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2014.1.LFG_.Familia_03

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MATERIAL DE APOIO 
DIREITO CIVIL 
DIREITO DE FAMÍLIA 
 
 
Apostila 03 
Prof. Pablo Stolze Gagliano 
 
 
1. Comentários ao art. 1647, CC 
 
O art, 1647 do Código Civil merece referência especial: 
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do 
outro, exceto no regime da separação absoluta: (grifos nossos) 
I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; 
II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; 
III - prestar fiança ou aval; (inovação legal) 
IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar 
futura meação. 
Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou 
estabelecerem economia separada. 
Note-se que, mesmo casados no regime de participação final nos aquestos, a anuência do outro cônjuge 
faz-se necessária (ressalvado, claro, suprimento judicial ou se os cônjuges houverem dispensado a 
necessidade de outorga, no pacto antenupcial – art. 1.656, CC). 
 
 
Com efeito, de acordo com a mais abalizada doutrina, “separação absoluta” deve ser entendida como 
sendo a separação convencional, ou seja, escolhida no pacto antenupcial (nesse sentido, NELSON NERY 
JR. e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, Novo Código Civil e Legislação Extravagante Anotados, SP, RT, 
2002). 
E a razão é lógica e óbvia. 
Isso porque, na separação obrigatória, é razoável exigir-se a outorga, considerando-se a necessidade de 
se beneficiar ou proteger o outro cônjuge, por conta da aplicação da S. 377, STF, estudada na apostila 
anterior. 
Nesse sentido, julgado do próprio STJ: 
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO ANULATÓRIA DE AVAL - OUTORGA CONJUGAL PARA CÔNJUGES CASADOS 
SOB O REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS - NECESSIDADE - RECURSO PROVIDO. 
1. É necessária a vênia conjugal para a prestação de aval por pessoa casada sob o regime da separação 
obrigatória de bens, à luz do artigo 1647, III, do Código Civil. 
2. A exigência de outorga uxória ou marital para os negócios jurídicos de (presumidamente) maior 
expressão econômica previstos no artigo 1647 do Código Civil (como a prestação de aval ou a alienação 
de imóveis) decorre da necessidade de garantir a ambos os cônjuges meio de controle da gestão 
patrimonial, tendo em vista que, em eventual dissolução do vínculo matrimonial, os consortes terão 
interesse na partilha dos bens adquiridos onerosamente na constância do casamento. 
3. Nas hipóteses de casamento sob o regime da separação legal, os consortes, por força da Súmula n. 
377/STF, possuem o interesse pelos bens adquiridos onerosamente ao longo do casamento, razão por 
que é de rigor garantir-lhes o mecanismo de controle de outorga uxória/marital para os negócios 
jurídicos previstos no artigo 1647 da lei civil. 
4. Recurso especial provido. 
(REsp 1163074/PB, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 
04/02/2010) 
 
 
Separação absoluta, por consequência, em nosso sentir, deve ser a convencional. 
Art. 1.648. Cabe ao juiz, nos casos do artigo antecedente, suprir a outorga, quando um dos cônjuges a 
denegue sem motivo justo, ou lhe seja impossível concedê-la. 
Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará anulável 
o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a 
sociedade conjugal. 
Parágrafo único. A aprovação torna válido o ato, desde que feita por instrumento público, ou particular, 
autenticado. 
Art. 1.650. A decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem consentimento, ou sem 
suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus 
herdeiros. 
Em conclusão, vale transcrever a S. 332 do STJ, referente à fiança prestada pelo cônjuge: 
A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia. 
(CORTE ESPECIAL, julgado em 05.03.2008, DJ 13.03.2008 p. 1) 
 
2. União Homoafetiva1 
 
Correntes que coexistiam no Brasil: 
 
a) trata-se de entidade familiar – O art. 226 da CF é uma norma geral de inclusão, não 
sendo admissível excluir-se uma relação estável calcada na afetividade (PAULO LOBO). 
Deve-se reconhecer direitos de família (alimentos) e sucessórios (herança)2; 
 
1 Ver DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. Porto Alegre: Livraria do 
Advogado. IMPORTANTE: O tema “união estável” foi objeto de aula própria, neste semestre, 
ministrada pelo Prof. André Barros. 
 
 
b) trata-se de mera sociedade de fato, regida pela Direito Obrigacional (S. 380, STF). 
 
Os ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua vez, em 2011, reconhecerem a união estável 
homoafetiva como forma de família: 
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgarem a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 
4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceram a união 
estável para casais do mesmo sexo. As ações foram ajuizadas na Corte, respectivamente, pela 
Procuradoria-Geral da República e pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. 
O julgamento começou na tarde de ontem (4), quando o relator das ações, ministro Ayres Britto, votou 
no sentido de dar interpretação conforme a Constituição Federal para excluir qualquer significado do 
artigo 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como 
entidade familiar. 
O ministro Ayres Britto argumentou que o artigo 3º, inciso IV, da CF veda qualquer discriminação em 
virtude de sexo, raça, cor e que, nesse sentido, ninguém pode ser diminuído ou discriminado em função 
de sua preferência sexual. “O sexo das pessoas, salvo disposição contrária, não se presta para 
desigualação jurídica”, observou o ministro, para concluir que qualquer depreciação da união estável 
homoafetiva colide, portanto, com o inciso IV do artigo 3º da CF. 
Os ministros Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de 
Mello e Cezar Peluso, bem como as ministras Cármen Lúcia Antunes Rocha e Ellen 
Gracie, acompanharam o entendimento do ministro Ayres Britto, pela procedência das ações e com 
efeito vinculante, no sentido de dar interpretação conforme a Constituição Federal para excluir qualquer 
significado do artigo 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do 
mesmo sexo como entidade familiar. 
Na sessão de quarta-feira, antes do relator, falaram os autores das duas ações – o procurador-geral da 
República e o governador do Estado do Rio de Janeiro, por meio de seu representante –, o advogado-
geral da União e advogados de diversas entidades, admitidas como amici curiae (amigos da Corte). 
 
2 O próprio TSE consagrou entendimento avançado: Registro de candidato. Candidatura ao cargo de 
prefeito. Relação estável homossexual com a prefeita reeleita do município. Inelegibilidade. (CF 14 § 
7º). Os sujeitos de uma relação estável homossexual, à semelhança do que ocorre com os de relação 
estável, de concubinato e de casamento, submetem-se à regra de inelegibilidade prevista no art. 14, § 
7º, da Constituição Federal. Recurso a que se dá provimento. (TSE – Resp Eleitoral 24564 – Viseu/PA – 
Rel. Min. Gilmar Mendes – j. 01/10/2004). 
 
 
Ações 
A ADI 4277 foi protocolada na Corte inicialmente como ADPF 178. A ação buscou a declaração de 
reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. Pediu, também, que 
os mesmos direitos e deveresdos companheiros nas uniões estáveis fossem estendidos aos 
companheiros nas uniões entre pessoas do mesmo sexo. 
Já na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, o governo do Estado do Rio 
de Janeiro (RJ) alegou que o não reconhecimento da união homoafetiva contraria preceitos 
fundamentais como igualdade, liberdade (da qual decorre a autonomia da vontade) e o princípio da 
dignidade da pessoa humana, todos da Constituição Federal. Com esse argumento, pediu que o STF 
aplicasse o regime jurídico das uniões estáveis, previsto no artigo 1.723 do Código Civil, às uniões 
homoafetivas de funcionários públicos civis do Rio de Janeiro. 
Fonte: http://www.stf.jus.br/portal/geral/verImpressao.asp acessado em 22 de junho de 2011. 
 
Por fim, lembrando MARIA BRAUNER (in Direitos Fundamentais do Direito de Família, coordenado por 
Belmiro Welter e Rolf Madaleno, Livraria do Advogado, 2004, págs. 267-268): 
 
“A aceitação recente da união afetiva entre iguais no âmbito do Direito de Família representa uma 
nova face do conceito de cidadania, transpondo a barreira do interdito, buscando a afirmação da 
diferença a partir da manifestação da liberdade de expressão e do direito ao livre desenvolvimento da 
personalidade”. 
 
A partir deste julgamento, e, bem assim, do REsp 1.183.378/RS, o casamento homoafetivo passou a 
ser admitido. 
 
Neste sentido, recente Resolução do CNJ: 
 
Resolução nº 175, de 14 de maio de 2013 
Texto original 
 
 
Dispõe sobre a habilitação, celebração de casamento 
civil, ou de conversão de união estável em casamento, 
entre pessoas de mesmo sexo. 
 
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições constitucionais e 
regimentais, 
 
CONSIDERANDO a decisão do plenário do Conselho Nacional de Justiça, tomada no julgamento do Ato 
Normativo no 0002626-65.2013.2.00.0000, na 169ª Sessão Ordinária, realizada em 14 de maio de 2013; 
CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal, nos acórdãos prolatados em julgamento da ADPF 
132/RJ e da ADI 4277/DF, reconheceu a inconstitucionalidade de distinção de tratamento legal às uniões 
estáveis constituídas por pessoas de mesmo sexo; 
CONSIDERANDO que as referidas decisões foram proferidas com eficácia vinculante à administração 
pública e aos demais órgãos do Poder Judiciário; 
CONSIDERANDO que o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do RESP 1.183.378/RS, decidiu 
inexistir óbices legais à celebração de casamento entre pessoas de mesmo sexo; 
CONSIDERANDO a competência do Conselho Nacional de Justiça, prevista no art. 103-B, da Constituição 
Federal de 1988; 
 
RESOLVE: 
 
Art. 1º É vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de 
casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo. 
Art. 2º A recusa prevista no artigo 1º implicará a imediata comunicação ao respectivo juiz 
corregedor para as providências cabíveis. 
Art. 3º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação. 
 
