilidade de firmarem contratos atípicos, ou seja, de criarem outras espécies contratuais, diversas daquelas elencadas no Código Civil para suprirem suas necessidades. Entretanto, esta liberdade é tolhida pelas normas gerais de Direito obrigacional, de Direito contratual, do Direito de consumo dentre outras estabelecidas pelo poder estatal. Assim, respeitadas às regras gerais, as partes podem criar livremente obrigações entre si, com o objeto que bem lhes convir e na forma que bem entenderem. Tais premissas são, no dizer de Mamede (2007, p.48), “molas propulsoras do processo de evolução das relações econômicas, [do] processo de modernização [...]”, que permitem que os particulares inovem “na criação de novas modalidades negociais” para acompanhar a dinâmica do mercado contemporâneo. Figura 4 – Liberdade de contratar Fonte: <www.sxc.hu> Capítulo 1 24 Direito Comercial e Legislação Societária regime jurídico privado Fique atento porque não obstante a tentativa frequente de superação da dicotomia direito público e privado no ordenamento jurídico brasileiro, a empresa é uma instituição eminentemente privada. Isso ocorre porque ela “atende, imediatamente, a um interesse privado, identificado com a idéia e a busca de lucro, e, apenas mediatamente, está submetida ao interesse público, o que se verifica pela compreensão de sua função social” (MAMEDE, 2007, p. 48). A ideia é reforçada pelo art. 41, parágrafo único do Código Civil de 2002 que assevera que as pessoas jurídicas de direito público interno com estrutura de direito privado regem-se, no que couber, quanto ao seu fundamento às normas de direito civil. Assinala Mamede (2007, p. 49) que “a localização da empresa no plano dos interesses privados e, portanto, submetida ao correspondente regime jurídico, é fruto do reconhecimento de sua condição de patrimônio jurídico especificado, como bem jurídico passível de titularidade e, mais, de transferência”. Assim, é importante que você tenha claro que as relações jurídicas empresariais são regidas pelo regime jurídico privado, muito embora possam ser atenuadas pelo interesse público, como os objetivos fundamentos da República fixados no art. 3°, incisos I ao IV da Constituição Federal de 1988. Livre concorrência Vamos voltar para a nossa viagem histórica? Pois bem, com a queda do regime feudal e ascensão do liberalismo econômico a burguesia passou a explorar as atividades econômicas de maneira desenfreada. Com o tempo, o abuso na liberdade econômica privada precisou ser freado pela intervenção estatal que passou a regular o mercado visando a preservação do interesse público na diversidade de iniciativa e sujeitos mercantis (MAMEDE, 2007). A burguesia é uma classe social que surgiu nos últimos séculos da Idade Média (por volta do século 12 e 13) com o renascimento comercial e urbano. Dedicava- se ao comércio de mercadorias (roupas, especiarias, joias, etc.) e prestação de serviços (atividades financeiras). Habitavam os burgos, que eram pequenas cidades protegidas por muros. Como eram pessoas ricas, que trabalhavam com dinheiro, não eram bem vistas pelos integrantes do clero católico. Capítulo 1 25 Direito Comercial e Legislação Societária Você precisa ter claro que o princípio da livre concorrência assegura que as empresas possam competir entre si. Veja, por exemplo, uma grande rede de supermercados e a mercearia da esquina. A priori, a mercearia não teria condições de competir com o supermercado, entretanto, o Estado intervém e oferece incentivos fiscais ou linhas de crédito para o microempresário. De outro lado, este princípio também assegura que, aqueles que têm posição dominante no mercado, não abusem de sua posição, tanto é assim, que foi instituída a Lei n. 8.884/94, a chamada Lei de Prevenção e Repressão às Infrações da Ordem Econômica. Como exemplo de infrações reprimidas pela lei n. 8.884/94 que têm relação direta com a livre concorrência, podemos citar a formação dos cartéis (aqui você deve se lembrar daquelas notícias veiculadas em jornais dando conta de acordos ilícitos realizados entre empresários para fixação do preço de determinado produto como os combustíveis) e a concorrência desleal (aqui você deve se lembrar das manifestações do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) quanto à fusão de grandes empresas). LEMBRETE Conselho administrativo de defesa econômica (Cade) é um órgão judicante, com jurisdição em todo o território nacional, criado pela Lei 4.137/62 e transformado em autarquia vinculada ao Ministério da Justiça