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Esquizofrenia - Aplicação do processo de enfermagem - Por: Prof. Msc. Mauricio Oliveira Avaliação dos dados de background Na primeira etapa do processo de enfermagem, a enfermeira reúne um banco de dados a partir do qual os diagnósticos de enfermagem são derivados e um plano de cuidados é formulado. Esta primeira etapa do processo de enfermagem é extremamente importante porque, sem uma avaliação precisa, a identificação do problema, os objetivos dos cuidados e os critérios de resultados não podem ser determinados com precisão. A avaliação do cliente com esquizofrenia pode ser um processo complexo, com base em informações reunidas de inúmeras fontes. Os clientes em um episódio agudo da doença raramente são capazes de fazer uma contribuição significativa para a sua história. Os dados podem ser obtidos a partir de membros da família, se possível, de registros antigos, se disponíveis, ou de outros indivíduos que estiverem em condições de relatar sobre a progressão do comportamento do cliente. A enfermeira deve estar familiarizada com comportamentos comuns relativos ao distúrbio para serem capazes de obter uma avaliação adequada do cliente com esquizofrenia. Os sintomas de esquizofrenia são comumente descritos como positivos ou negativos. Os sintomas positivos tendem a refletir um excesso ou distorção das funções normais, enquanto sintomas negativos refletem uma diminuição ou perda das funções normais (APA, 2000). A maioria dos clientes apresenta uma mistura de ambos os tipos de sintomas. Os sintomas positivos estão associados a estruturas normais do cérebro na tomografia computadorizada (TC) e respostas relativamente boas ao tratamento. Em relação aos sintomas negativos, Ho et al. (2003) afirmaram: “Não apenas *eles+ são difíceis de tratar e respondem bem menos aos neurolépticos que os sintomas positivos, mas eles também são os mais destrutivos, pois tornam o paciente inerte e desmotivado” (p. 386). raisa_000 Highlight raisa_000 Highlight Os distúrbios comportamentais são classificados como positivos ou negativos e são considerados em oito áreas de funcionamento: conteúdo do pensamento, tipo de pensamento, percepção, afeto, senso de si, vontade, comprometimento do funcionamento interpessoal e relacionamento com o mundo externo e do comportamento psicomotor. Um resumo dos sintomas positivos e negativos é apresentado no Boxe 26.1. Outros comprometimentos fora dos limites dessas oito áreas também são apresentados. ■ Sintomas positivos Conteúdo do pensamento Delírios Os delírios são falsas crenças pessoais que são incompatíveis com a inteligência ou nível cultural da pessoa. O indivíduo continua a acreditar apesar de provas evidentes de que é falso ou irracional. Os delírios são subdivididos de acordo com seu conteúdo. Alguns dos mais comuns estão listados aqui. Delírio de perseguição. O indivíduo sente-se ameaçado e acredita que os outros pretendem prejudicálo ou persegui-lo de alguma maneira (p. ex., “A polícia “colocou uma escuta” no meu quarto e tem a intenção de me matar”; “Eu não posso tomar um banho neste banheiro; as enfermeiras colocaram uma câmera lá dentro para que possam ver tudo o que eu faço”) ■ Delírio de grandeza. O indivíduo tem um sentimento exagerado de importância, poder, conhecimento ou identidade (p. ex.,”Sou Jesus Cristo”) ■ Delírio de referência. Todos os eventos dentro do ambiente são referidos pela pessoa psicótica a si própria (p. ex., “Alguém está tentando me trazer uma mensagem por meio dos artigos desta revista [ou jornal ou programa de TV]; eu tenho de desvendar o código para que possa receber a mensagem”). Ideias de referência são menos rígidas do que os delírios de referência. Um exemplo de uma ideia de referência é o pensamento irracional de que estão falando ou rindo de alguém raisa_000 Sticky Note Lembrar do exemplo do " motel delírios" serve como um lugar que pode ou não acontecer determinada "coisa" diferentemente de alucinação. raisa_000 Highlight ■ Delírio de controle ou influência. O indivíduo acredita que determinados objetos ou pessoas têm controle sobre seu comportamento (p. ex., “O dentista colocou uma restauração no meu dente; eu agora recebo transmissões por meio da restauração que controlam o que eu penso e faço”) ■ Delírio somático. O indivíduo tem uma falsa ideia sobre o funcionamento do seu corpo (p. ex., “Tenho 