 
 
Ministro Joaquim Barbosa 
Fonte: http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/resolucoespresidencia/24675-
resolucao-n-175-de-14-de-maio-de-2013, 
acessado em 01 de julho de 2013. 
 
3. Parentesco3 
Com base no pensamento de MARIA HELENA DINIZ, poderíamos dizer que o parentesco é a relação 
vinculatória não só entre pessoas que descendem umas das outras ou de um mesmo tronco comum, 
mas também entre o cônjuge ou companheiro e os parentes do outro e entre adotante a adotado 
(Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito de Família, Ed. Saraiva). Na mesma linha, poderá haver 
parentesco nas relações nascidas da socioafetividade no campo da filiação. 
 
O parentesco poderá ser: 
 
a) natural ou consangüíneo; 
b) por afinidade e 
c) civil. 
 
Em sala de aula, deverão ser desenvolvidos esses conceitos.4 
Pensamos, finalmente, ainda ser atual o entendimento do STJ que não reconhece dever de 
alimentar entre parentes por afinidade: 
 
ALIMENTOS A OBRIGAÇÃO ALIMENTAR DECORRE DA LEI, NÃO SE PODENDO AMPLIAR A PESSOAS POR 
ELA NÃO CONTEMPLADOS. INEXISTE ESSE DEVER EM RELAÇÃO A NORA. 
(RMS .957/BA, Rel. Ministro EDUARDO RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 09.08.1993, DJ 
23.08.1993 p. 16575) 
 
 
3
 Tema ministrado, neste semestre, pelo querido Prof. André Barros. 
4 Lembramos, no entanto, que a adoção é tratada em outra grade, dedicada ao estudo do 
Direito da Criança e do Adolescente. 
 
 
E já que tocamos no tema “parentesco por afinidade”, a ser analisado em sala, veja o teor da Lei n. 
11.924 de 2009: 
LEI Nº 11.924, DE 17 DE ABRIL DE 2009. 
 
Altera o art. 57 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 
1973, para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o 
nome da família do padrasto ou da madrasta. 
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a 
seguinte Lei: 
Art. 1o Esta Lei modifica a Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – Lei de Registros Públicos, 
para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome de família do padrasto ou da madrasta, em todo 
o território nacional. 
Art. 2o O art 57 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, passa a vigorar acrescido do seguinte 
§ 8o: 
“Art. 57. ..................................................................... 
............................................................................................. 
§ 8o O enteado ou a enteada, havendo motivo ponderável e na forma dos §§ 2o e 7o deste artigo, poderá 
requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família de seu 
padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus 
apelidos de família.” (NR) 
Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 
Brasília, 17 de abril de 2009; 188o da Independência e 121o da República. 
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA 
Tarso Genro 
 
 
4. Poder Familiar 
 
Trata-se de um verdadeiro munus, consistente em um conjunto de poderes (direitos e deveres), 
exercitáveis em prol do interesse existencial dos filhos. 
 
 
 
Este poder familiar não se mantém em face de filhos maiores e capazes. 
 
A esse respeito, leia-se interessante julgado do STJ: 
 
Habeas Corpus. Internação involuntária em clínica psiquiátrica. Ato de particular. Ausência de 
provas e/ ou indícios de perturbação mental. Constrangimento ilegal delineado. Binômio poder-
dever familiar. Dever de cuidado e proteção. Limites. Extinção do poder familiar. Filha maior e 
civilmente capaz. Direitos de personalidade afetados. 
- É incabível a internação forçada de pessoa maior e capaz sem que haja justificativa proporcional 
e razoável para a constrição da paciente. 
- Ainda que se reconheça o legítimo dever de cuidado e proteção dos pais em relação aos filhos, a 
internação compulsória de filha maior e capaz, em clínica para tratamento psiquiátrico, sem que 
haja efetivamente diagnóstico nesse sentido, configura constrangimento ilegal. 
Ordem concedida. 
(HC 35.301/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03.08.2004, DJ 
13.09.2004 p. 231) 
 
Veja, no tópico “Textos Complementares”, excelente artigo do professor PAULO LÔBO a respeito 
do Poder Familiar. 
 
É a nossa recomendação no seu estudo para concurso. 
 
 
5. Responsabilidade Civil nas Relações Afetivas 
 
Trata-se de tema bastante polêmico, e que ganhou fôlego com a disciplina dos direitos da 
personalidade, inaugurada pelo CC de 2002. 
 
Sem pretender esgotar o raio da abrangência da matéria, poderíamos centrar o nosso esforço 
analítico na:a) resp. civil no casamento e na união estável; 
b) resp. civil por abandono afetivo na filiação. 
 
Sobre a primeira situação, o STJ já se pronunciou a respeito: 
 
Separação judicial. Proteção da pessoa dos filhos (guarda e interesse). Danos morais (reparação). 
Cabimento. 
 1. O cônjuge responsável pela separação pode ficar com a guarda do filho menor, em se tratando 
de solução que melhor atenda ao interesse da criança. Há permissão legal para que se regule por 
maneira diferente a situação do menor com os pais. Em casos tais, justifica-se e se recomenda que 
prevaleça o interesse do menor. 
 2. O sistema jurídico brasileiro admite, na separação e no divórcio, a indenização por dano moral. 
Juridicamente, portanto, tal pedido é possível: responde pela indenização o cônjuge responsável 
exclusivo pela separação. 
 3. Caso em que, diante do comportamento injurioso do cônjuge varão, a Turma conheceu do 
especial e deu provimento ao recurso, por ofensa ao art. 159 do Cód. Civil, para admitir a 
obrigação de se ressarcirem danos morais. 
(RESP 37.051/SP, Rel. Ministro NAVES, TERCEIRA TURMA, julgado em 17.04.2001, DJ 25.06.2001 
p. 167) 
 
Já o abandono afetivo na filiação, poderá, em nosso sentir, autorizar a aplicação dos princípios da 
responsabilidade civil, sem que isso signifique a “monetarização” da relação de afeto. 
 
Assim pensamos desde que se entenda que a indenização imposta ao pai ou mãe que abandona o 
seu filho, em franco desrespeito ao dever legal de educação (que pressupõe amor) consiste em 
uma resposta que o novo Direito Civil dá, manifestando repulsa a este tipo de comportamento, 
violador do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. 
 
Trata-se, em nosso sentir, de especial aplicação da teoria do desestímulo. 
 
 
 
A função da indenização, pois, teria condão eminentemente pedagógico. 
 
Abaixo, no tópico “textos complementares”, não deixe de ler o excelente texto da querida 
professora GISELDA HIRONAKA a respeito do tema. 
 
Em um primeiro momento, no entanto, o STJ negou a aplicação da teoria, no campo da filiação: 
 
RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO MORAL. REPARAÇÃO. DANOS MORAIS. 
IMPOSSIBILIDADE. 
1. A indenização por dano moral pressupõe a prática de ato ilícito, não rendendo ensejo à 
aplicabilidade da norma do art. 159 do Código Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de 
reparação pecuniária. 
2. Recurso especial conhecido e provido. 
(Resp 757.411/MG, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 
29.11.2005, DJ 27.03.2006 p. 299) 
 
DIREITO CIVIL. PÁTRIO PODER. DESTITUIÇÃO POR ABANDONO AFETIVO. 
POSSIBILIDADE. ART. 395, INCISO II, DO CÓDIGO CIVIL C/C ART. 22 DO ECA. INTERESSES DO 
MENOR. PREVALÊNCIA. 
- Caracterizado o abandono efetivo, cancela-se o pátrio poder dos pais biológicos. Inteligência do 
Art. 395, II do Código Bevilacqua, em conjunto com o Art. 22 do Estatuto da Criança e do 
Adolescente. 
Se a mãe abandonou o filho, na própria maternidade, não mais o procurando, ela jamais exerceu o 
pátrio poder. 
(Resp 275.568/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 
18.05.2004, DJ 09.08.2004 p. 267) 
 
E, no STF, a Min. Ellen Gracie, julgando o RE 567164 (referente à responsabilidade civil por 
abandono afetivo), negou-lhe seguimento: 
 
 
 
 
 
Quarta-feira, 27 de Maio de 2009 
Ministra arquiva recurso sobre abandono afetivo por não existir ofensa direta à Constituição 
A ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF), arquivou Recurso Extraordinário (RE 567164) 
em que A.B.F. pedia ressarcimento por danos morais em razão de abandono familiar. Ele alegava ofensa 
aos artigos 1º, 5º, incisos V e X, e 229 da Constituição Federal. 
O autor questionava decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que ao dar provimento a um recurso 
especial concluiu, com base no artigo 159 do Código Civil de 1916, a inviabilidade do reconhecimento de 
indenização por danos morais decorrente de abandono afetivo. 
“O apelo extremo é inviável, pois esta Corte fixou o entendimento segundo o qual a análise sobre a 
indenização por danos morais limita-se ao âmbito de interpretação de matéria infraconstitucional, 
inatacável por recurso extraordinário”, explicou a ministra. Ela avaliou que, conforme o ato contestado, a 
legislação pertinente prevê punição específica, ou seja, perda do poder familiar, nos casos de abandono 
do dever de guarda e educação dos filhos. 
Assim, Ellen Gracie afastou a possibilidade de analisar o pedido de reparação pecuniária por abandono 
moral, pois isto demandaria a análise dos fatos e das provas contidas nos autos, bem como da legislação 
infraconstitucional que disciplina a matéria (Código Civil e Estatuto da Criança e do Adolescente), o que é 
inviável por meio de recurso extraordinário. Para a ministra Ellen Gracie, o caso “não tem lugar nesta via 
recursal considerados, respectivamente, o óbice da Súmula 279, do STF, e a natureza reflexa ou indireta 
de eventual ofensa ao texto constitucional”. 
Ao citar parecer da Procuradoria Geral da República, a ministra asseverou que conforme o Código Civil e 
o ECA, eventual lesão à Constituição Federal, se existente, “ocorreria de forma reflexa e demandaria a 
reavaliação do contexto fático, o que, também, é incompatível com a via eleita”. Dessa forma, a ministra 
Ellen Gracie negou seguimento (arquivou) ao recurso extraordinário. 
EC/LF 
 
