Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Capítulo # 9 INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS 9.1 Funções de duas variáveis 9.2 Funções de três variáveis 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 1 9.1 Funções de duas variáveis Chamamos função de duas variáveis a qualquer correspondência que associe a cada par ordenado de números reais, (x,y) ∈ Df ⊆ IR2, um único número real, z ∈ Cf ⊆ IR : O conjunto de partida, Df, é designado por domínio (de definição) da função f, e o conjunto de chegada, Cf, por contradomínio da mesma função. Os números x e y que constituem o par ordenado (x,y) dizem-se variáveis independentes ou argumentos da função f, enquanto que o número z = f(x,y) é designado por variável dependente, ou valor da função no “ponto” (x,y). 9.1.1 Tipos de domínios em IR2 Se escolhermos um sistema de coordenadas rectangulares Oxy no plano, é possível, em geral, representar graficamente o domínio Df de uma função de duas variáveis como sendo uma região bem definida desse plano. A curva plana que delimita essa região (se tal curva existir) chama-se fronteira do domínio Df . Os pontos situados na fronteira chamam-se pontos-fronteira, quer pertençam ou não a Df . CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 2 Os pontos de Df que não estejam situados sobre a fronteira são designados por pontos interiores do domínio. Se os pontos-fronteira pertencerem todos ao domínio Df, este diz-se fechado; caso contrário, o domínio dir-se-á aberto. Se a distância de qualquer ponto do domínio Df à origem das coordenadas for limitada superiormente, o domínio diz-se limitado; caso contrário, dir-se-á ilimitado. Muitos resultados importantes relativos a funções de duas variáveis são válidos para domínios que são simultaneamente fechados e limitados, designados em geral pelo nome de domínios compactos. No caso mais frequente, uma função de duas variáveis será definida por intermédio de uma fórmula ou expressão analítica, que nos permite calcular os valores da função se forem conhecidos os valores de x e de y. É costume chamar-se domínio natural de definição da função f(x,y) ao conjunto de todos os pares ordenados (x,y) para os quais a fórmula que é utilizada para definir a função faz sentido, isto é, “produz” apenas valores reais. Se nada for dito acerca do domínio de uma função f(x,y), subentende-se sempre que esse domínio é o domínio natural de definição associado à fórmula que é utilizada para definir essa função. Exemplo 9.1 Qual é o domínio natural de f(x,y) = � 16 − x2 − y2 ? 16 – x2 – y2 ≥ 0 ⇒ Df = {(x,y): x2 + y2 ≤ 16} Como toda a fronteira faz parte do domínio, é um domínio fechado e limitado, ou seja, é um domínio compacto. 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 3 Exemplo 9.2 Qual é o domínio natural de f(x,y) = � 1 16 − x2 − y2 ? 16 – x2 – y2 > 0 ⇒ Df = {(x,y): x2 + y2 < 16} Neste caso, temos um domínio aberto e limitado, já que a fronteira do domínio não faz parte do mesmo. Exemplo 9.3 Qual é o domínio natural de f(x,y) = � y x − y2 ? x – y2 > 0 ⇒ Df = {(x,y): x > y2} Este é um domínio aberto e ilimitado, constituído por todos os pontos para a direita da parábola com vértice na origem de equação x = y2: CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 4 9.1.2 Gráfico de uma função de duas variáveis Qualquer função de duas variáveis pode ser interpretada como sendo um conjunto de tripletos ordenados (x,y,z) de números reais, em que o par ordenado (x,y) ∈ Df e z = f(x,y). Se Oxyz for um sistema qualquer de coordenadas rectangulares no espaço a três dimensões, podemos associar a cada tripleto ordenado (x,y,z) um e um só ponto desse espaço. A totalidade desses pontos é aquilo a que chamamos o gráfico da função f(x,y) ou, o que é o mesmo, o gráfico da equação z = f(x,y). Em geral, esse gráfico será uma superfície no espaço a três dimensões. Em consequência da definição da função f(x,y), podemos afirmar que: • A projecção do gráfico de f(x,y) no plano Oxy é o domínio Df da referida função; • Se (x,y) ∈ Df, e se fizermos passar por esse ponto uma linha vertical, ela deverá intersectar o gráfico de f(x,y) num único ponto. 