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Andre Bonelli Rebouças

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DO SALVADOR 
MESTRADO EM FAMÍLIA NA SOCIEDADE CONTEMPORÃNEA 
 
 
 
 
 
ANDRÉ BONELLI REBOUÇAS 
 
 
 
 
GUARDA DOS FILHOS MENORES DE CASAIS SEPARADOS: 
COMO DECIDIR EM JUÍZO? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Salvador 
2008 
 
 
 
2 
 
ANDRÉ BONELLI REBOUÇAS 
 
 
 
 
 
 
 
 
GUARDA DOS FILHOS MENORES DE CASAIS SEPARADOS; 
COMO DECIDIR EM JUÍZO? 
 
 
 
 
Dissertação apresentada à Universidade Católica do 
Salvador como requisito parcial para obtenção do título 
 de Mestre em Família na Sociedade Contemporânea. 
 
 
 Orientador: Prof. Dr. José Euclimar Menezes 
 Co-Orientador: Prof. Dr. Camilo Colani 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Salvador 
2008 
 
3 
 
 
 TERMO DE APROVAÇÃO 
 
 ANDRÉ BONERLLI REBOUÇAS 
 
 
 GUARDA DOS FILHOS MENORES DE CASAIS SEPARADOS: 
 COMO DECIDIR EM JUÍZO? 
 
 
Tese aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Família 
na Sociedade Contemporânea da Universidade Católica do Salvador, pela 
seguinte banca examinadora: 
 
 
Vanessa Ribeiro Simon Cavalcanti 
Doutora em História – Universidad de León 
 
Camilo de Lelis Colani Barbosa 
Doutor em Direito – PUC-SP 
 
José Euclimar Xavier de Menezes 
Doutor em Filosofia - UNICAMP 
 
 
 
 
 
 
 
Salvador, 20 de agosto de 2008. 
4 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
 
 
 
Agradeço imensamente, pela oportunidade de ingressar e cursar o Mestrado em 
Família na Sociedade Contemporânea : 
 
A Ritinha, minha mulher, pelo apoio que recebi: foi muito importante; 
 
 
A meus filhos: André, Marina, Clara, Breno e Enzo, pela compreensão pelos 
momentos em que não me fiz presente; 
 
 
A meu orientador, Prof. Dr. Menezes, pela dedicação e atenção a este trabalho, 
orientando-me com grande esmero e competência. 
 
A Júlia e Gorete, pelo apoio logístico: meu muito obrigado. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
 
RESUMO 
 
 
 
 
Esta tese busca discutir a guarda de filhos menores no pós-separação dos pais, um 
desafio constante para a boa solução dos litígios intrafamiliares.Perpassa, 
,inevitavelmente, por aspectos culturais de nossa sociedade, de raízes fincadas no 
patriarcado; revela os meandros psicológicos dos genitores e de seus filhos; e 
questiona o sistema jurídico do Direito de família e do Direito processual, com 
especificidades de cunho conceitual, hermenêutico e operativo.Sob o aspecto 
cultural, percebe-se que ainda remanesce, em algumas das decisões judiciais 
relativas à guarda a crença derivada do senso comum de que a mãe deve ser a 
guardiã dos filhos porque,,detentora do ‘instinto materno’, lhe confere maior aptidão 
para o convívio e educação da prole. Ao homem deve ser confiado o papel de 
provedor e visitante. Mas esse posicionamento, que já não corresponde à 
orientação majoritária da jurisprudência, parece tender a esmaecer. Já se percebe 
que os operadores do direito, ante a constatação da dificuldade de solucionar as 
lides familiares apenas pela ótica jurídico-positivista, buscam seu equacionamento 
fundados na interdisciplinaridade, de modo que a custódia de menores, ainda que 
decidida pelo juiz, passa a ser abordada por outras fontes do saber. Neste sentido, 
tanto o Estatuto da Criança e do Adolescente, ECA como o Código Civil, CC abrem 
espaço à instrução processual motivada na perícia interdisciplinar. O menor deve 
ser visto como o foco principal nas ações relativas à sua guarda. É, pois, um sujeito 
de direito, o que implica ser uma pessoa suscetível de satisfazer suas necessidades 
juridicamente protegidas : o direito ao aleitamento materno, à ludicidade adequada, 
à escola qualificada, à assistência médica apropriada, à convivência comunitária e 
familiar, ao respeito; enfim, todo modo apropriado que possibilite seu bem-estar, 
conforme indica o ordenamento jurídico que lhe é protetivo. Se a criança ou 
adolescente é o foco, a modalidade da guarda a ser adotada —unilateral, 
compartilhada ou alternada —, não é importante por seus próprios atributos, mas em 
função do que, no caso concreto, pode proporcionar ao filho, em termos de garantir 
seu melhor interesse e a proteção integral de seus direitos.Por isso, a fixação da 
guarda não poderá contrapor-se à igualdade de gênero, constitucionalmente 
consagrada. 
 
 
Palavras chaves: Família; Guarda de filhos menores; Critérios para decisão: 
Instrução Processual; Efetivação das decisões. 
 
 
 
 
 
6 
 
ABSTRACT 
This thesis seeks to discuss the custody of minor children after separation from their 
parents, a constant challenge to the proper solution of disputes within the family. The 
text exists, inevitably, in the cultural aspects of our society, by from roots planted in 
patriarchy, it reveals the psychological intricacies of parents and their children and it 
questions the legal system of Family law and Procedural law, with specific features of 
conceptual imprint, hermeneutic and operating. Under the cultural aspect, we find 
that still remains, in some court decisions concerning the care, the belief derived from 
common sense that the mother should be the guardian of the children because she’s 
holding the “maternal instinct” and she giving it greater ability for the living and 
education of offspring. The man should be given the role of provider and visitor. But 
this position tends to weaken, because doesn’t correspond to the major direction of 
jurisprudence. 
 
Now, you can see that the operators of the law, at the conclusion of the difficulty of 
solving the deal between the families only positivist legal perspective, seek to align 
themselves based on interdisciplinary, so the custody of minors becomes 
approached by other sources of knowledge, even if decided by the judge. In this 
sense, both the ECA as the Civil Code provides room for instruction on procedural 
grounds interdisciplinary expertise. The minor must be seen as the main focus on 
actions relating to their custody. The minor is a subject of law, which requires a 
person be susceptible to satisfy their needs legally protected: it’s entitled to breast-
feeding, the playful approach, the school qualified, appropriate medical care, the 
living community and family, respect ; finally, all the appropriate manner which allows 
their well-being, as indicated by the legal system it’s protective. If the child or 
adolescent is the focus, the type of custody to be adopted - unilateral, alternately or 
shared – it’s not important for their own attributes, but in the light of that, in this case, 
the child can provide in terms of their best interest and ensure full protection of their 
law. Hence the setting of the guard can’t interpose itself to gender equality, 
constitutionally enshrined. 
7 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
AI – Agravo de Instrumento 
ApCv – Apelação Cível 
CC – Código civil 
CDC – Código de Defesa do Consumidor 
CF – Constituição Federal 
CP – Código Penal 
CPC – Código de Processo Civil 
DJ – Diário da Justiça 
ECA – Estatutoda Criança e do Adolescente 
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 
REsp – Recurso Especial 
STF – Supremo Tribunal Federal 
STJ – Superior Tribunal de Justiça 
TJBA – Tribunal de Justiça do Estado da Bahia 
TJMG - Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais 
TJPE - Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco 
TJPR - Tribunal de Justiça do Estado do Paraná 
TJRJ - Tribunal de Justiça do Estado do rio de Janeiro 
TJRS - Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul 
TJSE - Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe 
TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo 
8 
 
SUMÁRIO 
 
 
INTRODUÇÃO 10 
 
1 CRIANÇAS E ADOLESCENTES: UM OLHAR PARA O PASSADO 23 
1.1 Regramentos jurídicos brasileiros até o Código de Menores de 1979 26 
 
2 .DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DO MELHOR INTERESSE DO MENOR: UM 
SUJEITO DE DIREITO 32 
 
3.DO PODER FAMILIAR 46 
 
4 DO DIREITO DE CONVIVÊNCIA: UM RECONHECIMENTO DA 
DIGNIDADE DA PESSOA 64 
 
5 DA GUARDA 70 
5.1 Considerações históricas 70 
5.2 Aspectos conceituais 76 
5.3 Classificação da guarda quanto à origem 80 
5.4 Das modalidades de guarda 83 
5.4.1 Da guarda unilateral 83 
5.4.2 Da guarda alterada 90 
5.4.3 Da guarda compartilhada 92 
5.4.3.1 A regulamentação da guarda compartilhada no ordenamento 
jurídico brasileiro, mesmo antes da Lei 11 698, de 13 de junho de 2008 96 
5.4.3.2 Mais diretamente sobre a Lei 11 698, de 13 de junho de 2008, que 
altera os artigos 1 583 e 1 584 do Código Civil e dispõe sobre a guarda 
unilateral e compartilhada 107 
5.4.3.3 Guarda compartilhada pressupõe consenso dos pais? 118 
5.4.3.4 Na guarda compartilhada em que casa o infante deve ficar? 130 
 
6 A INSTRUÇÃO PROCESSUAL NAS AÇÕES DE GUARDA 135 
 
9 
 
7 A FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO QUE DETERMINA A GUARDA 143 
 
8 DA EFETIVAÇÃO DA DECISÃO QUE FIXA A GUARDA 148 
 
CONCLUSÃO 159 
 
REFERÊNCIAS 163 
 
 
 
10 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
 
 
 
. JUSTIFICATIVA 
 
 
 
A questão da guarda de filhos menores em decorrência do dissenso dos pais tem 
sido objeto de debates e indagações, que vão desde a situação e aspirações dos 
próprios pais até as expectativas e o resguardo dos interesses dos menores. Guarda 
é um conjunto de direitos e deveres para filhos e pais, respectivamente, que pode 
ser exercido de modo espontâneo ou em função de determinação judicial, mas 
sempre como uma manifestação do direito de convivência familiar. 
 