 
Fonte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=108739 acessado em 05 de 
julho de 2009 
Mas, recentemente, todavia, o STJ veiculou a seguinte noticia, no sentido da aceitação da tese: 
 
É cabível indenização por abandono afetivo 
“Amar é faculdade, cuidar é dever! Com estas palavras da ministra Nancy Andrigui, a Terceira Turma do 
Superior Tribunal de Justiça decidiu, de forma inédita, que é possível exigir indenização por dano moral 
por causa de abandono afetivo dos pais” (...). 
Confira a íntegra do noticiário no: 
http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=448&tmp.texto=105696&tmp.area_a
nterior=44&tmp.argumento_pesquisa=abandono%20afetivo# (acessado em 11 de junho de 2012) 
 
Nesse contexto, apenas sob o prisma teórico, e aprofundando a pesquisa: a perda do poder familiar 
imposta ao pai que ignora moral e espiritualmente a sua prole seria, para ele, uma sanção ou um 
favor?... 
 
Não seria o caso de o nosso Direito, no futuro, consolidar o entendimento no sentido da aplicação a 
função social da responsabilidade civil em casos como esse? 
 
Vale a pena refletir... 
 
E acompanhar o debate em torno do tema... 
 
Em conclusão, vale registrar que o professor GUILHERME DE OLIVEIRA, autoridade internacional em 
Direito de Família, analisando o tema, conclui: 
 
“Embora não haja jurisprudência clara sobre o assunto, suponho, julgo que é aceitável defender que o 
abandono afetivo – quer se traduza em descumprimento dos deveres jurídicos, quer integrados no poder 
parental e que provoque danos não-patrimoniais na pessoa do filho – pode dar lugar à obrigação de 
 
 
indenizar. Como em qualquer outra ação de responsabilidade civil, é preciso provar o descumprimento, a 
culpa, o dano e a causalidade” 
(Boletim iBDFAM 4 – Setembro/Outubro de 2006) 
 
OBS.: 
Pode ser que, em breve, a matéria seja uniformizada (veja o texto abaixo, do Min. Luis Felipe Salomão, 
publicado no excelente site do CONJUR, cuja íntegra encontra-se no final da apostila). 
Acompanhe a jurisprudência! 
 
MOMENTO PROPÍCIO 
STJ vai uniformizar jurisprudência sobre abandono afetivo 
08 de abril de 2014, 10:15h 
Por Luis Felipe Salomão 
Abandono afetivo é termo hoje encontrado comrelativa frequência no âmbito forense e nos mais 
variados manuais de direito de família. 
Em resumo, consiste na indiferença afetiva dispensada por um genitor a sua prole, um desajuste familiar 
que sempre existiu na sociedade e, decerto, continuará a existir, desafiando soluções de terapeutas e 
especialistas. 
O que é relativamente recente, contudo, é a transferência dessa contenda própria do ambiente familiar 
para as salas de audiências e tribunais país afora, essencialmente sob a forma de indenizações 
pecuniárias buscadas pelo filho em face do pai, ao qual se imputa o ilícito de não comparecer aos atos da 
vida relacionados ao desenvolvimento social e psíquico de seu descendente. 
O Superior Tribunal de Justiça terá a inédita oportunidade de uniformizar o entendimento acerca do 
tema por ocasião do julgamento dos EREsp 1.159.242/SP, de relatoria do eminente ministro Marco Buzzi, 
previsto para esta quarta-feira (9/4), na 2ª Seção - Direito Privado. 
A primeira vez em que a corte deliberou sobre o tema foi no julgamento do REsp (...) 
Luis Felipe Salomão é ministro do Superior Tribunal de Justiça. 
Revista Consultor Jurídico, 08 de abril de 2014, 10:15h 
 
 
 
Fonte: http://www.conjur.com.br/2014-abr-08/luis-felipe-salomaostj-uniformizar-entendimento-
abandono-efetivo?imprimir=1 acessado em 24 de junho de 2014. 
 
 
6. TEXTOS COMPLEMENTARES 
 6.1. DO PODER FAMILIAR 
Paulo Lôbo* (fonte: www.ibdfam.com.br) 
1. Poder familiar ou autoridade parental? – 2. Conteúdo básico do poder familiar – 3. Regulação do 
poder familiar no novo Código Civil comparada com a do Código de 1916 – 4. A interpretação 
conforme com a Constituição – 5. Regras sobreviventes do Estatuto da Criança e do Adolescente 
sobre “pátrio poder” – 6. Titulares do poder familiar – 7. Exercício do poder familiar – 8. Suspensão 
do poder familiar – 9. Extinção do poder familiar – 10. O castigo “moderado” dos filhos. 
 
 
1. PODER FAMILIAR OU AUTORIDADE PARENTAL? 
 
O poder familiar é a denominação que adotou o novo Código para o pátrio poder, tratado no 
Código de 1916. Ao longo do século XX, mudou substancialmente o instituto, acompanhando a 
evolução das relações familiares, distanciando-se de sua função originária – voltada ao exercício 
de poder dos pais sobre os filhos – para constituir um múnus, em que ressaltam os deveres. 
 
 
A denominação ainda não é a mais adequada, porque mantém a ênfase no poder. Todavia, é 
melhor que a resistente expressão “pátrio poder”, mantida pelo Estatuto da Criança e do 
Adolescente (Lei n. 8.069/90), somente derrogada com o novo Código Civil. Com a implosão, social 
e jurídica, da família patriarcal, cujos últimos estertores deram-se antes do advento da 
Constituição de 1988, não faz sentido que seja reconstruído o instituto apenas deslocando o poder 
do pai (pátrio) para o poder compartilhado dos pais (familiar), pois a mudança foi muito mais 
 
 
intensa, na medida em que o interesse dos pais está condicionado ao interesse do filho, ou 
melhor, no interesse de sua realização como pessoa em formação. 
 
Desafortunadamente, o novo Código não apreendeu a natureza transformada do instituto, 
mantendo praticamente intacta a disciplina normativa do Código de 1916, com adaptações 
tópicas. 
 
Ainda com relação à terminologia, ressalte-se que as legislações estrangeiras mais recentes 
optaram por “autoridade parental”. A França a utilizou desde a legislação de 1970, que introduziu 
profundas mudanças no Direito de Família1, com as alterações substanciais promovidas pela Lei de 
4 de março de 2002. O Direito de Família americano tende a preferi-lo, como anota Harry D. 
Krause.2 Com efeito, parece-me que o conceito de autoridade, nas relações privadas, traduz 
melhor o exercício de função ou de múnus, em espaço delimitado, fundado na legitimidade e no 
interesse do outro.3 “Parental” destaca melhor a relação de parentesco por excelência que há 
entre pais e filhos, o grupo familiar, de onde deve ser haurida a legitimidade que fundamenta a 
autoridade. O termo “paternal” sofreria a mesma inadequação do termo tradicional. 
 
A discussão terminológica é oportuna, pois expressa a mudança radical operada no instituto.4 
Contudo, para que se possa avançar na exposição do conteúdo, valer-me-ei, doravante, dos 
termos empregados pelo novo Código. 
 
 
2. CONTEÚDO BÁSICO DO PODER FAMILIAR 
 
As vicissitudes por que passou a família, no mundo ocidental, repercutiram no conteúdo do poder 
familiar. Quanto maiores foram a desigualdade, a hierarquização e a supressão de direitos, entre 
os membros da família, tanto maior foi o pátrio poder e o poder marital. À medida que se deu a 
emancipação da mulher casada, deixando de ser alieni juris, à medida que os filhos foram 
emergindo em dignidade e obtendo tratamento legal isonômico, independentemente de sua 
origem, houve redução do quantum despótico, restringindo esses poderes domésticos. No Brasil, 
foram necessários 462 anos, desde o início da colonização portuguesa, para a mulher casada 
 
 
deixar de ser considerada relativamente incapaz (Estatuto da Mulher Casada, Lei n. 4.121, de 27 de 
agosto de 1962); foram necessários mais 26 anos para consumar a igualdade de direitos e deveres 
na família (Constituição de 1988), pondo fim, em definitivo, ao antigo pátrio poder e ao poder 
marital. 
 
A redução do quantum despótico do antigo pátrio poder foi uma constante, na história do Direito. 
O patria potestas dos romanos antigos era muito extenso, ao início, pois abrangia o poder de vida 
ou morte, mas gradativamente restringiu-se, como se vê em antigo aforismo, enunciando que o 
pátrio poder deve ser exercido com afeição e não com atrocidade.5 
 
A evolução gradativa deu-se no sentido da transformação de um poder sobre os outros em 
autoridade natural com relação aos filhos, como pessoas dotadas de dignidade, no melhor 
interesse deles e da convivência familiar. Essa é sua atual natureza. 
 
