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A compra e venda é o mais importante dos contratos e a origem de quase todo o direito das obrigações, bem como de quase todo o direito comercial 10. Na sua caracterização jurídica, diz a doutrina 11 que este contrato é:
 a ) Sinalagmático ou bilateral perfeito, uma vez que gera obrigações recíprocas: para o comprador a de pagar o preço em dinheiro; para o vendedor, a de transferir o domínio de certa coisa. Se não existisse a reciprocidade de obrigações haveria uma doação ou uma dação em pagamento. Esta característica faz com que as obrigações se entrelacem de tal modo que a execução da prestação de um dos contraentes é causa do adimplemento da do outro.
 b) Em regra, consensual, em oposição aos contratos reais, porque se aperfeiçoa com o acordo de vontades, independentemente da entrega da coisa, consoante dispõe o art. 482 do Código Civil, verbis: “A compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço”. Forma-se, portanto, solo consensu. Em certos casos, todavia, tem caráter solene quando, além do consentimento, a lei exige uma forma para a sua celebração, como sucede na compra e venda de imóveis, em que a lei reclama a escritura pública (CC, art. 108) e registro.
 c ) Oneroso, pois ambos os contratantes obtêm proveito, ao qual corresponde um sacrifício (para um, pagamento do preço e recebimento da coisa; para outro, entrega do bem e recebimento do pagamento). Faz-se, destarte, por interesse e utilidade recíproca de ambas as partes.
 d) Em regra, comutativo, porque de imediato se apresenta certo o conteúdo das prestações recíprocas. As prestações são certas e as partes podem antever as vantagens e os sacrifícios, que geralmente se equivalem, malgrado se transforme em aleatório quando tem por objeto coisas futuras ou coisas existentes, mas sujeitas a risco.
Elementos da compra e venda
 O contrato de compra e venda, pela sua própria natureza, exige, como elementos integrantes, a coisa, o preço e o consentimento (res, pretium et consensus). Por se tratar da espécie de contrato mais utilizada no comércio jurídico e na convivência social, a lei procura facilitar a sua celebração, simplificando-a. O art. 482 do Código Civil, retrotranscrito, nessa ordem, a considera obrigatória e perfeita, desde que as partes acordem no objeto e no preço. 
Quando se fala em elementos essenciais da compra e venda deve-se ter em vista a sua natureza específica, a par dos elementos constitutivos em geral, comum a todos eles, como requisitos de existência e de validade.
 Malgrado a observação de Eduardo Espínola,de que aos elementos coisa, preço e consentimento acrescenta-se um quarto requisito, a forma, que é exigida na compra de bens imóveis, não é o último requisito, todavia, essencial na generalidade dos casos e, por essa razão, não retira da compra e venda o genérico caráter consensual.
O CONCENTIMENTO 
O consentimento pressupõe a capacidade das partes para vender e comprar e deve ser livre e espontâneo, sob pena de anulabilidade, bem como recair sobre os outros dois elementos: a coisa e o preço.
Será anulável a venda, também, se houver erro sobre o objeto principal da declaração ou sobre as suas qualidades essenciais (CC, art. 139). Não existe venda se o vendedor julga estar alienando uma coisa e o comprador acredita estar adquirindo objeto diferente. No erro sobre o objeto principal, o consentimento recai sobre objeto diverso daquele que o agente tinha em mente. Exemplo: o do indivíduo que se propõe a alugar a sua casa da cidade e o outro contratante entende tratar-se de sua casa de campo.
Ocorre erro sobre as qualidades essenciais do objeto quando o motivo determinante do consentimento é a suposição de que este possui determinada qualidade que, posteriormente, se verifica inexistir, como no caso da pessoa que adquire um quadro por alto preço, na persuasão de se tratar de original quando não passa de cópia. Somente não vicia a manifestação da vontade o erro acidental, de somenos importância, que não acarreta prejuízo.
Não basta a capacidade genérica para os atos da vida civil. Para vender exige-se também a específica para alienar, pois o cumprimento da obrigação de entregar a coisa pressupõe o poder de disposição do vendedor. No tocante ao comprador, basta a capacidade de obrigar-se.
As incapacidades genéricas dos arts. 3º e 4º do Código Civil não impedem, todavia, que os seus portadores realizem toda sorte de negócios jurídicos, especialmente os de compra e venda, porque podem ser supridas pela representação e pela assistência e pela autorização do juiz (CC, arts. 1.634, V, 1.691, 1.748 e 1.774).
Em muitos casos, a lei impõe restrição específica à liberdade de comprar e vender, atuando a limitação como hipótese de falta de legitimação. Assim, por exemplo, é anulável a venda de ascendente a descendente, sem que os demais descendentes e o cônjuge expressamente o consintam (CC, art. 496).
O art. 497 do Código Civil, por sua vez, impõe restrições à aquisição de bens por tutores, curadores, testamenteiros e outras pessoas, encarregadas de zelar pelo interesse dos vendedores. Ainda, pendente estado de indivisão, o condômino não pode vender a sua parte a estranho, se outro consorte a quiser, tanto por tanto (CC, art. 504); é vedada a compra e venda entre marido e mulher que tenha por objeto bem que integre a comunhão (art. 499); não pode o cônjuge, sem a anuência do outro, exceto quando o regime do casamento é o da separação absoluta de bens, celebrar contrato de compra e venda que tenha por objeto imóvel de qualquer valor (art. 1.647, I) etc.
