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O papel da universidade publica no seculo XXI

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XXVIII CONGRESSO INTERNACIONAL DA ALAS 
6 a 11 de setembro de 2011, UFPE, Recife-PE 
 
Grupo de Trabalho: Educação e desigualdade social 
 
Título do Trabalho: O papel da universidade pública brasileira no século 
XXI 
 
Autor: André Rodrigues Guimarães 
GEPES/ICED/UFPA e UNIFAP 
Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação Superior 
(GEPES) 
Doutorando em Educação PPGED/ICED/UFPA, com Bolsa da CAPES 
Docente da Universidade Federal do Amapá 
 
 
Introdução 
 
Neste texto temos como objetivo discutir o papel/função da 
universidade pública brasileira diante do processo de contrarreforma do Estado 
em curso no país nas últimas duas décadas. Entendemos que a política de 
expansão do acesso ao ensino superior privado, com a proliferação de 
instituições e o crescimento do número de matrículas em cursos de graduação, 
desencadeada no regime militar e acelerada a partir dos anos 1990 tem como 
premissa basilar a privatização/mercantilização da educação superior. Trata-se 
da efetivação de um processo de contrarreforma da educação superior que têm 
implicações negativas para a universidade pública ao induzir a conformação da 
lógica mercantil em tais instituições, rompendo o tripé ensino-pesquisa-
extensão. 
Destacamos que para compreendermos essa política em sua 
totalidade é necessário considerarmos o processo de “reforma” do Estado 
desencadeado nos últimos vinte anos. Também é fundamental percebermos o 
caráter dependente da formação capitalista no Brasil, com suas especificidades 
de capitalismo “atrasado”. Como destaca Lima (2007), essa compreensão nos 
possibilitará analisar com mais concretude o processo de contrarreforma da 
educação superior desenvolvida no país a partir dos princípios econômicos 
neoliberais e monitorada por organismos financeiros internacionais. 
Concluímos que diante do aprofundamento da crise estrutural do 
capital e da subserviência estatal reafirma-se, aos que concebem a educação 
como direito social, a necessidade de defender a universidade pública com 
ensino, pesquisa e extensão e vinculada aos interesses coletivos da sociedade. 
 
 
Capitalismo dependente e contrarreforma do Estado brasileiro 
 
A inserção/relação do Brasil na economia capitalista, como no conjunto 
dos países latino-americanos, deve ser analisada no contexto do movimento 
mundial do capital, fundamentalmente articulada ao imperialismo norte-
americano (FERNANDES, 2009), mas também a partir das especificidades 
histórico-conjunturais internas. Não há um modelo linear e único de 
desenvolvimento do capitalismo nas distintas áreas do globo. Como enfatiza 
Chilcote (2009) não há necessariamente uma simetria de caminhos seguidos 
entre os países capitalistas desenvolvidos e os menos desenvolvidos. 
O Brasil, como país capitalista periférico, não esteve/está em estágio 
preliminar de desenvolvimento, mas sim articulado orgânica e especificamente 
ao capitalismo global. Assim, na análise do capitalismo brasileiro é necessário 
romper com o modelo dualista desenvolvido a partir das orientações do modelo 
cepalino, segundo a qual o subdesenvolvimento é etapa preliminar (caminho) 
para o desenvolvimento capitalista. 
 
O “subdesenvolvimento” pareceria a forma própria de ser das 
economias pré-industriais penetradas pelo capitalismo, em 
“transito”, portanto, para as formas mais avançadas e 
sedimentadas deste; todavia, uma tal postulação esquece que 
o “subdesenvolvimento” é precisamente uma “produção” da 
expansão do capitalismo. (OLIVEIRA, 2003, p. 32-3). 
 