Assim, o poder familiar, sendo menos poder e mais dever, converteu-se em múnus, concebido 
como encargo legalmente atribuído a alguém, em virtude de certas circunstâncias, a que se não 
pode fugir. O poder familiar dos pais é ônus que a sociedade organizada a eles atribui, em virtude 
da circunstância da parentalidade, no interesse dos filhos.6 O exercício do múnus não é livre, mas 
necessário no interesse de outrem. É, como diz Pietro Perlingieri.7 “um verdadeiro ofício, uma 
situação de direito-dever; como fundamento da atribuição dos poderes existe o dever de exercê-
los”. 
 
Extrai-se do artigo 227 da Constituição o conjunto mínimo de deveres cometidos à família, a 
fortiori ao poder familiar, em benefício do filho, enquanto criança e adolescente, a saber: o direito 
à vida, à saúde, à alimentação (sustento), à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à 
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar. Evidentemente, tal conjunto de 
deveres deixa pouco espaço ao poder. São deveres jurídicos correspectivos a direitos cujo titular é 
o filho. 
 
3. REGULAÇÃO DO PODER FAMILIAR NO NOVO CÓDIGO CIVIL COMPARADA COM A DO CÓDIGO DE 
1916 
 
 
 
 
O novo Código, nos arts. 1.630 a 1.638, manteve a disciplina normativa do Código anterior, 
adaptando-a aos princípios determinantes na Constituição, notadamente quanto ao exercício 
conjunto do poder familiar pelo pai e pela mãe, conforme já tinha antecipado o Estatuto da 
Criança e do Adolescente. O enunciado deficiente da Lei do Divórcio, que se referia ao exercício do 
pátrio poder pelo marido “com a colaboração da mulher”, apenas atenuando a desigualdade entre 
os gêneros, foi expurgado de vez, na linha do estabelecido pelo ECA.Do confronto entre os dois textos (o antigo e o novo Códigos), chega-se à surpreendente 
conclusão de que a estrutura legal do antigo pátrio poder foi mantida intacta, com modificações 
tópicas de redação. A ordem, a seqüência e o conteúdo dos artigos permaneceram, como se a 
mudança da denominação e dos titulares (do pai para o pai e a mãe) e a exclusão das referências a 
filhos ilegítimos fossem suficientes. 
 
Houve, apenas, duas inclusões ao texto de 1916: a) outro tipo de extinção do poder familiar (por 
decisão judicial); b) outro tipo de perda do poder familiar, por ato judicial (incidir, reiteradamente, 
em falta aos deveres inerentes aos pais). 
 
Manteve-se o que já estava previsto com relação aos titulares do poder familiar, ao exercício e à 
suspensão e extinção. 
 
A alteração de monta foi a exclusão de toda a Seção III do Código de 1916, relativa ao pátrio poder 
quanto aos bens dos filhos, transferida para o Título destinado ao Direito Patrimonial, na forma de 
Subtítulo II deste, com a denominação de “Do Usufruto e da Administração dos Bens dos Filhos 
Menores” (arts. 1.689 a 1.693). A matéria, todavia, diz respeito ao poder familiar. O novo Código 
mantém o usufruto legal dos bens dos filhos em favor dos pais. A inclusão de artigo prevendo a 
representação dos filhos menores de 16 anos e a assistência aos filhos entre 16 e 18 anos é de 
natureza pessoal, não se atendo apenas às questões de cunho patrimonial. Modificando o texto 
legal anterior, há inovação no sentido de instituição de verdadeiros “bens reservados” em 
benefício do filho maior de 16 anos que os adquirir em virtude de qualquer atividade profissional 
 
 
que desenvolva (art. 1.693). 
 
4. A INTERPRETAÇÃO CONFORME COM A CONSTITUIÇÃO 
 
O princípio da interpretação conforme com a Constituição é uma das mais importantes 
contribuições dos constitucionalistas nas últimas décadas. Consiste, basicamente, em explorar ao 
máximo a compatibilidade com a Constituição das normas infraconstitucionais a ela anteriores ou 
supervenientes, e a partir dela. Apenas deve ser declarada a inconstitucionalidade de uma norma 
quando a incompatibilidade dela com a Constituição for insuperável. Essa diretriz hermenêutica 
harmoniza-se com os princípios da presunção de constitucionalidade das normas 
infraconstitucionais e da força normativa própria da Constituição. Mais importante é a função que 
desempenha na interpretação do conteúdo das leis, que há de ser conformado, delimitado e 
densificado pelos princípios e normas constitucionais. Assim, o Código há de ser interpretado, 
sempre, a partir da Constituição. No passado e, infelizmente, na atitude de muitos aplicadores do 
Direito, a operação hermenêutica encontrava-se invertida, pois a Constituição era tida apenas 
como uma moldura, cujo conteúdo era preenchido pelas leis e códigos. No que concerne aos 
princípios, a regra do art. 4.º da Lei de Introdução ao Código Civil, de vedação de non liquet 
(“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os 
princípios gerais de direito”), favoreceu a inversão hermenêutica, pois os princípios foram tidos 
como supletivos. Essa regra da LICC há de ser interpretada “em conformidade com a Constituição”, 
ou seja, apenas em relação aos princípios gerais que não sejam constitucionais, pois estes não são 
supletivos, mas conformadores da lei. 
 
O advento do novo Código traz à baila essas demarcações conceituais, imprescindíveis à sua 
interpretação adequada. Significa dizer que suas normas hão de ser interpretadas em 
conformidade com os princípios e regras que a Constituição estabeleceu para a família no 
ordenamento jurídico nacional, animados de valores inteiramente diferentes dos que 
predominavam na sociedade brasileira, na época em que se deu a redação do capítulo relativo ao 
pátrio poder do Código de 1916, que, em grande medida, manteve-se no capítulo destinado ao 
poder familiar para a família do século XXI. As palavras utilizadas pelo legislador de 1916, 
reaproveitadas pelo legislador do novo Código, são apenas signos, cujos conteúdos deverão ser 
 
 
hauridos dos princípios e regras estabelecidos pela Constituição. 
 
5. REGRAS SOBREVIVENTES DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE SOBRE “PÁTRIO 
PODER” 
 
O ECA trata do poder familiar em duas passagens, a saber: a) no capítulo dedicado ao direito à 
convivência familiar e comunitária, arts. 21 a 24; b) no capítulo dedicado aos procedimentos, 
relativamente à perda e à suspensão do pátrio poder, arts. 155 a 163, que estabelecem regras 
próprias, uma vez que a legislação processual é apenas supletiva. 
 
As regras procedimentais do ECA permanecerão, pois o novo Código delas não trata nem é com 
elas incompatível. No ECA são legitimados para a ação de perda ou suspensão do poder familiar o 
Ministério Público ou “quem tenha legítimo interesse”. Prevê-se a possibilidade de decretação 
liminar ou incidental da suspensão do poder familiar, ficando o menor confiado a pessoa idônea 
(art. 157). A sentença que decretar a perda ou suspensão será registrada à margem do registro de 
nascimento do menor (art. 163). 
 
Quanto ao direito material, há convergência entre o novo Código e o ECA sobre o exercício 
conjunto pelo pai e pela mãe, com recurso à autoridade judiciária para resolver as divergências. O 
Estatuto ressalta os deveres dos pais, enquanto o novo Código, repetindo o anterior, opta pelas 
dimensões do exercício dos poderes, como será demonstrado abaixo. No ECA há previsão de 
hipótese de perda do poder familiar não prevista no novo Código, justamente voltada ao 
descumprimento dos deveres de guarda, sustento e educação dos filhos (arts. 22 e 24). Em suma, 
não se vislumbra antinomia (cronológica ou de especialidade) entre os dois textos legais, não se 
podendo alvitrar a derrogação da lei anterior (ECA), salvo quanto à denominação pátrio poder, 
substituída por poder familiar. Como a menoridade, no novo Código, foi reduzida para até os 18 
anos – deixou de haver divergência com o que o ECA denomina de criança (até 12 anos) e 
adolescente (até 18 anos) – para fins do poder familiar, passa a ser a denominação comum aos 
campos de aplicação de ambas as leis. 
 
 
 
 
 
6. TITULARES DO PODER FAMILIAR 
 
O novo Código estabelece que “os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores”, 
podendo levar à interpretação ligeira de serem os pais os únicos titulares ativos e os filhos os 
sujeitos passivos dele. Para o cumprimento dos deveres decorrentes do poder familiar, os filhos 
são titulares dos direitos correspectivos. Portanto, o poder familiar é integrado por titulares 
recíprocos de direitos. 
 
O ECA estabelece que o poder familiar será exercido pelo pai e pela mãe, “na forma do que 
dispuser a legislação civil”. O novo Código refere-se apenas à titularidade dos pais, durante o 
casamento ou a união estável, restando silente quanto às demais entidades familiares tuteladas 
explícita ou implicitamente pela Constituição. Ante o princípio da interpretação em conformidade 
com a Constituição, a norma deve ser entendida como abrangente de todas as entidades 
familiares, onde houver quem exerça o múnus, de fato ou de direito, na ausência de tutela regular, 
como se dá com irmão mais velho que sustenta os demais irmãos, na ausência de pais, ou de tios 
em relação a sobrinhos que com ele vivem.8 
 
O poder familiar, concebido como múnus, é um complexo de direitos e deveres. O poder familiar 
não é mais o âmbito de competência delegada ou reconhecida pelo Estado para exercício de 
poder. Assim, a cada dever do filho corresponde um direito do pai ou da mãe; a cada dever do pai 
ou da mãe corresponde umdireito do filho. 
 