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 5 O gráfico da função f(x,y) = ax + by + c é o plano de equação z = ax + by + c Na figura junta, apenas se encontra representada a porção deste plano que está situada no 1º octante. O domínio natural desta função é o conjunto IR2. Embora o gráfico de uma função de duas variáveis seja, em geral, uma superfície no espaço a três dimensões, nem todas as superfícies são gráficos de uma única função de duas variáveis. É o caso, por exemplo, da superfície esférica de raio a centrada na origem, cuja equação é x2 + y2 + z2 = a2: O gráfico da função f(x,y) = � a2 − x2 − y2 , com a > 0 é a metade “superior” da superfície esférica de raio a centrada na origem, cuja equação é x2 + y2 + z2 = a2 A metade “inferior” desta superfície é o gráfico da função simétrica de f(x,y), ou seja, g(x,y) = – � a2 − x2 − y2 . O domínio natural destas funções é o conjunto {(x,y) ∈ IR2: x2 + y2 ≤ a2}. CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 6 O gráfico da função f(x,y) = � x2 + y2 é a folha “superior” da superfície cónica com vértice na origem e eixo de simetria Oz, cuja equação é z2 = x2 + y2 A folha “inferior” desta superfície é o gráfico da função simétrica de f(x,y), ou seja, g(x,y) = – � x2 + y2 . O domínio natural destas funções é o conjunto IR2. O gráfico da função f(x,y) = x2 + y2 é o parabolóide circular com vértice na origem e eixo de simetria Oz, cuja equação é z = x2 + y2 O domínio natural desta função é o conjunto IR2. 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 7 O gráfico da função f(x,y) = x2 – y2 é o parabolóide hiperbólico com “ponto de sela” na origem, eixo de simetria Oz e “abas para cima” na direcção de Ox, cuja equação é z = x2 – y2 O gráfico da função g(x,y) = y2 – x2 é semelhante ao apresentado, mas está rodado de 90º em torno de Oz. O domínio natural destas funções é o conjunto IR2. O gráfico da função f(x,y) = sen � x2 + y2 é a superfície de revolução que pode ser obtida rodando a curva z = sen x, com x ≥ 0 (ou z = sen y, com y ≥ 0), em torno do eixo Oz, e cuja equação é z = sen � x2 + y2 O domínio natural desta função é o conjunto IR2. Na figura junta, apenas se encontra representado o gráfico da função na restrição definida por x2 + y2 ≤ 4π2. CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 8 O gráfico da função f(x,y) = � 1 a + x2 + y2 , com a > 0 é a superfície de revolução obtida ao rodar a curva z = � 1 a + x2 , com x ≥ 0 (ou z = � 1 a + y2 , com y ≥ 0), em torno do eixo Oz, e cuja equaçãoé z = � 1 a + x2 + y2 Como por hipótese a ≠ 0, o domínio natural desta função é o conjunto IR2. O gráfico da função f(x,y) = x exp (– x2 – y2) é a superfície de equação z = x exp (– x2 – y2) O domínio natural desta função é o conjunto IR2. Na figura junta, apenas se encontra representado o gráfico desta função na restrição {(x,y): � x ≤ 2 ∧ � y ≤ 2}. 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 9 O gráfico da função f(x,y) = � a2 − x2 é a metade “superior” duma superfície cilíndrica circular paralela a Oy, cuja equação é: x2 + z2 = a2 A metade “inferior” desta superfície é o gráfico da função simétrica de f(x,y), ou seja, g(x,y) = – � a2 − x2 . O domínio natural destas funções é o conjunto {(x,y) ∈ IR2: � x ≤ a}. O gráfico da função f(x,y) = � x2 − a2 é a metade “superior” duma superfície cilíndrica hiperbólica paralela a Oy, cuja equação é: x2 – z2 = a2 A metade “inferior” desta superfície é o gráfico da função simétrica de f(x,y), ou seja, g(x,y) = – � x2 − a2 . O domínio natural destas funções é o conjunto {(x,y) ∈ IR2: � x ≥ a}. CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 10 O gráfico da função f(x,y) = � a2 + x2 é a metade “superior” duma superfície cilíndrica hiperbólica paralela a Oy, cuja equação é: z2 – x2 = a2 A metade “inferior” desta superfície é o gráfico da função simétrica de f(x,y), ou seja, g(x,y) = – � a2 + x2 . O domínio natural destas funções é o conjunto IR2. O gráfico da função f(x,y) = k x2 é uma superfície cilíndrica parabólica paralela a Oy, cuja equação é: z = k x2 O domínio natural desta função é o conjunto IR2. Nos quatro exemplos anteriores, se trocarmos x2 por y2 na expressão que define a função f(x,y), o gráfico sofre uma rotação de 90º em torno de Oz, passando a ser representado por uma superfície cilíndrica paralela a Ox. 