Por isso, coexistem entendimentos, na doutrina, na jurisprudência e agora ratificados 
pelo texto da Lei 11. 6981, de 13 de junho de 2008, que deu nova redação aos arts 
 
1
 Lei 11.698/08 e a nova redação dos arts 1 583 e 1 584 do Código Civil: 
“Art. 1º - Os arts. 1.583 e 1.584 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, passam a vigorar com 
a seguinte redação: 
"Art. 1 583. A guarda será unilateral ou compartilhada. 
§ 1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores, ou a alguém que o substitua (art. 
1,.584, § 5º) e, por guarda compartilhada, a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres, do 
pai e da mãe, que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. 
§ 2º A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, 
mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores: 
 I - afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; 
 II - saúde e segurança; 
 III - educação. 
§ 3º A guarda unilateral obriga o pai, ou a mãe, que não a detenha, a supervisionar os interesses dos filhos. 
 
"Art. 1 584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: 
 I - requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma, de separação, de 
divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar; 
 II - decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo 
necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. 
 § 1º Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua 
importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de 
suas cláusulas. 
 § 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que 
possível, a guarda compartilhada. 
§ 3º - Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob a guarda compartilhada, 
o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe 
interdisciplinar 
11 
 
1.583 e 1.584 do Código Civil, na direção de sustentar que: a guarda pode ser 
unilateral, ou seja, permite a apenas um dos pais a custódia da criança ou 
adolescente na pós ruptura do casal, restando ao cônjuge não guardião o direito de 
visitas ao filho; guarda conjunta, quando compartilhada entre os pais, que, embora 
separados, continuam em interação recíproca e quotidiana com o menor, 
dispensada assim a figura do pai ou mãe visitante; e, ainda, a guarda alternada, na 
qual o infante reveza períodos, isoladamente, com o pai e com a mãe. 
 
Os que criticavam o compartilhamento da guarda da criança ou adolescente 
argumentavam, a princípio, que esta espécie de custódia não era sequer regulada 
pelo direito brasileiro, pois a legislação nacional, antes da edição da Lei 11.698/08, 
pressuporia a presença contínua e inseparável do menor junto ao genitor guardião. 
Afirmavam também que, quando há animosidade entre os pais separados, é 
impossível a fixação conjunta da guarda 2, visto que isto poderia causar aos 
menores problemas de instabilidade emocional, perda de referências, ausência de 
definição de responsabilidade entre o pai e a mãe. E como derradeira justificativa 
defendiam que a guarda deve ser prevalentemente decidida em favor da mulher 
em razão do seu “instinto materno”, que tende a proporcionar melhores condições 
afetivas e educacionais para a prole. 
 
Por esse raciocínio, conforme delineia Eduardo de Oliveira Leite (2004, p. 264): 
 
Enquanto a família permanece unida, a guarda conjunta é perfeitamente 
admissível. Questionar-se-ia sobre a realidade de tal expressão quando a 
família já se encontra separada. A separação dos pais e o inevitável 
afastamento de um dos genitores da presença do filho impediriam a guarda 
conjunta. 
 
 
Mesmo após a vigência da Constituição Federal de 1988, nossos Tribunais se 
manifestaram a favor da guarda unilateral, como regra (TJRS, ApCv 70005760673, 
 
§ 4º A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de guarda, unilateral ou 
compartilhada, poderá implicar a redução de prerrogativas atribuídas ao seu detentor, inclusive quanto ao 
número de horas de convivência com o filho. 
 § 5º Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe , deferirá a guarda à 
pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de 
parentesco e as relações de afinidade e afetividade." 
 Art. 2º Esta Lei entra em vigor após decorridos 60 (sessenta) dias de sua publicação. 
 
2
 Conforme Rolf Madaleno (2004, 91-92) e Marilene Silveira Guimarães (2004, 5/6) 
12 
 
j. 12/03/03; TJRS, ApCv 70002792919, j. 01/11/01; TJMG, ApCv 1.0000.00.344568-
1/000, DJ 05/02/04)). É de se destacar quesegmentos da jurisprudência chegavam 
até a julgar extinto, por impossibilidade jurídica do pedido, o processo no qual se 
pleiteava a guarda compartilhada do filho menor que se encontrava sob a custódia 
exclusiva de um dos ex-consortes. Argumentavam que o ordenamento brasileiro 
prévio à Lei 11. 698/08 não reconhecia nem acolhia o compartilhamento da guarda a 
fim de garantir o direito da criança de conviver com os pais no caso de dissenso 
destes quanto àquela custódia. 
 
Para os que advogam o compartilhamento da guarda entre os pais, defendem-na, 
mesmo antes da publicação da nova Lei de Guarda (11.698/08), em função do 
melhor interesse do menor e de sua integral proteção, o direito à convivência 
familiar, assegurado pela Constituição Federal, já que para esses, a guarda 
compartilhada denota um efeito simbólico: reafirma a necessidade da criança poder 
estar — em disponibilidade —, tanto com a mãe como com o pai, reforçando em si 
sentimentos de inspiração e aceitação mútuas, tão importantes para a sua 
constituição psíquica. Pai ou mãe não guardião deixaria de exercer o papel de 
“visitante”, ato que não possibilita à família uma de suas mais significativas 
características: a intimidade do convívio. 
 
Há, ainda, quem avente a possibilidade da guarda alternada divisão simétrica do 
tempo e do espaço em que os pais exerceriam a custódia dos filhos. 
 
Observando as mudanças socioculturais em nossa sociedade e seus reflexos na 
questão da guarda, interessantes são as observações de Leila Maria Torraca Brito 
(2004, p. 360), 
 
 
Não se pode desprezar o fato de que, na sociedade ocidental, os estudos 
iniciais sobre a relação materno-infantil indicavam que as mulheres seriam 
portadoras do instinto materno, determinismo biológico que fixava lugares e 
atribuições e forjava estereótipos. Definia-se, ainda, que só a expressão do 
amor materno saberia dosar os cuidados e carinhos necessários ao 
adequado desenvolvimento infantil. Quanto aos homens, eram preparados 
para zelar pela honra da família, ao mesmo tempo em que eram afastados 
das tarefas domésticas. Como demonstram os estudos sobre gênero, as 
desigualdades em relação aos direitos e deveres entre homens e mulheres 
eram naturalizadas e legitimadas culturalmente. Dessa forma, a fiscalização, 
prevista inicialmente na legislação como prerrogativa do pai visitante, 
13 
 
retratava o mesmo como figura de autoridade, afastado do contexto diário 
com os filhos e a quem caberia avaliar o desempenho da ex-mulher na 
promoção do desenvolvimento infantil. 
Hoje, percebe-se que o significado do nascimento engloba, além do 
nascimento de um filho, o nascimento dos genitores nos lugares estruturais 
de pai e mãe, papéis que aprendemos a desempenhar. Tal condição pode 
ser enfraquecida, porém, quando a educação da criança passa a ser 
encaminhada, prioritariamente, pelo genitor responsável pela guarda. 
Atribuir ao genitor classificado como visitante o lugar prioritário de fiscal 
contraria as indicações atuais tanto dos documentos internacionais quanto 
das Ciências Humanas, que recomendam uma ampla aproximação e 
participação de ambos os pais no desenvolvimento dos filhos, sendo que o 
lugar e as funções dos genitores devem ser referendados pelos textos 
jurídicos. 
 
 
Observa-se, dessa forma, a existência de uma dinâmica social e, em virtude disto,l 
novos quadros se desenham, e as leis tendem a se adaptar a nova caminhada 
social. 
 
Diante deste cenário surge a indagação: quais são os mecanismos que o Direito 
dispõe para possibilitar a fixação da guarda de modo mais adequado aos interesses 
do menor? 
 
Responder a essa pergunta é o objeto dessa dissertação que se justifica em função 
dos critérios de interpretação e aplicação do Direito. A partir de investigações e 
posicionamentos da doutrina, da jurisprudência e da das próprias leis, consideram-
se os princípios que salvaguardam os interesses do menor, e que convergem em 
pensar a criança como sujeito, que tem desejos, prerrogativas, direitos e deveres, e 
não como objeto de manipulação dos que os cercam. Propõe-se, também, a 
demonstrar em que medida há necessidade da manutenção ou não dos laços de 
convivência entre os pais e seus filhos após a separação, divórcio, dissolução da 
união estável e, ainda, sobre os filhos nascidos de relações casuais ou acidentais, 
em que não houve um consenso sobre com quem permanecerão os filhos. 
 