A convivência dos pais, entre si, não é requisito para a titularidade do poder familiar, que apenas 
se suspende ou se perde, por decisão judicial, nos casos previstos em lei. Do mesmo modo, a 
convivência dos pais com os filhos. Pode ocorrer variação de grau do poder familiar, máxime 
quanto ao que cumpre o dever de guarda, mas isso diz respeito apenas ao seu exercício e não à 
titularidade. 
 
O novo Código estabelece que havendo separação judicial, divórcio ou dissolução da união estável, 
o poder familiar permanece íntegro, exceto quanto ao direito de terem os filhos em sua 
 
 
companhia (art. 1.631). No art. 1.589, quando tratou da dissolução da sociedade conjugal, 
estabelece que o pai ou a mãe que não for guardião poderá não apenas visitar os filhos mas os ter 
em suas companhias, bem como fiscalizar sua manutenção e educação, que são características do 
poder familiar. Do mesmo modo, o art. 1.579 prescreve que o divórcio não modifica os direitos e 
deveres dos pais em relação aos filhos. O direito (e dever) à companhia dos filhos, daquele que o 
reteve na separação, não exclui o do outro, na forma em que tiver sido decidido, amigável ou 
judicialmente, no tocante ao chamado direito de visita. A tendência mundial, que consulta o 
princípio do melhor interesse da criança, recomenda a máxima utilização da guarda 
compartilhada, da manutenção da coparentalidade,9 de modo a que o filho sinta a presença 
constante de ambos os pais, apesar da separação física deles. Neste sentido, o “direito à 
companhia” é relativo e não pode ser exercido contrariamente ao interesse do filho, que deve ter 
assegurado o direito à companhia do pai ou mãe que não seja o guardião. Em suma, o direito de 
um não exclui o direito do outro e o filho tem direito à companhia de ambos. No caso da guarda 
compartilhada,10 por ser modo de preservação das relações familiares, entre pais e filhos, tendo 
ambos os pais direitos/deveres equivalentes, a regra de exclusão do novo Código não pode ser 
aplicada. 
 
É importante frisar que o novo Código revogou a norma contida no art. 10 da Lei n. 6.515/77, que 
atribuía a guarda dos filhos ao cônjuge que não tivesse dado causa à separação judicial. 
Consequentemente, o filho ficará sob a guarda de quem revelar melhores condições para exercê-
la, afastando-se a odiosa regra da culpa do pai ou da mãe. 
 
O novo Código não utiliza os termos “criança” e “adolescente”, presentes na Constituição, no 
capítulo dedicado à família,11 porém “menor”. Mais uma vez, em conformidade com a 
Constituição, menor deve ser entendido como criança ou adolescente, segundo a distinção que o 
ECA faz. 
 
O art. 1.633 do novo Código determina, repetindo essencialmente o Código anterior, que o filho 
não reconhecido pelo pai “fica sob o poder familiar exclusivo da mãe”. A redação aprovada pelo 
Senado Federal, para o artigo correspondente, previa “autoridade da mãe”, muito mais adequado 
do que o malposto poder, que prevaleceu na Câmara dos Deputados. Se a mãe for desconhecida, 
 
 
diz a lei, o menor ficará sob autoridade de tutor. Para haver tutela, todavia, ambos os pais devem 
ser desconhecidos. O disciplinamento do ECA sobre desconhecimento dos pais, que permanece 
aplicável, é mais abrangente, pois não apenas se refere à tutela, mas à colocação do menor em 
família substituta, mediante guarda, tutela ou adoção (art. 28). 
 
Por ser dever, o poder familiar assegura ao menor o direito imprescritível ao reconhecimento do 
estado de filiação (art. 27), exercitável contra os pais. 
 
 
7. EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR 
 
Conferindo ao instituto o atributo preferencial de poder, o novo Código reproduz, quase 
literalmente, as sete hipóteses de “competências” (a redação é: “Compete aos pais, quanto à 
pessoa dos filhos menores: ...”) atribuídas aos pais, a saber: a) dirigir a educação e criação; b) ter 
direito de companhia e guarda; c) dar consentimento para casar; d) nomear tutor; e) representar e 
assistir o filho nos atos da vida civil; f) retomar o filho contra quem o detenha; g) exigir obediência, 
respeito e “serviços próprios de sua idade e condição”. 
 
A leitura das hipóteses de exercício do poder familiar está a demonstrar que significam expressão 
do poder doméstico, sem referência expressa aos deveres, que passaram à frente na configuração 
do instituto. O novo Código é omisso quanto aos deveres que a Constituição cometeu à família, 
como acima foram destacados. 
 
O ECA, quando cuida do poder familiar, incumbe aos pais (art. 22) “o dever de sustento, guarda e 
educação dos filhos menores” e, sempre no interesses destes, o dever de cumprir as 
determinações judiciais. Essa regra permanece aplicável, pois aos poderes assegurados pelo novo 
Código somam-se os deveres fixados na legislação especial e na própria Constituição. O dever de 
guarda não é inerente ao poder familiar, pois pode ser atribuído a outrem. 
 
Tenho por incompatível com a Constituição, principalmente em relação ao princípio da dignidade 
da pessoa humana (arts. 1.º, III, e 227), a exploração da vulnerabilidade dos filhos menores para 
 
 
submetê-los a “serviços próprios de sua idade e condição”, além de consistir em abuso (art. 227, § 
4.º). Essa regra surgiu em contexto histórico diferente, no qual a família era considerada, também, 
unidade produtiva e era tolerada pela sociedade a utilização dos filhos menores em trabalhos não 
remunerados, com fins econômicos. A interpretação em conformidade com a Constituição apenas 
autoriza aplicá-la em situações de colaboração nos serviços domésticos, sem fins econômicos, e 
desde que não prejudique a formação e educação dos filhos. 
 
O induzimento ao menor para fugir do lugar em que se exercite o poder familiar constitui crime, 
sujeito a pena de detenção de um mês a um ano, previsto no artigo 248 do Código Penal. Também 
constitui crime subtrair o menor à autoridade de quem detém o poder familiar, sujeito à pena de 
detenção de dois meses a dois anos (art. 248 do Código Penal). O crime considera-se agravado, 
com pena de reclusão de dois a seis anos, se a subtração do menor, de quem detém o poder 
familiar, se der com intuito de colocá-lo forçosamente em lar substituto. 
 
 
8. SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR 
 
O novo Código manteve, praticamente intactas, as hipóteses de suspensão e extinção do poder 
familiar, salvo o acréscimo de normas de remissão a outras de mesma natureza. A suspensão 
impede, temporariamente, o exercício do poder familiar. 
 
São três as hipóteses de suspensão do poder familiar dos pais, a saber (art. 1.637): a) 
descumprimento dos “deveres a eles (pais) inerentes”; b) ruína dos bens dos filhos; c) condenação 
em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão. As duas primeiras hipóteses 
caracterizam abuso do poder familiar. 
 
Os deveres inerentes aos pais, ainda que não explicitados, são os previstos na Constituição, no ECA 
e no próprio Código Civil, em artigos dispersos, sobretudo no que diz respeito ao sustento, guarda 
e educação dos filhos. De modo mais amplo, além dos referidos, a Constituição impõe os deveres 
de assegurarem aos filhos (deveres positivos ou comissivos) a vida, a saúde, a alimentação, o lazer, 
a profissionalização, a dignidade, o respeito, a liberdade, a convivência familiar e comunitária, e de 
 
 
não submetê-los (deveres negativos ou de abstenção) a discriminação, exploração, violência, 
crueldade e opressão. 
 
A suspensão pode ser sempre revista, quando superados os fatores que a provocaram. No 
interesse dos filhos e da convivência familiar, apenas deve ser adotada pelo juiz quando outra 
medida não possa produzir o efeito desejado, no interesseda segurança do menor e de seus 
haveres. 
 
 
 
9. EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR 
 
A extinção é a interrupção definitiva do poder familiar. 
 
São hipóteses exclusivas: a) morte dos pais ou do filho; b) emancipação do filho; c) maioridade do 
filho; d) adoção do filho, por terceiros; e) perda em virtude de decisão judicial. 
 
A morte de um dos pais faz concentrar, no sobrevivente, o poder familiar. A emancipação dá-se 
por concessão dos pais, mediante instrumento público, dispensando-se homologação judicial, se o 
filho contar mais de 16 anos. A natureza da adoção, que imita a natureza e impõe o corte 
definitivo com o parentesco original, leva ao desaparecimento do poder familiar. 
 
A perda por decisão judicial, por sua vez, depende da configuração das seguintes hipóteses: a) 
castigo imoderado do filho; b) abandono do filho; c) prática de atos contrários à moral e aos bons 
costumes; d) reiteração de faltas aos deveres inerentes ao poder familiar. A quarta hipótese não 
existia no Código anterior. 
 
Quanto ao castigo imoderado, por sua relevância, merece ser destacado abaixo. A moral e os bons 
costumes são aferidos objetivamente, segundo standards valorativos predominantes na 
comunidade, no tempo e no espaço, incluindo as condutas que o Direito considera ilícitas. Não 
podem prevalecer os juízos de valor subjetivos do juiz, pois constituiriam abuso de autoridade. Em 
 
 
qualquer circunstância, o supremo valor é o melhor interesse do menor, não podendo a perda do 
poder familiar orientar-se, exclusivamente, no sentido de pena ao pai faltoso. 
 
Por sua gravidade, a perda do poder familiar somente deve ser decidida quando o fato que a 
ensejar for de tal magnitude que ponha em perigo permanente a segurança e a dignidade do filho. 
A suspensão do poder familiar deve ser preferida à perda, quando houver possibilidade de 
recomposição ulterior dos laços de afetividade. 
 
