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AZEREDO-objeto da sintaxe

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AZEREDO, José Carlos. Fundamentos de gramática do português. 4.ed. Rio de Janeiro: Jorge 
Zahar, 2008. p. 153-154 
 
 
O pardalzinho nasceu 
Livre. Quebraram-lhe a asa. 
Sacha lhe deu uma casa, 
Água, comida e carinhos. 
Foram cuidados em vão: 
A casa era uma prisão, 
O pardalzinho morreu. 
O corpo Sacha enterrou 
No jardim, a alma, essa voou 
Para o céu dos passarinhos. 
(Manuel Bandeira, 1974) 
 
A sintaxe é responsável, ao lado da morfologia e do léxico, por parte fundamental da organização 
do significado das frases, mas alguns aspectos desse significado estão fora de seus limites. A 
sintaxe diz respeito aos mecanismos gramaticais que estruturam internamente o período a partir das 
palavras, mas não pode fornecer uma explicação, por exemplo, para o entendimento de que, na 
sétima oração, o sintagma o corpo equivale, de fato, a o corpo do pardalzinho. Esta informação está 
no texto, como parte da competência pragmático-textual, mas fora da oração. 
Os mecanismos gramaticais a que nos referimos no parágrafo acima como constitutivos da sintaxe 
compreendem: 
 
 a escolha da unidade – palavra ou sintagma – de acordo com sua classe ou subclasse. 
Assim, pode-se dizer O pardalzinho morreu, mas não O em vão morreu – pois essa posição 
tem de ser ocupada por um substantivo; pode-se dizer O corpo Sacha enterrou no jardim, 
mas não O corpo Sacha enterrou com o jardim – pois só a preposição em pode introduzir o 
complemento do verbo enterrar. 
 
 a posição de cada unidade – palavra ou sintagma – na construção da unidade do nível 
superior. 
Assim, pode-se dizer O corpo Sacha enterrou no jardim ou Sacha enterrou o corpo no 
jardim, mas não No enterrou jardim Sacha o. 
 
 
 a forma morfossintática dos vocábulos adequada à relação que se estabelece entre eles. 
Assim, pode-se dizer Foram cuidados em vão, mas não Foi cuidados em vão; Quebraram-
lhe a asa, mas não Quebraram-no a asa. 
 
 a substituição de unidades por alguma palavra ou por sua ausência, sem prejuízo para o 
entendimento da frase. 
Assim, diante da frase Luís colhia as laranjas e seu irmão encaixotava, atribui-se ao 
segundo verbo o mesmo complemento – laranjas – do primeiro. 
 
 
SAUTCHUK, Inez. Prática de morfossintaxe: como e por que aprender análise (morfo)sintática. 
Barueri, SP: Manole, 2004. p. 35-36. 
 
A importância da sintaxe 
 
Etimologicamente, sintaxe vem do grego syntaxis, significando “ordem, disposição, 
relação”. A sintaxe é a parte da gramática que se preocupa com os padrões estruturais, com as 
relações recíprocas dos termos das frases e das frases entre si, enfim, de todas as relações que 
ocorrerem entre as unidades linguísticas no eixo sintagmático (aquela linha horizontal imaginária). 
Como já vimos, a língua é formada pelo conjunto de morfemas lexicais e gramaticais, mas 
também pelo conjunto de regras e de leis combinatórias que permitem a atualização de tais palavras 
na elaboração de uma mensagem. Se realmente há dois tipos de inventários (um aberto e um 
fechado) dessas palavras, não existe, porém, um inventário de frases. São as leis sintáticas que irão 
promover, autorizar ou recusar determinadas construções, elegendo-as como “pertencentes à língua 
portuguesa” ou “não-pertencentes”. Dito de outra forma, se as sequências (e suas extensões e 
transformações) forem permitidas na língua, então essas sequências serão consideradas frases dessa 
língua. As sequências que não forem permitidas serão não-frases dessa língua. 
A força e a importância dessas leis são tão relevantes que a elas se reserva a manutenção da 
própria identidade da língua. Observe como qualquer falante do português consegue perceber que a 
frase (37) está mais próxima de um padrão sintático “conhecido” (ainda que “meio estranho”), do 
que a construção (38): 
 
(37) Acredito com isso seu recuperamento será mais breve. 
(38) As inconveniências do meio de comunicação chamada televisão é apresentado diante do visor 
suas transmissões. 
 
Ocorrem em (38) tantas transgressões de leis sintáticas do português, que fica bastante 
difícil, quando não impossível, recuperar a intenção comunicativa de quem produziu a frase.

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