Não tem sido exigido o requisito do consenso na compra e venda feita por incapazes, especialmente quando estes adquirem produtos no mercado de consumo para sua utilização pessoal. A doutrina tem enquadrado esses fatos negociais como relações contratuais de fato ou como condutas sociais típicas, que independem de vontade real ou tácita e de capacidade negocial das partes, em razão do irrefreável processo de massificação social
Assim, por exemplo, não se considera nula a compra de um doce ou sorvete feita por uma criança de sete ou oito anos de idade, malgrado não tenha ela capacidade para emitir a vontade qualificada que se exige nos contratos de compra e venda. Em se tratando de ato dotado de ampla aceitação social, deve ser enquadrado na noção de ato-fato jurídico, que a lei encara como fato, sem levar em consideração a vontade, a intenção ou a consciência.
O PRECO
O preço é o segundo elemento essencial da compra e venda. Sem a sua fixação, a venda é nula (sine pretio nulla venditio, dizia Ulpiano) 15. É determinado, em regra, pelo livre debate entre os contraentes, conforme as leis do mercado, sendo por isso denominado preço convencional. Mas, se não for desde logo determinado, deve ser ao menos determinável, mediante critérios objetivos estabelecidos pelos próprios contratantes.
O art. 486 do Código Civil permite que se deixe “a fixação do preço à taxa do mercado ou de bolsa, em certo e determinado lugar” 16. Se a cotação variar no mesmo dia escolhido, “tomar-se-á por base a média nessa data, caso as partes não tenham convencionado de forma diversa, por aplicação analógica do parágrafo único do art. 488 do Código”
Vários outros modos de determinação futura do preço podem ser escolhidos pelos contraentes: o preço do custo, o preço em vigor no dia da expedição, a melhor oferta, o preço do costume etc. O que não se admite é a indeterminação absoluta, como na cláusula “pagarás o que quiseres”, deixando ao arbítrio do comprador a taxação do preço. O art. 489 a declara nula, por potestativa.
Permite a lei que a fixação do preço seja “deixada ao arbítrio de terceiro, que os contratantes logo designarem ou prometerem designar. Se o terceiro não aceitar a incumbência, ficará sem efeito o contrato, salvo quando acordarem designar outra pessoa” (CC, art. 485). O terceiro age como mandatário destes, não se exigindo capacidade especial. Não é ele propriamente um avaliador da coisa, mas um árbitro escolhidopelos interessados.
Se as partes expressamente convencionarem submeter-se ao preço fixado por terceiro que escolherem, implicitamente renunciam ao direito de impugnar o laudo que este apresentar. Não têm o direito de repudiar a sua estimativa, que se torna obrigatória 19. Todavia, o preço não poderá ser desarrazoado, contrário às legítimas expectativas dos contratantes ou em desarmonia com as circunstâncias que devam ser levadas em conta 20 . Embora a estimação feita pelo terceiro não possa ser reduzida, é ressalvado a qualquer dos contratantes o direito de demandar a nulidade do contrato por dolo
O terceiro escolhido de comum acordo pelas partes levará em conta, ao fixar o preço, o valor atual da coisa, que é o contemporâneo da estimativa e não o da data da celebração da avença, salvo estipulação dos contraentes em contrário.
O preço pode ser fixado, também, “em função de índices ou parâmetros, desde que suscetíveis de objetiva determinação” (CC, art. 487). Índices são os indicadores de cálculo da variação de preços e valores de determinados conjuntos de bens. A inflação tem provocado a criação de índices de atualização monetária, que podem ser adotados pelos contratantes. Parâmetros são referenciais que servem como indicativos de custo de vida ou de inflação. Paulo Luiz Netto Lôbo dá o seguinte exemplo, para explicar o seu significado: “o contrato de compra e venda de derivados de petróleo pode ter como parâmetro a variação do preço do petróleo no mercado nacional”
Na sequência, aduz o mencionado autor que, se “as partes contratantes não definem o índice ou o parâmetro que serão aplicáveis, fazendo referência apenas a sua atualização de valor ou à correção monetária em geral, compete ao juiz defini-los dentre os que são calculados por entidades oficiais e que sejam mais pertinentes às finalidades do contrato”
Pode ser convencionada, ainda, “a venda sem fixação de preço ou de critérios para a sua determinação”, entendendo-se que, nesse caso, “as partes se sujeitaram ao preço corrente nas vendas habituais do vendedor”, se não houver tabelamento oficial (art. 488). Complementa o parágrafo único: “Na falta de acordo, por ter havido diversidade de preço, prevalecerá o termo médio”
O dispositivo mencionado, inovação do Código de 2002, constitui outra hipótese de determinabilidade do preço da coisa, a partir de comportamentos habituais dos contraentes. Busca preservar a avença nos casos de ausência de fixação expressa do preço, suprindo a omissão pela adoção do preço corrente nos negócios frequentemente celebrados pelo vendedor. A norma tem caráter supletivo, somente incidindo nos casos em que não houver manifestação expressa.