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 11 9.1.3 Curvas de nível para funções de duas variáveis As curvas de nível são uma forma alternativa de representar geometricamente funções de duas variáveis. Como vimos, o gráfico de uma tal função é, em geral, uma superfície no espaço a três dimensões. Se intersectarmos essa superfície por um plano horizontal de equação z = k, obtemos uma curva situada sobre a superfície z = f(x,y), chamada curva de contorno do gráfico de f(x,y). À projecção vertical de cada curva de contorno sobre o plano Oxy chamamos curva de nível (de equação) f(x,y) = k da função f(x,y), ou seja: {(x,y) ∈ IR2: (x,y) ∈ Df ∧ f(x,y) = k} Curvas de contorno e correspondentes curvas de nível de uma função f(x,y) Exemplo 9.4 Escrever as equações das curvas de contorno e das curvas de nível da função f(x,y) = y2 – x2, e em seguida descrever essas curvas, e representar graficamente algumas delas. As curvas de contorno são as curvas do espaço a três dimensões representadas pelo par de equações simultâneas: � z = y2 − x2 z = k ⎧ ⎨ ⎪ ⎩ ⎪ , com k ∈ IR . CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 12 As curvas de nível são as curvas do plano Oxy representadas pelas equações: y2 – x2 = k, com k ∈ IR • se k < 0, as equações x2 – y2 = – k representam hipérboles equiláteras com centro em (0, 0), tendo o eixo Ox como eixo focal; • se k = 0, a equação y2 – x2 = 0 ⇒ y2 = x2 ⇒ y = x ∨ y = – x tem como gráfico um par de rectas (as bissectrizes dos quadrantes ímpares e dos quadrantes pares, respectivamente); • se k > 0, as equações y2 – x2 = k representam hipérboles equiláteras com centro em (0, 0), tendo o eixo Oy como eixo focal. Na figura seguinte estão representadas 7 curvas de nível de f(x,y), 3 para valores de k > 0, 3 para valores de k < 0, e ainda a curva correspondente a k = 0, que é o par de rectas que passa pela origem. Repare-se que o “ponto de sela” do gráfico da função f(x,y) = y2 – x2, que é a origem das coordenadas, corresponde a um ponto de auto-intersecção de uma curva de nível (neste caso, da curva de nível correspondente a k = 0): Exemplo 9.5 Escrever as equações das curvas de nível da função f(x,y) = = � 4 − x2 − y2 , e em seguida descrever essas curvas e representar graficamente algumas delas. 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 13 � 4 − x2 − y2 = k ⇒ x2 + y2 = 4 – k2, com 0 ≤ k ≤ 2 Estas equações representam uma família de circunferências centradas na origem, de raio � 4 − k2 , em que 0 ≤ k ≤ 2. Na figura seguinte estão representadas 5 curvas de nível de f(x,y), para k = {0; 0.5; 1; 1.5; 2}; a última destas circunferências reduz-se a um ponto (a origem): Exemplo 9.6 Escrever as equações das curvas de nível da função f(x,y) = = x2 + 2y2, e em seguida descrever essas curvas e representar graficamente algumas delas. x2 + 2y2 = k (k ≥ 0) ⇒ � x k ⎛ ⎝ ⎞ ⎠ 2 + y k /2 ⎛ ⎝ ⎞ ⎠ 2 = 1, se k > 0 (0, 0), se k = 0 ⎧ ⎨ ⎪ ⎪ ⎩ ⎪ ⎪ Estas equações representam uma família de elipses centradas na origem, de semieixos � k e � k /2 , em que k ≥ 0. CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 14 Na figura junta estão representadas 5 curvas de nível de f(x,y), para k = {0; 1; 2; 3; 4}; a primeira destas elipses reduz-se a um ponto (a origem): 9.1.4 Limite de uma função de duas variáveis 9.1.4.1 O conceito de limite de f(x,y) Dizemos que o número l é o limite de f(x,y) quando (x,y) tende para (a,b), e escrevemos que: � lim (x,y)→(a,b) f(x,y) = l se conseguirmos que f(x,y) se aproxime tanto quanto quisermos de l, bastando para que isso aconteça que (x,y) se aproxime suficientemente de (a,b), sem contudo igualar (a,b): 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 15 Repare-se que a função f(x,y) não precisa de estar definida no ponto (a,b) para que exista � lim (x,y)→(a,b) f(x,y); e, mesmo que a função esteja definida nesse ponto, o valor de f(a,b) não tem de coincidir com o valor do limite. Por outro lado, o percurso que o ponto (x,y) deve “percorrer” no plano Oxy ao aproximar-se do ponto (a,b) é arbitrário. Ao contrário do que acontece com funções de uma variável, para as quais só há dois percursos possíveis na aproximação ao ponto a (pela direita, e pela esquerda), quando lidamos com funções de duas variáveis temos de considerar uma infinidade de percursos possíveis na aproximação ao ponto (a,b). 9.1.4.2 Teoremas mais importantes sobre limites Os teoremas mais importantes sobre limites de funções de duas variáveis são extensões naturais dos resultados correspondentes para funções de uma variável. O teorema seguinte é o resultado básico que nos permite calcular limites de funções a partir dos limites conhecidos de funções mais simples: CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 16 Teorema: � lim(x,y)→(a,b) f(x,y) = l ∧ � lim (x,y)→(a,b) g(x,y) = m ⇒ ⇒ � lim (x,y)→(a,b) f(x,y) + g(x,y)( ) = l + m lim (x,y)→(a,b) f(x,y) .g(x,y)( ) = l .m lim (x,y)→(a,b) f(x,y) g(x,y) ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ = l m , se m ≠ 0 ⎧ ⎨ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎩ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ Se z = f(u) e u = g(x,y), dizemos que z é uma função composta de x e de y por intermédio de u, ou seja, z = f(g(x,y)) = h(x,y). O teorema seguinte permite-nos calcular o limite desta função composta se soubermos os limites (em pontos diferentes) das duas funções que intervêm na composição: Teorema: � lim (x,y)→(a,b) g(x,y) = m ∧ � lim x→m f(x) = f(m ) ⇒ ⇒ � lim (x,y)→(a,b) f(g(x,y)) = f � lim (x,y)→(a,b) g(x,y) ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ = f(m) Notar a restrição que é imposta à função f neste teorema, a qual corresponde a considerar que esta função é contínua no ponto m. Nestas condições, e só nestas condições, é válido “trocar a ordem dos símbolos f e � lim (x,y)→(a,b) ”. 9.1.4.3 Limites direccionais Salientemos novamente que, se existir � lim (x,y)→(a,b) f(x,y), então o valor obtido para este limite deve ser sempre o mesmo, qualquer que seja o percurso escolhido na aproximação ao ponto (a,b). Portanto, se conseguirmos encontrar um percurso para o qual o limite não possa ser calculado, ou se conseguirmos encontrar dois percursos que conduzam a dois valores diferentes para o referido limite, podemos concluir imediatamente que o limite da função não existe. 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 17 Para provar que o limite de uma função de duas variáveis não existe, recorremos em geral à técnica dos limites direccionais. No caso mais simples, os percursos utilizados são os percursos rectilíneos correspondentes ao “feixe” de rectas que passa pelo ponto (a,b), de equações paramétricas � x = a + p t y = b + q t ⎧ ⎨ ⎩ , em que t ∈ IR : Limites direccionais: (percursos rectilíneos) � lim (x,y)→(a,b) x = a + p t y = b + q t ⎧ ⎨ ⎩ f(x,y) = = � lim t→0 f(a + pt, b + qt) Teorema: � lim (x,y)→(a,b) f(x,y) = l ⇒ � lim (x,y)→(a,b) x = a + p t y = b + q t ⎧ ⎨ ⎩ f(x,y) = l , ∀p,q Ou seja, se o limite direccional depender de p e/ou de q, isto é, se depender do declive do percurso rectilíneo, podemos dizer que não existe � lim (x,y)→(a,b) f(x,y); porém, se o limite direccional assim calculado tiver um valor numérico que não dependa de p nem de q, nada podemos concluir acerca da existência do limite da função: apenas podemos afirmar que o limite, se existir, terá de ter esse valor. Se for conveniente, podemos utilizar percursos não-rectilíneos na aproximação ao ponto (a,b), como por exemplo a família de parábolas com eixo paralelo a Oy que passam por (a,b), que podem ser representadas quer pelas suas equações paramétricas � x = a + t y = b + k t2 ⎧ ⎨ ⎩ quer pela equação (y – b) = k (x – a)2. De facto, podemos utilizar qualquer outra curva suave ou família de curvas suaves que passe(m) pelo ponto (a,b) no plano Oxy como percurso(s) na aproximação ao ponto (a,b). CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 18 Sejam quais forem os percursos utilizados, importa salientar mais uma vez que este procedimento serve exclusivamente para mostrar que � lim (x,y)→(a,b) f(x,y) não existe, e nunca poderá ser utilizado para provar que este limite existe. Exemplo 9.7 Mostrar que � lim (x,y)→(0, 0) � x2 − y2 x2 + y2 não existe, pelo método dos limites direccionais (percursos rectilíneos). � lim (x,y)→(0, 0) x = p t y = q t ⎧ ⎨ ⎩ � x2 − y2 x2 + y2 = � lim t→0 � p2 t2 − q2 t2 p2 t2 + q2 t2 = � lim t→0 � t2 p2 − q2( ) t2 p2 + q2( ) = (porque t ≠ 0) = � lim t→0 � p2 − q2 p2 + q2 = � p2 − q2 p2 + q2 . Como o limite direccional depende dos valores de p e de q, isto é, depende do declive do percurso rectilíneo escolhido, o limite da função não pode existir. Exemplo 9.8 Mostrar que � lim (x,y)→(0, 0) � xy x2 + y2 não existe, pelo método dos limites direccionais (percursos rectilíneos). � lim (x,y)→(0, 0) x = p t y = q t ⎧ ⎨ ⎩ � xy x2 + y2 = � lim t→0 � (p t) (q t) p2 t2 + q2 t2 = � lim t→0 � t2 p q t2 p2 + q2( ) = (porque t ≠ 0) = � lim t→0 � p q p2 + q2 = � p q p2 + q2 . 