O rompimento com a análise harmônica, linear e desenvolvimentista 
significa considerar que a consolidação do capitalismo no país, ao longo do 
século XX, não ocorreu apenas pelo viés economicista e externo. Para além de 
interesses das potências econômicas mundiais há motivações e acomodações 
político-econômicas locais. Conforme expressa Ricardo Antunes, na 
apresentação de Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina 
(FERNANDES, 2009), para além de pressões exclusivamente externas o Brasil 
historicamente desenvolveu-se sem grandes rupturas, realizando 
constantemente uma “conciliação pelo alto, excludente em relação à classe 
trabalhadora e sempre de prontidão para o exercício da contrarrevolução, 
encontrou na dependência e no subdesenvolvimento a sua forma de integração 
para fora e desintegração para dentro.” (p. 12). 
Isso significa que a formação do capitalismo dependente brasileiro 
ocorreu a partir de um acordo entre os objetivos da classe dominante local, 
principalmente a burguesia nacional, e o capital internacional (tendo nas 
últimas décadas a hegemonia norte-americana). Nesse ajuste, o Estado 
brasileiro desempenhou papel de protagonista e fundamental ao estabelecer as 
bases estruturais para a “modernização” do país e conformar/controlar a classe 
trabalhadora nacional. Isso fica explícito quando se analisa o processo de 
industrialização do país após 1930, delineados segundo a teoria 
desenvolvimentista (OLIVEIRA, 2003). 
Assim sendo, é necessário destacarmos que a consolidação, o papel e 
o significado dos Estados intervencionistas na América Latina não podem ser 
compreendidos a partir de modelos teóricos universais ou dos determinantes 
exclusivamente externos (como o imperialismo norte-americano). É necessário 
perceber a especificidade histórica e conjuntural (da qual também fazem parte 
elementos externos) que engloba interesses de classes e suas frações na 
constituição dos Estados nacionais na região. Para tal é possível/necessário 
“alinhar, na linha de alguns marxistas contemporâneos, um outro ponto de 
partida que permite uma releitura mais fecunda da problemática latino-
americana, em torno das especificidades do seu capitalismo” (FIORI, 2003, p. 
105). 
Para Demier (2009), fazendo referência a Trotsky, o caráter de 
capitalismo atrasado dos países latino-americanos tende a conduzi-los ao 
bonapartismo: o Estado amplia sua autonomia relativa diante das demandas do 
capital internacional, da burguesia nacional e da classe trabalhadora. Assim, o 
Estado apresenta-se “acima” dos interesses de classe e responsável pelo 
projeto de desenvolvimento da nação. 
No Brasil, desde o início da industrialização, até a crise dos anos 1980, 
a atuação estatal foi orientada a partir do modelo desenvolvimentista. O Estado 
interventor constituiu-se no principal responsável pelo fortalecimento da 
indústria e constituição dos pilares estruturais necessários à consolidação do 
capitalismo no país (FIORI, 2003). Entretanto, esse modelo de intervenção 
estatal além de não ter conduzido o conjunto da nação aos benefícios da 
riqueza produzida, em tempos áureos, levou a desestruturação da economia e 
do Estado brasileiro. 
O esgotamento do modelo desenvolvimentista, com a consequente 
crise do Estado interventor brasileiro, constituíram as bases de justificativa, 
com forte apego ideológico, da necessidade de ajustes estruturais no país na 
última década do século XX. Behring (2008) evidencia que um conjunto de 
fatores políticos, econômicos e sociais, desencadeados na década de 1980, 
criou as condições propícias para a contrarreforma do Estado brasileiro. Entre 
tais condições podemos destacar o crescente endividamento público e 
elevados índices de inflação em função do intervencionismo estatal do modelo 
desenvolvimentista; a intensificação das reivindicações sindical e popular por 
ampliação dos direitos democráticos, ocasionando uma crise política em torno 
de distintos projetos sociais; e a crise do intervencionismo estatal brasileiro 
(expressa no fracasso do projeto desenvolvimentista e nas críticas sociais a 
seus objetivos), que apontava a necessidade de reformas estruturais no 
Estado. 
Assim sendo, a década de 1990 será propícia para reformulação da 
política econômica adotada pelo país. Como destacamos, essasmudanças 
devem ser compreendidas a partir de um duplo movimento: a) de forma estrita 
considerando a especificidade da formação capitalista no Brasil (e suas crises) 
e sua inserção subalterna no mercado/produção mundial; b) de forma ampla a 
partir da reestruturação produtiva do capitalismo desencadeada no último 
quarto do século passado e a consequente liberalização dos mercados 
nacionais. 
Enquanto orientações gerais estão a liberalização dos mercados 
nacionais e de instituir políticas de ajustes fiscais, com o objetivo de reduzir a 
atuação do Estado (com o crescente ataque às políticas e direitos outrora 
considerados sociais) e ampliar a esfera do mercado. É enfatizado que a 
intervenção econômica estatal inibe o livre arbítrio dos consumidores. Nesse 
sentido, políticas e direitos sociais passam a ser considerados como serviços 
não exclusivos do Estado e devem estar na esfera mercantil. Os organismos 
financeiros internacionais (principalmente o Banco Mundial e o Fundo 
Monetário Internacional) consubstanciam-se em instituições centrais para 
estabelecimento, implementação e controle de tais diretrizes. 
 
