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DIREITO DO TRABALHO Curso e Discurso Augusto César Leite de Carvalho SOBRE O AUTOR Augusto César Leite de Carvalho nasceu em Sergipe, na cidade de Aracaju. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Sergipe, mestre em Direito Constitucional pela Universidade do Ceará, mestre e doutor em Direito das Relações Sociais pela Universidad Castilla La Mancha. Ingressou na Magistratura Trabalhista em 1990 como Juiz do Trabalho Substituto do TRT da 5ª Região (BA). Foi promovido ao cargo de Juiz Presidente da Segunda Junta de Conciliação e Julgamento de Aracaju, em abril de 1993. Atuou no Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região (SE), inicialmente como juiz convocado – em 1994 e em 2001. Em 2003 foi promovido a de Desembargador Federal do Trabalho e, no biênio 2004/2006, exerceu a Presidência do TRT da 20ª Região. Foi diretor da EMAT XX – Escola da Magistratura do Trabalho da Vigésima Região de 2007 até sua posse no cargo de Ministro do TST, em 14 de dezembro de 2009. É professor assistente da Universidade Federal de Sergipe, ora licenciado, e professor do Instituto de Educação Superior de Brasília – IESB. ÍNDICE 1 ORIGEM DO DIREITO DO TRABALHO 1.1 A pré-história do direito do trabalho 1.2 Os fatores econômicos que inspiraram o direito do trabalho 1.2.1 A revolução industrial 1.2.2 O trabalho humano, produtivo, alheio e livre 1.3 Os fatores sociais que inspiraram o direito do trabalho 1.3.1 Os primeiros movimentos de insurreição dos trabalhadores 1.3.1.1 A reação dos trabalhadores na Inglaterra 1.3.1.2 A reação dos trabalhadores na França 1.3.1.3 A reação dos trabalhadores na Alemanha 1.3.2 A organização das profissões 1.4 Os fatores políticos que inspiraram o direito do trabalho 2 HISTÓRIA DO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO 2.1 Direito coletivo e institutos afetos – sindicato, greve e convenção coletiva 2.2 O sindicalismo no sistema capitalista de produção 2.3 O sindicalismo sob intervenção totalitária 3 HISTÓRIA DO DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL 3.1 Pré-história do direito do trabalho: trabalho escravo e corporações de arte e oİcio no Brasil 3.1.1 As corporações de ofício na Europa e a analogia com o emprego 3.1.2 A escravidão na América e especialmente no Brasil 3.1.3 A escravidão inibe as corporações de ofício no Brasil 3.1.4 As leis trabalhistas surgiram antes da abolição da escravatura 3.2 A substituição do escravo africano pelo imigrante europeu 3.3 O direito do trabalho e a industrialização no Brasil 4 FONTES DO DIREITO DO TRABALHO 4.1 Conceito 4.2 As fontes materiais e as fontes formais do direito 4.2.1 As fontes formais do direito do trabalho 4.3 Métodos de integração da norma jurídica 4.4 Eficácia da norma trabalhista no tempo e no espaço 4.4.1 Eficácia da norma trabalhista no tempo 4.4.2 Eficácia da norma trabalhista no espaço 5 PRINCÍPIOS DE DIREITO DO TRABALHO 5.1 Conceito e funções do princípio 5.2 Preeminência do princípio constitucional da dignidade (da pessoa) humana 5.2.1 A importante contribuição do positivismo jurídico na conceituação da dignidade humana 5.2.2 A adoção do princípio da dignidade na relação entre capital e trabalho 5.3 Princípios especiais do direito do trabalho 5.3.1 Princípio da proteção 5.3.1.1 As regras in dubio pro operário, norma mais favorável e condição mais benéfica 5.3.1.2 A ultra-atividade das normas coletivas 5.3.2 Princípio da irrenunciabilidade 5.3.2.1. A indisponibilidade e a prescrição de pretensões trabalhistas 5.3.3 Princípio da continuidade 5.3.4 Princípio da primazia da realidade 5.3.5 Princípio da razoabilidade 5.3.6 Princípio da boa-fé 5.3.7 Princípio da igualdade de tratamento 5.3.8 Princípio da autodeterminação coletiva 5.3.8.1 A autonomia coletiva e os princípios regentes da organização sindical. Unicidade sindical e liberdade sindical 5.3.8.2 A autodeterminação coleƟva e a flexibilização do direito do trabalho. O princípio constitucional da proteção ao trabalhador 6 A PRESCRIÇÃO TRABALHISTA 6.1 A prescrição e o temor de propor a ação 6.2 Actio nata como termo inicial do prazo prescricional de cinco anos 6.3 Outras relevantes cizânias jurisprudenciais frente à evolução constitucional e das leis 6.3.1 Os fundamentos tradicionais da prescrição total de cinco anos 6.3.2 A prescrição total contra a pretensão de matriz constitucional 6.3.3 A possível influência do atual Código Civil no debate sobre a prescrição total de pretensão fundada em nulidade 6.3.4 A jurisprudência trabalhista sobre a prescrição da pretensão que investe contra o negócio jurídico nulo 6.3.5 A extinção do contrato como único termo inicial da prescrição bienal 6.3.6. Súmulas 326 e 327 do TST – a complementação de proventos da aposentadoria 6.3.7 A prescrição total de pretensão reparatória. A actio nata e os fundamentos da Súmula 278 do STJ 6.3.8 A prescrição em hipótese de lesão a direitos da personalidade 6.3.9 A lesão continuada e o termo inicial da prescrição 6.3.10 A pretensão que sobrevém à sua própria prescrição – uma heresia jurídica? 6.3.11 Prescrição contra domésticos, estagiários e avulsos 7 EMPREGADO 7.1 O conceito de empregado a partir da realidade social 7.2 Conceito legal de empregado. Requisitos da prestação laboral 7.2.1 A pessoalidade 7.2.2 A não eventualidade 7.2.2.1 Distinção entre o trabalho não eventual e o trabalho intermitente 7.2.2.2 Distinção entre o trabalho não eventual e o trabalho temporário 7.2.2.3 Distinção entre o trabalho não eventual e o trabalho avulso 7.2.2.3.1 Igualdade de direitos entre o trabalhador avulso e o empregado 7.2.3 A subordinação 7.2.3.1 Fundamento e grau da subordinação 7.2.3.2 O poder de comando – contraface da subordinação A) Morfologia do poder de comando B) Natureza jurídica do poder de comando C) Do poder regulamentar – extensão do poder diretivo 7.2.4 A onerosidade 7.3 Os elementos acidentais da prestação laboral 7.4 Empregados excluídos da proteção pela CLT 7.5 Tipos especiais de empregados e de trabalhadores subordinados 7.5.1 Altos-empregados. Os empregados-diretores e os diretores-empregadores 7.5.2 Os empregados públicos 7.5.3 Os empregados domésticos 7.5.4 O empregado em domicílio e o teletrabalho 7.5.5 O trabalho intra-familiar – entre filhos e pais ou entre cônjuges 7.5.6 O empregado aprendiz 7.5.6.1 Distinção de aprendizagem e estágio curricular 7.5.7 Os trabalhadores intelectuais 7.5.8 Os empregados-sócios 7.5.9 O trabalhador cooperativado 7.5.10 O trabalhador rural 8 EMPREGADOR 8.1 Empresa 8.2 O conceito legal de empregador 8.3 Empresa e estabelecimento 8.4 Sucessão de empregadores 8.4.1 A sucessão em outras searas do direito 8.4.1.1 Os efeitos da transferência do estabelecimento no direito civil 8.4.1.2 Os efeitos da transferência do estabelecimento na relação de consumo 8.4.1.3 Os efeitos da transferência de estabelecimento na relação tributária 8.4.2 A sucessão trabalhista no Brasil 8.4.3 A sucessão trabalhista em situações normais e anormais 8.4.3.1 A mudança na estrutura jurídica da sociedade empresária 8.4.3.2 A sucessão no âmbito de empresas prestadoras de serviço 8.4.3.3 A sucessão entre sociedades irregularmente constituídas 8.4.3.4 A invalidade da sucessão simulada 8.4.3.5 Os efeitos da sucessão predatória 8.4.3.6 A sucessão em hipóteses de falência e de recuperação judicial 8.5 A solidariedade entre entes empresariais que integram grupo econômico 8.5.1 Conceito de grupo econômico 8.5.2 Solidariedade passiva e solidariedade ativa (empregador único) 8.5.3 A sucessão no âmbito de uma das empresas do grupo econômico 8.6 A subcontratação e a intermediação de mão-de-obra 8.6.1 A subempreitada em vista da Súmula 331 do TST 8.6.2 A Súmula 331, IV e VI – a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, inclusive da administração pública 8.6.3 A extensão da responsabilidade subsidiária do tomadordos serviços 8.6.4 A subcontratação de serviços (terceirização) nas hipóteses de contrato de facção 8.6.5 A igualdade de direitos entre os empregados da tomadora dos serviços e os empregados da empresa prestadora 8.6.6 A terceirização da atividade-fim nos serviços de telefonia e de energia elétrica 9 REMUNERAÇÃO E SALÁRIO 9.1 Conceito 9.1.1 As teorias da tripartição e da bipartição 9.2 O salário 9.2.1 O salário mínimo 9.2.1.1 Salário mínimo profissional. Piso salarial 9.2.1.2 O salário por unidade de tempo e o salário mínimo. Jornada reduzida 9.2.1.3 O salário variável e o salário mínimo. Hipótese de jornada reduzida 9.2.2 Salário-utilidade 9.2.2.1 Limites percentuais do salário-utilidade 9.2.2.2 Configuração do salário-utilidade 9.2.2.3 Conversão em dinheiro. Salário-utilidade na suspensão contratual 9.2.3 Modalidades de salário 9.2.3.1 Comissão e percentagem 9.2.3.2 Gratificações ajustadas A) O décimo terceiro salário: a antiga gratificação natalina B) A gratificação de função. Reversão ao cargo efetivo. Incorporação da gratificação ao salário C) A gratificação e o prêmio 9.2.3.3 Diária para viagem. A distinção entre diária e ajuda de custo 9.2.3.4 Abono 9.2.4 O salário-base e os complementos salariais 9.2.4.1 A acessoriedade dos complementos salariais – a questão correlata da composição do salário mínimo 9.2.4.2 A periodicidade dos complementos salariais 9.2.4.3 A multicausalidade e a plurinormatividade dos complementos salariais 9.2.4.4 A condicionalidade dos complementos salariais 9.2.5 Prestações trabalhistas sem natureza salarial ou remuneratória 9.2.5.1 A participação nos lucros, resultados ou gestão da empresa 9.2.5.2 O Programa de Integração Social (PIS) 9.2.5.3 O Programa de Alimentação ao Trabalhador 9.2.5.4 O vale-transporte 9.3 A remuneração 9.3.1 A gorjeta imprópria 9.3.2 A oportunidade de ganho 9.3.2.1 O direito de arena como oportunidade de ganho 9.3.3 A remuneração, em especial a gorjeta, como base de cálculo de outras parcelas 9.4 Os adicionais - vedação à incidência