 
 
10. O CASTIGO “MODERADO” DOS FILHOS 
 
Como resquício do antigo pátrio poder, persiste na doutrina e na legislação a tolerância ao que se 
denomina castigo “moderado” dos filhos. O novo Código, ao incluir a vedação ao castigo 
imoderado, admite implicitamente o castigo moderado. O castigo pode ser físico ou psíquico ou de 
privação de situações de prazer. 
 
Deixando de lado as discussões havidas em outros campos, sob o ponto de vista estritamente 
constitucional não há fundamento jurídico para o castigo físico ou psíquico, ainda que 
“moderado”, pois não deixa de consistir violência à integridade física do filho, que é direito 
fundamental inviolável da pessoa humana, também oponível aos pais. O artigo 227 da 
Constituição determina que é dever da família colocar o filho (criança ou adolescente) a salvo de 
toda violência. Todo castigo físico configura violência. Note-se que a Constituição (art. 5.º, XLIX) 
assegura a integridade física do preso. Se assim é com o adulto, com maior razão não se pode 
admitir violação da integridade física da criança ou adolescente, sob pretexto de castigá-lo. 
Portanto, na dimensão do tradicional pátrio poder era concebível o poder de castigar fisicamente 
o filho; na dimensão do poder familiar fundado nos princípios constitucionais, máxime o da 
dignidade da pessoa humana, não há como admiti-lo. O poder disciplinar, contido na autoridade 
parental, não inclui, portanto, a aplicação de castigos que violem a integridade do filho. 
 
 
NOTA DE RODAPÉ 
 
1 Com influência no recente Código Civil da província canadense de Québec (1994), arts. 597 a 612. O 
artigo 699 refere-se a “direito e dever” de guarda, sustento e educação, que podem ser delegados. Sobre 
a Lei francesa de 4 de março de 2002, cf. Claude Lienhard, Les Nouveaux Droits du Père, Paris: Delmas, 
2002, passim. 
 
2 Family Law. St. Paul: West Publishing, 1991, p. 191. 
 
3 Para José Artur Rios (cf. verbete “autoridade”, no Dicionário de ciências sociais. Rio de Janeiro: 
Fundação Getúlio Vargas, 1986), forte em Max Weber, autoridade não se confunde com poder, que é a 
coação física ou psíquica exercida sobre grupos ou indivíduos que a ela são forçados a se submeter. A 
autoridade pode ser chamada de poder legítimo, pois é a ascendência sobre outros indivíduos, fundada 
na legitimidade. 
 
4 Registre-se, ainda, a tentativa de encontrar “expressão neutra” compreensiva da transformação havida 
no instituto, a exemplo de “poderes e deveres parentais” 
 
sugerida por Luiz Edson Fachin. FACHIN, Luiz Edson. Em nome do pai, estudo sobre o sentido e alcance 
do lugar jurídico ocupado no pátrio dever, na tutela e na curatela. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Org.). 
Direito de família contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 585-604. 
 
5 Patria potestas in pietate debet, non in atrocitate, consistere. 
 
6 Orlando Gomes (Direito de Família, Rio de Janeiro, Forense, 1998, p. 389) considera o múnus um 
ministério correspondente a um cargo privado, que deve ser exercido no interesse do filho. 
 
7 Perfis do direito civil: introdução ao direito civil constitucional. Trad. Maria Cristina de Cicco. Rio de 
Janeiro: Renovar, 1997, p. 129. 
 
8 Aqui não é o espaço adequado para discorrer, mais largamente, sobre tese que tenho sustentado de 
 
 
não constituírem numerus clausus os três tipos de entidades familiares, pois todas as uniões de pessoas 
com finalidades afetivas, com intenções sexuais ou não, e que assim se comportam socialmente, 
enquadram-se no conceito de “família”, previsto no artigo 226 da Constituição, não sendo necessário 
nem constitucionalmente sustentável equipará-las a sociedades de cunho econômico ou lucrativo 
(“sociedades de fato”). 
 
9 Sobre a experiência francesa da mediação para promoção da guarda compartilhada, v. GANANCIA, 
Danièle. Justiça e mediação familiar: uma parceria a serviço da co-parentalidade. Revista do Advogado, 
AASP, n. 62, mar. 2001, p. 7-15. 
 
10 Ainda sobre a guarda compartilhada, na perspectiva da psicanálise, cf. NICK, Sergio Eduardo. Guarda 
compartilhada: um novo enfoque no cuidado dos filhos de pais separados ou divorciados. In: BARRETO, 
Vicente (Org.). A nova família: problemas e perspectivas. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 127-168. 
 
11 O título do Capítulo VII do Título VIII é justamente “Da Família, da Criança, do Adolescente e do 
Idoso”. 
 
(*) Doutor em Direito Civil (USP), professor da UFAL e da UFPE (Pós-graduação). 
 
 
6.2. Responsabilidade Civil na Relação Paterno-Filial 
Giselda Hironaka (fonte: www.ibdfam.com.br) 
 1. Primeiras palavras 
O enfrentamento do presente tema – que me foi especialmente deferido, neste conclave, pela 
conhecidíssima e eterna gentileza de nosso Presidente, o Dr. Rodrigo da Cunha Pereira – 
descortinou para mim, ao tempo em que me dediquei a imaginar como construir esta exposição, 
um panorama tão variado e rico, que não tenho hoje nenhuma dúvida de que se trata de mais um 
daqueles assuntos que não se esgotam, que não auto-desenham os seus próprios limites, mas, ao 
contrário, oferecem de modo contínuo e incessante, ao pesquisador, ao estudioso e ao operador 
 
 
do direito, um fabuloso manancial de aspectos que podem ser sempre e sempre percorridos, sem 
o risco do esgotamento da seiva profícua que o vivifica. 
Pessoalmente, na minha atividade acadêmica, tenho dedicado muita atenção e grande esforço de 
pesquisa à volta da temática da responsabilidade civil, mormente esta conhecida como indireta, da 
qual se diz ora ser uma responsabilidade subjetiva – por culpa presumida – ora se tende a dizer ser 
uma responsabilidade objetiva, por se lhe conferir cada vez menos o ônus probatório da culpa. 
Estou a me referir à responsabilidadedos pais pelos danos causados pelos seus filhos menores, 
conforme é a regra da Lei Civil que ainda vige, o Código de 1916, em seu art. 1521, especialmente. 
Tem me sensibilizado, igualmente, nesta vertente da relação paterno-filial em conjugação com a 
responsabilidade, este viés naturalmente jurídico, mas essencialmente justo, de se buscar 
compensação indenizatória em face de danos que pais possam causar a seus filhos, por força de 
uma conduta imprópria, especialmente quando a eles é negada a convivência, o amparo afetivo, 
moral e psíquico, bem como a referência paterna ou materna concretas, acarretando a violação de 
direitos próprios da personalidade humana, magoando seus mais sublimes valores e garantias, 
como a honra, o nome, a dignidade, a moral, a reputação social, o que, por si só, é profundamente 
grave. 
Mas, dizia-lhes antes, o descortinamento do tema, conforme minha concepção, permitiu-me logo 
verificar que havia um estreitamento na temática que me fora presenteada, de sorte que a 
preocupação com a responsabilidade deveria cingir-se à civil e, sob este viés, deveria decorrer dos 
laços familiares que matizam a relação paterno-filial. 
Ora, assim visualizado o tema, impôs-se, prontamente, para mim, esta idéia de que deveria tratá-
lo sob as tintas da responsabilidade civil propriamente dita, costurando os conceitos – tão 
conhecidos, para mim e para tantos dos senhores – da urgência da reparação do dano, da re-
harmonização patrimonial da vítima, do interesse jurídico desta, sempre prevalente, mesmo à face 
de circunstâncias danosas oriundas de atos dos juridicamente inimputáveis... 
E não me satisfiz com esta idealização estrutural, já bem formatada na minha mente. 
 
 
Pensei ainda mais e concluí que a insatisfação vinha de um fato muito simples: se íamos nos reunir 
em Congresso de Direito de Família, certamente a pujança do tema deveria – como o sadio ramo 
de trigo que se enverga ao ritmo do vento, mas não se quebra – inclinar-se para um outro lado e 
suscitar outra ordem de inquietações, além daquelas (importantíssimas igualmente, não resta 
dúvida) que se condensa na preocupação com a vítima – quer a vítima de danos produzidos por 
filhos menores e indenizáveis pelos seus pais, quer a vítima consolidada na pessoa do próprio filho, 
pela violação de seus direitos de personalidade, principalmente – na recuperação de sua 
normalidade patrimonial ou moral, como instrumento de superior categoria e valoração, 
endereçado à mantença da dignidade da pessoa humana. 
Pensei então que seria adorável e certamente oportuno revirar os alicerces mais profundos do 
assunto para trazer à tona as inquietações, as dúvidas, as questões que nem sempre são do 
interesse imediato do direito, mas que são, indubitavelmente, a sua raiz mediata. Melhor de tudo, 
pensei, esta busca, ainda que significativamente difícil para mim, revelaria aquela nova maneira de 
se procurar desvendar e descrever o fenômeno jurídico a partir de sua interface com os 
fenômenos não-jurídicos que o antecedem. 
Este é, senhores, o rico caminho da interdisciplinaridade, que admite – a um agrupamento de 
pessoas como este nosso de hoje, sob as dobras da diversidade de pensamento, de linhas e de 
construções científicas, dobras essas que caracterizam e personificam o IBDFAM – que nos 
sentemos uns ao lado dos demais, sociólogos, antropólogos, psicólogos, filósofos e homens do 
direito. Sem castelos ou prisões. Sem moldes pré-estruturados e estratificados. Mas 
absolutamente abertos à contemplação da vida como ela é, e atentos aos contornos do caminho 
que leva à realização pessoal e plena de cada um dos homens, enquanto membro do grupo 
familiar que o abriga e guarda. 
E a inquietação intrigante que se encontrava presa dentro de mim, emergiu e expandiu-se, 
desdobrando-se na mais singela das perguntas: Por que impõe-se – e repercute no Direito de 
Família – a responsabilidade advinda da relação paterno-filial? 
Em que bases extra-jurídicas estariam assentadas as razões, as justificativas e os fundamentos da 
imposição de tal dever? 
 
