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Laplantine o seculo XVIII a invençao do conceito de homem

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1 
 
Laplantine, François. ―O Século XVIII: a invenção do conceito de homem‖. In: 
Aprender Antropologia. São Paulo: Brasiliense, 1994. 
 
- No Renascimento, no século XVI, há a exploração geográfica de continentes 
desconhecidos. Esse ―Encontro‖, esse ―choque cultural‖, leva às primeiras 
interrogações sobre a existência múltipla do homem, do ser humano. 
- No Século XVII, passa a ser aceita a evidência do cogito. Cogito, ergo sum 
significa "penso, logo existo"; é uma conclusão que Descartes alcançou após 
duvidar de sua própria existência, que comprova ao ver que pode pensar e se está 
sujeito à tal condição, deve de alguma forma existir. 
- René Descartes (La Haye en Touraine, 31 de março de 1596 — Estocolmo, 11 
de fevereiro de 1650) foi um filósofo, físico e matemático francês. É considerado 
por muitos o pai do Racionalismo da Idade Moderna. Ou o primeiro filósofo 
moderno. Dentre outras coisas, dividia a realidade em res cogitans (consciência, 
mente) e res extensa (matéria). Daí a noção de que o sujeito ―cartesiano‖ constitui-
se de uma oposição entre corpo e mente. Frase: ―Penso, logo existo‖. O que é 
interessante para nós aqui é que, a partir dessa noção, criam-se figuras de 
―anormalidade‖ [que ―não pensam‖] – o louco, a criança, o selvagem, figuras que 
escapam da ordem, do que é tido por ―normal‖. [Um dos pensadores que 
estudaram esses processos foi Michel Foucault. Os Anormais. Também a História 
da Sexualidade – invenção da figura do ―homossexual‖ como desvio da norma] (p. 
54). 
- O projeto de fundação de uma ciência do homem vai se dar somente no século 
XVIII. Um saber não mais especulativo [não mais etnocêntrico, não mais 
imaginativo], mas também positivo sobre o homem [Ciência positiva lembra o 
positivismo – a idéia de constituição de um saber científico racional, distanciado, 
objetivo. Essa positividade também evoca a idéia de que o sabewr cria as 
realidades que estuda, na nossa acepção corrente. Ex.: Positividade dos discursos 
sobre a sexualidade, na Medicina, na Psiquiatria, na Religião – discursos 
―positivos‖porque também criam essa realidade – Foucault – sexualidade não 
como repressão, mas como incitação ao discursos, nos últimos séculos. Coerção 
a falar sobre, e não repressão. Mas um falar sobre imiscuído em relações de 
poder e de saber-poder. Maneiras corretas de se falar sobre. Convenções, regras. 
Cria-se a sexualidade a partir de discursos que a nomeiam. Desnaturaliza-se a 
sexualidade. Sexualidade – natureza x cultura. Tema clássico. Noção de natureza 
varia; só existe dentro dos discursos históricos e culturais que a imaginam 
enquanto Natureza. Interesse para a Antropologia]. 
- Século XVI – elementos de ―pré-história da Antropologia‖. Século XVIII – espécie 
de repressão; Século XVIII (Iluminismo, Revolução Francesa) – entra-se de vez na 
Modernidade (segundo Foucault). ―Apenas nessa época, e não antes, é que se 
pode apreender as condições históricas, culturais e epistemológicas de 
possibilidade daquilo que vai se tornar a antropologia‖ (p. 54). 
- Foucault vai dizer que antes do Século XVIII, ―o Homem‖ não existia. 
- O que pressupõe esse projeto antropológico? 
- 1. A construção de um certo número de conceitos. O primeiro deles? O conceito 
de homem. E não apenas como sujeito de conhecimento, mas como objeto de 
conhecimento. [Ciências exatas e Naturais pressupunham separação entre sujeito 
2 
 