 
 
 
 
 
14 
 
 . PROBLEMATIZAÇÃO 
 
 
Para tratar do problema suscitado pelo presente trabalho, referente ao estudo dos 
mecanismos jurídicos de hermenêutica e aplicação do Direito a fim de fundamentar 
a decisão que definirá a guarda unilateral ou compartilhada ou mesmo alternada, é 
preciso que sejam analisados alguns princípios jurídicos que circundam o tema. Há 
que se desvelar o alcance e sentido de expressões e princípios que norteiam as 
relações do direito de família, tais como: o melhor interesse do menor, a proteção 
integral, o poder familiar, a maternidade e a paternidade responsáveis, o direito de 
convivência, a isonomia de gêneros, alicerces para melhor compreensão e solução 
de conflitos dessa natureza. 
 
Essas acepções precisam ser entendidas desde os seus sentidos mais específicos 
até os mais latos, para que se possa estudar o assunto com maior precisão e mais 
segurança epistemológica, pois a análise da guarda exorta o observador a conhecer 
determinadas variáveis do direito, numa compreensão que perpassa, 
interdisciplinarmente, pela psicologia, psiquiatria, sociologia e outras ciências afins. 
 
O princípio do melhor interesse da criança que traz a Constituição Federal - CF em 
seu art. 2273, e o Código Civil, sobretudo nos seus arts. 1.583 e 1.584, e o próprio 
Estatuto da Criança e do Adolescente em vários de seus dispositivos, é informador 
no sentido de que pode o magistrado conceder a guarda a um ou a ambos os pais, 
ou ainda a um terceiro, de modo que seja garantida a integridade física e psicológica 
do menor como precisamente, afirma Rosana Fachin (2005, p. 125): 
 
 
O melhor interesse da criança descreve-se como sendo aqueles essenciais 
cuidados para viver com saúde, incluindo física, emocional e intelectual, 
cujos interesses, inicialmente, são dos pais, mas que, se negligenciados, o 
Estado deve intervir. De acordo com a Constituição, o modelo institucional 
de família é atenuado para residir na relação entre pais e filhos o poder 
paternal que está centrado na idéia de proteção. A paridade de direitos e 
deveres tanto do pai quanto da mãe está em assegurar aos filhos todos os 
 
3
 Art. 227 da CF – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com 
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, 
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda 
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 
15 
 
cuidados necessários para o desenvolver de suas potencialidades para a 
educação, formação moral e profissional, revelando a transformação e a 
revalorização de cada um de seus componentes. 
 
 
Já o poder familiar é formado sobre novos conteúdos e significados inseridos na 
isonomia de gêneros de que trata o art. 226, § 5º 4, da Constituição Federal e os 
arts. 1.6305 e seguintes do Código Civil, que não deve ser entendido como fonte de 
força acintosa, exercida pelos pais, para revelar a igualdade de suas potencialidades 
no disputado comando da família, mas como poder familiar que tem sentido se for 
tradutor de uma relação familiar interativa entre pais e filhos. Lançando mão de uma 
perspectiva histórica, remetendo-se ao ambientegreco-romano para, em seguida, 
contextualizar poder familiar na atualidade, Caio Mário da Silva Pereira (2005, p. 
417 e 421) acentua: 
 
 
No direito antigo, a estrutura autocrática da família, alicerçada no princípio 
da autoridade, constitui na noção de pátrio poder em termos rígidos e 
severos. A tendência foi forçosamente a consagração da bilateralidade nas 
relações pais-filhos, a atribuição do poder parental a ambos os pais e a 
predominância dos deveres e do sentido de proteção e defesa dos 
interesses do menor sobre toda a idéia de prerrogativa paterna ou de direito 
dos pais sobre os filhos. Por isso mesmo, as definições tradicionais se 
desprestigiam, por acentuarem um lado apenas da relação jurídica. Daí, 
dizemos nós, fixando o conceito deste instituto após a Carta de 1988 
compreendendo: ‘complexo de direitos e deveres quanto à pessoa e bens 
do filho, exercidos pelos pais na mais estreita colaboração, e em igualdade 
de condições’. 
 
 
Não pode também o intérprete, para a definição da guarda, perder de vista o 
princípio responsável, da paternidade e da maternidade, que vincula os pais aos 
filhos menores, fazendo aqueles responderem pelos danos que causam a estes e 
bem assim por danos que os próprios filhos causem a terceiros. Segundo Vieira 
(2004, p 47-48), devem os genitores, solteiros, casados, separados, divorciados ou 
viúvos, ter a exata consciência de seu mister como pais e educadores de cidadãos 
do futuro, sendo certo que atos por eles praticados poderão gerar graves prejuízos 
em face dos filhos. 
 
4
 Art. 226, § 5º, da CF: Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo 
homem e pela mulher. 
5
 Art. 1 630 do CC: Os filhos estão sujeitos ao poder familiar enquanto menores. 
16 
 
 
 A guarda dos filhos menores, quando da ruptura familiar, até antes do advento da 
Lei 11.698/08, foi decidida, de ordinário, segundo a adoção de critério interpretativo 
literal do art. 1.5846, caput, do Código Civil, que, com antiga redação já revogada, 
pugnaria pela guarda unilateral. 
 
É preciso também ter em vista que o tema deve ser contextualizado com os 
princípios que alicerçam o direito de convivência do menor, consagrados na 
legislação constitucional e infraconstitucional, que deve ser interpretado e efetivado 
com o auxílio interdisciplinar de outras ciências sociais afins, principalmente 
considerando os diversos matizes e questionamentos que cercam os atores 
envolvidos — pais e filhos —, mas tendo a prole sempre como protagonista. 
 
Os pressupostos da guarda no ordenamento jurídico brasileiro, as suas modalidades 
e os critérios de racionalidade observados segundo os fatos da causa são aportes 
dos quais o juiz se vale para decidir qual dos consortes revela melhores condições 
de exercê-la, ou se ambos, concomitante ou alternativamente, podem fazê-lo no 
sentido de preservar o direito de convivência familiar (art. 227 da Constituição 
Federal). Esta escolha reclama, todavia, uma percepção mais ampla do julgador 
quanto à subjetividade dos envolvidos, exigindo-lhe um conjunto de informações que 
devem passar por abordagens multidisciplinares associados ao novo desenho 
constitucional do Direito de Família, sem o que a sua decisão estará desconectada 
da realidade a ser regulada. 
 
Por isso, rompendo as amarras das tradições, alguns intérpretes como Gustavo 
Tepedino (2004, p. 307) alerta para esses novos enfoques: 
 
 
Cuida-se, pois, de uma reconstrução das categorias do direito de família, 
renovado pelos valores existenciais, processo hermenêutico cuja 
importância avulta no exame da filiação. A relação parental, com efeito, e 
em particular a filiação, põe em evidência uma série de situações jurídicas 
existenciais incompatíveis com o tratamento dogmático tradicionalmente 
forjado nas relações patrimoniais. Ou seja, estudam-se com freqüência as 
 
6
 Art. 1.584 do CC: Decretada a separação ou o divórcio, sem que haja acordo entre as partes quanto à guarda 
dos filhos, será ela atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la (texto alterado pela Lei 
11.698/08). 
17 
 
relações entre pais e filhos a partir da estrutura do direito subjetivo, 
categoria típica dos direitos patrimoniais e, por isso mesmo, inapto a servir 
de paradigma para as situações jurídicas existenciais que medeiam o 
reconhecimento da filiação e a educação dos filhos como processo 
destinado à afirmação e ao desenvolvimento da personalidade. 
 
 
Por isso, deve-se visualizar em que medida os mecanismos de instrução processual, 
as técnicas de interpretação e de efetivação da decisão hoje disponíveis oferecem 
ao juiz os elementos necessários à adequada resolução dos problemas que 
envolvem a custódia dos filhos menores. 
 
 
Não é difícil constatar que a maioria das decisões judiciais, ao tornar unilateral a 
guarda o faz em direção da mãe, conforme se observará no percorrer deste trabalho, 
subestimando a figura paterna. A um só tempo, essas decisões criam um 
distanciamento dos filhos em relação ao pai, pois imprime a este a perda da 
reciprocidade do afeto ante a ausência do convívio. Isto pode ser reflexo de uma 
cultura pigmentada ainda com resquícios do patriarcado porque, quando se enaltece 
o papel da mulher na família, nem sempre é para notabilizá-la, mas, nas entrelinhas, 
para circunscrevê-la às prendas e muros domésticos. 
 
Para um esclarecimento epistemológico, há de se fazer quanto ao modo usual de 
fixação judicial da guarda do menor de forma disjuntiva ou conjunta ou alternada, 
aferido pelo julgador que nem sempre dispõe, numa perspectiva interdisciplinar, de 
ferramentas adequadas para decidir. Como se trata de questão multifacetada, a sua 
abordagem exige a apuração também do contexto sócio-antropológico e suas 
conseqüências sobre a estrutura psicológica do menor e dos pais, fundamentos que 
o juiz, isoladamente, a partir apenas dos seus conhecimentos jurídico-dogmáticos 
não alcança. 
 