Se houver tabelamento oficial, afastada fica a manifestação de vontade expressa ou tácita das partes na fixação do preço, por se tratar de norma cogente. Enquanto aquele perdurar, não se poderá entender que as partes se sujeitaram ao preço corrente nas vendas habituais do vendedor. O que sobejar ao valor tabelado estará eivado de nulidade.
A norma em apreço veio atenuar o rigor do entendimento de que, sem a fixação do preço, a venda é nula. Não o será se for possível considerar, pela intenção negocial demonstrada, manifestação tácita no sentido de sujeição das partes ao preço corrente nas vendas habituais do vendedor. A expressão “vendas habituais do vendedor” não significa que o preço será estabelecido unilateralmente por ele no caso concreto, mas o que costuma constar de seus catálogos ou tabelas ou ofertas ao público. O preço corrente deve representar a média aferida pelo conjunto das transações realizadas.
O preço deve ser pago “em dinheiro”, como prescreve o art. 481, in fine, do Código Civil ou redutível a dinheiro, subentendendo-se válido o pagamento efetuado por meio de título de crédito, do qual conste o montante em dinheiro estipulado. Se for pago mediante a entrega de algum objeto, teremos contrato de troca ou permuta; se mediante prestação de serviços, o contrato será inominado.
Quando o pagamento é estipulado parte em dinheiro e parte em outra espécie, a configuração do contrato como compra e venda ou como troca é definida pela predominância de uma ou de outra porcentagem. Se mais da metade do preço for paga em dinheiro, haverá compra e venda. Se, porém, a maior parte do preço for paga em espécie, a compra e venda se transmudará em permuta. Essa distinção produz pouco efeito prático, pois o legislador determinou, em razão da semelhança existente entre ambas, que se aplicassem à troca todas as disposições relativas à compra e venda, com apenas duas modificações (CC, art. 533).
O preço deve ser, também, sério e real, correspondente ao valor da coisa, e não vil ou fictício. A venda de um edifício suntuoso pelo preço de R$ 1,00 constitui, na verdade, doação. Não se exige, contudo, exata correspondência entre o valor real e o preço pago, pois muitas pessoas preferem negociar o bem por preço abaixo do valor real para vendê-lo rapidamente. O que não pode haver é erro, ne m lesão, que se configura quando uma pessoa, sob premente necessidade ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da assumida pela outra parte (CC, arts. 138 e 157).
Quando consta do contrato que a venda é feita pelo justo preço, deve-se entender, segundo a doutrina, haver alusão ao preço normal ou, conforme o caso, ao corrente no mercado ou na Bolsa.
A COISA
O art. 481 do Código Civil refere-se a “certa coisa” como objeto da prestação do vendedor. No direito do consumidor, o vocábulo “coisa” foi substituído, na compra e venda decorrente de relação de consumo, por “produto”, significando “qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial” (CDC, art. 3º, § 1º). A coisa, objeto do contrato de compra e venda, deve atender a determinados requisitos, quais sejam, os de existência, individuação e disponibilidade.
EXISTENCIA DA COISA
É nula a venda de coisa inexistente. A lei se contenta, porém, com a existência potencial da coisa, como a safra futura, por exemplo, cuja venda se apresenta como condicional (emptio rei speratae) e se resolve se não vier a existir nenhuma quantidade, mas que se reputa perfeita desde a data da celebração com o implemento da condição (CC, art. 459). Outras vezes a venda de coisa futura se identifica como venda da esperança (emptio spei), válida como negócio jurídico e devido o preço, ainda que nada venha a existir, como dispõe o art. 458 do Código Civil (v. Dos contratos aleatórios, Capítulo VIII, n. 2, retro)
São suscetíveis de venda as coisas atuais e as futuras, corpóreas e incorpóreas. O art. 483 do novo diploma, que não tem correspondente no Código de 1916, admite expressamente que “a compra e venda pode ter por objeto coisa atual ou futura”, dispondo que, “neste caso, ficará sem efeito o contrato se esta não vier a existir, salvo se a intenção das partes era de concluir contrato aleatório”. A doutrina fornece vários exemplos de venda de coisa futura: a do bezerro da vaca prenhe, obrigando-se o alienante a transferir a propriedade após o nascimento provável; a do produto que está sendo fabricado em série pela indústria etc
Destaque-se que o critério legal estabelecido no dispositivo supratranscrito para se definir se o contrato é aleatório ou não é o da intenção das partes, a ser aferida em cada caso pelo juiz. Se for interpretado como comutativo, estará afastada toda a álea da futuridade, ficando assegurado ao comprador uma maior garantia contra os riscos de a coisa não vir a existir.
A venda de coisas incorpóreas, como o crédito e o direito à sucessão aberta, por exemplo, é denominada cessão (cessão de crédito, cessão de direitos hereditários). Mas é proibida a venda de herança de pessoa viva, pois constitui imoral pacto sucessório (CC, art. 426). Trata-se de preceito de ordem pública, com origem no direito romano, que considerava a modalidade verdadeiro votum mortis ou pacta corvina.