recíproca 9.4.1 O adicional de hora extra 9.4.2. O adicional noturno 9.4.2.1 O trabalho noturno em regime de revezamento 9.4.2.2 O trabalho noturno decorrente da natureza da atividade 9.4.2.3 A prorrogação do trabalho noturno 9.4.2.4 O trabalho noturno do empregado rural 9.4.2.5 O trabalho noturno em regimes especiais – empregado portuário e advogado 9.4.3 Os adicionais de insalubridade e de periculosidade 9.4.3.1 Hipóteses de incidência 9.4.3.2 A base de cálculo dos adicionais de insalubridade e periculosidade 9.4.3.3 A prévia regulamentação pelo Ministério do Trabalho 9.4.3.4 A necessidade de perícia técnica em sede judicial 9.4.3.5 A supressão do direito ao adicional pela neutralização ou eliminação do risco 9.4.3.6 A condicionalidade do direito ao adicional de insalubridade ou periculosidade 9.4.3.7 A inacumulabilidade dos adicionais de insalubridade e de periculosidade 9.4.4 O adicional de transferência 9.5 Os princípios informantes da teoria jurídica do salário 9.5.1 Princípio da irredutibilidade 9.5.2 Princípio da integridade do salário 9.5.2.1 A integridade do salário e sua determinação supletiva 9.5.2.2. A integridade do salário e a vedação de descontos A) O desconto salarial e o risco da aƟvidade econômica. Recebimento de cheques sem fundo por frenƟstas. Dano por colisão de veículo por culpa de motorista. As diferenças de caixa e a gratificação quebra-de-caixa B) O desconto da contribuição assistencial 9.5.3 Princípio da intangibilidade do salário 9.5.3.1 Proteção contra a imprevidência do empregador. Falência. Recuperação judicial e extrajudicial. Liquidação extrajudicial 9.5.3.2 Proteção contra a imprevidência do empregado. Incessibilidade. Impenhorabilidade absoluta 9.5.4 Princípio da igualdade de salário 9.5.4.1 Os pressupostos da equiparação salarial com empregado brasileiro 9.5.4.2 A existência de quadro de carreira – fato impediƟvo da equiparação. Direito ao enquadramento 9.5.4.3 Equiparação salarial com estrangeiro 9.5.5 Princípio da certeza do pagamento do salário 9.5.5.1 A certeza que emana do modo de pagar o salário. O recibo de pagamento e o salário complessivo 9.5.5.2 A certeza quanto ao valor do salário 9.5.5.3 A certeza quanto ao tempo e ao lugar do pagamento de salário 10 DURAÇÃO DO TRABALHO 10.1 Duração. Jornada. Horário 10.2 A jornada de trabalho 10.2.1 Critérios gerais de fixação da jornada 10.2.1.1 O tempo de trabalho e o tempo à disposição do empregador. O ônus da prova 10.2.1.2 O tempo de deslocamento residência-trabalho-residência 10.2.1.3. O tempo de afastamento justificado 10.2.2 Critérios especiais de fixação da jornada 10.2.2.1 O tempo de prontidão 10.2.2.2 O tempo de sobreaviso 10.2.2.3 O tempo de intervalo especial 10.2.3 Jornada extraordinária 10.2.3.1 Jornada realmente extraordinária 10.2.4 Jornadas normais reduzidas – bancários, telefonistas, operadores cinematográficos, mineiros, cabineiros de elevador, professores, advogados, motoristas, aeronautas, técnicos em radiologia, artistas, músicos 10.2.5 Compensação de jornadas. Banco de horas e fonte do direito 10.2.6 Turnos ininterruptos de revezamento 10.2.6.1 Os intervalos em turnos ininterruptos de revezamento 10.2.6.2 A sobrevigência da Lei 5811/72 10.2.6.3 A redução da hora noturna no sistema de turnos ininterruptos de revezamento 10.2.7 Trabalhadores não protegidos pela norma regente da duração do trabalho 10.3 Intervalos intrajornadas e interjornadas 10.3.1 Intervalos intrajornadas 10.3.1.1 Intervalo mínimo. Autorização do Ministério do Trabalho para redução e efeitos da supressão. Regra específica para o motorista profissional 10.3.1.2 Intervalo máximo. Possibilidade de prorrogação por norma escrita. Efeitos da dilação não autorizada 10.3.2 Intervalos interjornadas 10.3.2.1 Intervalo entre duas jornadas 10.3.2.2 Repouso semanal e em feriados A) A preferência da folga aos domingos B) A folga obrigatória em feriados C) A folga e a remuneração da folga D) A remuneração do trabalho em dia de folga E) Os intervalos interjornadas dos motoristas profissionais 10.3.2.3 Férias A) Conceito, finalidade e história das férias B) Natureza jurídica das férias C) Aquisição do direito ao gozo de férias D) Período concessivo das férias. Poder patronal de datar a fruição das férias. Fracionamento. Aviso prévio e registros pertinentes D–1) Período legal de fruição em meio ao período concessivo E) Possibilidade de conversão em pecúnia F) Remuneração das férias – base de cálculo, prazo legal e sanção jurídica G) Férias não concedidas. Remuneração em dobro e outras sanções H) Férias coletivas I) Efeitos da cessação do contrato. Férias vencidas e proporcionais J) Férias remuneradas mas não gozadas K) As férias do empregado doméstico L) Prescrição das férias M) A Convenção 132 da OIT 11 NATUREZA DA RELAÇÃO DE EMPREGO 11.1 Natureza ou fonte das obrigações 11.2 As teorias anticontratualistas A) A teoria da relação de trabalho B) A teoria institucionalista 11.3 As teorias contratualistas A) Teoria do contrato de locação B) Teoria do contrato de compra e venda C) Teoria do contrato de sociedade D) Teoria do contrato de mandato E) Teoria do contrato-realidade 12 CONTRATOS AFINS AO DE EMPREGO 12.1 Relação de emprego: espécie do gênero relação de trabalho 12.2 A relevância da subordinação como elemento distintivo 12.3 A locação de serviços e o novo contrato de prestação de serviços 12.4 Distinção entre emprego e empreitada 12.5 Distinção entre emprego e mandato 12.6 Distinção entre emprego e sociedade 12.7 Distinção entre emprego e relação de consumo 13 CARACTERES DO CONTRATO DE EMPREGO 13.1 Classificação do contrato de emprego 13.1.1 Contrato nominado 13.1.2 Contrato de direito privado 13.1.3 Contrato principal 13.1.4 Contrato consensual 13.1.5 Contrato bilateral 13.1.6 Contrato oneroso e comutativo 13.1.7 Contrato intuitu personae 13.1.8 Contrato continuado13.1.9 Contrato de adesão 14 ELEMENTOS DO CONTRATO DE EMPREGO 14.1 O que são elementos de um contrato 14.2 Elementos essenciais do contrato de emprego 14.2.1 Os pressupostos: a capacidade, a liceidade do objeto e, em alguns casos, a legitimação A) A capacidade trabalhista B) A licitude do objeto C) A legitimação 14.2.2 Os requisitos da relação de trabalho: causa, consentimento e, excepcionalmente, a forma especial A) A causa B) O consentimento C) A forma escrita ou a exigência de solenidade 14.3 Elementos acidentais do contrato de emprego 15 CLASSIFICAÇÃO DO CONTRATO DE EMPREGO 15.1 Classificação quanto aos sujeitos 15.2 Classificação dos contratos de emprego quanto à duração 15.2.1 O termo final em norma geral 15.2.2 O termo final em norma especial 15.2.3 Contrato de trabalho sob condição resolutiva 15.2.4 Peculiaridades dos contratos a termo. Duração máxima. Recondução tácita. Suspensão contratual. Ruptura antecipada. Aquisição de estabilidade. Sucessão de contratos com termo certo 16 CONTEÚDO DO CONTRATO DE EMPREGO 16.1 A semântica da teoria dos contratos – distinção entre conteúdo e objeto mediato 16.2 O conteúdo do contrato de emprego 17 ALTERAÇÃO DO CONTRATO DE EMPREGO 17.1 A alteração contratual no âmbito do direito civil 17.2 Considerações gerais sobre a alteração contratual no âmbito do direito do trabalho. O direito de variar e o direito de resistir 17.3 Alterações por intervenção do Estado e por negociação coletiva 17.4 Alterações voluntárias do contrato de emprego 17.4.1 A alteração consensual do contrato de emprego 17.4.2 A inalterabilidade unilateral do contrato e o jus variandi 17.4.2.1 A alteração funcional e seu limite de licitude 17.4.2.2 A tentativa de padronizar o jus variandi 17.4.2.3 A mudança de localidade e seus efeitos pecuniários. Grupo econômico 17.4.2.4 O jus variandi extraordinário 18 SUSPENSÃO DO CONTRATO DE EMPREGO 18.1 A suspensão contratual sob a ótica do direito do trabalho 18.2 Nome e conteúdo dos tipos de suspensão 18.3 Classificação legal 18.3.1 Hipóteses de interrupção contratual 18.3.2 Hipóteses de suspensão contratual 18.3.2.1 Efeitos da suspensão contratual no tocante a prestações não sinalagmáƟcas – assistência escolar, médica ou odontológica 18.3.2.2 Efeitos da suspensão contratual no tocante à justa causa 18.3.2.3 A proteção ao empregado portador da AIDS 18.3.2.4 Efeitos da suspensão contratual no tocante à prescrição 18.3.3 Casos híbridos. Efeitos jurídicos 18.4 Conversibilidade da suspensão do contrato 19 CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO 19.1 Terminologia 19.2 Resilição do contrato de emprego. Direito potestativo, ônus da prova e aviso prévio 19.2.1 O aviso prévio 19.2.1.1 Conceito e cabimento do aviso prévio 19.2.1.2. Forma do aviso prévio. Aviso prévio de trabalhador menor 19.2.1.3. Indenização compensatória do aviso prévio. Integração ao tempo de serviço do aviso prévio indenizado pelo empregador 19.2.1.4 Prazo de aviso prévio 19.2.1.5 Especificidades do aviso prévio devido pelo empregador 19.2.1.6 Natureza jurídica do aviso prévio 19.2.1.7 Aviso prévio e justa causa. Aquisição de estabilidade provisória 19.2.1.8 Aviso prévio e suspensão contratual 19.2.1.9 Aviso prévio, prazo para pagamento das resilitórias e prescrição 19.2.2 Assistência ao empregado demissionário. Empregado menor que se demite 19.3 Resolução do contrato de emprego. Extinção normal. Justa causa 19.3.1 A resolução mediante extinção normal do contrato de emprego 19.3.2 A justa causa – implemento da condição resolutiva tácita 19.3.2.1 A justa causa e a falta grave 19.3.2.2 As justas causas atribuíveis aos empregados A) Ato de improbidade B) Incontinência de conduta ou mau procedimento C) Negociação habitual D) Condenação criminal E) Desídia no desempenho das funções F) Embriaguez habitual ou em serviço G) Violação de segredo da empresa H) Indisciplina ou insubordinação I) Abandono de emprego J) Ato lesivo da honra e boa fama ou ofensas físicas K) Prática constante de jogos de azar 19.3.2.3 As justas causas atribuíveis aos empregadores