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 19 Como o limite direccional depende dos valores de p e de q, isto é, depende do declive do percurso rectilíneo escolhido, o limite da função não pode existir. O aspecto do gráfico da função f(x,y) = � xy x2 + y2 na vizinhança da origem mostra claramente que os diversos percursos rectilíneos no plano Oxy passando pela origem produzem valores diferentes para os correspondentes limites direccionais. Na figura junta, estão assinalados os percursos correspondentes a p = q (a recta de equação y = x) e p = – q (a recta de equação y = – x); o limite direccional é igual a � 1 2 se p = q, e é igual a – � 1 2 se p = – q: 9.1.4.4 Cálculo de limites utilizando coordenadas polares Os limites de funções de duas variáveis em pontos de descontinuidade podem por vezes ser calculados utilizando uma mudança de variáveis apropriada. Em particular, a mudança para coordenadas polares, definida pelas equações simultâneas {x = r cos θ, y = r sen θ}, com r ≥ 0 e 0 ≤ θ < 2π, é especialmente útil quando estamos a tentar calcular � lim (x,y)→(0, 0) f(x,y), já que se tem: r = � x2 + y2 ≥ 0 ⇒ (x,y)→(0, 0) ⇔ r→0+ CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 20 e portanto o limite acima referido poderá ser calculado da seguinte maneira: � lim (x,y)→(0, 0) f(x,y) = � lim r→0+ f(r cos θ, r sen θ) = � lim r→0+ g(r,θ) Este último limite pode, em geral, ser calculado, se conseguirmos mostrar que ele é independente de θ, ou então se a própria função g(r,θ) não depender de θ. Exemplo 9.9 Mostre que � lim (x,y)→(0, 0) � xy x2 + y2 = 0, utilizando para o efeito coordenadas polares. � lim (x,y)→(0, 0) � xy x2 + y2 = � lim r→0+ � (r cos θ) (r sen θ) r = � lim r→0+ (r sen θ cos θ) = = � lim r→0+ (r) � lim r→0+ (sen θ cos θ) = 0 pois o 2º limite é sempre finito, independentemente da forma como θ varia com r na aproximação ao ponto (0, 0). Isto é assim porque, como sabemos, se tem � sen θ cos θ ≤ 1, ∀θ . Também é possível utilizar a mudança para coordenadas polares para provar que o limite de uma função de duas variáveis no ponto (0, 0) não existe: Exemplo 9.10 Mostre que � lim (x,y)→(0, 0) � xy x2 + y2 não existe, utilizando para o efeito coordenadas polares. � lim (x,y)→(0, 0) � xy x2 + y2 = � lim r→0+ � (r cos θ) (r sen θ) r2 = � lim r→0+ (sen θ cos θ) = (se θ for constante, isto é, se não depender de r) = sen θ cos θ = g(θ). 9.1 FUNÇÕES DE DUASVARIÁVEIS ________________________________________________________________ 21 Como obtivemos um valor diferente para cada valor de θ no intervalo [0, 2π], o limite da função não pode existir. 9.1.5 Continuidade de funções de duas variáveis Dizemos que a função f(x,y) é contínua no ponto (a,b) se existir o limite de f(x,y) quando (x,y) tende para (a,b) e esse limite for igual ao valor que f(x,y) assume no ponto (a,b): � lim (x,y)→(a,b) f(x,y) = f(a,b) Para a função f(x,y) poder ser contínua no ponto (a,b), tem de estar definida numa vizinhança desse ponto, e também no próprio ponto (a,b). Se o limite não existir, ou se f(a,b) não existir, ou se existirem ambos mas forem diferentes, a função f(x,y) dir-se-á descontínua no ponto (a,b). O resultado básico que nos permite decidir sobre a continuidade de funções a partir da continuidade conhecida de funções mais simples é o seguinte: Teorema: f(x,y) e g(x,y) são contínuas no ponto (a,b) ⇒ ⇒ � f(x,y) + g(x,y)[ ] é contínua no ponto (a,b) f(x,y) g(x,y)[ ] é contínua no ponto (a,b) f(x,y) g(x,y) ⎡ ⎣ ⎢ ⎤ ⎦ ⎥ é contínua no ponto (a,b), seg(a,b) ≠ 0 ⎧ ⎨ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎩ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ Frequentemente, uma função de duas variáveis pode ser escrita como o produto de uma função só de x por uma função só de y. É a este tipo de funções de duas variáveis que se refere o teorema seguinte: CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 22 Teorema: Se g(x) for contínua no ponto x = a e h(y) for contínua no ponto y = b, então f(x,y) = g(x) h(y) é contínua em (a,b). Como vimos atrás, quando z = f(u) e u = g(x,y), dizemos que z é uma função composta de x e de y por intermédio de u, ou seja, z = f(g(x,y)) = h(x,y). O teorema seguinte refere-se à continuidade desta função composta: Teorema: Se g(x,y) for contínua no ponto (a,b) e f(u) for contínua em u = g(a,b), então a função composta h(x,y) = f(g(x,y)) também é contínua em (a,b). Exemplo 9.11 A função h(x,y) = sen (3x2y5) é uma função contínua, ∀(x,y) ∈ IR2, porque g(x,y) = 3x2y5 é uma função polinomial, que é contínua ∀(x,y) ∈ IR2 , e porque a função f(u) = sen u também é contínua, ∀u ∈ IR . Uma função de duas variáveis f(x,y) diz-se contínua num domínio compacto (isto é, fechado e limitado), se for contínua em todos os pontos desse domínio (incluindo os pontos-fronteira). Uma função nestas condições tem as seguintes três propriedades importantes: • É limitada nesse domínio; • Assume um valor máximo e um valor mínimo algures nesse domínio; • Assume no mesmo domínio todos os valores intermédios entre o valor máximo e o valor mínimo. Estas três propriedades são o equivalente das correspondentes propriedades de uma função f(x) contínua num intervalo fechado [a,b]. Problemas propostos / Secção 9.1 1. Descreva por palavras de forma resumida o domínio natural das seguintes funções de duas variáveis: (a) f(x,y) = exp (– x2 – y2); 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 23 (b) f(x,y) = ln (x2 – y2 – 1); (c) f(x,y) = � 4 − x2 − y2 ; (d) f(x,y) = � x y x2 − y2 . 