pela Lei 8.884 de 11 de junho de 1994. As atribuições do Cade estão previstas também na Lei nº 8.884/94. Ele tem a finalidade de orientar, fiscalizar, prevenir e apurar abusos de poder econômico, exercendo papel tutelador da prevenção e da repressão a tais abusos. Fonte: <www.cade.gov.br> Função social da empresa O princípio da função social da empresa é decorrente da função social da propriedade que está prevista no art. 5°, XXIII da Constituição Federal de 1988. Capítulo 1 26 Direito Comercial e Legislação Societária Inicialmente, você poderia pensar que a empresa atenderia sua função social se desenvolvesse atividades filantrópicas. Entretanto, não é este o seu melhor significado. O art. 170, III da CF/88 estabelece a função social da empresa como um princípio da ordem econômica. Isso significa que as empresas, independente de sua forma jurídica, deverão conduzir suas atividades tendo como baliza o bem da coletividade, ou seja, devem gerar riquezas e empregos, recolher tributos, promover o desenvolvimento econômico e respeitar os direitos e interesses de todos os indivíduos. O objetivo básico da empresa privada é a obtenção do lucro, entretanto, este não deve estar acima do interesse da coletividade. Assim, caso a empresa não cumpra sua função social é lícita a intervenção estatal, em outras palavras, o interesse público se sobrepõe ao interesse privado. Em contrapartida, cumprindo a empresa sua função social indubitavelmente receberá proteção do ordenamento jurídico brasileiro, tendo acesso, por exemplo, a recuperação judicial e extrajudicial antes da falência propriamente dita. Preservação da empresa O princípio da preservação da empresa complementa o princípio da função social. A ideia aqui é que em decorrência do interesse público haja continuidade na produção de bens ou prestação de serviço. A extinção da empresa poderia causar danos não só ao empresário, ou aos seus empregados e fornecedores, mas sim a toda a sociedade, por isso a intenção é que ela sempre seja mantida. Veja por exemplo a seguinte situação: João, proprietário de uma empresa de transporte morre e deixa como herdeiro apenas Paulo, que conta com 15 anos. Paulo é considerado pela legislação civil brasileira incapaz e, portanto, a priori, não poderia dar continuidade à empresa, devendo ela ser extinta.Imagine os reflexos que a extinção desta empresa podem acarretar. REFLEXÃO Capítulo 1 27 Direito Comercial e Legislação Societária Os prejuízos afetariam toda a comunidade local, que ficaria sem transporte. Ocorre que em decorrência do Princípio da Preservação da Empresa, o art. 974 do Código Civil de 2002 estabelece que o incapaz, no caso, Paulo, poderá, por meio de representante legal, dar continuidade à empresa antes exercida pelo autor da herança. O mesmo princípio também permite a unicidade de sócios por um prazo de 180 dias (CC/2002, art. 1033, IV). Entretanto, é importante salientar que este princípio não tem caráter absoluto se, por exemplo, a empresa estiver exercendo uma atividade ilícita. Neste caso será fechada independente dos reflexos que possa causar na comunidade. Foi o que ocorreu com os bingos há algum tempo e o que acontece com empresas poluidoras do meio ambiente. O desemprego é fator de menor importância frente aos danos que a continuidade da atividade empresarial pode ocasionar à sociedade. O jogo estava proibido desde 1946 por decreto lei do presidente Eurico Gaspar Dutra. A nova proibição foi decretada pelo presidente Lula, em fevereiro de 2004 . A aplicação do princípio também deverá considerar outros fatores como a viabilidade jurídica e econômico-financeira da empresa. É o que se depreende da Lei n. 10.101/2005, a chamada Lei de Falência e Recuperação Judicial que será objeto de estudo futuro. No que se refere à aplicação do princípio da preservação da empresa, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu que a impontualidade no pagamento de dívida de pequeno valor não é razão suficiente para autorizar a quebra de uma empresa (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (Terceira Turma). Recurso Especial N° 805.624. Brasília, 21 de agosto de 2009. Relator: Min. Sidney Beneti. Disponível em: http://www.stj.gov.br. Acesso em: 12 ago. 2011). No mesmo sentido, também entendeu que: [...] É inegável que o comércio possua o condão de gerar renda, emprego, arrecadação de tributos e, portanto, não pode ser tutelado apenas no interesse de credores particulares. Ao revés, a proteção jurídica do empresário deve ter em mira aspectos outros, notadamente aqueles de cunho social, eis que o empresário não exerce sua atividade em seu exclusivo interesse. Assim, não se pode desconsiderar a importância da atividade empresarial para a sociedade como um todo, é inviável supor que todo e qualquer crédito possa servir de suporte ao pedido falimentar. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (Terceira Turma). Recurso Especial Capítulo 1 28 Direito Comercial e Legislação Societária N° 1.089.092 – SP (2008/0203816-1). Brasília, 29 de abril de 2009. Relator: Min. Massami Uyeda. Disponível em: http://www.stj.gov.br. Acesso em: 12 ago. 2011). Assim, o princípio da preservação da empresa prioriza o interesse público na manutenção da atividade empresarial. 1.2.5 conceito de empresário O legislador não definiu a “empresa”, preferiu incluir no art. 966 do CC/2002 o conceito de empresário, in verbis: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.” Para uma melhor compreensão deste conceito, iremos com base em Coelho (2005), analisar suas palavras-chave, quais sejam: profissionalismo, atividade econômica, organização e produção ou circulação de bens ou serviços. Esclarece Coelho (2005) que “a noção do exercício profissional de certa atividade é associada, na doutrina, a considerações de três ordens”. O primeiro diz respeito à habilitualidade, ou seja, aquele que realiza a atividade de maneira esporádica para, por exemplo, se socorrer de uma situação emergencial em suas finanças não será considerado empresário. O segundo aspecto é a pessoalidade, isso não significa que o empresário deva exercer as atividades pessoalmente. O significado aqui compreende a contratação de empregados que irão em seu nome produzir ou circular bens ou serviços. O terceiro aspecto é o monopólio das informações que o empresário possui sobre o produto ou serviço que é objeto da empresa, ou seja, refere-se a toda gama de informações, tais como condições de uso, qualidade, insumos empregados, possíveis defeitos, riscos a saúde dos consumidores etc. que ele deve ter sobre os produtos ou serviços que coloca no mercado. A atividade empresarial é econômica, uma vez que o empresário explora determinada atividade com o objetivo de obter lucro. Veja bem, não é o lucro por si só que caracteriza o empresário, mas sim o objetivo de obter lucro. Ainda que a empresa feche o mês negativa, o objetivo da obtenção de lucro persiste. Capítulo 1 29 Direito Comercial e Legislação Societária A atividade explorada economica- mente pelo empresário também deve ser organizada, ou seja, nela devem ser encontrados de forma articulada os quatro fatores de produção, ou seja, capital, mão de obra, insumos e tecnologia. Você provavelmente tem uma amiga ou conhecida que costuma viajar, comprar produtos e, depois, vai até a sua casa ou ao seu local de trabalho para vendê-los. São as chamadas sacoleiras. Hoje inclusive virou moda ser sacoleira de luxo. Muito bem, estas pessoas não são empresárias. Muito embora objetivem o lucro, exerçam a atividade com habitualidade e pessoalidade, falta-lhes o requisito da organização de mão de obra. A produção de bens consiste na fabricação de produtos, enquanto a produção de serviço consiste na prestação de serviços. Para ficar mais claro: a fábrica de carros produz bens, enquanto a concessionária promove a circulação destes bens. Por outro lado, a circulação de bens é uma atividade de intermediação entre o produtor e o consumidor, enquanto a circulação de serviços é a intermediação da prestação de serviços. A empresa aérea produz um serviço, enquanto a agência de turismo intermedeia o serviço. atividades econômicas civis Superada a definição de empresário, deve importante ressaltar que o art. 966, parágrafo único do CC/2002 elenca atividades que não são consideradas empresariais, in verbis: “Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa”. Figura 5 – Atividade empresarial visa o lucro Fonte: <www.sxc.hu> Capítulo 1 30 Direito Comercial e Legislação Societária O exercício de atividade intelectual perfaz, a priori, uma atividade econômica civil, ou seja, os médicos, os advogados, os contadores são profissionais liberais e não estão sujeitas as regras de Direito Comercial. O mesmo também ocorre com os artistas plásticos, os músicos, os atores e os escritores, ainda que sejam auxiliados por outras pessoas. Entretanto, a parte final do parágrafo único admite exceção quando o exercício profissional constituir elemento de empresa. É o que ocorre quando um cliente procura uma clínica para ser