É em nome da proteção integral ao melhor interesse da criança, observado inclusive 
por uma ótica interdisciplinar, também na crença de uma instrução processual e em 
técnicas de decisão que possibilitem essa concepção e, ainda, firme em critérios 
mais eqüitativos para se determinar o presente e o futuro de um sujeito (ainda) em 
formação, que se estabelece o fio condutor deste trabalho. 
18 
 
 
Com atenção voltada para essa realidade, em que se trabalha com relações 
jurídicas, sentimentos, emoções, inserções culturais e psíquicas, não se pode negar 
que a Constituição Federal trouxe ao Direito de Família uma nova tábua axiológica, 
vertendo seu eixo para a preservação e valorização da pessoa. Com isso, exige-se 
dos intérpretes do Direito uma releitura dos conceitos do Código Civil, do Estatuto da 
Criança e do Adolescente e do Código de Processo Civil postos à luz da própria 
Constituição. Este é o encaminhamento para o trato dos interesses e conflitos no 
núcleo familiar. João Batista Villela (1980, p. 132) denomina de “intinerário da 
liberdade” essa mudança da família, em razão do aprofundamento afetivo ocorrido 
no interior do grupo que lhe deu novo rosto. 
 
Tornou-se um canon, na contemporaneidade, sustentar que a família vem sendo 
moldada sob novos paradigmas, passando a ser o principal locus de construção da 
realização pessoal de seus membros. Como decorrência dessas mudanças, em 
contraposição a um quadro outrora pincelado com as linhas do domínio autoritário e 
ensimesmado dos pais, o menor passou a ser o ponto central da entidade familiar, o 
seu “novo interlocutor” (PERLINGIERI, 1997, p. 244), e isto com efeitos concretos e 
importantes nas nossas Leis e nosso Direito, no modo de interpretá-los e de aplicá-los. Não é sem razão que o Estatuto da Criança e do Adolescente — ECA destaca o 
valor intrínseco do menor como ser humano e a necessidade de especial respeito a 
sua condição de pessoa em desenvolvimento. 
 
A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, de 1989, que serviu de 
fonte inspiradora ao ECA, ressalta, como se constatará mais adiante, a importância 
da manutenção e continuidade dos laços familiares da criança e ascendente, a fim 
de preservar o seu bem-estar. Os pais, mesmo que separados pelos seus próprios 
conflitos, têm o dever de preservar tais laços com os filhos, vínculos que são pilares 
de vida da pessoa. Todavia, situações poderão ocorrer em que a continuidade da 
convivência com um ou ambos os pais será nefasta para a boa formação psicofísica 
da criança, e nesses casos, a decisão sobre a guarda deverá contemplar outras 
possíveis variáveis, incluindo-se, até mesmo, a hipótese do menor ficar sob a 
custódia do Estado. 
 
19 
 
Os operadores do direito, principalmente os juízes, porque têm o poder de decisão, 
por mais que queiram, não estão habilitados a compreender sozinhos as relações 
familiares, dado sua complexidade. Devem ser analisados os aspectos jurídicos e 
afetivos dos filhos, que necessitam de proteção a seus direitos e de 
acompanhamento quotidiano com orientação, equilíbrio e amor. Sem se considerar 
essa conjuntura não se pode pensar em julgamento justo. 
 
Em uma perspectiva de ampliação e fortalecimento do princípio da 
paternidade/maternidade responsável, é necessário que os aplicadores do Direito 
busquem sempre o auxílio dos valores sociais e da dignidade pessoal previstos na 
Constituição, como elos estruturantes da personalidade, da família e da cidadania. 
 
O Direito, como uma das ciências sistematizadoras das relações intersubjetivas, 
precisa abarcar para si elementos colhidos da interdisciplinaridade da cultura 
humana, com vistas a contribuir para melhor aparelhar advogados, promotores e 
juízes no trato das questões que envolvem a guarda de crianças e adolescentes. 
 
A atividade jurisdicional deve considerar a subjetividade de cada um, moldando-a 
aos ajustes sociais/normatizantes que forem adequados. A melhor interpretação da 
Lei será aquela realizada por esse prisma, pois em derredor do Direito gravitam 
outras ciências sociais de suma importância para a compreensão e solução dos 
conflitos de família. Não se devem decidir essas questões de modo isolado, afinal, 
nada é sozinho, senão é nada. 
 
O ECA ,entretanto, já sinaliza nessa direção. Num primeiro momento, ressalta o 
dever dos pais (arts. 4º7 e 198) — dos dois, portanto —, de conviverem com os filhos, 
sem excepcioná-la no pós-separação, desde que a convivência seja salutar ao 
desenvolvimento infantil. A lei 11.698/08 trouxe para o Código Civil concreta 
manifestação do direito de convivência familiar, ao tornar pragmática a guarda 
 
7
 art. 4º do ECA: É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público, assegurar, com 
absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, 
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. 
8
 Art. 19 do ECA: Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família, e, 
excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da 
presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes. 
20 
 
conjunta como regra geral do pós-separação em seu art. 1.584, § 2º 9. Conviver em 
família é um direito mútuo e recíproco de todos que integram esse núcleo. Além do 
mais, também não foram esquecidos pelo ECA (art. 15110) e pela nova Lei de 
Guarda (art. 1.584, § 3º 11) os insumos da interdisciplinaridade para o trato da 
questão, de modo a contribuir para que a prática forense possa conjugar princípios 
do direito, da psicologia, da sociologia e da antropologia em direção à construção de 
um ser humano melhor. 
 
Esses trabalhos instrumentam o juiz durante todo o processo, prestando-lhe auxílio 
indispensável para compor os fundamentos da decisão judicial. Ainda no campo das 
inovações processuais trazidas pelo ECA, há a inédita possibilidade do próprio juiz 
re-decidir o mérito do que acabou de sentenciar (art. 198, VII 12), o que se traduz 
numa importante exceção à regra geral do esgotamento da atividade cognitiva 
prevista no art. 463 13 do Código de Processo Civil. 
 
De seu turno, a Lei 11.698/08 conferiu amplos poderes ao juiz para deferir, inclusive 
ex officio, a concessão da guarda em atenção às necessidades prementes do menor 
(art. 1.584, inc. II14), o que é um aspecto importante na outorga de tutela protetiva da 
criança/adolescente. 
 
O que se pode notar é que o ECA e o Código Civil estão atentos à nova realidade 
jurisdicional, que exige que a decisão proferida pelo Juiz possa ser edificada 
também sobre os vários alicerces do saber humano e que esse Magistrado deve ser 
 
9
 Art. 1.584, § 2º, do CC: Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: 
 § 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que 
possível, a guarda compartilhada. 
10
 Art. 151 do ECA: Compete à equipe interpessoal, dentre outras atribuições que lhes forem reservadas pela 
legislação local, fornecer subsídios por escrito, mediante laudos, ou verbalmente na audiência, e bem assim 
desenvolver trabalhos de aconselhamento, orientação, encaminhamento, prevenção e outros, tudo sob a 
imediata subordinação da autoridade judiciária, assegurada a livre manifestação do ponto de vista técnico. 
11
 Art. 1.584, § 3º, do CC: § 3º Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência 
sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em 
orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar 
12
 Art. 198, VII, do ECA: VII – antes de determinar a remessa dos autos à instância superior, no caso de apelação 
ou de instrumento, no caso de agravo, a autoridade judiciária proferirá despacho fundamentado, mantendo ou 
reformando a decisão, no prazo de cinco dias. 
13
 Art. 463 do CPC: Publicada a sentença, o juiz só poderá alterá-la: 
I – para corrigir, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais, ou lhes retificar erro de cálculos; 
II – por meio de embargos de declaração. 
14
 Art; 1.584,II: A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: 
II - decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo 
necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. 
21 
 
detentor de maiores poderes, a serem utilizados na direção do melhor interesse 
infanto-juvenil. 
 
Numa ordem seqüencial, pode-se afirmar que o indivíduo integra a família, que, de 
sua vez, compõe a coletividade como seu elemento estruturador. A boa formação da 
criança, nessa cadeia indivíduo>família>sociedade, é, portanto, essencial à 
harmonia das relações sociais. Daí porque a Constituição de 1988 foi tão incisiva ao 
dispor que a família é base da sociedade (art. 22615) e que é dever da família, da 
sociedade e do Estado — e aí seguramente está incluído o juiz com as decisões que 
produz —, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à 
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à 
dignidade, ao respeito, à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a 
salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade 
e opressão (art. 227, caput). 
 
A família é o maior dos fenômenoshumanos de coexistência e suas relações devem 
ser interpretadas num amplo contexto. Luis Edson Fachin (2003, p. 14-15), com 
inegável sensibilidade, diz: 
 
 
A família, como fato cultural, está antes do Direito e nas entrelinhas do 
sistema jurídico. Mais que fotos nas paredes, quadros de sentido, 
possibilidades de convivência, na cultura, na história; prévia a Códigos e 
posteriores a emoldurações. No universo jurídico, trata-se mais de um 
modelo de família e de seus direitos. Vê-la tão só na percepção jurídica do 
Direito de Família é olhar menos que a ponta de um iceberg. Antecede, 
sucede e transcende o jurídico, a família como fato e fenômeno. 
 
 
 Como fenômeno que habita as divisas do Direito, mas que também vasa as suas 
fronteiras, não pode, sob nenhum argumento, ser visto apenas pelos olhos de quem 
vê a literalidade da Lei. Reclama que o exegeta tenha braços mais longos para 
manusear outros ramos do saber humano, em cooperação constante. 
 