A) Serviços superiores às forças do empregado B) Rigor excessivo C) Perigo manifesto de mal considerável D) Não cumprimento de obrigações do contrato E) Ato lesivo da honra ou boa fama. Ofensas físicas F) Redução do trabalho remunerado por peça ou tarefa 19.3.2.4 A culpa recíproca 19.3.2.5 Justa causa do empregado doméstico 19.3.2.6 A resolução do contrato de empregado público 19.3.2.7 A greve e a resolução contratual 19.4 Rescisão do contrato de emprego 19.5 Caducidade do contrato de emprego A) Morte do empregado B) Aposentadoria do empregado C) Morte do empregador D) Força maior que determina a extinção da empresa E) Factum principis F) Outros casos de cessação da empresa ou estabelecimento. Falência. Recuperação judicial. Liquidação extrajudicial G) A confusão como causa extintiva da obrigação trabalhista 19.6 O regime do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço 19.6.1 A história e a estrutura do sistema de depósitos 19.6.2 Alíquotas e titulares do direito ao FGTS 19.6.3 Natureza jurídica do FGTS. Contribuição social ou salário diferido. A Lei Complementar 110 e sua aparente inconstitucionalidade 19.6.4 A movimentação da conta vinculada 19.7 A forma e a força liberatória do recibo firmado no desate contratual 19.8 Efeitos da cessação do contrato de emprego 19.8.1 O direito à reintegração A) Estabilidade B) Reintegração na hipótese de suspensão do contrato C) Dispensa discriminatória D) Dispensa lesiva a direito fundamental – a garantia de indenidade E) Dispensa de empregado público com motivo declarado e infundado F) Anistia 19.8.2 As prestações típicas da dissolução do contrato A) Indenização e integração do período de aviso prévio B) Férias em dobro, simples e proporcionais C) Décimo terceiro salário proporcional D) Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e acréscimo indenizatório de 40% E) Multa do artigo 477, §8o, da CLT F) Sanção do artigo 467 da CLT G) Indenização adicional. Artigo 9o da Lei 7.238/84 H) Seguro-desemprego I) Indenização por danos morais 20 ESTABILIDADE NO EMPREGO 20.1 Fonte jurídica e tipologia da estabilidade 20.2 A estabilidade definitiva 20.3 A estabilidade provisória (ou garantia de emprego) 20.3.1 A estabilidade sindical 20.3.2 A estabilidade dos membros da CIPA eleitos pelos empregados 20.3.3 A estabilidade da gestante 20.3.4 A estabilidade acidentária 20.3.5 A estabilidade dos membros da Comissão de Conciliação Prévia eleitos pelos empregados 20.3.6 A estabilidade do membro do Conselho Curador do FGTS 20.3.7 A estabilidade do empregado eleito diretor de cooperativa 20.3.8 A estabilidade do membro do CNPS 20.3.9 A estabilidade dos representantes dos trabalhadores na empresa 20.3.10 A estabilidade no período pré-eleitoral 21 DIREITO FUNDAMENTAL DE GREVE 21.1 A greve e o meio ambiente de trabalho 21.2 A interação entre a greve e os sistemas político e econômico 21.3 Conceito legal 21.4 A greve como direito fundamental 21.4.1 A greve como direito coletivo fundamental 21.4.1.1 As dimensões individual e coletiva do direito fundamental à greve 21.4.1.2 A greve como direito fundamental – a opção pela via pacífica e a preeminência como método de solução dos conflitos coletivos 21.4.1.3 O interesse coletivo e as greves geral, política e de solidariedade 21.4.1.4 A greve como direito fundamental – o lock-in e o lock-out 21.4.2 A greve e o princípio da boa-fé objetiva 21.4.2.1 Imunização da greve contra a perturbação patronal 21.4.2.2 Imunização da greve contra a perturbação obreira 21.4.3 A suspensão do contrato durante a greve 21.5 A greve sob intervenção judicial 21.6 A greve e o interdito proibitório 21.6.1 A ameaça à posse como pressuposto do interdito possessório 21.6.2 A necessidade de audiência de justificação para a concessão do mandado proibitório REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS NOTAS 1 ORIGEM DO DIREITO DO TRABALHO Augusto César Leitede Carvalho 1.1 A pré-história do direito do trabalho Houve tempo em que o homem produzia para atender às suas próprias necessidades e às de sua família, interagindo com a natureza e com outros homens que agiam à sua semelhança. Era um tempo, portanto, de mediações de primeira ordem [i] , ou mediações primárias, e de comportamento instintivo. Produzindo o que era útil para o próprio consumo, o homem primitivo desconhecia o conceito de mercadoria e o mundo do trabalho não comportava, em situação de normalidade, a estrutura hierárquica que mais tarde viria a predominar nas relações de trabalho. A terra não estava repartida, nem havia quem a repartisse. A troca ou escambo ganhou, progressivamente, alguma complexidade até que se iniciou um processo de conversão do valor de uso em valor de troca [ii] , pois as coisas transferidas não o eram mais segundo o valor da utilidade que proporcionavam, mas passaram a ter o seu valor inflado pelo trabalho humano e, mais adiante, pelo valor que correspondia ao lucro, vale dizer, o ganho do empresário que precisava existir para justificar o seu investimento na produção. O investimento na produção de mercadorias, em escala industrial, não foi a primeira forma de inversão do capital a contribuir para que se reduzissem gradualmente as mediações de primeira ordem. Um modelo econômico que pressupunha a realização de capital e, sob perspectiva histórica, precedeu o sistema capitalista fora decerto o sistema mercantilista. Desde as primeiras formas de mercantilismo (bulionismo ou metalismo), preconizava-se estar a riqueza das nações associada à quantidade de metais preciosos – ouro e prata – acumulada, servindo o incremento das exportações a esse fim. Não por acaso, as nações colonialistas impediam que o ouro da colônia fosse vendido a outros povos. Também a exploração do trabalho humano não surgiu, evidentemente, com a primeira revolução industrial. Ademais de citar o trabalho escravo e as suas modalidades – desde aquele que se realizava por meio de prisioneiros de guerra até o crudelíssimo aprisionamento da gente africana – podem-se mencionar o labor dos servos de gleba[iii] e o dos aprendizes e oficiais nas corporações de arte e ofício[iv]. O aparecimento do direito do trabalho tem relação com um modo específico de produção capitalista que emergiu com a realidade social sobrevinda após os movimentos de ruptura sócio- política e econômica que caracterizaram o fim da era moderna, no tumultuado século XVIII. As condições adversas do trabalho humano que se percebiam no âmbito do emprego industrial exigiam um sistema de compensação jurídica que por zelo ou hipocrisia as legitimasse, atenuando o seu caráter espoliativo, além de demandarem uma construção teórico-filosófica que fizesse face à ideia, desde antes difundida entre os colbertistas, de que o industrial deveria assegurar aos seus trabalhadores apenas a remuneração que lhes garantisse a sobrevivência, pois do contrário não ocorreria a acumulação de riqueza tão cara ao mercantilismo. Há, a propósito, sistematização proposta por Maurício Godinho Delgado[v] que destaca os fatores econômicos, sociais e políticos que deflagraram o surgimento do direito do trabalho como ramo específico do direito privado. Pode ser referido como fator econômico o advento do trabalho humano, alheio, produtivo e livre que caracterizou o emprego industrial; o fator social mais relevante terá sido a concentração urbana que propiciou a organização das profissões e viabilizou assim os movimentos obreiros reivindicatórios; os fatores políticos a serem ressaltados são decerto a liberdade de exercer qualquer profissão sem as amarras da sociedade estamental ou mesmo do sistema corporativo, bem assim as ações coletivas que se desencadearam a partir do ambiente de empresa e geraram não apenas a normatização das condições de trabalho sem a colaboração do Estado, mas também o modelo de democracia social que se contraporia à solução de força preconizada por Marx para a conquista de uma sociedade menos desigual. Cabe destrinçar cada um desses fatos determinantes para o nascimento e consolidação do direito laboral. 1.2 Os fatores econômicos que inspiraram o direito do trabalho Nos estertores do século XVIII, os trabalhadores perceberam a influência danosa da primeira revolução industrial na oferta de trabalho e recusaram, por isso, a submissão a normas inspiradas nos princípios da revolução burguesa, especialmente nos postulados da igualdade e liberdade que os supunham, no plano artificial das abstrações jurídicas, semelhantes aos empresários que lhes exigiam, inclementemente, condições injustas de trabalho. Cabe-nos estudar, portanto e analiticamente, os atributos do trabalho que justificaram a nova regência, ou melhor, impende analisar o fenômeno social que motivou o surgimento do direito do trabalho. Antes de detalhar as condições em que o trabalhador prestava serviço naquele novo modelo de organização social, ou seja, na empresa que emergira com a primeira revolução industrial, convém, por certo, relembrar o significado e as derivações desse conceito (revolução industrial). 