atendido independentemente do trabalho pessoal do médico que a criou. Você precisa ter claro que, por outro lado, por expressa disposição legal, as sociedades de advogados não podem ter características mercantis, ou seja, não podem ser empresárias (Lei n. 8.906/94, art. 16). O individuo que exerce atividade econômica rural também possui tratamento específico no Código Civil de 2002. O art. 970 do referido Código assegura-lhe tratamento diferenciado e simplificado no que se refere a sua inscrição e aos efeitos. O art. 971 do CC/2002 dispõe que uma vez inscrito na Junta Comercial ele ficará equiparado ao empresário,para todos os efeitos, devendo, portanto, se conduzir pelas normas de Direito Comercial. O mesmo também ocorre com a sociedade que tenha por objeto o exercício de atividade própria de empresário rural (CC/2002, art. 984). Figura 6 – Atividade rural tem tratamento específico na legislação empresarial Fonte: <www.sxc.hu> As cooperativas, por expressa disposição legal, são sempre sociedades simples independente da atividade que explorem (CC/2002, art. 982, parágrafo único). Este tipo de sociedade tem ganhado destaque no Brasil e no mundo. A Organização das Nações Unidades (ONU) inclusive declarou 2012 o Ano Capítulo 1 31 Direito Comercial e Legislação Societária Internacional das Cooperativas. Destaco que a ONU é uma organização internacional criada em 1945, logo após a Segunda Guerra mundial, com o objetivo de facilitar a cooperação em matéria de direito internacional, segurança internacional, desenvolvimento econômico, progresso social, direitos humanos e a realização da paz mundial. As cooperativas são regidas pela lei n. 5.764, de 16 de dezembro de 1971 e podem ser compreendidas como uma pessoa jurídica formada por pessoas que se reúnem de maneira autônoma e voluntária para satisfazer necessidades econômicas, sociais ou culturais, com propriedade privada e gerencia coletiva. a capacidade civil como requisito para ser empresário A condição primária de validade de todo e qualquer ato ou negócio jurídico é a capacidade civil do agente que o pratica. Assim, só poderá ser empresário aquele que estiver em pleno gozo da sua capacidade civil e não estiver impedido legalmente, sob pena de responder pelas obrigações contraídas (CC/2002, art. 972 c/c art. 973). Para podermos compreender o que é a capacidade civil, precisaremos primeiramente compreender o que é a personalidade. Todo ser humano é considerado uma pessoa natural (ou física como querem os tributaristas) e ao nascer com vida ele adquire personalidade. Muito embora a lei ponha a salvo os direitos do nascituro, somente com o nascimento com vida é que adquire personalidade (CC/2002, art.2°). DEFINIÇÃO Nascituro é aquele que está para nascer. Atualmente existem várias correntes doutrinárias que discutem o momento em que inicia a vida, dentre elas destacamos a natalista que é aquela que atribui tutela jurídica ao ser humano, a partir do momento em que ele consegue sobreviver de forma independente do útero materno, ou seja, Capítulo 1 32 Direito Comercial e Legislação Societária após o nascimento com vida. A teoria concepcionista que atribui ao pré-nato a condição de pessoa humana, com todos os direitos assegurados, inclusive com personalidade jurídica, desde a concepção. A teoria natalista ainda é a mais aceita, mas a concepcionista já começa a ser aplicada nos tribunais. Ainda teremos muita discussão até que chegue a um consenso sobre isso. Por definição, a personalidade é a “aptidão genérica para adquirir direito e contrair obrigações” (DINIZ, 2007, v.1, p. 114). Mas é importante que você compreenda que personalidade não por ser confundida com a capacidade. Capacidade é “a medida jurídica da personalidade, pois para uns é plena e, para outros, limitada” (GONÇALVES, 2003, v.1, p.71). A capacidade pode ser de fato ou de direito. Todo o individuo é capaz de direito, ou seja, tem capacidade para contrair direito e obrigações. Entretanto, nem todos têm capacidade de fato, ou seja, nem todos têm aptidão para exercer, por si só, atos da vida civil. Então essa capacidade vai depender do discernimento do indivíduo em distinguir o lícito do ilícito, o conveniente do prejudicial. O Código Civil de 2002 elenca em seu art. 3° as pessoas que são absolutamente incapazes, in verbis: Art. 3° São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I – os menores de dezesseis anos; II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. Assim, um indivíduo menor de 16 anos não poderá ser