O juiz tem o dever, pela letra da Constituição, de assegurar à criança e ao 
adolescente, com absoluta prioridade, o direito à saúde, inclusive psíquica; à 
 
15
 Art. 226 da CF: A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. 
22 
 
educação, também em seu sentido mais lato de cidadania; ao lazer, como 
possibilidade de dar asas às brincadeiras que os colocam em estado de felicidade; à 
cultura, que informa e projeta; à dignidade, que os faz respeitar o próximo e por ele 
serem respeitados; e, por derradeiro, à convivência familiar que proporciona à 
criança/adolescente e a seus pais o aprendizado recíproco do afeto e generosidade. 
Esse juiz, que tem sobre os ombros o dever/função de assegurar todos esses 
direitos, não tem como fazê-lo sozinho, com o respaldo apenas no seu 
conhecimento jurídico que carreou das leis. 
 
 
 
. OBJETIVOS 
 
 
Analisam-se em que medida os operadores do direito, em especial o juiz, dispõem, 
com fundamentação jurídica e sustentada por uma visão interdisciplinar, de critérios 
e mecanismos adequados para a definição da guarda unilateral, ou da 
compartilhada, ou da alternada dos filhos. Faz-se necessária, desse modo, a 
utilização de mecanismos processuais com vistas a proporcionar uma instrução 
multidisciplinar da demanda; a implementação de critérios sistemático e zetético de 
interpretação da norma, aí considerados os princípios e valores constantes da 
Constituição; e, ainda, a efetivação das decisões judiciais embasada nas novas 
técnicas do cumprimento de tutelas específicas. 
 
 
 
23 
 
1. CRIANÇAS E ADOLESCENTES: UM OLHAR PARA O PASSADO 
 
 
Até por volta dos Séculos XVIII e XIX, os adultos não olhavam as crianças com os 
olhos da atualidade. A sociedade, de um modo geral, não lhes dispensava a devida 
atenção em termos de políticas públicas com adequações específicas, estabelecidas 
a partir das carências infantis e voltadas para o seu bem-estar, porque pessoas em 
formação. O Estado, mais especialmente, não desenvolvia mecanismos jurídico-
sociais de proteção aos interesses da sua população de crianças e adolescentes, 
capazes de resguardá-los de todo modo de abusos, discriminações e violências, 
inclusive dentro do seio da própria família. 
 
Aliás, a família — os pais, mais notadamente —, detinha o exclusivo poder sobre os 
destinos e educação dos filhos, bem como de seus modos de viver e de ser, ainda 
que isto implicasse em cerceio às suas aptidões psíquicas, morais ou físicas, 
utilizando, muitas vezes, meios cruéis, constrangedores e opressores. O núcleo 
familiar não deixava espaço para atuação institucional externa e, assim, as primeiras 
investidas do Estado deparavam-se nos muros domésticos, instransponíveis, servis 
aos excessos dos pais. 
 
A estrutura familiar no Império Romano (750 a.c a 450 d.c), que se propagou no 
tempo e por grande parte do ocidente, é aqui tomada como referência histórica 
porque moldou o direito de família ocidental, deixando ainda enorme legado para as 
normas que regem a família na contemporaneidade, não só nos países de origem 
latina e integrantes do chamado sistema civil law, isto é, aquelas nações que 
mantiveram o sistema romano onde a lei é a principal fonte do Direito, mas também 
nos países de origem anglo-saxônica, que adotaram o método common law, no qual 
o Direito se origina na lei, nos costumes sociais e é também construído pelos 
próprios tribunais. Seja como for, o esboço normativo que hoje regula as relações de 
família tem assento no Império Romano. Analisando o perfil do núcleo familiar em 
Roma antiga, Ricardo Pereira Lira (1997, p. 87) comenta: 
 
 
24 
 
O pater familias era o chefe absoluto, sacerdote incumbido de oficiar a 
veneração dos penates, deuses domésticos. Como chefe do grupo familiar, 
excedente do poder marital, tinha direitos absolutos sobre a mulher e os 
filhos, inclusive com direito de vida e morte sobre os últimos, decorrente do 
jus vitae necisque. O pater familias era titular do jus noxae dandi, 
consistente no abandono reparatório do filho em favor da vítima que 
houvesse sofrido prejuízo com a prática pelo filho de um ilícito privado. 
Podia exercer também o jus vendendi, que era a faculdade de alienar o 
filho, mediante o mancipatio, a outro pater familias. Subespécie do jus vitae 
necisque era o jus exponendi, faculdade do pater familias de abandonar o 
filho recém-nascido ao seu destino. 
 
 
Ter o direito de matar um filho ou de abandoná-lo ou de vendê-lo era, no contexto, 
algo inerente à condição paterna. Que significado tinha a criança/adolescente para o 
adulto de então? Não obstante o contexto, compreender essa relação entre pais e 
filhos estabelecida no Império Romano exige uma análise que dê conta de sua 
complexidade, sobretudo quando se investiga o papel da criança desde então até o 
final de Idade Média. Observando a criança e em seu entorno,a partir do que a arte 
medieval retratou do cotidiano das pessoas na Europa, num período compreendido 
entre os séculos XI até XV, Philipe Ariès (1981, p.51: p. 55) constata que a criança 
não tinha significação expressiva para a sociedade. A arte refletia, assim, o descaso 
dos adultos em relação às crianças e adolescentes. 
 
 
{...} a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la. É 
difícil crer que essa ausência se devesse à incompetência ou à falta de 
habilidade. É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse 
mundo. Não se pensava como normalmente acreditamos hoje, que a 
criança já contivesse a personalidade de um homem. Elas morriam em 
grande número. Consta que durante muito tempo se conservou no País 
Basco, o hábito de se enterrar em casa, no jardim, a criança morta sem 
batismo. Talvez houvesse aí uma sobrevivência de ritos muito antigos, de 
oferendas sacrificiais. Ou será que simplesmente as crianças mortas muito 
cedo eram enterradas em qualquer lugar, como hoje se enterra um animal 
doméstico, um gato ou um cachorro?16 
 
 
16
 Philippe Ariès analisa algumas gravuras do XI a XIII e relata: “Uma miniatura otoniana do século XI nos dá 
uma idéia impressionante da deformação que o artista impunha então aos corpos das crianças, num sentido que 
nos parece muito distante do nosso sentimento e da nossa visão. O tema é uma cena do Evangelho em que 
Jesus pede que se deixe vir a ele as criancinhas, sendo o texto latino claro: parvuli. Ora, o miniaturista agrupou 
em torno de Jesus oito verdadeiros homens, sem nenhuma das características da infância: eles foram 
simplesmente reproduzidos numa escala menor. Apenas seus tamanhos os distinguem dos adultos. Numa 
miniatura francesa do século XI, as três crianças que São Nicolau ressuscitou estão representadas numa escala 
mais reduzida que os adultos,sem nenhuma diferença de expressão ou de traços. O pintor não hesitava em dar 
à nudez das crianças, nos raríssimos casos em que era exposta, a musculatura do adulto: assim, no livro de 
salmos de São Luiz de Leyde, datado do fim do século XII ou do início do século XIII, Ismael, pouco depois de 
seu nascimento, tem os músculos abdominais e peitorais de um homem. Embora exibisse mais sentimento ao 
retratar a infância, o século XIII continuou fiel a esse procedimento”. 
25 
 
Se se interpretar a suspeita de Àries a respeito dos costumes medievais como 
indiferença dos adultos em relação às crianças e o hermetismo da família em face 
da sociedade e do próprio Estado, pode-se ter como hipótese que o mundo medieval 
proporciona um domínio absoluto dos pais sobre seus filhos e, mais 
especificamente, um poder desmedido do próprio pai sobre a prole. Isto é verificado 
não só na Europa dominada tantos séculos pelos romanos, mas também em outros 
povos, mesmo já por volta do século XVIII, como constata Göran Therborn (2006, p. 
31): 
 
 
Em algumas sociedades, particularmente nas africanas, mas, em princípio, 
também na China imperial, o poder patriarcal era o poder supremo e 
elaboraram-se práticas religiosas para veneração dos ancestrais e para o 
contato com seus espíritos. As regras do confucionismo ortodoxo, mais 
precisamente os códigos penais da China imperial, colocavam o dever filial 
acima da lealdade ao Estado e às suas Leis, de modo a, de forma explícita, 
endossar ou permitir, respectivamente, a cobertura dos crimes cometidos 
pelos pais ou por outro membro graduado da família. 
 
 
As primeiras manifestações a dedicar proteção às pessoas com hipossuficiência 
psicofísica de convivência desenvolvem-se lentamente e ainda que de forma apenas 
embrionária, na Inglaterra, por volta do século XIV, através do regime do parens 
patriae, que era concebido como a autoridade herdada da família pelo Estado, em 
situações muito singulares e que não se aplicavam aos filhos menores, para atuar 
como guardião de um indivíduo com limitação de sua capacidade jurídica, tal é o 
relato de Tânia Pereira (2000, p. 2-3), em prospecção histórica da obra de Daniel B. 
Griffith. 
 