INDIVIDUALIZACAO DA COISA
O objeto da compra e venda há de ser determinado, ou suscetível de determinação no momento da execução,pois o contrato gera uma obrigação de dar, consistente em entregar, devendo incidir, pois, sobre coisa individuada. Admite-se a venda de coisa incerta, indicada ao menos pelo gênero e quantidade (CC, art. 243), que será determinada pela escolha, bem como a venda alternativa, cuja indeterminação cessa com a concentração (art. 252).
A coisa pode ser, portanto, específica, quando o objeto que se vende é precisamente determinado, ou genérica, quando é feita alusão ao gênero das coisas ou à sua quantidade, sem especificá-las (tantas sacas de café, sem precisar a sua qualidade, p. ex.). Admitese também a determinação por meio de comparação com a amostra, protótipo ou modelo exibido, entendendo-se, nesse caso, como se verá a seguir, no item 7.1, infra, “que o vendedor assegura ter a coisa as qualidades que a elas correspondem” (CC, art. 484).
Quando o contrato alude à quantidade da coisa, deve especificar o peso ou a medida. Não o fazendo, ou não sendo claro, “prevalece o que determinem os usos e costumes do lugar em que deva ser cumprido, inclusive quanto a pesos bruto e líquido, a embalagens e a critérios de medição, que nem sempre observam o sistema métrico decimal. As expressões ‘aproximadamente’ ou ‘cerca de’ deixam o vendedor com larga margem para atendê- las”.
DISPONIBILIDADE DA COISA
A coisa deve encontrar-se disponível, isto é, não estar fora do comércio. Consideram-se nesta situação as coisas insuscetíveis de apropriação (indisponibilidade natural) e as legalmente inalienáveis, sejam estas indisponíveis por força de lei (indisponibilidade legal) ou devido a cláusula de inalienabilidade colocada em doação ou testamento (indisponibilidade voluntária). São igualmente inalienáveis os valores e direitos da personalidade (CC, art. 11), bem como os órgãos do corpo humano (CF, art. 199, § 4º).
A disponibilidade alcança a coisa litigiosa, como se extrai do art. 457 do Código Civil, que impede o adquirente de demandar pela evicção se sabia da litigiosidade, quando adquiriu a coisa, pois assumiu voluntariamente o risco de o alienante sucumbir. Por sua vez, o art. 42 do Código de Processo Civil confirma a possibilidade de ser alienada coisa litigiosa. Embora a citação válida torne a coisa litigiosa (CPC, art. 219), tal fato, como visto, não impede a sua alienação.
Nem sempre, porém, a coisa in commercium pode ser transferida ao comprador. Não o pode a coisa alheia (venda a non domino), salvo se o adquirente estiver de boa-fé, e o alienante adquirir depois a propriedade. Nesse caso, considera-se realizada a transferência desde o momento em que ocorreu a tradição (CC, art. 1.268, § 1º). A eficácia da venda de coisa alheia depende de sua posterior revalidação pela superveniência do domínio. Se se admite a convalidação, a venda em princípio não é nula, mas anulável. Por outro lado, não pode ser transferida ao comprador, pelo aludido contrato, coisa que já lhe pertence. Ninguém pode adquirir o que já é seu, ainda que o desconheça (Suae rei emptio non valet, sive sciens, sive ignorans emi).
EFEITOS DA COMPRA E VENDA
5.1. Efeitos principais: geração de obrigações recíprocas e da responsabilidade pelos vícios redibitórios e pela evicção
 O s principais efeitos da compra e venda são: a) gerar obrigações recíprocas para os contratantes: para o vendedor, a de transferir o domínio de certa coisa, e para o comprador, a de pagarlhe certo preço em dinheiro (CC, art. 481); e b) acarretar a responsabilidade do vendedor pelos vícios redibitórios e pela evicção. Pode tal responsabilidade derivar também de outros contratos. Por essa razão, o nosso direito a disciplina na teoria geral dos contratos, diferentemente de alguns sistemas, que a inserem na dogmática da compra e venda, em face da íntima relação que mantém com o aludido contrato.
No direito brasileiro, como já foi dito, a compra e venda não é contrato translativo, pois o vendedor apenas promete transferir a posse e a propriedade ao adquirente. O contrato gera obrigações, mas não produz o efeito de transferir a propriedade. O vendedor não a transfere e, sim, promete transferir. Embora separados, os dois negócios jurídicos, ou seja, a compra e venda e o acordo de transmissão mediante a tradição ou a outorga da escritura pública, encontram-se entrelaçados. Quem vende um imóvel por escritura pública, preleciona Couto e Silva, não necessitará de outro ato ou de outra declaração de vontade para que possa ser realizado o registro, pois, na vontade de vender, está a vontade de adimplir, de transmitir, que, por si só, é suficiente para permitir o registro no albo imobiliário.