1.2.1 A revolução industrial Poderia causar estranheza o uso indiscriminado do vocábulo revolução para designar uma transformação nos meios de produção – como é o caso da revolução industrial – e também alguns movimentos de ruptura política, como a Revolução Francesa de 1789 e, na mesma Inglaterra, a Revolução Gloriosa, um século antes. Ensina-nos Fábio Konder Comparato que “revolutio, em latim, é o ato ou efeito de revolvere (volvere significa volver ou girar, com o prefixo re indicando repetição), no sentido literal de rodar para trás e no figurativo de volver ao ponto de partida, ou de relembrar-se”[vi]. Anota Comparato que o uso político do vocábulo revolução “começou com os ingleses, no sentido de uma volta às origens e, mais precisamente, de uma restauração dos antigos costumes e liberdades. [...] O termo revolution é assim usado, pela primeira vez, para caracterizar a restauração monárquica de 1660, após a ditadura de Cromwell”[vii]. Deu-se, porém, um giro semântico a partir da Revolução Francesa, pois a mesma palavra que expressava o retorno ao regime político anterior passou a significar uma mudança completa na ordem dos fatos e dos valores sociais, com o sinal claramente prospectivo da promessa de um mundo novo: O grande movimento que eclodiu na França em 1789 veio operar na palavra revolução uma mudança semântica de 180º. Desde então, o termo passou a ser usado para indicar uma renovação completa das estruturas sociopolíticas, a instauração ex novo não apenas de um governo ou de um regime político, mas de toda uma sociedade, no conjunto das relações de poder que compõem a sua estrutura. Os revolucionários já não são os que se revoltam para restaurar a antiga ordem política, mas os que lutam com todas as armas – inclusive e sobretudo a violência – para induzir o nascimento de uma sociedade sem precedentes históricos. [viii] Nos dias que correm, o termo revolução é polissêmico, embora preserve a conotação de ruptura que lhe foi dada pela Revolução Francesa. Lembra Paulo Bonavides[ix] que pode tal palavra significar, para os historiadores, a “transformação fundamental de uma situação existente, não importa em que domínio”; enquanto para os juristas a revolução é essencialmente “a quebra do princípio da legalidade, a queda de um ordenamento jurídico de direito público, sua substituição pela normatividade nova que advém da tomada do poder e da implantação e exercício de um poder constituinte originário”. Muito próximo e até se relacionando intrinsecamente com o conceito jurídico, o conceito político de revolução: a “modificação violenta dos fundamentos jurídicos de um Estado”. Interessa o tema, sobretudo aos sociólogos, e eles, quando instados ao conceito de revolução, concebem-na, como ocorrera a Marx, como “a buscaretroativa de um desenvolvimento obstaculizado”, o que corresponderia, na sociedade de classes em constante conflito, ao momento em que “as forças materiais de produção na Sociedade caem em contradição com as relações de produção existentes”. Ainda no campo sociológico, Ortega y Gasset observou que a revolução “não é barricada, mas um estado de espírito”, rematando enfim que “o revolucionário não se rebela contra os abusos da sociedade, conforme fazia o homem medieval, mas contra os usos, quer dizer, contra as instituições, como faz o homem moderno”. O mestre Bonavides, de cujo ensinamento extraímos várias destas breves notas, acrescenta: “se a mudança se refere ao pessoal de governo, não houve revolução, mas golpe de Estado; se a mudança, porém, atingiu a Constituição política e a forma de governo, já é possível falar em revolução, a saber, revolução política; se, porém, as transformações se verticalizarem mais [...], com ascensão de uma nova classe ao poder ou aparição de um novo sistema de camadas sociais, redistribuição de propriedade ou até mesmo sua abolição [...], aí o cientista político reconhecerá então a revolução social”[x]. Como se pode perceber, o termo revolução não comporta, sob o ponto de vista conceitual, redução sociológica, jurídica ou política. Os seus vários sentidos denotam mudança e não raro se interpenetram os vários matizes dos fatos ou atos que sociólogos, juristas e cientistas políticos classificam, ao mesmo tempo, como revolucionários. O laboralista Evaristo de Moraes Filho[xi] atribui a autoria da expressão revolução industrial a Arnold Toynbee, situando-a em escrito de 1884, e nos remete a trecho pinçado da obra de Blanqui (célebre revolucionário e socialista francês que passou na prisão quase trinta anos de sua vida): Enquanto a Revolução Francesa fazia suas grandes experiências sociais em cima de um vulcão, a Inglaterra começava as suas no terreno da indústria. O fim do século XVIII assinalou-se naquele país por descobertas admiráveis, destinadas a modificar a face do mundo e aumentar de modo inesperado o poder de seus inventores. As condições de trabalho sofreram a mais profunda modificação que haviam experimentado desde a origem das sociedades. Duas máquinas, imortais desde então, a máquina a vapor e a máquina de fiar, transformaram o velho sistema comercial e fizeram nascer no mesmo momento produtos materiais e questões sociais, desconhecidas dos nossos pais. Os pequenos trabalhadores iriam tornar-se tributários dos grandes capitalistas; a máquina-ferramenta substituía a roda de fiar, e o cilindro a vapor sucedia a economia doméstica. O autor francês se referia ao maquinismo e à nova realidade social que dele emergia. E que progresso teve, afinal, a máquina, ao fim do século XVIII? Historiando a Idade Contemporânea, Cláudio Vicentino[xii] anota que a revolução industrial se iniciou com a mecanização do setor têxtil, cuja produção tinha amplos mercados nas colônias, inglesas ou não, da América, África e Ásia. Alinha, entre as principais invenções mecânicas do período, a máquina de fiar, o tear hidráulico e o tear mecânico. Em 1712, Thomas Newcomen inventou a máquina movida a vapor, sendo sua invenção aperfeiçoda por James Watt (1765). Em 1805, surgiu o barco a vapor e em 1814, a locomotiva a vapor, sendo assim os transportes igualmente influenciados pela descoberta do vapor como força motriz. Em verdade, a associação entre o maquinismo e a evolução dos meios de transporte tem um efeito singular: a um só tempo, produzia-se em série e se distribuía o bem produzido em mercados antes não explorados, o que estimulava novos investimentos na produção desse e de outros bens. Inicialmente, a Inglaterra monopolizou a industrialização. Os ingleses abandonaram inclusive a produção e a exportação de produtos primários[xiii], transferindo-as para as colônias que, situando- se em zona temperada, possuíam solo fértil para a agricultura que era, na grande ilha europeia, substituída pela criação de carneiros que proveriam as novas indústrias têxteis[xiv]. É fato, porém, que o padrão inglês de industrialização exigia investimentos não muito elevados e tecnologia pouco complexa, o que permitiu a outros povos (Alemanha, EUA, França, Japão e Rússia) inserir-se gradualmente, ao decorrer o século XIX, no mesmo modelo de produção fabril que caracterizou a primeira revolução industrial[xv]. Sobreveio, porém, a segunda revolução industrial, configurando-se afinal por uma maior escala de produção imposta pelo produção de novos bens que exigiam investimentos de maior monta, a exemplo da produção de energia elétrica, automóvel, química, petróleo, aço etc. Pochmann explica: O surgimento de grandes empresas, por meio de fusão e cartéis, e a união dos capitais industrial e bancário (financeiro) viabilizaram, para poucos empresários, a possibilidade de produção e difusão de uma nova onda de inovação tecnológica. As dificuldades adicionais de acesso à segunda Revolução Industrial e Tecnológica tornaram mais complexas as possibilidades de transição das nações periféricas para as nações do centro capitalista. Assim, entre 1890 e 1940, as exportações mundiais de produtos manufaturados estiveram concentradas em apenas 5 países (Inglaterra, Estados Unidos, França, Japão e Alemanha), que respondiam por cerca de 80% do total do comércio internacional (Chirot, 1977). A bem dizer, a segunda revolução industrial teve início na última metade do século XIX, quando se descobriu a eletricidade (o dínamo a ensejar a substituição do vapor), como fonte alternativa de energia para a indústria, e invenção de Henry Bessemer permitiu a transformação do ferro em aço, este suplantando aquele por suas características de dureza, resistência e baixo custo - a invenção revolucionou a indústria metalúrgica, que passou a produzir o aço em larga escala. Ao início do século XX, a Inglaterra dá sinais de fragilidade na sua condição de potência hegemônica, agravando-se esse quadro em razão das duas guerras mundiais e da depressão econômica de 1929. A seu turno, os Estados Unidos já se apresentavam como a principal economia do centro capitalista e, no segundo pós-guerra, assumiram afinal a posição de hegemonia[xvi]. A evolução tecnológica se intensificou desde a inserção do petróleo (motor de combustão interna) como fonte energética e, em vista do atual processo de informatização da indústria, já há quem se refira a uma terceira revolução industrial. Não se pode, com efeito, abstrair que a agilidade dos atuais meios de comunicação e a globalização dos mercados, mediante a formação de blocos econômicos e interação entre estes, está por transmudar, como lembra o Professor José Eduardo Faria, a sociedade industrial em uma nova sociedade informacional, na qual o tempo de exploração comercial das invenções industriais se acelera na mesma proporção em que tais invenções são superadas por outras que revelam maior avanço tecnológico, contando-se esse tempo à razão de semanas ou meses, sequer de anos... O alto investimento em pesquisa e a expansão do mercado – mediante a globalização da economia – se justificariam, assim, como fórmula medicinal para o tempo mínimo por que uma invenção industrial se converte em lucro. O paralelismo entre a questão social vivenciada no final do século XVIII (ou desde então) com a realidade de nossos dias nos autoriza, quando menos, a diagnosticar a causa recorrente do conflito entre capital e trabalho: a evolução do maquinismo e da tecnologia sempre exigiram o desemprego como custo social. É irresistível lembrar, contudo, a visão otimista de Domenico de Masi, que concebe o desemprego estrutural, causado pela automação em todos os setores da economia, como uma fase de transição que desembocará na libertação do trabalho, tal como a humanidade outrora se libertou da escravidão e, por meio do direito do trabalho, libertou-se da fadiga. De Masi[xvii] nos traz o alento: Quando comparadaà libertação da escravidão, que caracterizou a Idade Média, e