empresário, entretanto, como já vimos quando tratamos do princípio da preservação da empresa, o art. 974 do CC/2002 permite que o incapaz, por meio de representante legal, dê continuidade à empresa antes exercida por seus pais ou pelo autor da herança. O art. 4°, do Código Civil, por sua vez, enumera os relativamente incapazes, in verbis: Art. 4° São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: I – os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; Capítulo 1 33 Direito Comercial e Legislação Societária II – os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; III – os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; IV – os pródigos. Os relativamente incapazes também não podem ser empresários, salvo se possuírem autorização judicial e apenas para dar continuidade à empresa (CC/2002, art. 974). Neste caso, eles deverão ser assistidos. Ou seja, eles podem praticar certos atos jurídicos, entretanto, precisam da ratificação do assistente, sob pena de anulação do referido ato (CC/2002, art. 171, I). Para que você compreenda melhor a distinção entre a capacidade de direito e a capacidade de fato, veja o exemplo a seguir: o homem maior de 18 anos [...], na plenitude de sua capacidade mental, tem ambas as capacidades, a de direito e a de fato, pode ser sujeito de direito, podendo praticar pessoalmente atos da vida civil; já o alienado mental, interdito por decisão judicial, não deixa de ter personalidade, como ser humano que é, possuindo capacidade jurídica, podendo figurar como sujeito de direito, porém necessita de que alguém, por ele, exercite a capacidade de fato que não possui, por lhe faltar o devido discernimento. Seus atos da vida civil são praticados por curador (VENOSA, 2005, p. 141). O incapaz, a priori, não pode ser empresário, salvo naquelas hipóteses previstas no art. 974 do CC/2002 que foram indicadas anteriormente. Além disso, o incapaz só poderá exercer a atividade empresarial: • por meio de representante ou assistente; • se o exercício for precedido por autorização judicial (alvará) e de estudo da viabilidade da continuidade da empresa; • se os direitos de terceiros em virtude do exercício empresarial pelo incapaz não serão prejudicados; • quando os bens particulares do incapaz, anteriores à sucessão ou interdição, desde que estranhos ao acervo daquela, não estão sujeitos ao resultado da empresa. Mas há um dado importante: a autorização pode ser revogada pelo juiz, ouvidos os pais, tutores ou representantes legais do incapaz. As Juntas Comerciais deverão registrar ou alterar o contrato da sociedade que envolva incapaz, desde que Capítulo 1 34 Direito Comercial e Legislação Societária • o menor não exerça a administração da sociedade, • que o capital esteja totalmente integralizado e o relativamente incapaz seja assistido e o absolutamente incapaz seja representado; • se o representante ou assistente do incapaz estiver impedido de ser empresário, nomeará, com aprovação do juiz, um ou mais gerentes, entretanto, a nomeação não o exime da responsabilidade pelos atos que forem praticados; • as provas da emancipação e da autorização do incapaz e a sua eventual revogação devem ser inscritas ou averbadas na Junta Comercial. O uso da firma caberá, conforme o caso, ao representante ou ao gerente nomeado, ou mesmo ao incapaz , quando autorizado (CC/2002, arts. 974-975). A incapacidade civil do menor de 18 anos de idade pode ser cessada de maneira antecipada por meio da emancipação. A emancipação é umadeclaração irrevogável da maioridade e ocorrerá nos casos previstos no art. 5°, parágrafo único, incisos I ao V do CC/2002, in verbis: Art. 5º A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil. Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade: I – pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos; II – pelo casamento; III – pelo exercício de emprego público efetivo; IV – pela colação de grau em curso de ensino superior; V – pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria. Observe que uma das causas de emancipação é o estabelecimento civil ou comercial do menor de 16 anos completos que tenha econômica própria, ou seja, se o menor tiver condições de se sustentar sozinho ele poderá ser emancipado. Capítulo 1 35 Direito Comercial e Legislação Societária Do empresário casado Preste atenção a este item que vou apresentar para você agora. Dispõe o art. 977 do CC/2002 que é facultado aos cônjuges contratar sociedade entre si ou com terceiros. Entretanto, eles não poderão estar casados no regime de comunhão