Assinala, por sua vez, Paulo Lôbo 29 que o nosso direito estabelece relação de causalidade entre o modo (transmissão da propriedade) e o título (contrato de compra e venda). Se este for invalidado, aquele também o será, por consequência. No direito alemão, distintamente, aduz, o modo é abstrato, não sendo contaminado pela invalidade ou ineficácia do contrato (título)..
O descumprimento da obrigação de transmitir o domínio (acordo de transmissão) mediante a tradição ou o registro caracteriza o inadimplemento, possibilitando a resolução do contrato do qual é oriunda, com o retorno das partes ao statu quo ante 30, podendo o adquirente optar pelo ajuizamento da ação de obrigação de fazer prevista no art. 466-B do Código de Processo Civil ou pela ação de adjudicação compulsória, conforme o caso.
A principal obrigação do vendedor, como visto, é a entrega da coisa ou tradição, que é o ato pelo qual se consuma a compra e venda. Não haverá compra e venda, como sublinha Cunha Gonçalves, se for feita com a cláusula de nunca se fazer a tradição.
A tradição pode ser real (ou efetiva), simbólica (ou virtual) e ficta (ou tácita). Real, quando envolve a entrega efetiva e material da coisa, ou seja, quando o comprador recebe a posse material, tendo a coisa nas suas mãos ou em seu poder. É a entrega propriamente dita. É simbólica a tradição quando representada por ato que traduz a alienação, como a entrega das chaves do apartamento vendido, ou de documentos concernentes à coisa, tais como conhecimento de carga, ordem de remessa, fatura ou qualquer outro que autorize a entrega 32. E é ficta, no caso do constituto possessório ou cláusula constituti, que se configura, por exemplo, quando o vendedor, transferindo a outrem o domínio da coisa, conserva-a todavia em seu poder, mas agora na qualidade de locatário.
A referida cláusula tem a finalidade de evitar complicações decorrentes de duas convenções, com duas entregas sucessivas. O novo Código Civil a adotou no parágrafo único do art. 1.267, segundo o qual a propriedade das coisas “não se transfere pelos negócios jurídicos antes da tradição”, mas esta se subentende “quando o transmitente continua a possuir pelo constituto possessório”.
EFEITOS SEGUNDARIOS ou SUBSIDIARIOS 
Outras consequências ou efeitos a compra e venda acarreta e que podem ser chamados de secundários ou subsidiários, destacandose os que seguem.
A RESPONSABILIDADE PELO RISCO
Até o momento da tradição dos móveis e o registro dos imóveis, a coisa pertence ao vendedor. Os riscos da coisa perecer ou se danificar, até esse momento, correm, portanto, por sua conta (res perit domino); e os do preço se perder, por conta do comprador. Preceitua, com efeito, o art. 492 do Código Civil:
“Até o momento da tradição, os riscos da coisa correm por conta do vendedor, e os do preço por conta do comprador”
Essa regra é uma consequência da vinculação do nosso Código ao sistema alemão. Se já houve a transferência do domínio, pela tradição ou pelo registro, quem sofre as consequências do perecimento é o comprador; e da perda do dinheiro, depois de pago, é o vendedor. Risco é o perigo que recai sobre a coisa objeto da prestação, de perecer ou deteriorar-se por caso fortuito ou força maior.
O § 1º do supratranscrito art. 492 prevê hipótese de tradição simbólica, ao proclamar que “os casos fortuitos, ocorrentes no ato de contar, marcar ou assinalar coisas ” e que “já tiverem sido postas à disposição do comprador,correrão por conta deste ”. Na compra e venda de gado, por exemplo, o comprador costuma contar, pesar e marcar os animais, ao retirá-los. Enquanto tais operações não forem feitas, não se pode considerar certa a coisa vendida, principalmente porque ainda se encontram na propriedade do vendedor. Mas se este os colocou à disposição do comprador, que os contou e marcou nessa mesma propriedade, os casos fortuitos ocorridos durante tais atos correrão por conta deste.
Outrossim, a coisa deve ser entregue, na falta de estipulação expressa, no local em que se encontrava ao tempo da venda, como proclama o art. 493 do Código Civil, verbis:
“A tradição da coisa vendida, na falta de estipulação expressa, dar- -se-á no lugar onde ela se encontrava, ao tempo da venda”
A norma é de caráter supletivo, pois os contraentes podem estipular o que quiserem a respeito do lugar onde deva ocorrer a tradição da coisa. A coisa móvel pode ter, assim, qualquer lugar para sua entrega ou tradição. Em regra, esse lugar é onde o contrato foi concluído. No caso de omissão ou dúvida incidirá a norma supratranscrita.
Como assevera Paulo Lôbo, nas hipóteses em que o comprador já tenha posse imediata da coisa que lhe foi vendida (p. ex., locação ou comodato), “a tradição é no lugar em que essa posse existe e o que se tem a receber é apenas a posse mediata, transferida pelo vendedor (chamada tradição brevi manu). Configurando-se o constituto possessório, a tradição se dá no endereço do vendedor, pois houve transferência da posse mediata para o comprador. Nas relações de consumo, na dúvida quanto ao local do contrato, prevalecerá o do contratante consumidor”.