2. Descreva por palavras de forma resumida o gráfico das seguintes funções de duas variáveis: (a) f(x,y) = x + y; (b) f(x,y) = x2 + y2; (c) f(x,y) = � 4 − x2 − y2 ; (d) f(x,y) = 10 – � x2 + y2 . 3. Obtenha as equações das curvas de nível para cada uma das funções seguintes, e descreva essas curvas por palavras de forma resumida: (a) f(x,y) = y – x3; (b) f(x,y) = x2 + y2 – 6x + 4y + 7; (c) f(x,y) = exp (– x2 – y2); (d) f(x,y) = � 1 1 + x2 + y2 . 4. Calcule os seguintes limites de funções de duas variáveis, ou mostre que não existem: (a) � lim (x,y)→(0, 0) � x − y x2 + y2 ; (b) � lim (x,y)→(0, 0) � sen x2 + y2( ) x2 + y2 ; (c) � lim (x,y)→(0, 0) � x4 − y4 x2 + y2 ; (d) � lim (x,y)→(0, 0) � x y 3x2 + 2y2 ; (e) � lim (x,y)→(1, − 2) � sen (x − 1)2 + (y + 2)2( ) (x − 1)2 + (y + 2)2 ; CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 24 (f) � lim (x,y)→(− 3, 2) � (x + 3) (y − 2) (x + 3)2 + (y − 2)2 . 5. Mostre que � lim (x,y)→(0, 0) � x2 y x4 + y2 não existe, utilizando sucessivamente os percursos � x = p t y = q t ⎧ ⎨ ⎩ e y = x2 para o cálculo do limite indicado. 6. Prove que � lim (x,y)→(0, 0) � x3 y 2x6 + y2 não existe, utilizando sucessivamente os percursos � x = p t y = q t ⎧ ⎨ ⎩ , � x = t y = m t2 ⎧ ⎨ ⎩ e y = x3 para o cálculo do limite indicado. 7. Prove que � lim (x,y)→(0, 0) � x2 y2 x2 + y2 = 0 utilizando coordenadas polares. Soluções dos problemas propostos / Secção 9.1 1. (a) Df = IR2; (b) Df = {(x,y): x2 – y2 > 1}; (c) Df = {(x,y): x2 + y2 ≤ 4}; x2 – y2 > 1 x2 + y2 ≤ 4 (d) Df = {(x,y): y ≠ x ∧ y ≠ – x}. 9.1 FUNÇÕES DE DUAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 25 2. (a) Plano que passa pela origem; (b) Parabolóide circular com vértice em O e eixo de simetria Oz, em que z ≥ 0; (c) Semiesfera de raio 2 centrada na origem, com z ≥ 0; (d) Parte inferior de um cone circular com vértice em (0, 0, 10) e eixo de simetria Oz. 3. (a) y = x3 + k, com k ∈ IR : parábolas cúbicas com ponto de inflexão no eixo Oy; (b) (x – 3)2 + (y + 2)2 = k + 6, com k ≥ – 6: circunferências centradas em (3, – 2), de raio r = � k + 6 ; CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 26 (c) x2 + y2 = – ln k, com 0 < k ≤ 1: circunferências centradas na origem, de raio r = � − ln k ; (d) x2 + y2 = � 1 − k k , com 0 < k ≤ 1: circunferências centradas na origem, de raio r = � 1 − k k . 4. (a) Não existe limite; (b) 1; (c) 0; (d) Não existe limite; (e) 0; (f) Não existe limite. 5. 9.2 FUNÇÕES DE TRÊS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 27 9.2 Funções de três variáveis Chamamos função de três variáveis a qualquer lei de correspondência que associe a cada tripleto ordenado de números reais, (x,y,z) ∈ Df ⊆ IR3, um único número real, w ∈ Cf ⊆ IR : A terminologia utilizada para os domínios destas funções é análoga à que é utilizada para funções de duas variáveis. A fronteira do domínio Df, se existir, será constituída por superfícies e curvas no espaço a três dimensões. Exemplo 9.12 Qual é o domínio natural das funções de três variáveis: (a) f(x,y,z) = � 9 − x2 − y2 − z2 ; (b) f(x,y,z) = � x2 + y2 + z2 − 9 ? (a) 9 – x2 – y2 – z2 ≥ 0 ⇒ Df = {(x,y,z): x2 + y2 + z2 ≤ 9} O domínio natural é constituído pelos pontos da superfície esférica de equação x2 + y2 + z2 = 9, e por todos os pontos do espaço interiores a essa superfície: é um sólido esférico de raio 3 centrado no ponto (0,0,0). Como toda a fronteira faz parte do domínio, é um domínio fechado e limitado, ou seja, é um domínio compacto. CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 28 (b) x2 + y2 + z2 – 9 ≥ 0 ⇒ Df = {(x,y,z): x2 + y2 + z2 ≥ 9}O domínio natural é constituído pelos pontos da superfície esférica de equação x2 + y2 + z2 = 9, e por todos os pontos do espaço exteriores a essa superfície. Como toda a fronteira faz parte do domínio, é um domínio fechado e ilimitado. Para conseguirmos representar o gráfico de uma função de três variáveis, seriam necessárias quatro dimensões, três para as variáveis independentes (x,y,z) mais uma para a variável dependente w. Portanto, esta representação é claramente impossível, ao contrário do que acontece com as funções de duas variáveis. 