universal de bens, nem no regime de separação obrigatória de bens. O regime de comunhão universal de bens é aquele em que, de modo geral, há comunicação entre todos os bens e dívidas anteriores e posteriores dos nubentes. Em contrapartida, o regime de separação obrigatória de bens é aquele que, de modo geral, não há qualquer comunicação entre os bens e dívidas dos nubentes. Este regime é de adoção obrigatória, nos casos, especificados no art. 1641 do Código Civil de 2002, in verbis: Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: I – das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; III – de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial. Nos demais regimes de bens, comunhão parcial de bens, separação total de bens convencional e da participação final nos aquestos (bens adquiridos na constância da convivência) conjuga que não há qualquer impedimento dos cônjuges figurarem como sócios entre si ou entre eles com terceiro. Saliento a você que o art. 978 do CC/2002 autoriza o empresário casado a alienar ou gravar de ônus real os imóveis que integram o patrimônio da empresa, sem que para isso necessite da outorga conjugal. O pacto antenupcial, a decisão judicial que decretar ou homologar a separação judicial e o ato de reconciliação, assim como o título de doação, herança ou legado, os bens clausulados de incomunicabilidade ou inalienabilidade, todos devem ser arquivados e averbados na Junta Comercial como condição de sua eventual oposição a terceiros. Capítulo 1 36 Direito Comercial e Legislação Societária impedimentos legais para o exercício da empresa O art. 5°, XIII da CF/88 dispõe que é livre o exercício de qualquer oficio ou profissão desde que atendidas as qualificações que a lei exigir, ou seja, apenas, excepcionalmente, pode ser exigida habilitação especial para o exercício da empresa. Por exemplo, só poderá ser contador aquele que tiver cursado graduação de Ciências Contábeis, for aprovado no exame de suficiência e estiver inscrito no Conselho Regional de Contabilidade. O mesmo também ocorre com o advogado, o médico, o corretor de seguros etc. Não obstante estas exceções, em regra, para ser empresário basta que a pessoa seja legalmente capaz e que não esteja impedida de exercer a atividade econômica empresarial por expressa disposição em lei (CC/2002, art.972). Dentre as pessoas que estão impedidas por lei de exercer atividade empresarial, destacamos: a) Os estrangeiros com visto temporário ou que se encontre no Brasil na condição do art. 21, §1° da Lei 6.815/1980 não podem estabelecer-se “com firma individual, ou exercer cargo ou função de administrador, gerente ou diretor de sociedade comercial ou civil, bem como inscrever-se em entidade fiscalizadora do exercício de profissão regulamentada”. (Lei n. 6.815/1980, art. 99). Mas não se enquadram nesta regra se possuírem visto temporário e “vierem ao país na condição de cientista, professor, técnico ou profissional de outra categoria, sob regime de contrato ou a serviço do governo brasileiro” (Lei n. 6.815/1980, art. 13, V). Os estrangeiros que possuem visto permanente também sofrem restrições de natureza constitucional como, por exemplo, a proibição de pesquisa ou lavra de recursos minerais ou aproveitamento de potenciais de energia elétrica. b) magistrados – o art. 95, parágrafo único, inciso I da CF/88 veda o exercício, ainda que em disponibilidade, de outro cargo ou função, salvo a do magistério. A Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979 (Lei Orgânica da Magistratura) em seu art. 36 veda expressamente o exercício da atividade econômica empresarial. Capítulo 1 37 Direito Comercial e Legislação Societária c) membros do ministério Público – o exercício da atividade empresarial é vedado nos termos do art. 128, §5º, II, “c” da CF/88 e do art. 44, III, da Lei n. 8625, de 11 de fevereiro de 1993. d) agentes públicos – de acordo com art. 117, X, da Lei n. 8112, de 11 de dezembro de 1990, os agentes públicos não podem “participar de gerência ou administração de sociedade privada, personificada ou não personificada, exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário”. e) militares – o art. 29 da Lei n. 6880, de 09 de dezembro de 1980 veda ao militar da ativa comerciar ou tomar parte na administração ou gerência de sociedade ou dela ser sócio ou participar, exceto como acionista ou quotista, em sociedade anônima ou por quotas de responsabilidade limitada. f) Falidos – estão impedidos de exercer qualquer atividade empresarial a partir da