à libertação da fadiga, que caracterizou a sociedade industrial, a libertação do trabalho, que irá caracterizar a sociedade pós-industrial, delineia-se com traços peculiares. Posto que as máquinas se incumbirão de quase todo o trabalho físico, assim como de boa parte do trabalho intelectual do tipo executivo, o ser humano irá guardar para si o monopólio da atividade criativa que, por sua própria natureza, dá muito menos margem do que a atividade industrial para a alocação de tarefas e para a divisão entre tempo de trabalho e tempo livre. De modo diferente do desemprego, que necessariamente é acompanhado pelos males da miséria e da marginalização, a libertação do trabalho admite formas de vida muito mais livres e felizes. Ainda não alcançamos, decerto, esse promissor estágio. Como ainda tende a ocorrer num regime de dominação do capital, o trabalhador que assistiu ao nascimento do maquinismo, no final de século (XVIII), não convivia apenas com a ameaça de desemprego. Aceitava ele qualquer condição de trabalho, e a chamada meia-força (mulheres e crianças) despendia, em contra-senso, ainda mais força de trabalho em troca de pior remuneração. Mas se rebelava a massa trabalhadora contra essa situação indigna, a que fora injustamente lançado. A realidade social indicava uma tensão insuportável entre a necessidade de o trabalhador garantir a subsistência e, do outro lado, a oferta de trabalho que rareava na mesma proporção em que se desenvolvia o maquinismo, sobretudo após a inserção da energia elétrica no processo produtivo. O direito do trabalho veio sendo conquistado pelos trabalhadores na exata medida em que a pressão desses pontos extremos rompeu o tênue fio do individualismo jurídico (fundado no axioma: quem diz contratual, diz justo; depende do indivíduo assumir ou não obrigações) e inspirou na classe proletária o anseio de um novo Direito. A origem primeira do direito do trabalho nos remete, contudo e certamente, à realidade vivenciada, ao final do século XVIII, pelos trabalhadores da Europa Ocidental, pois nessa região se desenvolveu, mais intensamente, o emprego industrial e a conseqüente necessidade de resgatar a dignidade do trabalho humano. Não deve causar estranheza a circunstância de não nos atermos à experiência soviética, embora a ela se refiram os homens de nosso tempo quando, desavisadamente, pretendem estabelecer alguma correlação inexorável entre o regime comunista e o direito do trabalho vigente entre nós. É preciso antecipar que o marxismo não se coaduna com a presença de um Estado, menos ainda de uma estrutura estatal que, sendo provedora de direitos laborais, legitime o modo de produção capitalista. Além disso, parece-nos assistir razão a Hobsbawn[xviii], quando afirma o historiador: Com exceção dos românticos que viam uma estrada reta levando das práticas coletivas da comunidade aldeã russa a um futuro socialista, todos tinham como igualmente certo que uma revolução na Rússia não podia e não seria socialista. As condições para uma tal transformação simplesmente não estavam presentes num país camponês que era sinônimo de pobreza, ignorância e atraso, e onde o proletariado industrial, o predestinado coveiro do capitalismo de Marx, era apenas uma minúscula minoria, embora estrategicamente localizada. 1.2.2 O trabalho humano, produtivo, alheio e livre Que o direito do trabalho disciplina o trabalho humano, não há dúvida. As relações jurídicas de direito privado têm a pessoa como sujeito, regra geral. Quando pormenorizamos as características da relação jurídica de trabalho, percebemos, contudo, que o direito laboral cuida exclusivamente do trabalho prestado pelo homem, pessoa física ou natural, não lhe interessando o serviço realizado por pessoa jurídica ou ideal. Não é demasia lembrar, ainda, que o direito do trabalho trata o homem como tal, sublimando inclusive o fato de a prestação de trabalho importar o dispêndio de energia humana. Não mais se iguala o homem ao semovente ou à coisa - objeto da locação que retorna ao proprietário quando cessa o contrato. A saber, a razão de o direito do trabalho existir é decerto a perspectiva de o trabalho ser um valor social que dignifica o homem na era contemporânea e a necessidade de o trabalho humano exigir uma regência normativa que o associe à dignidade da pessoa que o realiza. Trabalho produtivo e lazer não se distinguem pela técnica acaso utilizada (o mesmo método de pescar pode servir a uma atividade profissional ou lúdica), mas se diferenciam pela característica, que só o primeiro revela, de o homem “usar seu esforço tendo como finalidade próxima a obtenção através deste dos meios materiais, dos bens econômicos de que necessita para subsistir”, como ensina Olea[xix]. Trabalho por conta alheia, certamente, porque na empresa que surgira após a abolição das corporações de arte e ofício, a partir da inversão do capital burguês na aquisição de maquinário e contratação de pessoal, a novidade estava não apenas na divisão e técnica de trabalho mas, sobremodo, no fato de os operários serem contratados para movimentar a engrenagem empresarial em troca de uma remuneração que significava apenas parte do produto de seu trabalho. A outra parte era convertida em lucro. Nessa perspectiva, a alienação do trabalho era o resultado dessa produção coletivizada de mercadorias em que o trabalhador não se identificava no objeto que ajudara a criar. Em suma, ao trabalhador já não cabia o fruto de seu labor, que era atribuída, na nova forma de produção, ao titular da empresa (mais adiante, diria Marx: utilidade do trabalho - salário = plus valia). O trabalho livre diferia, por igual, daquele que até então prevalecia nas organizações produtivas. Lembremos que a Antigüidade conheceu, predominantemente, o trabalho escravo. Segadas Viana[xx] anota que “aos escravos eram dados os serviços manuais exaustivos não só por essa causa como, também, porque tal gênero de trabalho era considerado impróprio e até desonroso para os homens válidos e livres [...] Na Grécia havia fábricas de flautas, de facas, de ferramentas agrícolas e de móveis onde o operariado era todo composto de escravos. Em Roma os grandes senhores tinham escravos de várias classes, desde os pastores até gladiadores, músicos, filósofos e poetas”. Aristóteles, que concebia o homem como um ser político, já preconizava, a seu modo, que a real igualdade consistia em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. Com essa proposição pretendia, porém, justificar a escravidão e a dizia mesmo necessária para que outros homens pudessem pensar. E supondo, num vaticínio não confirmado pela História, que a automação viria libertar o homem do trabalho, afirmou Aristóteles[xxi] que “se cada instrumento pudesse, a uma ordem dada, trabalhar por si, se as lançadeiras tecessem sozinhas, se o arco tocasse sozinho a cítara, os empreendedores não iriam precisar de operários e os patrões dispensariam os escravos”. O homem se libertou do trabalho escravo que se revelava como uma forma legitimada de violência, mas a transição para o modelo atual de trabalho, na modalidade de emprego, não se deu linearmente, pois se seguiu a Era Medieval e, nela, uma sociedade dividida em rígidos estamentos: os senhores feudais e os servos. A servidão era imposta a quase todos os camponeses e se diferenciava do trabalho escravo porque o servo se ligava à terra e pelo seu uso pagava diversos tributos[xxii], passando a ter novo amo quando a terra era vendida. A Baixa Idade Média[xxiii] assistiu a transformações sociais e econômicas que serviram à progressiva estruturação do sistema capitalista de produção. A sociedade estamental foi gradativamente se desintegrando e, nesse mesmo toar, a economia auto-suficiente, típica do feudalismo, foi sendo substituída por uma economia comercial. O crescimento demográfico[xxiv] e o renascimento urbano, coma emancipação pacífica ou não das cidades onde mais florescia a atividade comercial, deram origem a uma nova sociedade, agora estruturada em classes e a habitar cidades ou burgos[xxv]. Nessas cidades, as corporações de mercadores, que buscavam garantir o monopólio do comércio local, e as corporações de ofício, visando cada uma destas à monopolização de uma certa arte ou ofício, eram influenciadas pela cultura cristã conhecida como escolástica e, sob a sua doutrina, condenavam a usura. Por isso, uma mercadoria deveria sempre ser vendida pelo preço da matéria-prima utilizada mais o valor da mão-de-obra empregada[xxvi]. Apenas os companheiros (ou oficiais) eram remunerados como se fossem protótipos de assalariados, pois o mestre-artesão retribuía o trabalho dos aprendizes, que ocupavam a base da pirâmide corporativa, através de alimentos, vestuário e alojamento, além do aprendizado. Com o passar do tempo, muitos dos mestres se enriqueciam e exerciam, com rigor, a exclusividade da atividade artesanal. Os companheiros se uniam com o intuito de conquistar as parcelas de monopólio asseguradas à mestria, quando não se resignavam ante a ausência de perspectiva econômica mais favorável. Noutro passo, a burguesia, que se fortalecia economicamente, interessava-se na instituição de um poder central que reduzisse a influência política da nobreza, não tardando a se constituírem as monarquias nacionais, que grassaram por toda a Era Moderna. Os avanços tecnológicos, de que tratamos quando referimos a Revolução Industrial, e, mais adiante, as novas técnicas de divisão do trabalho prometiam alargar oportunidades e permitir que o homem se libertasse, uma vez por todas, dos grilhões da escravatura e da servidão, sem as amarras que o corporativismo impunha ao desenvolvimento de atividades econômicas por quem delas não tinha o direito à mestria. Contudo, o trabalho livre que surgira na empresa moderna não o era por completo, uma vez que se caracterizava exatamente pelo fato de o trabalhador ser livre (ou livre de coação absoluta) para escolher entre prestar ou não trabalho, embora não estivesse investido de igual liberdade no tocante ao tempo, lugar e modo de executar essa prestação laboral. Olea conclui: “A liberdade a que estamos aludindo se refere ao momento do estabelecimento da relação de alheamento, sendo, portanto, seu sentido o de que aquela, no trabalho forçado, fica anulada frente à presença de uma violência invalidante do consentimento”[xxvii]. 