 
Poderia, acaso, a filosofia fornecer alguma base para a discussão da responsabilidade civil na 
relação paterno-filial? 
Poderia, acaso, a psicologia adequadamente explicar qual o liame existente entre pais e filhos, que 
seja capaz de gerar e de justificar a concretude desta responsabilização, à face de terceiros, mas – 
e principalmente – à face deles próprios, um em ralação ao outro? 
Sim, certamente sim, do mesmo modo como outros segmentos de apreciação e formulação do 
conhecimento humano, como a antropologia, como a sociologia, e como todas as demais 
persecuções científicas que tenham por objeto de interesse imediato o homem e sua circunstância 
relacional humana. 
E assim, sob este desenho pré-jurídico, sob esse matiz fundante, sob esta inquietação acerca da 
raiz, decidi mudar o curso de minha apreciação, a qual lhes trago hoje, deixando-a sob suas mais 
que competentes considerações e críticas. 
2. O arco filosófico da circunstância relacional humana, entre pais e filhos. 
Levando o conceito de responsabilidade civil para suas bases mais longínquas, que o confundem 
com o termo genérico da responsabilidade, e o dever clássico da prestação do devido, a filosofia, 
por exemplo, tem sim, muito que dizer. 
Basicamente, ela tem muito que dizer sobre essa responsabilidade na relação entre pais – ou só o 
pai, ou só a mãe – e filhos, sempre que a idéia de família estiver presente ou for o centro das suas 
questões. 
Há, a propósito, uma longa história do conceito de família na própria história da filosofia, além da 
história das instituições civis. E essa é uma história que vem desde os gregos – portanto, desde o 
início da filosofia ocidental – e que se confunde muitas vezes com a própria filosofia política, com o 
próprio pensamento em torno do direito e das sociedades. 
Já de uma forma muito sofisticada, o tema da família aparece nessa ligação com a política 
justamente no pensamento político de Aristóteles, quando, em sua Política, apresenta uma 
 
 
explicação da pólis (cidade) como sendo uma associação de várias associações menores, das quais 
a originária é a família. 
A cidade, antes de ser uma reunião de poderes, de instituições, de leis, é uma associação de 
famílias. Essa concepção aristotélica da cidade como uma reunião de famílias, célebre na história 
da filosofia política, não prosseguiu, todavia, com grande repercussão desde a Idade Média. 
A partir do longo período medieval, a concepção da vida política se verá derivada, em especial, das 
próprias instituições e da presença efetiva de certos poderes ou autoridades, perdendo-se de certa 
forma a idéia grega de que a cidade é uma grande família. Mais do que isso, quer no período 
medieval, quer nos períodos subseqüentes (em especial naquele em que se desenvolve o jus-
naturalismo moderno), será possível encontrar longas considerações jurídicas a respeito do que a 
família é ou deva ser. 
Mas há algo na concepção aristotélica que é fundamental, que talvez não convenha esquecer, 
mesmo quando se desviar a atenção para as concepções mais modernas. Trata-se do seguinte, 
resumindo este aspecto: Por que a cidade é uma associação máxima que resulta da reunião de 
outras associações que resultam, por sua vez, da reunião de associações menores que são, enfim, 
as famílias? Porque, justamente, a família é uma associação natural humana (como a cidade, de 
certa forma, será de maneira mais complexa), onde as relações dentro dessa associação são 
naturalmente determinadas. O que permitiria, assim, conceber não só a família, não só a cidade, 
mas qualquer associação, é a sua condição de elo de ligações naturais. 
Há, bem sabe elembra Aristóteles, vários tipos diferentes de associações, e conseqüentemente 
vários tipos diferentes de cidades, de famílias e de comunidades de toda ordem. A conseqüência é 
que, se for o caso de tentar uma classificação dos tipos de cidade ou dos tipos de família, isso só 
será possível se for definido um critério para a tipologia. 
Esse critério é buscado por Aristóteles para a classificação das cidades; e é encontrado não como 
critério único, mas como critério duplo: primeiro, uma cidade pode ser governada por um só, por 
poucos ou por muitos; segundo, o governo pode ser puro ou corrompido. Conseqüência: há seis 
tipos de cidades – três tipos puros (monarquia, o governo de um só; aristocracia, o governo de 
 
 
poucos; politéia, o governo de muitos) e três tipos impuros, corrompidos, que são 
correspondentes às três formas puras (respectivamente: tirania, oligarquia e democracia). 
E para a família? Diferentemente do que ocorre com a cidade, para o caso da família não há 
critério que permita sua classificação em vários modelos puros; existem, certamente, vários tipos 
de família, no sentido de que há famílias com diferenciados números de componentes, que se 
beneficiam ou não de servos, propriedades, etc. Mas, diferente do que ocorre com a cidade (onde 
o poder pode estar na mão de um só, ou não), no caso da família o comando familiar está sempre 
nas mãos dos pais, e para certas funções está exclusivamente em poder do pai. Em outras 
palavras: em Aristóteles, assim como em toda a tradição grega, é um consenso entre os autores a 
idéia de que são os pais que têm autoridade sobre seus filhos, e que é o marido que tem 
autoridade sobre sua esposa (ou suas esposas). 
Por que essa autoridade masculina, paterna e marital? Porque ela é, como toda autoridade, uma 
autoridade natural, segundo a visão filosófica de Aristóteles. 
Ora, segundo a concepção clássica, então, será por uma necessidade natural humana que os filhos 
devam obedecer aos pais e a mulher deva obediência ao marido. Se a família antiga, assim, é 
patriarcal, é porque a natureza inteira o é. 
Essa concepção clássica, que obviamente se encontra em completo descompasso com a 
contemporaneidade, é a concepção que, como se sabe, mais dominou as teorias ou doutrinas em 
torno da família, por toda a história da humanidade. De fato, Aristóteles está mais presente do 
que distante em certos aspectos: ainda que nunca mais se tivesse desenvolvido a idéia de que a 
cidade é uma reunião de famílias, por praticamente toda a história da humanidade se manteve a 
idéia de que a família é a mais originária das associações naturais, e que sua composição envolve 
uma autoridade natural dos pais sobre os filhos e do marido sobre a mulher. 
Por isso mesmo, pressinto que a análise do tema, a partir de Aristóteles seja relevante, na medida 
em que deixa claro o que sempre estará em questão, na composição da família: a família é uma 
associação na qual alguém tem poder sobre outrem, restando saber, primeiro, a quem e por que 
se deve esse poder e, segundo, se a família não pode ser uma associação baseada em outra coisa 
que não a dominação ou a dependência. 
 
 
Sempre que se tratar das relações de família e da responsabilidade envolvida nas relações de 
família, fundamental será que se trate, também, da base dessa relação. 
A inquietação tipicamente pós-moderna assenta-se em buscar a resposta à pergunta: no seio da 
família da contemporaneidade desenvolve-se ainda, e tipicamente, uma relação de poder ou é 
possível afirmar, por exemplo, que a ênfase relacional se encontra deslocada para a afetividade? 
O tema da responsabilidade nas relações de família envolve necessariamente essa visão clássica da 
autoridade, para bem ou para mal. 
O olhar histórico de contemplação pretérita sobre o assunto admite afirmar que é marcante essa 
significação da família do passado mais como uma relação de poder do que como uma relação de 
afeto. Por conseqüência, a família aparece tradicionalmente como uma associação cujos 
benefícios se dirigem mais para os pais (e mais ainda para o pai ou o marido) do que para os filhos 
(ou para a mulher). 
A tradição patriarcal, de índole francamente autoritária, na concepção das relações de família, 
pretendeu muitas vezes, e na intenção de justificar-se como instituição civil, fazê-lo por vieses 
imaginados racionais ou científicos. 
E mesmo que uma tal justificação fosse ideológica e impossível, o principal argumento utilizado 
para a defesa da autoridade do patriarca foi, desde os gregos, a existência de uma hierarquia ou 
de uma dependência natural. Essa idéia – que está na base das concepções antigas e clássicas de 
família e que se faz notar principalmente na imposição da autoridade nas relações familiares – 
curiosamente aparecerá também como índice, no pólo oposto dessa relação, vale dizer, aparecerá 
como o fator de consagração da responsabilidade dos pais diante dos filhos, assim como do 
marido diante da mulher. 
O que a tradição mostra, enfim, é que a concepção da autoridade é baseada numa idéia de 
natureza, mas ao mesmo tempo essa idéia de natureza traz uma concepção de responsabilidade 
muito equivalente. 
 