decretação da falência até a sentença que extingue suas obrigações. (Lei n. 11.101/2005, art. 102). A condenação por prática de crime previsto na lei de falência e recuperação judicial também impede o exercício da atividade empresarial. (Lei n. 11.101/2005, art. 181). g) deputados e senadores – O art. 54 da CF/88 proíbe que os deputados e senadores sejam proprietários, controladores ou diretores de empresas que gozem de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público. Eles também estão proibidos de exercer função remunerada ou cargo de confiança sob pena de perda do mandato. Os deputados estaduais e vereadores, nos termos do art. 29, IX da CF/88, possuem a mesma restrição. Se um impedido exercer a atividade em nome próprio, seus atos serão válidos respondendo pelas obrigações contraídas, mas ficará sujeito às sanções previstas em lei, como por exemplo, na área penal, a prisão simples ou multa pelo exercício ilegal da profissão e na área administrativa a demissão. Por fim, é importante ressaltar com base em Fazzio Junior (2005) que a incompatibilidade empresarial não alcança a participação em sociedade empresária na qualidade de acionista ou cotista. O impedimento está ligado ao exercício de função ou cargo de direção e administração da sociedade. Capítulo 1 38 Direito Comercial e Legislação Societária Da pessoa jurídica A pessoa jurídica consiste em uma invenção legislativa. Ela é “a unidade de pessoas naturais ou de patrimônio, que visa à consecução de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica como sujeito de direito e obrigações”(DINIZ, 2007, v.1, p. 229). Estabelece o art. 40 do CC/2002 que as pessoas jurídicas podem ser de direito público, interno ou externo e de direito privado. SAIBA QUE Dentre as pessoas jurídicas de direito público externo estão os estados estrangeiros, as uniões aduaneiras e os organismos internacionais. Já as pessoas jurídicas de direito público interno podem ser: de administração direta, União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios; ou de administração indireta, Autarquias, Associações Públicas, Fundações Públicas e Agências Reguladoras. As pessoas jurídicas de direito privado, por sua vez, são: as fundações particulares, as associações, as sociedades simples e empresárias, as organizações religiosas e os partidos políticos (CC/2002, art. 44, I ao V). Ao longo desta disciplina você vai estudar mais detalhadamente as sociedades de pessoas jurídicas de direito privado. O início da existência legal da pessoa jurídica de direito privado se dá pelo preenchimento em duas fases distintas. A primeira se inicia com formulação do contrato social ou o estatuto social, conforme o caso. Neste documento deverá constar qual a atividade da sociedade, as relações entre os sócios, dos sócios com a sociedade e da sociedade com terceiros. A segunda fase é a de registro público. O art. 45, do Código Civil de 2002 dispõe que o começo da existência legal da pessoa jurídica de direito privado se dá com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo. A partir de Capítulo 1 39 Direito Comercial e Legislação Societária então, toda e qualquer alteração no ato constitutivo deverá ser averbada no respectivo registro. Determina o art. 1.150, do Código Civil de 2002 que o empresário (individual) e a sociedade empresária (sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples, sociedade limitada, sociedade anônima e sociedade em comandita por ações) vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantins, o qual está a cargo das juntas comerciais, e a sociedade simples (civis) ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária. São muitos detalhes, mas, ao longo dos estudos, você vai entender que um está vinculado ao outro, facilitando assim o entendimento de todo o processo. Com o registro do ato constitutivo a sociedade passa a ter personalidade jurídica própria diversa dos seus sócios. Entretanto, hoje em dia, a jurisprudência tem aplicado cada vez com mais frequência, a chamada Teoria da desconsideração da Personalidade Jurídica, que consiste na possibilidade jurídica de garantir as dívidas da empresa com os bens particulares dos sócios ou administradores da pessoa jurídica em determinadas situações. Ou seja, essa teoria tem como objetivo responsabilizar os sócios ou administradores pela prática de fraudes e abusos de direito realizados em nome da pessoa jurídica. A referida teoria foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pelo art. 28 do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90). Posteriormente, o art. 4°, da Lei de Crimes Ambientais (Lei n. 9.605/98) e o art. 50 do Código Civil de 2002 também contemplaram esta expressa disposição normativa. 