1.3 Os fatores sociais que inspiraram o direito do trabalho O trabalho penoso que se desenvolvia na indústria têxtil do fim do século XVIII propiciava, em contraponto, a concentração dos trabalhadores nas cidades e, sobretudo, no chão da fábrica, onde se aguçavam, a um só tempo, os sentimentos de indignação e solidariedade entre os que vivenciavam aquelas mesmas condições adversas de trabalho. 1.3.1 Os primeiros movimentos de insurreição dos trabalhadores Os movimentos obreiros de insurreição surgiam e se desdobravam na Inglaterra e, mais aidante, também nos países que se inseriam no processo de industrialização. Vale a pena referir o modo como reagiram os trabalhadores nesses países. 1.3.1.1 A reação dos trabalhadores na Inglaterra Os trabalhadores almejavam uma condição mínima de trabalho que pudesse ser imposta ao industrial capitalista e, para alcançarem o objetivo, se rebelaram. Inicialmente na Inglaterra, onde o luddismo e a revolução cartista davam o sinal do inconformismo. Ned Ludd comandou trabalhadores que atribuíam às máquinas a culpa pelos males que os afligiam. O luddismo foi o movimento obreiro que se opôs, portanto, à mecanização do trabalho vinda a reboque da primeira revolução industrial, e pode ser ilustrado por carta que Ludd endereçou a um certo empresário de Hudersfield, em 1812: "Recebemos a informação de que é dono dessas detestáveis tosquiadoras mecânicas. Fica avisado de que se elas não forem retiradas até o fim da próxima semanal eu mandarei imediatamente um de meus representantes destrui-las... E se o senhor tiver a imprudência de disparar contra qualquer dos meus Homens, eles têm ordem de matá-lo e queimar toda a sua casa".[xxviii] Por sua vez, os cartistas surgiram quando, em 1832, o Parlamento inglês aprovou o Reform Act, uma lei eleitoral que privou os operários do direito ao voto. Os trabalhadores reagiram e formularam suas reivindicações na "Carta do Povo", um documento com quase trezentas mil assinaturas e conteúdo político que fundava, assim, o movimento operário conhecido como cartismo[xxix]. Esclarecem Olga Coulon e Fabio Pedro[xxx]: [...] o movimento cartista ajudou os operários ingleses a melhorarem suas condições de vida e deu-lhes experiência de luta política. Assim, em 1833, surgiu a primeira lei limitando a 8 horas de trabalho a jornada das crianças operárias. Em 1842 proibiu-se o trabalho de mulheres em minas. Em 1847, houve a redução da jornada de trabalho para 10 horas. Em 1842, os cartistas encaminharam nova carta, em que reclamavam a existência de milhares de homens morrendo de fome na Escócia, Irlanda e País de Gales e denunciavam: “a jornada de trabalho, especialmente nas fábricas, excede o limite das forças humanas” e “o salário por um trabalho que se presta nessas condições ruins de uma fábrica é insuficiente para manter a saúde dos obreiros e assegurar o conforto tão necessário depois de um desgaste intenso da força muscular [...]”. Os cartistas tentaram deflagrar motins e greves gerais, porém quando não fracassavam eram reprimidos à força. 1.3.1.2 A reação dos trabalhadores na França Mas o movimento revolucionário dos trabalhadores também eclodiu na França, em 1848, inclusive com maior ressonância na Europa e influência decisiva para que na Alemanha, por igual, se iniciasse a revolução obreira. Diferente da Inglaterra, a França era antes um país de vocação agrária, em que o pequeno agricultor era sacrificado por pesados impostos, destinados a custear a burocracia e a casta militar. Contudo, o processo de industrialização se acelerou e, também na França, em prejuízo do artesanato e do pequeno proprietário, originando a proletarização do homem da cidade. Ainda sobre o movimento obreiro francês, observa De La Cueva que “durante toda la monarquía, desde la restauración de los Borbones, fué Francia un verdadero volcán. Bastaría recordar los dos grandes movimientos huelguísticos de los trabajadores de la sede de Lyon de 1831 y 1834 y la organización, desde 1821, de diversas sociedades secretas”[xxxi]. Ainda na França, intensificava-se o trânsito do socialismo utópico, em que a crítica ao regime se associava à intenção de suplantá-lo através da tentativa – malsucedida – de convencer a burguesia a promover ou aceitar a transformação social. Em 1848, surge o Manifesto Comunista de Marx e Engels, que ao historicismo hegeliano incrementava a idéia de o regime burguês ser uma etapa transitória e, no processo histórico, o advento de uma sociedade regida pelos princípios do socialismo seria a conseqüência necessária da evolução das forças econômicas. A História, para Marx, era a história da luta de classes, classes estas que se digladiavam visando à conquista dos meios de produção. Assim inspirado, Marx conclamava: “Proletários de todo o mundo, uni-vos”. Não obstante a pouca tolerância à greve e ao associativismo, a duras penas o trabalhador francês adquiriu consciência de classe e promoveu a divulgação da doutrina marxista, com reflexos positivos na evolução do direito do trabalho, mesmo após Napoleão III ser alçado a imperador, após o golpe de estado que restaurara a monarquia, em 1851. Mas, num embaraço a esse processo, a história obrigou o povo francês a se unir em razão da guerra franco-prussiana, vencida pela Alemanha em 1870. A derrota da França exigiu de seu povo uma significativa indenização de guerra. 1.3.1.3 A reação dos trabalhadores na Alemanha Já na Alemanha, aindustrialização teve impulso somente na segunda metade do século XIX, quando já era inegável o poder político e econômico da Inglaterra. Mas à semelhança do que ocorrera entre os ingleses, que promoveram a revolução cartista, o progresso industrial produziu na Alemanha um intenso movimento obreiro. A primeira insurreição de trabalhadores na Alemanha terá sido, segundo Jaques Droz[xxxii], a sublevação dos tecelões da Silésia, em 1844. O autor explica: Na origem da revolta é preciso colocar o fardo das imposições feudais que continuavam a pesar sobre a classe rural da Silésia mesmo com a abolição da escravatura: trabalhadores a domicílio, obrigados a vender o produto do seu trabalho a negociantes que comercializavam em seguida as mercadorias, os tecelões eram sobrecarregados pelos foros censitários e pelas prestações em dinheiro, sem falar dos impostos do Estado; a sua situação agravou-se com o encerramento dos mercados americanos e a criação de uma indústria têxtil na Polônia, e isto num quadro de um mercado onde a concorrência inglesa se fazia sentir duramente e cuja produção estava tecnicamente mal organizada. As revoltas que tiveram lugar em Peterswaldau e em Langenbielau, no mês de junho de 1844, resultaram na destruição de residências, confiscando-se títulos de propriedade e dizimando-se máquinas. Embora não houvesse violência contra pessoas, os levantes daquele ano foram afinal reprimidos por forças militares que, mobilizadas, aplicaram penas variadas a oitenta e sete tecelões. Anota Jaques Droz[xxxiii] que o proletariado de fábrica era de pouca expressão numérica, mas a construção de ferrovias, especialmente em Saxe, teve papel relevante no processo de industrialização na Alemanha, desencadeando cerca de quarenta greves entre 1844 e 1848. 1.3.2 A organização das profissões A alusão a esses movimentos obreiros permite verificar que, após o impacto da primeira revolução industrial, os trabalhadores formaram coalizões, que se dissolviam após a vitória ou insucesso de cada insurgência. Os sindicatos vieram depois, quando as vantagens de se instituírem organismos permanentes foram percebidas pelos trabalhadores. Sanseverino situa entre 1815 e 1848 a fase das coalizões e anota que “o mundo do trabalho encaminhou-se, definitivamente, rumo à consciente conquista da liberdade sindical” quando publicado o Manifesto Comunista de 1848, por Marx e Engels[xxxiv]. O capitalismo comercial e, mais adiante (século XVIII), o capitalismo industrial, forjaram o trabalhador livre e investido de liberdade cívica. Ao trabalhador, dava-se a liberdade de contratar e a paradoxal perspectiva de ajustar assim a própria espoliação, como alternativa para sua sobrevivência. Observa Bourguin: [...] nos sistemas anteriores, ou havia associação do trabalho e da propriedade – neste caso, o trabalhador gozava de liberdade cívica –, ou o trabalhador não era proprietário, mas então não era também um cidadão livre. A alternativa era bem clara na era pré-capitalista. Mas o capitalismo empreendeu a grande aventura de associar, nas massas de homens sempre crescentes, a ausência completa de propriedade a uma completa liberdade pessoal e a uma completa igualdade política [xxxv] . O sindicato foi, na sequência, a forma associativa que se constituiu no sistema capitalista de produção, visando à defesa dos interesses coletivos dos trabalhadores. Contra esses interesses, somavam-se o fim das corporações medievais com a ruptura da estrutura econômico-social, o maquinismo e a transformação do homem que, a custo menor e em maior quantidade, operava a mutação da matéria. A produção de bens ou serviços já não mais dependia da aptidão artística ou especialização do homem profissional, podendo mulheres e crianças prestar, com salário reduzido, o mesmo trabalho. Esse sentimento de angústia e desamparo por que passava o trabalhador é associada por Deveali às causas sociais do sindicalismo, em passagem emblemática de sua obra: “Essa transformação de caráter psicológico tem, na nossa opinião, uma influência preponderante na formação da mentalidade classista que é o efeito e a causa, por sua vez, da união de massas indiferençadas, unidas exclusivamente por uma dor comum, por um sentir comum e pelo mesmo desejo de libertação, se não de vingança”[xxxvi]. O sindicalismo não teria trajetória exitosa, porém, caso tivesse prescindido da greve, como meio de pressão para novas conquistas obreiras, e não houvesse instituído as convenções coletivas de trabalho, em detrimento do monopólio estatal na produção normativa. Esses três institutos (sindicato, direito de greve e convenção coletiva) percorreram a mesma estrada, sendo inicialmente proscritos, em seguida tolerados e, afinal, reconhecidos pela ordem jurídica. A história do sindicalismo, quando relacionada com a institucionalização das convenções coletivas e da greve, revela o modo como reagiu a classe operária à consagração, pela revolução burguesa, do princípio da autonomia da vontade individual. Em suma, os referidos institutos jurídicos expressam, hoje, o modo de atuação da vontade coletiva. 