O papel dos organismos internacionais na elaboração e difusão 
dos valores e concepções que constituem este projeto de 
dominação tem sido fundamental. As políticas promovidas por 
estes sujeitos políticos coletivos do capital – Grupo BM, 
UNESCO e, mais recentemente, a OMC – vêm orientando um 
conjunto de reformas econômicas e políticas realizadas nos 
países da periferia do capitalismo. (LIMA, 2007, p. 51). 
 
Como analisa Behring (2008) essas orientações encontraram “solo 
fértil” no Brasil dos anos 1990. Como resultado de pressões dos organismos e 
acordos financeiros internacionais e com o aval da burguesia brasileira, o Brasil 
passou a adotar políticas de redução da atuação social do Estado e ampliação 
da esfera do mercado. Trata-se de ajustes que visam “reformar” o Estado a 
partir dos princípios neoliberais: “reformas” que desestruturam políticas sociais 
e atacam os direitos da classe trabalhadora, por isso trata-se de uma 
contrarreforma (BEHRING, 2008). 
Principalmente a partir dos governos de Fernando Henrique Cardoso 
(1995-2002) o Estado brasileiro passará por “reformas” estruturais, seguindo as 
indicações do Consenso de Washington1: tratava-se de ajustar a política 
econômico-social brasileira aos princípios neoliberais do livre comércio. A 
centralidade e urgência do tema nos governos de FHC se expressaram na 
criação, em seu primeiro mandato, do Ministério da Administração Federal e 
Reforma do Estado (MARE), nomeando como ministro Bresser Pereira. Ainda 
em 1995, foi criado o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado que 
redefiniu o papel do Estado na condução do setor público a partir de um 
modelo gerencial com centralidade no controle de resultados. 
Desde então, o Brasil passa por política de ajuste fiscal, com o 
argumento de controle da inflação, elevadas taxas de juros, privatização e 
abertura comercial com forte incentivo ao capital especulativo e a consequente 
redução do orçamento social. Como resultado, as políticas sociais e os direitos 
trabalhistas são duramente atacados em um cenário de crescente desemprego, 
informalidade e outras formas de precarização do trabalho (BEHRING, 2008). 
Em 2003, com a chegada de Lula da Silva à presidência, com uma 
Coligação de Frente Popular, da qual participou o Partido Liberal (que indicou 
como seu vice-presidente José de Alencar, empresário da indústria têxtil), 
havia certa expectativa, por parte do movimento sindical e popular e de 
intelectuais da esquerda, na modificação da política econômica. Entretanto, 
seu governo evidenciou a manutenção, em uma nova fase, da política de 
ajustes neoliberais no país (LIMA, 2007). 
Desse modo, mesmo com o discurso de reformas estruturais que 
levariam ao desenvolvimento nacional, o Estado brasileiro adentra o século XXI 
marcado por um processo histórico de submissão/dependência internacional, 
 
1
 O “Consenso de Washington” foi como ficou conhecido o resultado de reunião, realizada no 
final de 1989, conduzida pelos EUA e organismos financeiros (FMI, BM e BID), que avaliando a 
situação latino-americana reafirmou a necessidade de políticas econômicas de orientações 
neoliberais para a região. 
construído a partir de acordos/consenso com a burguesia brasileira. Como 
característica nova, tal processo trás a desestruturação do caráter social do 
Estado brasileiro e o ajuste aos novos ditames do capitalismo em crise e 
global. Em suma, trata-se de ampliar o espaço do mercado/capital na condução 
do Estado e reduzir a pressão/conquista da classe trabalhadora brasileira. 
 