1.3 aplicando a teoria na prática Pedro e Mariana são casados há cinco anos e decidiram juntar os investimentos que cada um mantinha na caderneta de poupança para abrir uma empresa, mais precisamente uma padaria. Depois de proceder todos os estudos que um empreendimento requer, eles procuraram o contador para dar entrada na documentação e, finalmente, começar a produzir. Como não sabemos qual o regime de casamento de ambos, pode haver algum impedimento legal para a constituição da sociedade? Conseguiu responder? Veja. Capítulo 1 40 Direito Comercial e Legislação Societária A resposta correta seria depende, pois, conforme estudamos, o regime de casamento poderia ser causa impeditiva. Assim, se eles fossem casados no regime de comunhão universal ou no regime de separação obrigatória de bens, não poderiam constituir sociedade entre si. Entretanto, se fossem casados no regime de comunhão parcial de bens, no regime de separação total de bens convencional ou no regime da participação final nos aquestos, não haveria qualquer problema. 1.4 Para saber mais Título: Direito Comercial Autor: BULGARELLI, W. Editora: Atlas Ano: 2001 Muito embora sua edição não seja muito recente, este livro é interessante sobre o ponto de vista da evolução histórica do Direito comercial. Título: Princípios de Direito Comercial Autor: ROCCO, A. Editora: LZN Ano: 2003 Este livro serve principalmente aqueles que buscam na solução das controvérsias jurídicas orientações claras e precisas sobre os princípios gerais. Rocco foi um dos principais defensores da dicotomia direito civil e comercial. Título: Instituições de Direito Comercial Autor: VIVANTE, C. Editora: Minelli Ano: 2007 Vivante foi o mentor da Teoria da Empresa italiana. É, portanto, um clássico da área. Site: Cooperativismo URL: <http://www.ocb.org.br/site/brasil_cooperativo/index.asp> Site oficial da Organização das Cooperativas Brasileiras que traz uma série de informações sobre o cooperativismo no Brasil. Capítulo 1 41 Direito Comercial e Legislação Societária 1.5 relembrando Neste capítulo, você estudou que: • o Direito Comercial como um ramo autônomo surgiu na Idade Média, entretanto, é possível vislumbrar em sociedades mais antigas regras que regulavam o comércio; • a evolução histórica do Direito Comercial pode ser dividida em três fases distintas: a primeira, subjetiva, voltada para proteção do mercador; a segunda, objetiva, baseada na Teoria dos Atos do Comércio, e a terceira, apoiada na Teoria da Empresa; • estrangeiros, magistrados, membros do Ministério Público, militares, senadores e deputados não podem exercer atividade empresarial; • o exercício de atividade intelectual perfaz, a priori, uma atividade econômica civil, ou seja, os médicos, os advogados, os contadores são profissionais liberais e não estão sujeitas às regras de Direito Comercial. 1.6 Testando os seus conhecimentos 1) Assinale a alternativa incorreta: a) Nos primeiros momentos de sua história, o Direito Comercial foi concebido de maneira subjetiva como um sistema normativo regente da classe dos comerciantes. b) No Direito Romano antigo, os romanos não praticam o comércio por considerarem o seu exercício indigno. c) O Código Comercial de Napoleão adotou o sistema objetivista apoiado na teoria dos atos de comércio. d) O Código Civil italiano de 1942 instituiu a teoria da empresa. e) O Código Comercial de 1850 foi revogado totalmente pelo Código Civil de 2002. Capítulo 1 42 Direito Comercial e Legislação Societária 2) Assinale a alternativa incorreta: a) O Código Civil de 2002 adotou a Teoria de Empresa. b) O Código Comercial de 1850 continua em vigor na parte que trata do direito marítimo. c) O Código Civil de 2002 conceitua empresário. d) Em decorrência do princípio da legalidade apenas a lei é fonte de Direito Comercial. e) O princípio da preservação da empresa não tem caráter absoluto estando limitado a licitude e viabilidade econômico-financeira da empresa. 3) Assinale a alternativa incorreta: a) O menor de 18 e maior de 16 se for emancipado poderá exercer a atividade empresarial. b) O incapaz pode, por meio de seu representante legal, ou devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele quando capaz. c) Os estrangeiros podem exercer qualquer tipo de atividade empresarial.
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