70 anos e serei a pessoa mais velha a dar à luz. O médico disse que eu não estou grávida, mas eu sei que estou”) ■ Delírio niilista. O indivíduo tem uma falsa ideia de que o eu, uma parte do eu, os outros ou o mundo é inexistente (p. ex., “O mundo não existe mais”; “Eu não tenho coração”). Religiosidade A religiosidade é uma demonstração excessiva ou obsessão por ideias e comportamento religiosos. Pelo fato de os indivíduos variarem grandemente suas crenças religiosas e o nível de comprometimento espiritual, frequentemente é difícil avaliar a religiosidade. O indivíduo com esquizofrenia pode usar ideias religiosas em uma tentativa de fornecer significado racional e estrutura para seu comportamento. A preocupação religiosa nessa linha pode, portanto, ser considerada uma manifestação da doença. No entanto os clientes que tiram conforto de suas crenças religiosas não devem ser desencorajados a empregar este meio de apoio. Um exemplo de religiosidade é o indivíduo que acredita que a voz que ele ouve é Deus e procura incessantemente a Bíblia para interpretação. Paranoia Os indivíduos com paranoia têm extrema desconfiança dos outros e de suas ações ou intenções percebidas (p. ex., “Eu não vou comer essa comida. Eu sei que ela foi envenenada”). Pensamento mágico Com o pensamento mágico, a pessoa acredita que seus pensamentos ou comportamentos exercem controle sobre situações ou pessoas específicas (p. ex., a mãe, que acreditava que, se ela repreendesse seu filho de qualquer maneira, ele seria levado dela). O pensamento mágico é comum em crianças (p. ex., “Está chovendo; o céu estátriste”; “Nevou na noite passada porque eu quis muito muito que nevasse”). raisa_000 Highlight Tipo de pensamento Associação frouxa de ideias O pensamento caracteriza-se pelo discurso no qual as ideias mudam de um assunto não relacionado para outro. Com a associação frouxa de ideias, o indivíduo não sabe que os temas não estão conectados. Quando a condição é grave, o discurso pode ser incoerente (p. ex., “Nós queríamos pegar o ônibus, mas o aeroporto atrapalhou todo o tráfego. A passagem é dirigir quando você quer ir a algum lugar. Ninguém precisa de passagem para o paraíso. Temos tudo em nossos bolsos”). Neologismos A pessoa psicótica inventa novas palavras ou neologismos, que não têm significado para outras pessoas, mas têm significado simbólico para si (p. ex., “Ela queria me dar uma carona no seu uniprorum novo”). Pensamento concreto A concretude, ou interpretação literal do ambiente, representa uma regressão a um nível anterior de desenvolvimento cognitivo. O pensamento abstrato é muito difícil. Por exemplo, o cliente com esquizofrenia teria grande dificuldade em descrever o significado abstrato de dizeres como “Estou subindo pelas paredes” ou “Está chovendo canivete”. Associações auditivas A escolha das palavras é governada por sons. As associações auditivas frequentemente são rimas, como, por exemplo, “Está muito frio. Estou com frio e calafrio. O rio está bravio”. Salada de palavras A salada de palavras é um grupo de palavras que são colocadas juntas aleatoriamente, sem qualquer conexão lógica (p. ex., “A maioria da ação adiante cresce vida dupla tem círculo uniforme”). Circunstancialidade Com circunstancialidade o indivíduo demorapara atingir o ponto de uma comunicação devido a detalhes desnecessários e entediantes. O ponto ou meta é normalmente alcançado, mas apenas com inúmeras interrupções do entrevistador para manter a pessoa no caminho do tema a ser discutido. Tangencialidade A tangencialidade difere da circunstancialidade, pois a pessoa nunca realmente chega ao ponto da comunicação. Tópicos não relacionados são apresentados e o foco da discussão original é perdido. Mutismo O mutismo é a incapacidade ou a recusa de um indivíduo a falar. Perseveração O indivíduo que apresenta perseveração persistentemente repete a mesma palavra ou ideia em resposta a perguntas diferentes. Percepção Alucinações As alucinações ou falsas percepções sensoriais não associadas, como estímulos externos reais, podem envolver qualquer um dos cinco sentidos. Tipos de alucinações incluem o seguinte: ■ Auditiva. As alucinações auditivas são falsas percepções de som. Mais comumente são de vozes, mas o indivíduo pode relatar cliques, ruídos apressados, música e outros sons. ■ As alucinações de comando podem colocar o indivíduo ou outros em uma