 
Contrarreforma da educação superior brasileira 
 
A constituição histórica e as transformações recentes do Estado 
brasileiro têm implicações negativas para a consolidação da educação superior 
enquanto política social. Os interesses das camadas economicamente 
superiores (representada, a partir do ideário desenvolvimentista, pela burguesia 
brasileira) e o caráter dependente da economia nacional impediram a 
constituição da educação como direito social e dever do Estado. Como 
veremos, a ausência estatal na manutenção da educação superior como 
política pública e direito de todos será mantida e aprofundada no processo 
contrarreforma de orientação neoliberal em curso no país. 
Conforme destaca Lima (2007) o caráter extremante elitista da 
educação superior brasileira, nascida como privilégio social, tem seus limites 
nas necessidades na modernização do capital. As transformações produtivas 
implementadas no país com a vigência da orientação das teorias 
desenvolvimentistas imputavam a necessidade de ampliar o acesso aos 
trabalhadores a possibilidade de formação de nível superior. Por outro lado e 
em contraposição, movimentos docentes e estudantis reivindicavam reformas 
democratizantes para a universidade brasileira. 
Esse movimento, acirrado no início da década de 1960, com as 
crescentes reivindicações sociais por reformas estruturais no país, implicava 
um rompimento com o elitismo do acesso à universidade e, estruturalmente, a 
revisão do padrão dependente do capitalismo brasileiro. Com o intuito de evitar 
tais transformações, a burguesia brasileira com aval/desejo do imperialismo 
norte-americano, passou a implementar, a partir do golpe militar de 1964, um 
processo de reforma universitária que, ao mesmo tempo, atendesse as 
demandas do mercado de trabalho, controlasse as reivindicações sociais e, 
como demandas das intenções anteriores, ampliasse o acesso à educação 
superior. Trava-se então da burguesia conduzir o “processo que Florestan 
Fernandes [...] denominou ‘reforma universitária consentida’” (LIMA, 2007, p. 
127), para manter seu controle sobre o Estado. 
Essa reforma trouxe, entre outras implicações, a ampliação do número 
de matrículas em cursos de graduação, passando de 142 mil, em 1964, para 
932 mil, em 1974. Entretanto, essa expansão se deu principalmente em 
instituições privadas (com crescimento de quase 1000% de matrículas na 
década em questão), invertendo o predomínio público na manutenção do 
ensino superior. Em 1964 a maioria das matrículas (61,6%) estava em 
instituições públicas, dez anos depois as instituições privadas já possuíam essa 
hegemonia (com mais de 63% das matrículas). Ainda que a hegemonia do 
mercado na oferta de educação superior se reduza na década seguinte, 
considerando os dados de 1984 (com quase 1,4 milhões matrículas, com 
40,9% públicas) é notório que a ampliação do acesso ao ensino superior no 
período militar implicou no fortalecimento da lógica mercantil neste nível de 
ensino. (SGUISSARDI, 2008). 
 
Em primeiro lugar, a proliferação de escolas privadas de ensino 
superior [...] permitiu o acesso de vastas camadasda classe 
média ao ensino universitário, atendendo assim a uma 
expectativa que se vinha tornando cada vez maior. Em 
segundo lugar, o caráter próprio dessas organizações 
empresariais supunha naturalmente um perfil de curso superior 
significativamente distinto daquele dos cursos em instituições 
públicas. Os parâmetros de eficiência e lucratividade excluíam 
qualquer ideário pedagógico mais consistente, o que foi 
substituído pelo senso de oportunidade comercial na 
organização e venda de serviços segundo o critério da 
demanda. (SILVA, 2001, p. 295). 
 