9.2.1 Superfícies de nível para funções de três variáveis Como não é possível traçar o gráfico de uma função de três variáveis, utiliza-se como alternativa um conceito análogo ao das curvas de nível para funções de duas variáveis. De facto, se f(x,y,z) for uma função qualquer de três variáveis, e se k for uma constante, então uma equação da forma f(x,y,z) = k representa, em geral, uma superfície no espaço a três dimensões, para cada valor de k. Por analogia, designamos essa superfície pelo nome de superfície de nível f(x,y,z) = k da função f(x,y,z), ou seja: {(x,y,z) ∈ IR3: (x,y,z) ∈ Df ∧ f(x,y,z) = k} Nos casos mais simples, as superfícies de nível da função f(x,y,z) poderão ser visualizadas ou representadas graficamente, utilizando para o efeito uma projecção qualquer de um sistema de coordenadas rectangulares Oxyz. Exemplo 9.13 Obtenha as equações das superfícies de nível da função de três variáveis f(x,y,z) = x2 + y2 – z2, e descreva de forma resumida essas superfícies. As superfícies de nível de f(x,y,z) = x2 + y2 – z2 têm as seguintes equações: 9.2 FUNÇÕES DE TRÊS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 29 x2 + y2 – z2 = k, com k ∈ IR • se k > 0, vem � x k ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ 2 + y k ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ 2 − z k ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ 2 = 1: é a equação de uma família de hiperbolóides circulares de uma folha centrados na origem, que têm o eixo Oz como eixo principal de simetria; • se k = 0, obtém-se x2 + y2 – z2 = 0, ou z2 = x2 + y2: é a equação de um cone circular centrado na origem, que tem o eixo Oz como eixo principal de simetria; • se k < 0, vem � x − k ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ 2 + y − k ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ 2 − z − k ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ 2 = − 1: é a equação de uma família de hiperbolóides circulares de duas folhas centrados na origem, que têm o eixo Oz como eixo principal de simetria. Na figura seguinte, estão representadas três destas superfícies (k = – 1; 0; 1): CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 30 9.2.2 Limite de uma função de três variáveis 9.2.2.1 O conceito de limite de f(x,y,z) Afirmar que � lim(x,y,z)→(a,b,c)f(x,y,z) = l significa que é possível fazer com que a função f(x,y,z) se aproxime tanto quanto quisermos de l, bastando para que isso aconteça que (x,y,z) se aproxime suficientemente de (a,b,c), sem contudo ter de igualar (a,b,c). Como no caso das funções de duas variáveis, é essencial notar que também neste caso o percurso que o ponto (x,y,z) deve percorrer ao aproximar-se do ponto (a,b,c) é completamente arbitrário. Se o limite l existir, deve obter-se o mesmo valor para todos os percursos possíveis. Portanto, basta encontrar um percurso para o qual o limite não possa ser calculado, ou então encontrar dois percursos que conduzam a dois valores diferentes do limite, para podermos concluir imediatamente que o limite não existe. 9.2.2.2 Limites direccionais Para mostrarmos que � lim (x,y,z)→(a,b,c) f(x,y,z) não existe, podemos utilizar a técnica dos limites direccionais. Os percursos escolhidos serão, no caso mais simples, os percursos rectilíneos que passam pelo ponto (a,b,c), cujas equações paramétricas são as seguintes: � x = a + p t y = b + q t z = c + r t ⎧ ⎨ ⎪ ⎩ ⎪ , com t ∈ IR . Se calcularmos o limite da função ao longo dos percursos acima referidos, e se verificarmos que esse limite depende de p e/ou de q e/ou de r, podemos concluir que o � lim (x,y,z)→(a,b,c) f(x,y,z) não existe. 9.2 FUNÇÕES DE TRÊS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 31 Contudo, se obtivermos o mesmo valor (finito) para o limite ao longo de todas as rectas do feixe, não podemos daí inferir que o limite da função exista; quando muito, podemos afirmar que o limite da função, se existir, terá de ter esse valor. Exemplo 9.14 Analisar o � lim (x,y,z)→(0, 0,0) � x y z x3 + y3 + z3 pelo método dos limites direccionais (percursos rectilíneos). O feixe de rectas que passa pela origem tem as seguintes equações: � x = p t y = q t z = r t ⎧ ⎨ ⎪ ⎩ ⎪ , com t ∈ IR . � lim (x,y,z)→(0, 0, 0) x = p t y = q t z = r t ⎧ ⎨ ⎪ ⎩ ⎪ � x y z x3 + y3 + z3 = � lim t→0 � (p t) (q t) (r t) (p t)3 + (q t)3 + (r t)3 = = � lim t→0 � t3 (p q r) t3 p3 + q3 + r3( ) = � lim t→0 � p q r p3 + q3 + r3 = � p q r p3 + q3 + r3 Como o limite direccional depende dos valores de p, de q e de r, isto é, depende do percurso rectilíneo escolhido, então o limite da função não pode existir. 