situação potencialmente perigosa. “Vozes” que emitem comandos para a violência a si ou a outros podem ou não ser atendidas pela pessoa psicótica. As alucinações auditivas são o tipo mais comum nos transtornos psiquiátricos ■ Visual. Essas são percepções visuais falsas. Elas podem consistir em imagens formadas, como de pessoas, ou imagens não formadas, como clarões de luz ■ Tátil. Alucinações táteis são falsas percepções do sentido do tato, muitas vezes de algo sobre ou sob a pele. Uma alucinação tátil específica é o formigamento, a sensação de que algo está rastejando sobre ou sob a pele ■ Gustativa. Este tipo é uma falsa percepção de paladar. Mais comumente, as alucinações gustativas são descritas como gostos desagradáveis ■ Olfatória. Alucinações olfatórias são falsas percepções do sentido do olfato raisa_000 Highlight Ilusões Ilusões são equívocos ou interpretações erradas dos estímulos externos reais. Senso de si O senso de si descreve a singularidade e a individualidade que uma pessoa sente. Devido a limites do ego extremamente fracos, o indivíduo com esquizofrenia não tem esse sentimento de singularidade e experimenta uma grande confusão sobre sua identidade. Ecolalia O cliente com esquizofrenia pode repetir as palavras que ouve, o que é chamado de ecolalia. Esta é uma tentativa de se identificar com a pessoa que fala. (Por exemplo, o enfermeiro diz: “John, é hora do almoço”. O cliente pode responder: “É hora do almoço, é hora do almoço” ou, algumas vezes, “Almoço, almoço, almoço, almoço”). Ecopraxia O cliente que apresenta ecopraxia pode imitar sem intenção os movimentos feitos por outras pessoas. Identificação e imitação A identificação, que ocorre em um nível inconsciente, e a imitação, que acontece em um nível consciente, são mecanismos de defesa do ego utilizados pelos indivíduos com esquizofrenia e refletem sua confusão com relação a sua autoidentidade. Pelo fato de terem dificuldade para saber onde terminam seus limites finais do ego e onde começam os de outra pessoa, seu comportamento frequentemente assume a forma daquilo que eles veem na outra pessoa. Despersonalização A autoidentidade instável de um indivíduo com esquizofrenia pode levar a sentimentos de irrealidade (p. ex., sentir que suas extremidades mudaram de tamanho; ou uma sensação de ver-se a distância). ■ Sintomas negativos Afeto O afeto descreve o comportamento associado a um estado de sentimento de um indivíduo ou tom emocional. Afeto inadequado O afeto é inadequado quando o tom emocional do indivíduo é incongruente com as circunstâncias (p. ex., uma mulher jovem que ri quando alguém fala da morte de sua mãe). Afeto brando ou embotado O afeto é descrito como brando quando o tônus emocional é muito fraco. O indivíduo com afeto embotado parece ser desprovido de tônus emocional (ou expressão evidente de sentimentos). Apatia O cliente com esquizofrenia geralmente demonstra uma indiferença ou desinteresse pelo ambiente. O afeto brando ou embotado é uma manifestação da apatia emocional. Vontade O comprometimento da vontade tem a ver com a incapacidade de iniciar uma atividade dirigida para uma meta. No indivíduo com esquizofrenia, isso pode assumir o modo inadequado de interesse, motivação ou capacidade de escolher um curso lógico de ação em uma determinada situação. Ambivalência emocional A ambivalência no cliente com esquizofrenia refere-se à coexistência de emoções opostas em relação ao mesmo objeto, pessoa ou situação. Essas emoções opostas podem interferir na habilidade da pessoa para tomar até mesmo uma decisão muito simples (p. ex., se toma café ou chá no almoço). Subjacente à ambivalência está a dificuldade que o cliente com esquizofrenia tem de atender a uma relação humana satisfatória. Essa dificuldade baseia-se no dilema necessidade- medo – a necessidade simultânea por e o medo de intimidade. raisa_000 Highlight Comprometimento do funcionamento interpessoal e relação com o mundo externo Alguns clientes com esquizofrenia aguda agarram-se a outros e invadem o espaço dos outros, exibindo comportamentos que não são social e culturalmente aceitáveis. O comprometimento do funcionamento social também pode se refletir em isolamento social, distanciamento emocional e ausência de consideração pelas convenções sociais. Autismo O autismo descreve a condição criada pela pessoa com esquizofrenia que se volta para dentro em um mundo de