Desse modo, mesmo com uma expansão significativa do acesso à 
universidade durante o regimento militar, inclusive em instituições públicas 
(saindo de pouco mais de 87 mil matrículas em 1964 para mais de 570 mil em 
1984), institui-se no país um espaço propício para o mercado: o ensino 
superior. Tal abertura implicou na fundamentação de duas grandes concepções 
de educação superior. Por um lado, temos a concepção, adotada 
principalmente por universidades públicas e historicamente reivindicada pelo 
movimento docente e estudantil, que defende a universidade como espaço 
crítico e autônomo, responsável pela formação profissional, produção e 
socialização de conhecimentos de acordo com os interesses coletivos da 
sociedade. Por lado, temos a constituição de instituições privadas, 
predominantemente de ensino, preocupadas com interesses comerciais que 
buscam sujeitos/consumidores para comprar seus produtos formulados 
segundo as condições econômicas dos compradores e as exigências mais 
imediatas do mundo produtivo. 
Com a adoção das políticas de ajustes fiscais e incentivo ao livre 
mercado a partir dos anos 1990, o Estado brasileiro passa a adotar medidas 
que incentivam a manutenção e proliferação da privatização e mercantilização 
do ensino superior. Tendo como balizadores externos os grandes organismos 
financeiros do capital internacional, amplia-se a esfera do mercado tanto em 
termos percentuais de atendimento, quanto na instituição cada vez mais 
acentuada da lógica mercantil na universidade pública. Em tal processo, é 
exaltado, na concepção, função e manutenção da universidade, um viés 
economicista segundo a qual conhecimento, ciência tecnologia são tidos como 
mercadoria. Como sintetiza Sguissardi (2005, p. 215) essa “idéia de uma 
universidade organizada e gerida nos moldes empresariais, trabalhando com 
uma semimercadoria no quase-mercado educacional está cada vez mais 
presente no discurso e nas práticas oficiais das políticas públicas de educação 
superior”. 
O marco legal principal de adequação da educação superior brasileira 
ao projeto neoliberal é certamente a Lei a Diretrizes e Bases da Educação 
Nacional (LDB 9.394/1996). A atual LDB intensifica o processo de privatização 
e mercantilização da universidade segundo os interesses operacionais do 
mercado neoliberal. Há, na Lei, um incentivo ao mercado da educação superior 
com a indução à expansão de instituições de ensino – com abandono da 
pesquisa e da extensão; a constituição de universidades isoladas por campo de 
saber e diversificação das Instituições de Educação Superior (ISE); 
centralidade e centralização da avaliação institucional com ênfase na cobrança 
de resultados; a flexibilidade curricular com a instituição de cursos seqüenciais; 
e o tratamento superficial sobre a educação à distância (BELLONI, 2003). 
Passado um pouco mais de dez anos de vigência da LDB, essas ações se 
confirmam em Decretos e Leis que regulamentam a Educação Superior. 
No âmbito do discurso governamental todo esse processo reformista foi 
ideologicamente justificado pela necessidade de modernizar a educação 
superior brasileira e promover a ampliação do acesso a tal nível de ensino. 
Além disso, recorrentemente a universidade pública foi acusada de ineficiente, 
onerosa e elitista, sendo esses os motivos, intrínsecos à instituição pública, da 
exclusão da população do acesso ao ensino superior. 
Como resultados de tal política verificamos no país um processo 
crescente de acesso ao ensino superior nos últimos anos. Triplicamos o 
número de vagas na graduação, saímos de 1,7 milhão, em 1995, para quase 6 
milhões, em 2009. Entretanto ampliou-se a participação do mercado: em 
termos percentuais do total de matrículas em 2002 (final do governo FHC) 
69,8% eram em IES privadas e em 2009 (penúltimo ano do segundo mandato 
de Lula da Silva) esse número sobe para 74,2%. A Tabela 1 evidencia o 
aumento anual constante de instituições e matrículas em cursos de graduação 
no Brasil, porém, também explicita o caráter marcadamente mercantil de tal 
processo. 
 
Tabela 1 – Evolução das IES, Matrículas Presenciais e a Distância na 
Educação Superior, por categoria administrativa – Brasil – 1995/2009 
Fontes: INEP (1999a, 1999b, 2000, 2002, 2005, 2007a, 2007b, 
2009). 
Notas: Sinal convencional utilizado: 
- Dado numérico igual a zero não resultante de 
arredondamento; 
* Não se aplica dado numérico. 
 