Se a coisa for expedida “para lugar diverso” de onde se encontrava ao tempo da venda, “por ordem do comprador, por sua conta correrão os riscos”, uma vez entregue à transportadora indicada, porque houve tradição, “salvo se das instruções dele se afastar o vendedor”, remetendo-a por meio diverso do solicitado, como dispõe o art. 494 do estatuto civil, porque, assim procedendo, age como mandatário infiel. Não se escusará, como esclarece Caio Mário, “com a alegação de que procurou ser útil ao comprador mediante a adoção de meio mais eficiente e mais rápido, como o transporte aéreo em vez do terrestre, por exemplo, porque não se trata de apurar uma possível intenção de bem servir. Deixando de seguir as instruções do comprador, tomou a si o risco da coisa até sua efetiva entrega, e, desta sorte, a pessoa que a transportou deixa de ser um representante do adquirente. A tradição fica, pois, adiada até a chegada ao destino.
Quando o comprador está em mora de receber a coisa adquirida, “colocada à sua disposição” conforme ajustado, os riscos correrão por sua conta (CC, art. 492, § 2º). A mora accipiendi traz como consequência, pois, a inversão do risco, sem que tenha havido a tradição. Mesmo que a coisa “venha a desaparecer, por motivo de caso fortuito, e estando em poder do vendedor, poderá este exigir o preço.
A distribuição dos riscos entre o vendedor e o comprador no comércio internacional de mercadorias, envolvendo o transporte, é definida nas cláusulas ou termos comerciais (Incoterms) regulados pela Câmara de Comércio Internacional, que foram comentados no final do item 1, retro.
REPARTICAO DE DISPESAS 
Dispõe o art. 490 do Código Civil:
“Salvo cláusula em contrário, ficarão as despesas de escritura e registro a cargo do comprador, e a cargo do vendedor as da tradição”.
Pode, no entanto, em face do princípio da autonomia da vontade, ser adotada outra solução, de comum acordo, carreando, por exemplo, ao vendedor todos os ônus, inclusive o de arcar com o pagamento das despesas da própria escritura e registro
Despesas da tradição são as efetuadas com o transporte da coisa e sua entrega no domicílio do comprador, ou outro lugar por ele indicado. Pode ser convencionado que incumbe ao adquirente retirá- la no endereço do vendedor, fornecer embalagem mais segura ou veículo adequado para o seu transporte. A norma supratranscrita incidirá na falta de cláusula expressa.
O direito de reter a coisa ou o preço;
Na compra e venda à vista, as obrigações são recíprocas e simultâneas. Mas cabe ao comprador o primeiro passo: pagar o preço. Antes disso, o vendedor não é obrigado a entregar a coisa, podendo retê-la, ou negar-se a assinar a escritura definitiva, até que o comprador satisfaça a sua parte. É o que estatui o art. 491 do Código Civil, verbis:
Não sendo a venda a crédito, o vendedor não é obrigado a entregar a coisa antes de receber o preço”
Se o vendedor não está em condições de entregar a coisa, deve o comprador se precaver, consignando o preço. Por outro lado, como observa Enneccerus, tem o comprador, salvo pacto em contrário, o dever, suscetível de ser exigido por ação, de receber a coisa comprada, ou de retirá-la materialmente, liberando o vendedor; se não o faz, isto é, se não recebe a coisa que se lhe oferece devidamente, incorre não somente em mora accipiendi, mas também em mora debendi em relação ao seu dever de receber.
Sendo a venda a crédito, pode o vendedor sobrestar a entrega, se antes de tradição “o comprador cair em insolvência”, até obter dele “caução” de que pagará “no tempo ajustado” (CC, art. 495). Preceito semelhante consta do art. 477 do mesmo diploma, de caráter geral: “Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das partes contratantes diminuição em seu patrimônio capaz de comprometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou, pode a outra recusar-se à prestação que lhe incumbe, até que aquela satisfaça a que lhe compete ou dê garantia bastante de satisfazê-la”.
Tal dispositivo fala, porém, em diminuição do patrimônio do devedor, enquanto o art. 495, aplicável à compra e venda, mais rigoroso, exige que ele tenha caído em insolvência. Da mesma forma, e para que haja igualdade de tratamento das partes, se é o vendedor que se torna insolvente, pode o comprador reter o pagamento até que a coisa lhe seja entregue, ou prestada caução.
É importante a definição sobre qual das partes deve adimplir em primeiro lugar, como consta do art. 491 retrotranscrito, tendo em vista a possibilidade de utilização da exceção do contrato não cumprido (exceptio non adimpleti contratus). Proclama, efetivamente, o art. 476 do Código Civil que “nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro”. De acordo com o sistema adotado, o benefício da ordem é atribuído ao vendedor, que pode opor a exceção, enquanto não houver o pagamento do preço.
Se a venda for a prazo, todavia, não é lícito ao alienante condicionar sua prestação à do outro. A entrega, imediata ou não, não dependerá do pagamento integral do preço. Na hipótese versada, o vendedor entrega a coisa e o comprador assume a dívida, a ser paga nas datas e condições estabelecidas no contrato.