Mas, só a partir do século XVIII que as Cortes de Chancelaria inglesas passaram, no 
contexto do parens patriae, a distinguir as crianças daquelas outras pessoas 
portadoras de determinadas limitações, como os loucos ou os pródigos. Desta 
época consta, segundo a referida autora acima, a primeira decisão judicial, ainda 
que isolada, em que o interesse do menor é exaltado a um patamar em que se 
sobrepõe aos interesses dos próprios pais. É o tímido limiar de uma era em que os 
poderes constituídos passam a intervir na órbita familiar para resguardar interesses 
da prole, conforme afirma: 
26 
 
 
 
A criança era considerada uma coisa pertencente a seu pai (thing to be 
owned). Era predominante a preferência da custódia para o pai, sem que se 
importasse com as conseqüências dela decorrentes. Griffith, referindo-se às 
origens históricas do parens patriae, reporta-se ao caso Finlay versus 
Finlay, julgado pelo Juiz Cardozo, em que ficou ressalvado que, ao exercitar 
o parens patriae, a preocupação não deveria ser a controvérsia entre as 
partes adversas e nem mesmo compor as diferenças entre elas. O bem-
estar da criança deveria se sobrepor aos direitos de cada um dos pais. 
Dois julgados do Juiz Lord Mansfield, em 1763, envolvendo medidas 
semelhantes ao nosso procedimento de ‘busca de apreensão do menor’, 
identificados como o caso Rex versus Delaval e o caso Blissets, são 
conhecidos no Direito Costumeiro inglês como os precedentes que 
consideraram a primazia do interesse da criança e o que era mais próprio 
para ela. Somente em 1836, porém, este princípio tornou-se efetivo na 
Inglaterra. 
 
 
Esses são os primeiros movimentos político-sociais, ainda incipientes, na direção de 
se começar a reconhecer na criança um sujeito de direito. Eram os passos iniciais no 
caminho de se ver a criança como titular do direito à sua proteção psicofísica pela 
família, pela sociedade e pelo Estado. 
 
 
1.1 Regramentos jurídicos brasileiros até o Código de Menores de 1979 
 
 
Antes do rei D. João VI desembarcar no Brasil, em 1808, estava em vigências as 
Ordenações Filipinas, uma legislação imposta pela Coroa portuguesa, criada pela 
dinastia dos Felipe, reis espanhóis que governaram Portugal entre os anos de 1580 
a 1640. Essas Ordenações retratavam com fidedignidade o tratamento que era 
dispensado às crianças e aos adolescentes brasileiros até o início do século XIX, o 
que nos impele a significar, para a nossa realidade, as observações de Ariès sobre a 
infância pincelada pela arte da Idade Média. Em seus estudos sobre a história da 
responsabilidade penal do menor no Brasil, Janine Borges Soares (2007, p. 40) 
constata: 
 
 
De acordo com as Ordenações Filipinas, a imputabilidade penal iniciava-se 
aos sete anos, eximindo-se o menor da pena de morte e concedendo-lhe 
27 
 
redução da pena. Entre dezessete e vinte e um anos havia um sistema de 
‘jovem adulto’, o qual poderia até mesmo ser condenado à morte, ou, 
dependendo de certas circunstâncias, ter sua pena diminuída. A 
imputabilidade penal plena ficava para maiores de vinte e um anos. Antes 
de 1830, quando foi publicado o primeiro Código Penal do Brasil, as 
crianças e os jovens eram severamente punidos, sem muita diferenciação 
quanto aos adultos, a despeito do fato de que a menor idade constituísse 
um atenuante à pena. A adolescência confundia-se com a infância, que 
terminava em torno dos sete anos de idade, quando iniciava, sem transição, 
a idade adulta. 
 
 
 Observa-se que não se distinguia praticamente a criança do adulto naquilo que 
correspondia aos deveres deste e suas respectivas sanções pelo não cumprimento. 
O menor era, sobretudo, um ser de deveres, como se pudesse discernir entre o certo 
e o errado; entre o possível e o não permitido. A criança era punida quase com que 
se adulto fosse. Não havia diferenças significativas. É como se o ser humano (ainda) 
em formação fosse o ser humano (já) formado ou como se a punição excessiva 
fosse exemplar e profilática. O que levaria a sociedade de então a punir com 
reclusão a criança que cometesse um “crime” aos sete anos de vida? Que espécie 
de “crime” seria esse? 
 
O Código Penal do império, de 1830, e também o primeiro Código Penal da era 
republicana, de 1890 foram inspirados pelo que se chamou da “Doutrina do Direito 
Penal do Menor”, preocupavam-se especialmente com a delinqüência infanto-juvenil 
e baseavam a imputabilidade na pesquisa do discernimento, em que se atribuía ao 
Juiz a competência para determinar o grau de esclarecimento do infrator quanto à 
menor ou maior gravidade do ato que tivera praticado. O art. 13 do Código, de 1830 
autorizava o juiz punir a criança com menos de quatorze anos de idade, com pena 
de reclusão, nos seguintes termos: 
 
 
Art. 13 – Se se provar que os menores de quatorze anos, que tiverem 
cometido crimes, obraram com discernimento, deverão ser recolhidos às 
casas de correcção, pelo tempo que ao juiz parecer, com tanto que o 
recolhimento não exceda a idade de dezesete annos. 
 
 
Assim, segundo Liborni Siqueira (1979, p. 32), cabia ao magistrado verificar se o 
jovem era ou não capaz de dolo e, para tal fim, levaria em conta a sua vida 
28 
 
pregressa, seu modo de pensar, sua linguagem, não justificando basear-se apenas 
numa razão, obrigando-o a pesquisar um conjunto de elementos informadores. 
 
Vivia-se no Brasil dessa época, ainda uma era de mecanismos excessivos e, às 
vezes, cruéis de punição, quando, ao redor do mundo, outros países do continente 
europeu já acenavam com novas formas de repressão institucionalizada. Era 
preciso, então,distinguir o punido do punidor: este, quando voraz e selvagem, se 
igualava, aos olhos da modernidade, ao criminoso a ser punido. A sociedade 
reclamava humanização na aplicação da pena. O esquartejamento público, a 
fogueira que ardia nos corpos dos condenados, o ferro em brasa que lhes 
deformavam as faces, a castração, etc., etc., vão cedendo espaço a outros modos 
de punição. Michel Foucault (2003, p. 12) investiga esse momento da história, ao 
que denomina de nova justificação moral e política do direito de punir, revelando: 
 
 
No fim do século XVIII e começo do século XIX, a despeito de algumas 
grandes fogueiras, a melancólica festa de punição vai-se extinguindo. 
Nessa transformação misturam-se dois processos. Não tiveram nem a 
mesma cronologia nem as mesmas razões de ser. De um lado, a supressão 
do espetáculo punitivo. O cerimonial da pena vai sendo obliterado e passa a 
ser apenas um novo ato de procedimento e ou de administração. A 
confissão pública dos crimes tinha sido abolida na França pela primeira vez 
em 1791, depois novamente em 1830 após ter sido restabelecida por um 
breve tempo; o pelourinho foi supresso em 1789; a Inglaterra aboliu-o em 
1837. As obras públicas que a Áustria, a Suíça e algumas províncias 
americanas, como a Pensilvânia, obrigavam a fazer em plena rua ou nas 
estradas — condenados com coleiras de ferro, em vestes multicores, 
grilhetas, trocando com o povo desafios, injúrias, zombarias, pancadas, 
sinais de rancor ou de cumplicidade — são eliminados mais ou menos em 
toda a parte no fim do século XVIII, ou na primeira metade do século XIX. O 
suplício de exposição do condenado foi mantido na França, até 1831, 
apesar das críticas violentas — ‘cena repugnante’, dizia Real; ela é 
finalmente abolida em abril de 1848. Quanto às cadeias, que arrastavam os 
condenados a serviços forçados através de toda a França, Brest e Toulon, 
foram substituídas em 1837 por decentes carruagens celulares, pintadas de 
preto. A punição, pouco a pouco, deixou de ser uma cena. E tudo que 
pudesse implicar em espetáculo desde então terá um cunho negativo; e 
como as funções da cerimônia penal deixavam de ser compreendidas, ficou 
a suspeita de que tal rito que dava um ‘fecho’ ao crime mantinha com ele 
afinidades espúrias; igualando-o, ou mesmo ultrapassando-o em selvageria, 
acostumando os espectadores a uma ferocidade de que todos queriam vê-
los afastados, mostrando-lhes a freqüência dos crimes, fazendo o carrasco 
se parecer com o criminoso, os juízes aos assassinos, invertendo no último 
momento os papéis, fazendo do suplicado um objeto de piedade e de 
admiração. 
 
 
29 
 
Se o mundo experimenta, na passagem pela Idade Contemporânea, novos modos 
de tratar seus criminosos, é provável que disso tenha também defluido as novas 
formas de tratamento diferenciado que se ensaiava para as crianças e adolescentes, 
no final do século XIX, distanciando-os dos adultos e remetendo esses menores, 
pouco a pouco, para um sistema jurídico protetivo, com regras que os reconhecem 
sujeitos titulares de direitos, não necessariamente os mesmo direitos dos adultos, 
mas outros, mais específicos, que se compadeciam de suas vulnerabilidades. 
 
A nossa primeira legislação dedicada exclusivamente à pessoa de menor idade (até 
21 anos, então) foi o Código de Menores de 1927, também denominado de Código 
Mello de Mattos, instituído pelo Decreto Federal 17 943-A, de 12 de outubro de 
1927, que, embora guardasse resquícios da legislação anterior (como a permissão 
para o trabalho de crianças maiores de 12 anos — art. 101, por exemplo), continha 
alguns elementos que se inspiravam em recentes documentos internacionais 
vigentes na ocasião, como a Declaração de Genebra, de 1924, que já estabelecia “a 
necessidade de proporcionar à criança uma proteção especial”. 
 