1.4 Os fatores políticos que inspiraram o direito do trabalho O final do século XVIII assistiu ao nascimento da primeira geração dos direitos humanos, aquela que se traduz nas liberdades civis e políticas. A Declaração de Direitos da Virgínia (1776) proclamava: Todos os seres humanos são, pela sua natureza, igualmente livres e independentes, e possuem certos direitos inatos, dos quais, ao entrarem no estado de sociedade, não podem, por nenhum tipo de pacto, privar ou despojar sua posteridade; nomeadamente, a fruição da vida e da liberdade, como os meios de adquirir e possuir a propriedade de bens, bem como de procurar e obter a felicidade e a segurança. A seu turno, o art. 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na França de 1789, reiterava que “os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos”. É verdade que a preocupação dos norte-americanos era mais a de consolidar a sua própria independência em relação à coroa britânica, enquanto “os franceses consideraram-se investidos de uma missão universal de libertação dos povos”[xxxvii]. Assinalando que as grandes etapas históricas de invenção dos direitos humanos coincidem com as mudanças nos princípios básicos da ciência e da técnica, Comparato observa com a acuidade de sempre: Foi justamente no sentido francês, e não na acepção inglesa, que a transformação radical na técnica de produção econômica, causada pela introdução da máquina a vapor [...] na Inglaterra, tomou o nome de Revolução Industrial. [xxxviii] Nessa quadra histórica em que se festejavam os direitos de liberdade, uníam-se a liberdade de exercer qualquer profissão, sem os limites da sociedade estamental ou dos grêmios corporativos, e o modo de reagir o operariado às ações da empresa. Criaram-se, assim, novos espaços de participação política dos trabalhadores que os fariam atuantes na normatização das condições de trabalho e na construção de uma sociedade que lhes parecesse menos injusta. A circunstância de a empresa ser uma coletividade, não se esgotando na dimensão individual as agruras vivenciadas pelos trabalhadores que nela mourejavam, porque todos o faziam em condições semelhantes, traduziu-se em um campo fértil à coletivização também das condutas reativas desses trabalhadores. Por assim dizer, os operários resistiam coletivamente às ações danosas do ser coletivo, que era a organização produtiva na qual laboravam. A um só tempo, os trabalhadores organizados inauguravam uma nova maneira de regular a vida social. Desde essa época até os dias atuais, passaram a atuar diretamente, sem a intervenção do Estado, na elaboração de normas jurídicas que viriam a disciplinar as suas condições laborais. Em um primeiro momento, as convenções coletivas surgiram como gentlemen’s agreement, ou seja, como um pacto que não podia ser cobrado coercitivamentee comportava, no caso de descumprimento, apenas sanções morais. A possibilidade de os próprios atores sociais regularem as relações de trabalho que porventura os unisse importava, na linha do pensamento liberal, um ato de demasiada condescendência com a ação dos sindicatos, em detrimento dos ideais burgueses que proscreviam, a pretexto de conjurarem as velhas corporações de ofício, os corpos intermediários. Mas as convenções coletivas brotavam incessantemente e solucionavam conflitos, ganhando legitimidade em razão de sua natural eficácia. Além disso, a ação política dos trabalhadores não se esgotava na elaboração da norma coletiva, imiscuindo-se gradualmente nos recintos do Estado Liberal que pareciam guardados para a ação política do empresariado, investido de poder econômico. A esse propósito, o advento da social democracia alemã revela o modo como as coletividades de trabalhadores se organizaram politicamente, ilustrando como aprenderam a valer-se dos instrumentos de ação democrática para ocupar espaços políticos antes reservados à burguesia ou, residualmente, a classes hegemônicas de variado matiz. Em rigor, os alemães sofreram clara influência do Manifesto Comunista e das idéias de Lassalle. Ferdinand Lassalle foi personalidade marcante do trabalhismo alemão, que em 1863 convocou o congresso obreiro em que fora constituída a Associação Geral de Trabalhadores Alemães, cujos fundadores, em declaração de princípios, firmavam: “somente o sufrágio universal e direto pode assegurar uma representação adequada e segura dos interesses sociais da classe obreira alemã, assim como a eliminação dos antagonismos de classe.” Foi a urgência de praticar a democracia, após o estabelecimento do império germânico, com um Reichstag eleito por voto popular amplo, o que uniu, em 1875, os einsenachers marxistas aos lassallistas, todos pressionados pela necessidade de fundirem os dois partidos socialistas alemães em um único, o Partido Social Democrático Alemão. Uniram-se em Gotha com vistas voltadas para a perspectiva de sucesso eleitoral. Quando lembramos que Marx propunha a substituição da classe hegemônica pela via revolucionária, bem assim a substituição da sociedade estatal em sociedade não-estatal, parece paradoxal a necessidade que se apresentava aos socialistas, na maior parte da Europa ocidental (inclusive França e Alemanha), de apresentarem aos eleitores programas imediatos de reforma dentro do sistema político e econômico. O chefe de governo era responsável perante o parlamento, parecendo, assim, inviável a obtenção do socialismo integral, a substituição revolucionária da classe dominante, sem a colaboração dos parlamentares. Sobre essa união entre marxistas e lassalistas traduzir, então, um recuo de Marx, porque incompatível com sua doutrina a ascensão do proletariado pela via eleitoral, é elucidativa a observação de George Cole: O Partido Social Democrático Alemão de 1875, embora adotasse em grande parte o marxismo como credo histórico, na prática aceitava essa necessidade (de apresentar um projeto de reforma dentro do sistema), sem a qual não teria sido possível a fusão com os lassalistas. Marx, que recebera de seus adeptos alemães um exemplar adiantado da proposta das condições da fusão, protestou energicamente contra o que considerava uma traição aos princípios socialistas; seus adeptos suprimiram o longo e arrazoado protesto (que foi publicado como Crítica ao Programa de Gotha, somente muitos anos após sua morte). Marx não publicou suas opiniões, compreendendo que os eisenachers o repudiariam se o fizesse. A democracia social nasceu em conseqüência de um compromisso ao qual o homem geralmente considerado como seu profeta era violentamente contrário [xxxix] . Como anota Mario de la Cueva, a Alemanha vivia enfim “uma extraordinária contradição: um progresso industrial incomparável e um grande movimento socialista, perigo grande para o progresso industrial, pois a crescente agitação ameaçava destruir a paz social e deter, por greves e movimentos obreiros, o trabalho normal nas fábricas”[xl]. Bismarck, o Chanceler de Ferro, percebera a importância do movimento obreiro e entabulara negociação com Lassalle. Todavia, a morte de Ferdinand Lassalle, em duelo, no ano de 1864, evidentemente significara um estorvo nesse processo de conquistas dos trabalhadores alemães. De toda sorte, o temor dessa influência socialista em meio à classe proletária fez Bismarck precaver-se, expedindo uma regulamentação minudente das relações de trabalho, em que inclusive limitava a vontade dos contratantes - bom auspício! - no que tocava, entre outros assuntos, às medidas de proteção à saúde e à vida dos trabalhadores, às normas para o trabalho de mulheres e crianças e às disposições a propósito da vigilância obrigatória das empresas. 