9.2.2.3 Cálculo de limites utilizando coordenadas esféricas Os limites de funções de três variáveis podem por vezes ser obtidos utilizando uma mudança de variáveis apropriada. CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 32 Em particular, a mudança para coordenadas esféricas, definida pelas equações simultâneas � x = ρ senφ cosθ y = ρ senφ senθ z = ρ cosφ ⎧ ⎨ ⎪ ⎩ ⎪ , com ρ ≥ 0, 0 ≤ φ ≤ π e 0 ≤ θ < 2π, é muito útil quando estamos a tentar calcular � lim (x,y,z)→(0, 0,0) f(x,y,z), já que se tem: ρ = � x2 + y2 + z2 ≥ 0 ⇒ (x,y,z)→(0, 0, 0) ⇔ ρ→0+ e portanto o limite pretendido poderá ser calculado da seguinte maneira: � lim (x,y,z)→(0, 0,0) f(x,y,z) = � lim ρ→0+ g(ρ,φ,θ) em que g(ρ,φ,θ) é a função que resulta depois de efectuada a mudança de variáveis para coordenadas esféricas. Exemplo 9.15 Utilize coordenadas esféricas para demonstrar que � lim (x,y,z)→(0, 0,0) y ln � x2 + y2 + z2( ) = 0. � lim (x,y,z)→(0, 0,0) y ln � x2 + y2 + z2( ) = ((0) (– ∞)) = (porque y = ρ sen φ sen θ e x2 + y2 + z2 = ρ2) = � lim ρ→0+ ρ sen φ sen θ ln � ρ2( ) = = � lim ρ→0+ ρ ln ρ2( ) ⎛ ⎝ ⎜ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ ⎟ � lim ρ→0+ sen φ sen θ ⎛ ⎝ ⎜ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ ⎟ = (porque � lim ρ→0+ ρ ln ρ2( ) = (0) x (– ∞) = 0, pela regra de L'Hôpital) 9.2 FUNÇÕES DE TRÊS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 33 = (0) � lim ρ→0+ sen φ sen θ ⎛ ⎝ ⎜ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ ⎟ = 0, porque � sen φ sen θ = � sen φ � sen θ ≤ 1, ∀φ,θ . 9.2.3 Continuidade de funções de três variáveis A função de três variáveis f(x,y,z) diz-se contínua no ponto (a,b,c) se o limite da função existir, e se for igual ao valor que a função assume no mesmo ponto: � lim (x,y,z)→(a,b,c) f(x,y,z) = f(a,b,c) Segue-se pois que a função f(x,y,z) terá de estar obrigatoriamente definida não só no ponto (a,b,c), mas também numa vizinhançadesse mesmo ponto. Se o limite no ponto (a,b,c) não existir, ou se f(a,b,c) não existir, ou se existirem ambos mas forem diferentes, diremos que a função f(x,y,z) é descontínua no ponto (a,b,c). Os resultados enunciados atrás, relativos à continuidade de uma função de duas variáveis num ponto e num domínio compacto, são facilmente generalizáveis a funções de três variáveis. Problemas propostos / Secção 9.2 1. Descreva por palavras de forma resumida o domínio natural das seguintes funções de três variáveis: (a) f(x,y,z) = � 1 z − x2 − y2 ; (b) f(x,y,z) = ln (x y z); CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 34 (c) f(x,y,z) = � 25 − x2 − y2 − z2 ; (d) f(x,y,z) = � x y z x + y + z . 2. Obtenha as equações das superfícies de nível para cada uma das funções seguintes, e descreva essas superfícies por palavras de forma resumida: (a) f(x,y,z) = x2 + y2 – z; (b) f(x,y,z) = x2 + y2 + z2 – 4x – 2y – 6z; (c) f(x,y,z) = z2 – x2 – y2; (d) f(x,y,z) = z + � x2 + y2 . 3. Calcule os seguintes limites de funções de três variáveis, ou mostre que não existem: (a) � lim (x,y,z)→(0, 0, 0) � sen x2 + y2 + z2( ) x2 + y2 + z2 ; (b) � lim (x,y,z)→(0, 0, 0) � y z x2 + y2 + z2 ; (c) � lim (x,y,z)→(0, 0, 0) � sen x2 + y2 + z2 x2 + y2 + z2 ; (d) � lim (x,y,z)→(0, 0, 0) � x z2 x2 + y2 + z2( )3/2 ; (e) � lim (x,y,z)→(1, 2, −1) � sen (x − 1)2 + (y − 2)2 + (z + 1)2 (x − 1)2 + (y − 2)2 + (z + 1)2 . 4. Prove que � lim (x,y,z)→(0, 0, 0) � x y z x2 + y2 + z2 = 0 utilizando coordenadas esféricas. Soluções dos problemas propostos / Secção 9.2 1. (a) Df = {(x,y,z): z > x2 + y2}; 9.2 FUNÇÕES DE TRÊS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 35 (b) Df = {(x,y,z): x y z > 0}; (c) Df = {(x,y,z): x2 + y2 + z2 ≤ 25}; (d) Df = {(x,y,z): x + y + z ≠ 0}. 2. (a) z + k = x2 + y2, com k ∈ IR : parabolóides circulares com vértice em (0, 0, – k) e eixo de simetria Oz, em que z ≥ – k; (b) (x – 2)2 + (y – 1)2 + (z – 3)2 = k + 14, com k ≥ – 14: esferas centradas em (2, 1, 3), de raio r = � k + 14 ; (c) x2 + y2 – z2 = – k, com k ∈ IR : hiperbolóides circulares de uma folha (k < 0), ou cone circular (k = 0), ou hiperbolóides circulares de duas folhas (k > 0), com centro na origem e eixo de simetria Oz; CAPÍTULO # 9: INTRODUÇÃO ÀS FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS ________________________________________________________________ 36 (d) x2 + y2 – (z – k)2 = 0 ∧ z ≤ k, com k ∈ IR : folha inferior de cones circulares com vértice em (0, 0, k) e eixo de simetria Oz. 3. (a) 0; (b) Não existe limite; (c) ∞; (d) Não existe limite; (e) ∞.
Compartilhar