O referido Código ainda fundava-se na teoria do discernimento e na aplicação de 
processos repressivos, remanescentes do Brasil imperial, em vez da adoção de 
medidas socioeducativas (CARVALHO, 1977). Além de ser uma legislação de 
cunho autoritário, para Janine Borges Soares,(2006), simbolizava a intenção de 
controle das crianças e jovens, constituindo mecanismo de intervenção sobre a 
população pobre. Nesse momento constrói-se a categoria do “menor”, que, ainda, 
segundo a autora , referia-se à infância pobre e potencialmente perigosa, diferente 
do restante da infância. 
 
Muito embora se constituísse o Código de 1927 numa legislação autoritária, 
contemplava um aspecto relevante, na época, para a criança e o adolescente, 
consistente na possibilidade de intervenção do Estado no seio da família, para 
proteger os menores dos excessos e maltratos dos pais, como se constata do seu 
art. 26, VII e respectivas alíneas: 
 
 
Art. 26 – Consideram-se abandonados os menores de 18 annos: 
30 
 
VII, que, devido à crueldade, abuso de autoridade, negligência ou 
exploração dos Paes, tutor ou encarregado de sua guarda, sejam: 
a) victimas de máos tratos physicos habituaes ou castigos 
immoderados; 
b) privados habitualmente dos alimentos ou dos cuidados indispensáveis 
à saúde; 
c) empregados em ocupações prohibidas ou manifestamente contrarias 
à moral e aos bons costumes, ou que lhe ponham em risco a vida ou a 
saúde; 
d) excitados habitualmente para a gatunice, mendicidade ou 
libertinagem; 
 
 
Com o advento do novo Código de Menores, de 1979, o Brasil adotou a “Doutrina 
Jurídica da Situação Irregular”, mas essa legislação apresentava-se defasada em 
face de documentos internacionais (Convenção Americana sobre Direitos Humanos, 
de 1969) e de outras legislações estrangeiras. Esse Código, nos termos do seu art. 
1º, I, dispunha sobre a assistência, proteção e vigilância de menores que se 
encontrassem em situação irregular, isto é, praticantes de atos que infringissem, 
sobretudo, as leis criminais. Eis o teor do dispositivo: 
 
 
Art. 1º - Este Código dispõe sobre a assistência, proteção e vigilância de 
menores: 
I – até 18 (dezoito) anos de idade, que se encontrem em situação irregular. 
 
 
Em algumas situações, o referido Código de Menores estabelecia, relativamente aos 
processos judiciais, mecanismos que submetiam crianças e adolescentes ao mesmo 
tratamento dos adultos, em vez de legislar de modo diferenciado e específico a 
proteção infanto-juvenil. No seu art. 84, por exemplo, determina aquele diploma: 
 
 
Art. 84. A jurisdição de menores será exercida, em cada Comarca, por Juiz 
a quem se atribuam as garantias constitucionais da magistratura, 
especializado ou não, e, em segundo grau, pelo Conselho da Magistratura 
ou órgão Judiciário equivalente, conforme dispuser a Lei de Organização 
Judiciária. 
 
 
Jurisdição, como se sabe, é atribuição do Estado ao qual, através do juiz, cabe 
dirimir os conflitos interpessoais mediante aplicação impositiva do Direito, na busca 
do ideal de paz social. A jurisdição de menores representa, então, a atuação do 
31 
 
Estado para solucionar os conflitos de interesses que envolvam crianças e 
adolescentes e, como tal, seria mais efetiva se aplicada, diferentemente do que 
preconizou o Código, apenas por juízes especializados, com conhecimento apurado 
na área de sua competência, até porque, a Convenção Americana sobre Direitos 
Humanos já exortava, antecedentemente àquele Código, medidas diferenciadas, 
com jurisdição especializada, para o tratamento da criança e do adolescente, com 
vistas à sua proteção integral, pela família, pela sociedade e pelo Estado. Nos seus 
arts. 5º, V, e 19 a citada Convenção estatuía: 
 
 
Art. 5º - Direito à integridade pessoal: 
V – Os menores, quando puderem ser processados, devem ser separados 
dos adultos e conduzidos a um tribunal especializado, com a maior rapidez 
possível, para seu tratamento. 
Art. 19 – Direitos da CriançaToda criança terá direito às medidas de proteção que a sua condição de 
menor requer, por parte de sua família, da sociedade e do Estado. 
 
 
Márcio Marques (2000, p. 468) bem discorre sobre o período de vigência do Código 
de Menores no Brasil: 
 
 
No Brasil, o Código de Menores foi o instrumento mais poderoso na 
consolidação da chamada doutrina da situação irregular, esta instituída com 
foco estigmatizante, no mais das vezes, por se referir quase sempre àquele 
infanto-juvenil em situação de desajuste familiar, por questões 
principalmente de ordem econômica, alcançando notadamente meninas e 
meninos habitantes de rua, adictos ou de qualquer forma marginalizados, 
excluindo-os ainda mais do gozo dos direitos e garantias que teriam, se 
adultos fossem. 
O ‘paternalismo’ das instâncias com ações voltadas às crianças e 
adolescentes traduzia uma perspectiva de que a criança e o adolescente 
somente seriam conhecidos como objetos de medidas de proteção, em uma 
perspectiva tutelar, pelo que sua dimensão ôntica, como pessoa em 
desenvolvimento, era substituída por uma condição de receptor da prática 
assistencialista, como benesse, e, portanto, sem considerar seus direitos à 
convivência familiar e comunitária, à opinião, ao respeito e à dignidade. 
 
 
Esses são movimentos que a sociedade brasileira experimenta e vivencia até o 
advento da Constituição de 1988, diploma que significou um marco para o 
tratamento jurídico da criança e adolescente. 
32 
 
2. DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DO MELHOR INTERESSE DO MENOR: UM 
SUJEITO DE DIREITO. 
 
 
No decorrer do século XX, surgem documentos internacionais de defesa dos direitos 
humanos, como a Declaração de Genebra, de 1924, que passam a propugnar pela 
“necessidade de proclamar à criança uma proteção especial”. O mesmo teor é 
ratificado pela Declaração Universal de Direitos Humanos, das Nações Unidas, de 
1948. Entretanto, só com a Declaração Universal de Direitos da Criança, de 1959, é 
que o menor passa a ser alvo de destaque como titular de direitos que preservam 
sua integridade como ser humano em sua completude, conforme exorta o seu 
Segundo Princípio: 
 
 
A criança gozará de proteção especial e disporá de oportunidade e serviços, 
a serem estabelecidos em lei por outros meios, de modo que possa 
desenvolver-se física, mental, moral, espiritual e socialmente de forma 
saudável e normal, assim como em condições de liberdade e dignidade. Ao 
promulgar leis com este fim, a consideração fundamental a que se atenderá 
será o interesse superior da criança. 
 
 
Há um aspecto interessante: a Declaração Universal de Direitos da Criança destaca, 
pela primeira vez, num documento internacional voltado para os interesses da 
criança, a inserção da afetividade como direito seu e elemento essencial para a 
formação da sua personalidade. Neste sentido, o Sexto Princípio enuncia: 
 
 
A criança necessita de amor e compreensão, para o desenvolvimento pleno 
e harmonioso de sua personalidade; sempre que possível, deverá crescer 
com o amparo e sob a responsabilidade de seus pais, mas, em qualquer 
caso, em um ambiente de afeto e segurança moral e material; salvo 
circunstâncias excepcionais, não se deverá separar a criança de tenra idade 
de sua mãe. A sociedade e as autoridades públicas terão a obrigação de 
cuidar especialmente do menor abandonado ou daqueles que careçam de 
meios adequados de subsistência. Convém que se concedam subsídios 
governamentais, ou de outra espécie, para a manutenção dos filhos de 
famílias numerosas. 
 
 
33 
 
Vai-se desenhando, assim, nos textos legais, por volta de meados do século 
passado, o reconhecimento da criança como pessoa necessitada de cuidados 
especiais; um ser humano que é peculiar por sua própria condição de estar em 
desenvolvimento. Alguém que merece ser tratado com proteção compatível com a 
sua circunstância de ser hipossuficiente diante das demais pessoas. 
 
Em termos de eficácia dos documentos internacionais — vale esclarecer —, as 
Declarações contêm princípios que, embora possam inspirar as legislações dos 
países, não têm, todavia, caráter de obrigatoriedade para impor aos Estados que 
adotem e que cumpram o quanto nelas se contém. Somente as Convenções 
dispõem de regras que, adaptáveis às circunstâncias culturais de cada povo, devem 
ser recepcionadas e obedecidas pelas legislações dos chamados Estados-partes. 
Os países signatários de tratados internacionais se obrigam, através de suas 
próprias leis, a dar seguimento àquilo que prescrevem as Convenções. 
 
Em 1969, a Convenção Americana de Direitos Humanos, referendada pelo Pacto de 
São José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário, dispôs, em seu art. 19, que 
“toda criança tem direito às medidas de proteção que sua condição de menor requer, 
por parte da família, da sociedade e do Estado”, diante do que os países partícipes 
daquele Pacto obrigaram-se a reproduzir, em seus textos legais, dispositivos que 
assegurassem a proteção integral capitulada na citada Convenção. 
 