2 HISTÓRIA DO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO Augusto César Leite de Carvalho 2.1 Direito coletivo e institutos afetos – sindicato, greve e convenção coletiva Não há como dissociar o sindicato, o direito de greve e a convenção coletiva do trabalho, institutos que são a melhor expressão do fenômeno social mais expressivo dos dois últimos séculos, o sindicalismo. O sindicalismo nasceu como um movimento espontâneo dos trabalhadores que estavam concentrados em torno das cidades industriais e, movidos pelo instinto gregário, perceberam que a sua união os fortalecia na luta contra as condições desumanas de trabalho que lhes estavam sendo impostas. Não sem razão, a Inglaterra que se fez berço da revolução industrial gerou a primeira forma de associativismo a que se pôde emprestar o atributo de sindicato: a trade union. Passado o primeiro impacto da Grande Revolução, os trabalhadores formaram coalizões, que se dissolviam após a vitória ou insucesso do movimento. Os sindicatos vieram depois, quando as vantagens de se instituírem organismos permanentes fora percebida pelos trabalhadores. Sanseverino situa entre 1815 e 1848 a fase das coalizões e anota que “o mundo do trabalho encaminhou-se, definitivamente, rumo à consciente conquista da liberdade sindical” quando publicado o Manifesto Comunista de 1848, por Marx e Engels[xli]. É preciso ver que o sindicato não derivou de outras formas precedentes de associativismo, sendo merecedora de apupos ou poucos aplausos a doutrina que sugere os colégios romanos, as guildas (entre germânicos e saxônicos) ou as corporações de arte e ofício como organizações que se tenham convertido em sindicatos, quando estes experimentavam o seu estado germinal. Não há investigação histórica que permita certificar, por exemplo, que trabalhadores assalariados tivessem ingresso nos colégios de Roma, como observa Russomano, que acentua os fins preponderantemente mutualistas dos collegia, dada a “sua finalidade de ajuda recíproca entre os que se dedicavam ao mesmo ofício e para defesa dos interesses resultantes da similitude das posições por ele ocupadas na vida romana”. O movimento colegial guarda semelhanças, porém, com a experiência vivida pelos sindicatos. Após se expandirem, num crescimento espontâneo, e passarem a exercer influência no encaminhamento dos problemas do Império, o Senado Romano proibiu o seu funcionamento, à exceção apenas dos oito colégios criados por Numa Pompílio. Em estudo proveitoso, Russomano assinala que se seguiu a represália, mas “as novas forças se organizam e dispõem-se a enfrentar, ao se sentirem poderosas, a resistência do Estado”. A Lex Clodia (ano 59 a. C.) reconheceu enfim o direito de associação mas Júlio César percebeu a prosperidade dos colégios e resolveu novamente aboli-los. Em 56 a. C, após a morte de César, Augusto editou a Lex Julia, que reconheceu direitos e privilégios dos colégios romanos mas os transformou em órgãos oficiosos do Estado Romano, inclusive quanto à arrecadação de contribuições fiscais. É ainda do mestre gaúcho o remate: A crônica dos colégios mostra que há irresistível tendênciaà repressão, pelo Estado, das novas forças sociais, que podem atuar, mais tarde, algumas vezes, em tom de contestação, em face do próprio Estado. Sucede-se, em geral, o reconhecimento de sua livre expansão e, logo depois, em uma etapa terciária, o Estado trata de intervir através de sistemas de controle e condução, em proveito próprio, das novas forças desencadeadas pela vida das comunidades. Isso se deu, exatamente, com os colégios romanos. E aquilo que ocorreu em Roma, vários séculos antes de Cristo, ocorre, ainda hoje, neste século interplanetário e tecnológico que levou nossos passos além das estrelas que nossos olhos conheciam [xlii] . As guildas (ou gildas) tinham caráter mercantil e não laboral, tendo dado origem às ligas de mercadores dos mares do norte europeu. Sobre as corporações de arte e ofício, pode-se dizer que o movimento das companhias (ou compagnonnages - reunião de companheiros com fins reinvindicatórios) significou o primeiro momento em que o monopólio dos mestres fora posto à prova, no regime corporativo. Mas é também pertinente, quanto ao mais, a lição de Mozart Victor Russomano [xliii] : As corporações representaram a organização de classes, segundo critério unilateral, dispostas essas classes em planos sucessivos e níveis hierárquicos ascendentes (do aprendiz ao mestre). O sindicato, ao contrário, é um movimento bilateral, que parte do confronto entre trabalhadores e empresários e, por isso, os coloca, frente a frente, em sindicatos distintos e opostos, em evidente paralelismo, mas sobre o mesmo plano. O sindicato foi, portanto, a forma associativa que se constituiu no sistema capitalista de produção, visando à defesa dos interesses coletivos dos trabalhadores. Contra estes, somavam-se o fim das corporações medievais com a ruptura da estrutura econômico-social, o maquinismo e a transformação do homem, enfim, de artesão a operador da máquina que, a custo menor e em maior quantidade, operava a mutação da matéria. A produção de bens ou serviços já não mais dependia da aptidão artística ou especialização do homem profissional, podendo mulheres e crianças prestar, com salário reduzido, o mesmo trabalho. Esse sentimento de angústia e desamparo por que passava o trabalhador é associada por Deveali às causas sociais do sindicalismo, em passagem emblemática de sua obra: “Essa transformação de caráter psicológico tem, na nossa opinião, uma influência preponderante na formação da mentalidade classista que é o efeito e a causa, por sua vez, da união de massas indiferençadas, unidas exclusivamente por uma dor comum, por um sentir comum e pelo mesmo desejo de libertação, se não de vingança”[xliv]. O sindicalismo não teria trajetória exitosa, porém, caso tivesse prescindido da greve, como meio de pressão para novas conquistas obreiras, e não houvesse instituído as convenções coletivas de trabalho, em detrimento do monopólio estatal na produção normativa. Esses três institutos (sindicato, direito de greve e convenção coletiva) percorreram a mesma estrada, sendo inicialmente proscritos, em seguida tolerados e, afinal, reconhecidos pela ordem jurídica. A história do sindicalismo, quando relacionada com a institucionalização das convenções coletivas e da greve, revela o modo como reagiu a classe operária à consagração, pela revolução burguesa, do princípio da autonomia da vontade individual. Em suma, os referidos institutos jurídicos expressam, hoje, o modo de atuação da vontade coletiva. 2.2 O sindicalismo no sistema capitalista de produção É fato, porém, que o movimento sindical não incorporou aos seus objetivos a revolução socialista, ao menos como regra. No Ocidente capitalista, os sindicatos têm lutado, o mais das vezes, pela implementação de medidas compensatórias que são outorgadas aos trabalhadores pelo direito laboral, como observa Ricardo Antunes[xlv]: Pode-se dizer que junto com o processo de trabalho taylorista/fordista erigiu-se, particularmente durante o pós-guerra, um sistema de 'compromisso' e de 'regulação' que, limitado a uma parcela dos países socialistas avançados, ofereceu a ilusão de que o sistema de metabolismo social do capital pudesse ser efetiva, duradoura e definitivamente controlado, regulado e fundado num compromisso entre capital e trabalho mediado pelo Estado [...]. O 'compromisso fordista' deu origem, progressivamente, à subordinação dos organismos institucionalizados, sindicais e políticos, da era da prevalência social- democrática, convertendo esses organismos em verdadeiros cogestores do processo global de reprodução do capital. Por isso, era inevitável que o sindicalismo de enfrentamento cedesse lugar, gradualmente, a um novo modelo, que Ruprecht denomina sindicalismo de participação, no qual as corporações de trabalhadores consideram a possibilidade de colaborar na gestão da empresa e do Estado, reorientando assim a sua função social. É Alfredo Ruprecht quem nota: De La Cueva chama a atenção para essa evolução, observando que o sindicalismo pertence ao futuro e sonha com uma sociedade fundada na justiça social. Seu fim primordial era econômico: melhorar as condições de vida do trabalhador. No meado do século XIX, sua finalidade tinha um nítido traço político, uma vez que a convenção coletiva e sua ação não eram suficientes para obter o que desejava e, então, era preciso partir para a organização política mesmo. No começo deste século já deixa de ser exclusivamente um órgão de luta para se transformar num órgão de cooperação [xlvi] . Não há como desvincular o movimento sindical da inserção dos direitos sociais em várias cartas políticas editadas a partir da Constituição mexicana de 1917 e da Constituição de Weimar (Alemanha), que alargaram assim o conteúdo e os horizontes dos direitos fundamentais (antes restritos aos direitos civis e direitos políticos). 2.3 O sindicalismo sob intervenção totalitária Mas sofreu duro golpe o sindicalismo na década seguinte, por obra ou influência do regime fascista. Observam Wilson Batalha e Sílvia Marina Batalha [xlvii] : [...] segundo a Declaração VI da Carta del Lavoro, as corporações (os sindicatos entre estas) constituíam a organização unitária das forças da produção e lhe representavam integralmente os interesses. Constituíam, portanto, órgãos do Estado, compostos de representantes dos trabalhadores e dos empregadores das várias categorias econômicas, atuando-se nelas a integração das forças econômicas e das forças políticas do País. Objeto de sua atividade era a disciplina da produção e do trabalho [...] Eram instituídas por decreto do Chefe do Governo. Esse sistema corporativista passou a vigorar nos vários países que se fizeram receptivos ou se renderam a tal concepção de Estado totalitário, a exemplo da França (durante a ocupação nazista), Alemanha, Espanha (sob o regime de Franco e da Falange), Portugal (sob o mando de Salazar) e Brasil, neste sob o Governo Vargas. O retorno à democracia sindical, com a possibilidade de ratificar a Convenção n. 87 da Organização Internacional do Trabalho, que cuida da liberdade de os sindicatos se constituírem e agirem na medida de sua legitimidade, teve lugar, nos países citados, após a derrocada das forças do Eixo e conseqüente fim da Segunda Grande Guerra. Menos no Brasil. 3 HISTÓRIA DO DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL Augusto César Leite de Carvalho 3.1 Pré-história do direito do trabalho: trabalho escravo e corporações de arte e ofício no Brasil O trabalho de escravos, dos servos de gleba e dos aprendizes e companheiros em corporações de arte e ofício antecedeu o modo de prestar trabalho que, mais adiante, ambientou-se na empresa capitalista e provocou o surgimento do direito laboral. Mas também se costuma dizer que, no Brasil, o direito do trabalho não teria sido o resultado desse quadro evolutivo, migrando para a nossa ordem jurídica pela intervenção de Getúlio Vargas. Ainda que a teoria da generosidade
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