 Limitações à compra e venda 
Algumas pessoas sofrem limitações, decorrentes da falta de legitimação, em razão de determinadas circunstâncias ou da situação em que se encontram, que não se confundem com incapacidade. Só não podem vender ou comprar de certas pessoas. A lei, nessas hipóteses, não cogita de qualquer deficiência individual que constitua ou acarrete incapacidade genérica de agir. São pessoas maiores e dotadas de pleno discernimento, mas que, em face de sua posição na relação jurídica, isto é, por serem ascendentes, condôminos, tutores ou, ainda, cônjuges, ficam impedidas de comprar e vender até estarem devidamente legitimadas.
VENDAS ESPECIAIS
VENDA MEDIANTE AMOSTRA
Dispõe o art. 484 do Código Civil: “Se a venda se realizar à vista de amostras, protótipos ou modelos, entender-se-á que o vendedor assegura ter a coisa as qualidades que a elas correspondem”.
Amostra é o mesmo que paradigma. Constitui reprodução integral da coisa vendida, com suas qualidades e características, apresentada em tamanho normal ou reduzido. Se a mercadoria entregue não for em tudo igual à amostra, caracteriza-se o inadimplemento contratual, devendo o comprador protestar imediatamente,sob pena de o seu silêncio ser interpretado como tendo havido correta e definitiva entrega. Para acautelar-se, pode este requerer a vistoria da mercadoria, como medida preparatória da ação de resolução contratual, cumulada com perdas e danos, ou da ação para pedir abatimento do preço.
Acrescenta o parágrafo único do citado dispositivo, sem correspondente no Código de 1916, que “prevalece a amostra, o protótipo ou modelo, se houver contradição ou diferença com a maneira pela qual se descreveu a coisa no contrato”.
A regra tem relação com o dever de prestar informação adequada e suficiente ao comprador a respeito da mercadoria oferecida à venda, como corolário do princípio fundamental da boafé objetiva consagrado no art. 422 do Código Civil, comprometendo a responsabilidade contratual do alienante.
A amostra ou modelo é um meio prático e eficiente de evitar minuciosa descrição das características e qualidade da mercadoria ofertada, que fala muito melhor do que as próprias palavras, como bem destaca Washington de Barros Monteiro. Por isso, “há de ser em tudo igual à mercadoria que se vai entregar; se o vendedor não a entrega em perfeita correspondência com a amostra, protótipo ou modelo, pode o comprador recusá-la no ato do recebimento”.
Venda ad corpus e venda ad mensuram:
O art. 500 do Código Civil apresenta regra aplicável somente à compra e venda de imóveis: “Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida de extensão, ou se determinar a respectiva área, e esta não corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões dadas, o comprador terá o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço”.
Trata-se da venda ad mensuram, em que o preço é estipulado com base nas dimensões do imóvel (p. ex., tal preço por alqueire). A venda é ad mensuram, pois, quando se determina o preço de cada unidade, de cada alqueire, hectare ou metro quadrado. Se se verifica, em posterior medição, que a área não corresponde às dimensões dadas, tem o comprador o direito de exigir a sua complementação. Somente se esta não for possível (pois não se oferece uma tríplice alternativa), por não ter o vendedor área remanescente contígua, é que se abre para aquele a opção de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço.
A complementação de área é exigida por meio da ação ex empto ou ex vendito, de natureza pessoal, porque o que nela se pleiteia é o integral cumprimento do contrato, mediante a entrega de toda a área prometida. Não pode ser pleiteada a resolução da avença, ou abatimento no preço, se puder ser feita a complementação. Inexistente essa possibilidade, abre-se então a alternativa para o comprador: ajuizar a ação redibitória (actio redhibitoria) ou a estimatória (actio aestimatoria ou quanti minoris).
O novo Código Civil, como observa Ruy Rosado de Aguiar Júnior, deixou de prever a possibilidade de ser concedida a indenização, em lugar destas duas últimas alternativas, “uma vez que o prejuízo pode não justificar a extinção do contrato, nem ficar satisfeito com o abatimento proporcional do preço. Assim pode ocorrer, por exemplo, na venda de apartamento com área de estacionamento em dimensão insuficiente para o fim a que se destina”
Como também ocorre no caso de vícios redibitórios, “decai do direito” de propor as referidas ações, bem como a ex empto, o comprador que não o fizer no prazo decadencial “de um ano”, a contar, porém, “do registro do título”, e não da efetiva entrega da coisa (CC, art. 501). Se houver “atraso na imissão de posse no imóvel, atribuível ao alienante, a partir dela fluirá o prazo de decadência” (parágrafo único). A redução do prazo, como se vê, foi radical, pois era o das ações pessoais, de vinte anos, no Código de 1916, tendo agora sido igualado ao previsto para as ações edilícias no caso de vícios redibitórios de coisas imóveis (CC, art. 445).