fantasia, enquanto distorce ou exclui o ambiente externo. Aparência deteriorada Atividades de asseio pessoal e autocuidado podem ser negligenciadas. O cliente com esquizofrenia pode aparecer descabelado e desarrumado e precisar ser lembrado da necessidade de higiene pessoal. Comportamento psicomotor Anergia Anergia é uma deficiência de energia. O indivíduo com esquizofrenia pode não ter energia suficiente para realizar atividades da vida diária ou para interagir com os outros. Flexibilidade cérea A flexibilidade cérea descreve uma condição em que o cliente com esquizofrenia possibilita que partes do corpo sejam colocadas em posições bizarras ou desconfortáveis. Uma vez posicionado, o braço, a perna ou a cabeça permanece nessa posição por longos períodos, independentemente de quão desconfortável seja para o cliente. Por exemplo, a enfermeira posiciona o braço do cliente em uma posição voltada para fora a fim de realizar uma medição da pressão arterial. Quando o manguito é removido, o cliente mantém o braço na posição em que foi colocado para efetuar a leitura. Postura Este sintoma manifesta-se pela adoção voluntária de posturas inadequadas ou bizarras. Andar e balanço O andar para frente e para trás e o balançar o corpo (um balanço lento, rítmico, para frente e para trás do tronco a partir dos quadris, geralmente raisa_000 Highlight raisa_000 Sticky Note Todo autista é esquizofrênico ou vice e versa ? enquanto sentado) são comportamentos psicomotores comuns do cliente com esquizofrenia. Características associadas Anedonia Anedonia é a incapacidade de sentir prazer. Esse é um sintoma particularmente angustiante que leva alguns clientes a tentar o suicídio. Regressão A regressão é o recuo a um nível anterior do desenvolvimento. A regressão, um mecanismo de defesa primário da esquizofrenia, é uma tentativa disfuncional de reduzir a ansiedade. Fornece a base para muitos dos comportamentos associados à esquizofrenia. ▶ Identificação do diagnóstico/resultado Usando informações coletadas durante a avaliação, a enfermeiracompleta a base de dados do cliente, a partir da qual a seleção de diagnósticos de enfermagem adequados é determinada. ■ Critérios de resultado Os seguintes critérios podem ser usados para a mensuração dos resultados no cuidado do cliente com esquizofrenia. O Cliente ■ Demonstra capacidade de se relacionar de maneira satisfatória com os outros ■ Reconhece as distorções da realidade ■ Não causou lesão a si próprio nem aos outros ■ Percebe o eu de maneira realista ■ Demonstra capacidade de perceber o ambiente corretamente ■ Mantém a ansiedade em um nível administrável raisa_000 Highlight ■ Abandona a necessidade de delírios e alucinações. ■ Demonstra capacidade de confiar nos outros ■ Usa a comunicação verbal apropriada na interação com outros ■ Realiza atividades de autocuidado independentemente. RECOMENDAÇÕES: Use a dúvida razoável como uma técnica terapêutica: “Entendo que você acredita que isso é verdade, mas eu pessoalmente acho difícil de aceitar”. Não reforce a alucinação. Use “as vozes” em vez de palavras como “eles”, que implicam validação. Deixe o cliente saber que você não compartilha a percepção. Diga: “Mesmo que eu compreenda que as vozes são reais para você, eu não ouço nenhuma voz”. É importante que a enfermeira seja honesta e o cliente deve aceitar a percepção como irreal antes que as alucinações possam ser eliminadas. Intervenha ao primeiro sinal de aumento da ansiedade, agitação ou agressão verbal ou comportamental. Ofereça resposta empática aos sentimentos do cliente: “Você parece ansioso (ou frustrado, ou com raiva) sobre esta situação”. “Como posso ajudar?”. A validação dos sentimentos do cliente transmite uma atitude solidária e oferecer assistência reforça a confiança. Tente decodificar padrões de comunicação incompreensíveis. Procure validação e explicitação afirmando: “É isso que você quer dizer...?” ou “Eu não entendo o que você quer dizer com isso. Você poderia, por favor, explicar-me?”. Estas técnicas revelam ao cliente como ele está sendo percebido pelos outros e a responsabilidade pela não compreensão é aceita pela enfermeira. Fale de maneira simples e clara com palavras que não possam ser mal interpretadas. Exemplo: “pegue a colher, coloque um pouco de purê de batatas nela e coloque na boca”. raisa_000 Highlight
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