Com atenção voltada exclusivamente para a criança, a Assembléia Geral das 
Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989, após um longo período de dez anos 
de discussões e amadurecimento de teses e propostas, aprova a sua Resolução nº 
L.44 e assim promulga o documento político-jurídico de grande relevância prática: a 
Convenção Internacional dos Direitos da Criança, a qual, no seu art. 3º, dispõe 
expressamente que “todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por 
instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades 
administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o 
interesse maior da criança”. 
 
Mais especificamente, com relação à garantia do direito de convivência familiar, 
prerrogativa da criança que se espraia nos ordenamentos jurídicos contemporâneos, 
34 
 
aquela Convenção enuncia regras que impõem aos Estados-partes o dever de 
proporcionar, naquilo que for de suas competências, o convívio entre pais e filhos, 
como se vê do seu art. 9���
�
 
Art. 9º. 
1. Os Estados-partes deverão zelar para que a criança não seja separada 
dos pais contra a vontade dos mesmos, exceto quando, sujeita à 
revisão judicial, as autoridades competentes determinarem, em 
conformidade com a lei e com os procedimentos legais cabíveis, que tal 
separação é necessária ao interesse maior da criança. Tal 
determinação pode ser necessária em casos específicos, por exemplo, 
nos casos em que a criança sofre maus-tratos ou descuidos por parte 
de seus pais ou quando estes vivem separados e uma decisão deve ser 
tomada a respeito do local da residência da criança. 
2. Caso seja adotado qualquer procedimento em conformidade com o 
estipulado no parágrafo primeiro do presente artigo, todas as partes 
interessadas terão a oportunidade de participar e de manifestar suas 
opiniões. 
3. Os Estados-partes respeitarão o direito da criança que esteja separada 
de um ou de ambos os pais de manter regularmente relações pessoais 
e contato direto com ambos, a menos que isso seja contrário ao 
interesse da criança. 
 
 
Incrementam-se, por todo o mundo, a partir da segunda metade do século XX, as 
manifestações da sociedade, reveladas em textos legais, que indicam a necessidade 
de se disponibilizar mecanismos que dêem efetividade aos direitos que crianças e 
adolescentes foram vagarosamente conquistando a partir dos séculos XVIII e XIX. 
 
Já na fase final que antecedeu sua elaboração e mesmo antes de ter sido 
promulgada, a Convenção Internacional dos Direitos da Criança trouxe significativa e 
determinante influência para Constituição brasileira de 1988 e, posteriormente, para 
o próprio ECA — Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069, de 13 de julho de 
1990. Essa influência não se dásó pela obrigação protocolar diplomática do Brasil 
em referendar os ditames de uma Convenção que subscreve, mas responde 
também aos anseios da sociedade brasileira que também pugna pela criação e 
execução de políticas protetivas infantis. 
 
Nesse sentido, a Constituição Federal brasileira estabelece em seu art. 227 que: 
 
 
35 
 
Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança 
e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à 
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à 
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, 
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, 
exploração, violência, crueldade e opressão. 
 
 
De igual modo, o ECA, que define como criança “a pessoa com até doze anos de 
idade incompletos, e adolescente, aquela entre doze e dezoito anos de idade” (art. 
2º), estabelece normas protetivas que desdobram e regulamentam o enunciado pelo 
art. 227, da Constituição e pela Convenção Internacional dos Direitos da Criança, , 
com ênfase no contido em seus arts.1º, 4º e 5º: 
 
 
Art. 1º - Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao 
adolescente 
Art. 4º - É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do 
Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos 
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, 
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à 
convivência familiar e comunitária. 
Art. 5º - Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de 
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, 
punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus 
direitos fundamentais. 
 
 
Mais especificamente, com relação à guarda de menores no pós-separação, o 
Código Civil manifesta regra protetiva dos filhos, em seu art. 1 583, § 1º (redação da 
Lei 11..698/08), ao estabelecer a responsabilidade conjunta dos pais, dispondo que 
“compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores, ou a 
alguém que o substitua (art. 1.584, § 5º) e, por guarda compartilhada, a 
responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres, do pai e da mãe, que 
não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns”. 
 
É por intermédio da Constituição Federal de 1988, que o Brasil, enfim, chancela a 
“Doutrina da Proteção Integral”, o que só se fez possível em face de um longo 
processo evolutivo da sociedade brasileira em derredor das questões que envolvem 
a criança e o adolescente. A família é conduzida para a Constituição em meio a 
debates, na sociedade e no Congresso constituinte, envolvendo entidades 
representativas dos interesses dos menores, das mulheres, parlamentares, juristas, 
36 
 
governo, judiciário, órgãos de classe, igrejas, etc.. Acolhiam-se também, assim, as 
orientações emanadas da Convenção Americana de Direitos Humanos (de 1969) e 
as teses e princípios que logo seriam referendadas pela Convenção Internacional 
dos Direitos da Criança de 1989. 
 
O significado que a Constituição trouxe e trará para a família, e em particular para 
seus filhos menores, é algo que deve ser vivenciado e avaliado pela própria 
sociedade, com o passar do tempo. A letra da Lei, por si só, não é muito; pouco ou 
nada pode significar, se não for interpretada e aplicada com o sentido, no particular, 
de salvaguardar os interesses da criança e do adolescente. A Lei não basta por si 
mesma. Eros Grau (2006, p. 27; p. 82) enfatiza: 
 
 
Compreender é algo existencial, consubstanciando, destarte, experiência. O 
que se compreende, no caso da interpretação do direito, é algo — um 
‘objeto’ — que não pode ser conhecido independentemente de um ‘sujeito’. 
As disposições, os enunciados, os textos, nada dizem; somente passam a 
dizer algo quando efetivamente convertidos em normas (isto é, quando – 
através e mediante a interpretação – são transformados em normas). Por 
isso as normas resultam da interpretação, e podemos dizer que elas, 
enquanto disposições, nada dizem – elas dizem o que os intérpretes dizem 
que elas dizem. 
 
 
Não obstante, a Carta constitucional de 1988 representa um avanço. A criança e o 
adolescente que, desde os tempos mais remotos, foram tratados como objeto 
passivo de manipulação, passam a ser, com a promulgação da Constituição, sujeitos 
titulares de direitos fundamentais, que são um conjunto de direitos e garantias 
outorgados ao ser humano para protegê-lo do arbítrio de quem quer que seja, 
preservando sua integridade como pessoa e estabelecendo condições mínimas para 
viver e se desenvolver, tais como: o direito à vida, à dignidade, à honra, à liberdade, 
à igualdade social, à nacionalidade, à fraternidade, ao meio ambiente equilibrado, 
etc. 
 
Tal como os adultos, os menores incorporam uma série de possibilidades, 
prerrogativas e necessidades juridicamente protegidas. Porém, mais que os adultos, 
são alvo de proteção especial, dada a sua condição singular de pessoa em 
desenvolvimento, que os fazem mais frágeis e, portanto, destinatários de tratamento 
37 
 
desigual como tentativa de equalizá-los, em sua hipossuficiência, diante do restante 
da sociedade. A proteção integral é, em verdade, uma manifestação do princípio da 
isonomia de que fala a Constituição da República (art. 5º, caput17) e que proporciona 
igualdade de tratamento a todas as pessoas, independentemente de idade, credo, 
sexo, etnia, etc.. Proteção do menor que se realiza em duas mãos: de um lado, 
devem crianças e adolescentes, ser protegidos pela própria família, sociedade e 
Estado e, do outro, serem protegidas das omissões ou excessos da própria família, 
da sociedade e do Estado. A proteção integral está contida num conjunto de normas 
jurídicas que tanto exorta a família, sociedade e Estado a guarnecerem o menor, 
como, também,, reprime os atos desses mesmos agentes que possam ser-lhes 
prejudicial. Aliás, o ECA é bastante incisivo neste sentido: 
 
 
Art. 98 – As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis 
sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou 
violados: 
I — por ação ou omissão da sociedade ou do Estado 
II — por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; 
 
 
Embora seja esse jovem, no campo das relações jurídicas, uma pessoa incapaz ou 
relativamente incapaz para exercer, por si mesmo, os atos da vida civil em sua 
plenitude, conforme limita o Código Civil, necessitando, pois, enquanto menor, de 
representação ou assistência de seus pais ou curadores para casar, vender, 
transacionar, renunciar, etc. isto não se lhe retira a titularidade de direitos que lhe 
seja específica, a fim de que possa exercer a sua cidadania no quadrante que lhe for 
possível como pessoa em construção de si própria. Gomes da Costa (1990, p. 39) 
acentua que, não obstante a sua incapacidade para os atos da vida jurídica, a 
condição de peculiar desenvolvimento do menor 
 
 
Não pode ser definida apenas a partir do que a criança não sabe, não tem 
condições e não é capaz. Cada fase do desenvolvimento deve ser 
reconhecida como revestida de singularidade e de completude relativa, ou 
seja, a criança e o adolescente não são seres inacabados, a caminho de 
uma plenitude a ser consumada na idade adulta, enquanto portadora de 
 
17
 Art. 5º, caput, da CF: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos 
brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à 
segurança e à propriedade,[...] 
38 
 
responsabilidades pessoais, cívicas e produtivas plenas. Cada etapa é, à

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