IES Matrículas Presenciais Matrículas EAD Ano 
Pública Privada Pública Privada Pública Privada 
1995 210 684 700.540 1.059.163 - - 
1997 211 689 759.182 1.186.433 - - 
1999 192 905 832.022 1.537.923 - - 
2001 183 1.208 939.225 2.091.529 5.359 - 
2003 207 1.652 1.136.370 2.750.652 39.804 10.107 
2005 231 1.934 1.192.189 3.260.967 53.117 61.525 
2007 249 2.032 1.240.968 3.639.413 92.873 276.893 
2009 245 2.069 1.351.168 3.764.728 172.696 665.429 
∆ (%) 95-01 -12,8 76,6 34,1 97,4 * * 
∆ (%) 03-09 18,3 25,2 18,9 36,8 333,8 6.483,8 
∆ (%) 95-09 16,6 202,5 92,9 255,4 * * 
De modo geral, como expressa a Tabela 1, é possível identificarmos que 
a expansão da educação superior nos governos de FHC ocorreu por meio do 
crescimento estrondoso do número de instituições e matrículas presenciais na 
iniciativa privada. Considerando o período 1995-2001 atingiu-se, 
respectivamente, elevação de 76,6% e 97,4%. Já nos governos Lula da Silva 
essa expansão encontra seus limites em função do poder aquisitivo das 
famílias brasileiras (SGUISSARDI, 2008). Isso conduziu, apesar da elevação 
nominal, a uma retração percentual, em relação ao período anterior, do número 
de instituições e matrículas presenciais no setor privado para, respectivamente, 
25,2% e 36,8%. 
Destacamos que no período em questão, ocorreu uma expansão das 
vagas em instituições públicas federais, acentuada a partir da instituição do 
Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB)2, com expansão de matrículas de 
graduação via EaD, e do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e 
Expansão das Universidades Federais (Reuni)3, ambos criados no governo 
Lula da Silva. Entretanto, essa expansão tem implicado no fortalecimento do 
modelo mercantil do acesso ao ensino superior. De forma explícita este 
processo ocorre a partir da ampliação do mercado educacional (expressa nas 
estatísticas oficiais). Por outro lado, mas segundo o mesmo princípio, 
implicitamente ações privatizantes são desenvolvidas pelo Estado brasileiro, 
seja para fortalecer a iniciativa privada como o Fies (Fundo de Financiamento 
do Ensino Superior) e o Prouni (Programa Universidade para Todos), ou 
consolidar a lógica gerencial (segundo modelo de contrato de gestão de 
Bresser Pereira) na relação da manutenção estatal das instituições públicas 
federais por meio do estabelecimento de “contratos de gestão” vinculando a 
liberação de recursos ao cumprimento de metas (cujo maior e mais recente 
exemplo é o Reuni). 
 
2
 Criado pelo Decreto 5.800/2006, o Sistema tem a finalidade de expandir e interiorizar a oferta 
pública da educação superior com ênfase nos cursos de licenciaturas. Para análise da UAB e 
da recente política de expansão da educação superior brasileira na modalidade EAD consultar 
Dourado (2008). 
3
 Instituído, segundo os princípios do contrato de gestão,pelo Decreto 6.096/2007 o Reuni 
permitiu que as universidades federais celebrarem convênios com o MEC, com propostas de 
expansão dos cursos e vagas na graduação, reestruturação curricular e ampliação da relação 
aluno/professor e das taxas de conclusão de cursos na graduação. Para análise do Programa 
ver Chaves e Mendes (2009). 
Em suma, o processo de “reforma” universitária em curso no país, 
ainda que eleve no número instituições de ensino superior e de matrículas em 
cursos de graduação, não rompe com a lógica excludente constituída a partir 
da formação dependente do país. Ao contrário, as políticas de ajustes 
neoliberais, em distintas fases e governos, ampliam o controle do capital 
(nacional e internacional) sobre o Estado e submete, de forma explicita ou não, 
a educação superior brasileira aos interesses mercantis. 
 