As ações previstas para a hipótese de a área não corresponder às dimensões dadas, na venda ad mensuram, não se confundem com as ações edilícias por vício redibitório. Como assinala aresto do Superior Tribunal de Justiça, enquadra-se nesta última hipótese a entrega da coisa vendida em sua integralidade, mas apresentando vícios ou defeitos ocultos — o que não era o caso sub judice, porque se tratava de venda de apartamentos por uma construtora, com áreas menores do que a declarada. Porém, diz o acórdão, “quando a coisa é entregue em quantidade menor daquela declarada, o comprador pode acionar o vendedor pelo descumprimento do contrato, em razão da falta de parte do bem adquirido. Tratando-se de imóvel, incide a regra do art. 1.136 do Código Civil (de 1916, correspondente ao art. 500 do CC de 2002), e três são as alternativas a ele oferecidas, correspondentes à ação ex empto: a) pode exigir a complementação do que falta; b) não sendo isso possível, a rescisão do contrato, se a falta é suficientemente grave para determinar a perda do seu interesse em manter o negócio; c) pedir o abatimento do preço, ou a restituição do seu equivalente, se já pago”
Se em vez de falta houver excesso de área, “e o vendedor provar que tinha motivos para ignorar a medida exata da área vendida, caberá ao comprador, à sua escolha, completar o valor correspondente ao preço ou devolver o excesso”, sob pena de caracterizar-se o enriquecimento sem causa deste. Assim preceituam o Código Civil italiano e o novo Código Civil brasileiro (art. 500, § 2º).
É de se presumir, em princípio, que o alienante conhece a coisa que lhe pertence. Se a vendeu pelo preço estipulado, não pode atribuir ao adquirente uma complementação de preço injustificada, devendo a venda, para ele, ser considerada ad corpus. Ressalva-selhe, contudo, o direito de ilidir essa presunção, provando que tinha motivos para ignorar a medida exata da área vendida, igualmente no prazo decadencial de um ano, a contar do registro do título. O ônus, pois, de provar que apenas tomou conhecimento da diferença após a conclusão do contrato, é do vendedor. Neste caso, o direito de escolha das duas alternativas legais não cabe a ele, pois o legislador concedeu ao comprador o direito potestativo de completar o valor do preço, correspondente ao excesso, ou devolver a parte que excedeu do imóvel.
Na venda ad corpus a situação é diferente. O § 3º do citado art. 500 prescreve que “não haverá complemento de área, nem devolução de excesso, se o imóvel for vendido como coisa certa e discriminada, tendo sido apenas enunciativa a referência às suas dimensões, ainda que não conste, de modo expresso, ter sido a venda ad corpus”. Nessa espécie de venda o imóvel é adquirido como um todo, como corpo certo e determinado (p. ex., Chácara Palmeiras), caracterizado por suas confrontações, não tendo nenhuma influência na fixação do preço as suas dimensões. Presume-se que o comprador adquiriu a área pelo conjunto que lhe foi mostrado e não em atenção à área declarada. Certas circunstâncias, como a expressão “tantos alqueires mais ou menos”, a discriminação dos confrontantes e a de se tratar de imóvel urbano totalmente murado ou quase todo cercado, evidenciam que a venda foi ad corpus.
Não exige a lei, para que uma venda se caracterize como ad corpus, que o contrato o diga expressamente. O juiz, para decidir sobre sua natureza, se ad mensuram ou ad corpus, deve apurar a real intenção das partes, consultando o contrato. Não existindo declaração expressa, ou sendo esta dúbia, deverá o magistrado valer-se de elementos extraídos da descrição do imóvel, de sua finalidade econômica e até de indícios e presunções, que lhe “permitam inferir se o objeto da venda foi coisa certa ou foi uma área”.
Aduz o § 1º do mencionado dispositivo: “Presume-se que a referência às dimensões foi simplesmente enunciativa, quando a diferença encontrada não exceder de um vigésimo da área total enunciada, ressalvado ao comprador o direito de provar que, em tais circunstâncias, não teria realizado o negócio”. Um vigésimo corresponde a 5% da extensão total.Diferença tão pequena não justifica o litígio, salvo se foi convencionado o contrário. A presunção em questão é juris tantum: não prevalecerá quando comprovada intenção diversa das partes. O critério deve ser aplicado, assim, somente em casos de dúvida sobre a intenção das partes, não dirimida pela leitura do contrato.
Na venda ad corpus, compreensiva de corpo certo e individuado, presume-se que o comprador teve uma visão geral do imóvel e a intenção de adquirir precisamente o que se continha dentro de suas divisas. A referência à metragem ou à extensão é meramente acidental. O preço é global, pago pelo todo vistoriado. Feita nessas condições, a venda não outorga ao comprador direito de exigir complemento de área, nos termos do § 3º do art. 500 do Código Civil retrotranscrito.
Malgrado o aludido dispositivo legal, diferentemente do diploma de 1916, indique apenas a exclusão do complemento de área e a devolução do excesso, não se deve interpretá-lo de modo literal, mas sim de forma sistemática, no sentido de entender-se a referência a apenas duas pretensões como exemplificativa, não restringindo o alcance e a natureza da venda ad corpus, como propõe Paulo Luiz Netto Lôbo 80. Se se admitir que o comprador possa postular, nas vendas ad corpus, a resolução do contrato ou o abatimento do preço, não haverá diferença entre ela e a venda ad mensuram.

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