 
A primeira explicação para a idéia de que a associação mais primitiva é a família, pode ser vista, 
ainda em Aristóteles, por meio de sua afirmação de que a família é o resultado da associação 
daqueles seres que "não podem, por natureza, ficar separados um do outro". Refere-se, o filósofo 
grego, ao homem e à mulher. 
Ou seja: Aristóteles até concebe que as famílias tenham ou não posses, que tenham ou não filhos, 
mas não concebe uma família sem a idéia de casamento, e muito menos concebe as famílias 
homoafetivas. A concepção corrente da família brasileira até muito pouco tempo era vulgarmente 
aristotélica, ainda que a prática da família brasileira fosse muitas vezes o inverso da sua imagem... 
E porque o novo Código Civil não incluiu as uniões homoafetivas entre as entidades familiares, 
talvez seja o caso de dizer que, em termos oficiais, ainda estamos na visão aristotélica de família, 
onde essa associação originária só é legítima se obedecer ao que a sociedade patriarcal considera 
normalidade sexual e moral. 
Mas enfim, a idéia original é a de que a família é uma associação que decorre da natureza humana, 
na medida em que decorre de uma necessidade de vida em comum, que Aristóteles, e novamente 
a tradição posterior a ele, atribuirá à relação entre homem e mulher. 
E que relação é essa? Uma relação física, apenas, ou uma relação de dependência? 
Aristóteles coloca que é uma relação de dependência, especialmente da mulher em relação ao 
homem: esta, sozinha, não apenas não é capaz de procriar, como não seria capaz de subsistir, e 
muito menos comandar uma cidade ou um exército. E não seria capaz por quê? Porque, por sua 
constituição natural, ela seria mais fraca que o homem, incapaz, enquanto só ele seria capaz, para 
a prática de certas ações que demandam força e prudência. 
Aristóteles quer apontar, portanto, uma deficiência, uma debilidade natural na mulher, visível seja 
por sua comparação ao homem, seja por sua própria compleição. 
Ora, sob o preconceito dessa idéia de que a mulher é fisicamente, mas também racionalmente, 
inferior ao homem, Aristóteles sequer foi um dos primeiros: a idéia já estivera colocada com todas 
as letras por Demócrito de Abdera, quando recomendou que a mulher não se exercite na palavra, 
 
 
porque isso é coisa perigosa, ou que ser governado por uma mulher é, para o homem, a suprema 
violência. 
Esse argumento pretensamente naturalista de que a mulher é inferior ao homem hoje nos assusta 
com sua brutalidade? Pois foi o principal argumento utilizado em quasetoda a história da 
humanidade para tentar justificar o poder patriarcal ou masculista sobre as mulheres. É esse o 
principal argumento utilizado hoje em dia para justificar a violência doméstica contra as mulheres 
e meninas no Brasil, assim como a violência generalizada contra as mulheres e meninas em 
regimes fundamentalistas como o do Taleban, que por uma certa e infeliz contingência tem sido 
constantemente focado e criticado em nossos dias. 
Numa palavra, o argumento da debilidade ou incapacidade natural da mulher é o argumento mais 
utilizado para tentar justificar a autoridade do homem em relação à mulher dentro da estrutura 
familiar, ao mesmo tempo que a dependência da mulher em relação ao homem, nessa mesma 
estrutura. 
O nosso tema aqui não é, diretamente, essa relação patriarcalista entre homens e mulheres, entre 
maridos e esposas, entre pais e filhas, e por isso não é o caso de levar adiante a análise e a crítica 
dessa concepção irracional que sempre insiste em se manifestar até hoje na concepção dos papéis 
do homem e da mulher na família. 
Mas é fundamental que tenhamos começado por apontá-la, pois ela é a base para aquela outra 
relação que constitui, aqui, o nosso tema principal: a relação entre pais e filhos. 
O que a história mostra, e as histórias do pensamento e das instituições mostram junto, é que, se a 
relação entre homens e mulheres, em família, foi sempre baseada numa concepção naturalista de 
dependência e subordinação da mulher, com muito mais razão será apontada uma dependência e 
subordinação dos filhos em relação aos pais. 
Se a própria subordinação da mulher era vista como necessária, mesmo sendo a mulher um 
indivíduo adulto e experiente, o que dizer então, e sempre, de pessoas que tinham pouca 
experiência ou não tinham experiência nenhuma? Pessoas que não tinham condições de se 
 
 
manterem sozinhos? Dir-se-á não apenas que dependiam muito mais dos adultos na relação 
familiar, mas, conseqüentemente, que deviam, na mesma proporção, muito mais obediência. 
Se a família, nessa concepção clássica e reiteradamente patriarcal, foi tida como uma relação de 
poder praticamente despótico, cujo pater era o detentor exclusivo ou principal de todo o poder de 
decisão quanto à liberdade e o destino dos integrantes da família, então os filhos estiveram, 
certamente, numa posição muito próxima à escravidão: sua dependência física, material e moral 
foi eternamente a causa do seu dever incessante de obediência. 
Se assim é, o que dizer, então, de uma concepção de família que a vê como uma associação 
daqueles que não podem deixar de estar unidos (Aristóteles), ao mesmo tempo em que o homem 
é, naturalmente, o cabeça de sua família (cultura grega, teologia judaico-cristã, direito romano...)? 
Nessa associação, o elo de ligação e o índice dos deveres não se indicam pelo amor, não se 
matizam pela recíproca generosidade, não se caracterizam pela mútua proteção, mas sim se 
realizam por meio da dominação. E se trata de dominação porque, na concepção patriarcal 
clássica, jamais haverá um espaço para que a mulher e os filhos assumam, contra a vontade do pai, 
o posto que deveria lhes corresponder. 
O correr histórico desnudará a certeza de que, para se vislumbrar a igualdade de direitos entre 
homem e mulher – e também entre pais e filhos – na condução da família, serão necessários 
milênios. 
Mas esse longo tempo, necessário certamente para a concepção dessa igualdade de direitos, de 
certa forma seria necessário, também, para a concretude da própria responsabilidade paterna 
como um dever dos pais, em lugar de um poder dos pais. 
A idéia de responsabilidade paterna que existe hoje não encontra grandes referências nas 
concepções antigas de natureza humana e de família. É verdade que o mundo antigo concebeu 
deveres dos pais, dos chefes de família; mas a concepção de responsabilidades civis é muito mais 
recente. Por quê? Porque, se a simples responsabilidade envolvida no dever de assistência é 
classicamente determinada pelo poder do pai sobre sua família, a responsabilidade envolvida nos 
 
 
danos decorrentes da má gestão dessa chefia de família não decorre mais do arbítrio desse 
mesmo pai de família. 
Vale dizer: na concepção antiga e tradicional de família, o pater tinha obrigações, mas tinha 
também poder suficiente para arbitrar quais seriam essas obrigações, já que era senhor de suas 
mulheres e de seus filhos. 
Ao contrário, em concepções mais recentes de família – e que remontam, no máximo, ao início do 
período moderno – os pais de família têm certos deveres que independem do seu arbítrio, porque 
agora quem os determina é o Estado. 
3. A concepção jus-naturalista de família e a distinta visualização do pátrio poder. 
 
A partir do Renascimento e da modernidade, ser chefe de família continuou significando deter um 
poder privilegiado e amplo, mas que já não é mais um poder superior à capacidade – cada vez 
mais visível – dos outros integrantes da família. A modernidade abre espaço para uma 
transformação lenta, mas radical, na concepção de família, já que investe pela primeira vez 
(especialmente no âmbito do jus-naturalismo) na idéia de igualdade entre homem e mulher 
quanto à capacidade para chefiar a família. 
Quem mostra isso com muita ênfase desde a década de 1970 é um dos maiores historiadores do 
jus-naturalismo, Alfred Dufour. Num ótimo estudo publicado originalmente em 1975, mas 
retomado e desenvolvido anos mais tarde, denominado Autoridade marital e autoridade paterna 
na escola do direito natural moderno, Dufour mostra que uma das maiores contribuições do jus-
naturalismo foi inovar na concepção dos direitos entre os integrantes da família. 
Neste estudo, Dufour mostra que tanto a relação entre homem e mulher recebeu inovações 
importantes no ambiente jus-naturalista, como também as recebeu a relação entre pais e filhos, 
ainda que em menor medida. No que diz respeito à relação entre homens e mulheres, autores 
como John Locke no século XVII, mas também como Christian Wolff, e seu discípulo Daniel 
 
 
Nettelbladt, no século XVIII, investiram na idéia de que a mulher, como o homem, detém uma 
autoridade natural sobre os filhos, e efetivamente equivalente à do homem. 
No que respeitasse, pois, à autoridade sobre os filhos, a mulher teria os mesmos direitos que o 
homem, e por razões naturais diferentes daquelas que eram alegadas por Aristóteles ou por toda a 
tradição medieval cristã: a mulher, como o homem, é causa da existência dos filhos, e isso torna a 
sua autoridade natural. Esta lógica é menos restritiva do que a concepção anterior, mas é ainda, 
sem dúvida, um reconhecimento tímido do potencial racional da mulher, já que ela não é 
desenhada, ainda, como uma possível autoridade equivalente à de seu próprio marido. 
No que respeita à relação paterno-filial, por outra parte, nota-se que as mudanças serão também 
visíveis, embora se mostrem menores do que a relativa equalização de direitos ou de autoridade 
entre homem e mulher. Todavia, apesar do seu menor peso, dar-se-á igualmente, nesta 
circunstância relacional, uma mudança suficiente para caracterizar, enfim, a concepção da relação 
entre pais e filhos como uma relação na qual sempre haverá uma responsabilidade dos pais em 
relação às necessidades dos filhos, a ponto de se poder dizer que é aí que nasce, propriamente, 
uma concepção articulada de responsabilidade civil na relação paterno-filial. 
Esta interferência do jus-naturalismo moderno na reformulação da concepção em tela, ocorrida 
nos séculos XVII e XVIII, fez com que se realizasse, aos poucos, a noção propriamente jurídica de 
responsabilidade – que se desenvolve até se tornar responsabilidade civil, no início do século XIX –

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