 
Defender a universidade pública diante da crise estrutural do capital 
 
Como evidenciamos o processo de mercantilização/privatização da 
educação superior em curso no Brasil deve ser analisado a partir do contexto 
sócio-histórico do capitalismo contemporâneo. Entendemos que isso implica 
em considerar que a submissão da função/papel da universidade aos ditames 
do mercado capitalista está organicamente vinculada à crise estrutural do 
capital. Essa articulação permite compreender a realidade em sua totalidade e 
nos possibilita uma ação em defesa da universidade pública efetiva, pois 
evidencia essência da problemática em questão. 
Desde o final da década de 1960 István Mészáros tem enfatizado que o 
capitalismo enfrenta uma crise estrutural (ANTUNES, 2009). Diferentemente 
das crises cíclicas do capitalismo, recorrentes e passageiras, vivenciamos um 
processo de intensificação da crise estrutural do sistema sociometabólico do 
capital. Todas as formas de exploração da vida atingiram níveis limítrofes, não 
sendo possível forjar novos mecanismos propulsores da lucratividade desejada 
pelo capital. Isso significa que se esgotaram inclusive as possibilidades de 
ajustes conjunturais (como o intervencionismo keynesiano) capazes de 
recuperar a economia em tempos de depressão: a manutenção do capital 
chegou ao seu limite. 
O sistema capitalista é estruturalmente contraditório (tendo como 
central/originária a contradição entre capital e trabalho) e incapaz de realizar 
suas projeções/promessas de universalidade (MÉSZÁROS, 2003). É esse 
caráter essencialmente contraditório do capital que é levado ao extremo nos 
dias atuais, com a intensificação sem precedentes da degradação humana e 
ambiental. Entretanto, todo esse processo de contradição e expropriação, 
mesmo diante da crise estrutural, é escamoteado ideologicamente segundo os 
interesses da classe dominante. O fetiche do capital busca ignorar as 
consequências desastrosas e intransponíveis dentro da ordem estabelecida, 
reafirmando sua supremacia onipotente e onipresente. 
Desde o final dos anos 1960, como tentativa de enfrentamento à crise 
estrutural e fundamentalmente com o intuito de ampliar/recuperar o 
espaço/lucro da economia capitalista, vivenciamos um conjunto de 
transformações na sociabilidade humana. Como destaca Antunes (2002) nesse 
processo, a reestruturação produtiva, na perspectiva da acumulação flexível, e 
a redefinição dos papeis desempenhados pelos Estados nacionais, com a 
retomada das teses do livre mercado, assumem dimensões/impactos globais 
com o crescente agravamento da exclusão social. Trata-se de levar ao extremo 
a subordinação humana aos interesses estritos do capital: reprodução do valor 
de troca em detrimento do valor de uso na produção da existência humana 
(MÉSZÁROS, 2002). 
A reestruturação produtiva caracteriza-se pela crescente flexibilização 
na produção de mercadorias e nas relações de trabalho. Trata-se de um 
processo de acumulação flexível com inovação tecnológica, comercial e 
organizacional das empresas que passam a produzir de acordo com as 
demandas imediatas do mercado. A flexibilidade pressupõe produzir bens e 
relações trabalhistas supérfluas, descartáveis. Em suma, a estrutura produtiva 
é modificada/reformada, com a intensificação da exploração da força de 
trabalho4, para ampliar o espaço da produção e comercialização das 
mercadorias. 
Como parte desse processo o Estado, fundamentalmente administrador 
dos interesses burgueses (MARX; ENGELS, 2008), passa também por 
redefinições em sua função/intervenção. Para garantir os pressupostos 
necessários ao livre mercado, inclusive com a constituição de novas 
mercadorias, os Estados nacionais devem eliminar barreiras alfandegárias e 
limitar sua atuação na esfera social. Para os apologetas do capital toda 
 
4
 Para compreensão mais detalhada das características e conseqüências da reestruturação 
produtiva ver Ricardo Antunes, especialmente seu livro Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a 
afirmação e a negação do trabalho (ANTUNES, 1999). 
estagnação econômica desencadeada pela crise do capital desde o início dos 
anos 1970 é também uma crise do intervencionismo estatal. Nessa 
perspectiva, ao estabelecer certos direitos sociais, como respostas às 
demandas dos trabalhadores, o Estado intervém para além de sua função 
basilar (garantir o direito à propriedade privada) e impede que o mercado 
proporcione a harmonia/desenvolvimento da sociedade (HAYEK, 1994). 
É nesse contexto, como evidenciamos anteriormente, que o processo de 
mercantilização/privatização da educação superior é concebido e implantado. A 
educação superior, principalmente na periferia do capitalismo global, é reduzida 
ao ensino e com objetivo de formação aligeira e técnica-ideologicamente 
ajustada aos interesses estritos do capital em crise estrutural. Segundo tal 
lógica, é necessário “desonerar” os custos com a universidade para permitir ao 
mercado maior competitividade e objetividade na oferta do ensino superior. 
 
 
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