e objeto de conhecimento; elas serão o modelo, o paradigma, para a antropologia 
no seu início. Logo, essa separação está presente aqui também. É preciso 
desenvolver um conhecimento objetivo, distanciado, do homem pelo próprio 
homem] (p. 55). 
- 2. A constituição de um saber que não seja apenas reflexivo, mas de 
observação. Busca por um entendimento do ser humano em sua existência 
concreta. Separação entre ―idealismo‖ e ―materialismo‖. O homem é entendido 
como um ser determinado seja pela biologia (pelo seu organismo), seja pelas 
relações de produção material (Marx), seja pela linguagem, pelas instituições e 
comportamentos sociais. Sociedade como materialidade, como realidade 
empírica, que determina o homem.‖Assim começa a constituição dessa 
positividade de um saber empírico (e não mais transcendental [especulativo]) 
sobre o homem enquanto ser vivo (biologia), que trabalha (economia), pensa 
(psicologia) e fala (lingüística)‖ (p. 55). E também como um ser social, que vive em 
sociedade e é determinado, localizado socialmente. Surge uma ―ciência da 
sociedade‖, uma Sociologia. [E surge uma ciência inicialmente preocupada com as 
sociedades ―simples‖, ou ―primitivas‖ – a Antropologia, em seu início. Essa era 
uma das formas de se separar a Sociologia da Antropologia nesse momento. Ela 
era uma Sociologia ―em pequena escala‖, em sociedades menores, mais simples]. 
- - 3. Uma problemática essencial: a da diferença. No sécuilo XVIII, rompe-se com 
a evidência do cogito, coloca-se a relação com o impensado. Laplantine vai dizer 
que no século XVIII rompe-se com o pensamento do mesmo [ó que é dado, o que 
é natural, o que ―sempre foi assim‖]. ―A sociedade do século XVIII vive uma crise 
de identidade do humanismo e da consciência européia. Parte de suas elites 
busca suas referências em um confronto com o distante‖ (p. 56). 
- Em 1724, por exemplo, o padre Lafitau publica Os Costumes dos Selvagens 
Americanos Comparados aos Costumes dos Primeiros Tempos. Seu objetivo era 
fundar uma ciência dos costumes e dos hábitos humanos e tinha um esforço 
comparativo. 
- [Essa é uma época, por exemplo, em que se questionam sobre onde se inicia a 
humanidade. O mito da criança-lobo, por exemplo, é contemporâneo ao século 
XVIII. O Enigma de Kasper Hauser, século XIX. Hauser passou os primeiros anos 
de sua vida aprisionado numa cela, não tendo contacto verbal com nenhuma outra 
pessoa, facto esse que o impediu de adquirir uma língua. Porém, logo lhe foram 
ensinadas as primeiras palavras, e com o seu posterior contacto com a sociedade, 
ele pôde paulatinamente aprender a falar, da mesma maneira que uma criança o 
faz. Afinal, ele havia sido destituído somente de uma língua, que é um produto 
social da faculdade de linguagem, não da própria faculdade em si. A exclusão 
social de que foi vítima não o privou apenas da fala, mas de uma série de 
conceitos e raciocínios, o que fazia, por exemplo, que Hauser não conseguisse 
diferenciar sonhos de realidade durante o período em que passou aprisionado. 
Hauser, supostamente com quinze anos de idade, foi deixado em uma praça 
pública de Nuremberg, em 26 de maio de 1828, com apenas uma carta 
endereçada a um capitão da cidade, explicando parte de sua história, um pequeno 
3 
 
livro de orações, entre outros itens que indicavam que ele provavelmente 
pertencia a uma família da nobreza. 
Entre as idiossincrasias originadas pelos seus anos de solidão, Hauser odiava 
comer carne e beber álcool, já que aparentemente havia sido alimentado 
basicamente por pão e água. Aprendeu a falar, a ler e a se comportar, e a sua 
fama correu a Europa, tendo ficado conhecido à época, como o "filho da Europa". 
Obteve um desenvolvimento do lado direito do cérebro notoriamente maior que o 
do esquerdo, o que teoricamente lhe proporcionou avanços consideráveis no 
campo da música. 
Hauser foi assassinado com uma facada no peito, em Dezembro de 1833, nos 
jardins do palácio de Ansbach. As circunstâncias e motivações ou autoria do crime 
jamais foram esclarecidas, apesar da recompensa de 10.000 Gulden (c. 
180.000,00 Euros) oferecida pelo rei Luís I da Baviera. 
A sua história foi representada no filme de Werner Herzog, "Jeder für sich und Gott 
gegen alle" (em língua portuguesa, "Cada um por si e Deus contra todos"), de 
1974, lançado em Portugal com o título "O Enigma de Kaspar Hauser"] 
- Rousseau, no Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade.Desenvolve o programa para a antropologia clássica. 
- 4. Um método de observação e de análise – o método indutivo. Os grupos 
sociais eram comparados a organismos vivos. São considerados sistemas 
―naturais‖, que devem ser estudados empiricamente, a partir da observação direta 
de fatos, a fim de se extrair princípios ou leis gerais, válidas para todas as 
sociedades. Isso vai ser chamado de naturalismo. É uma emancipação em relação 
ao pensamento teológico. É algo que surge antes na Inglaterra do que na França. 
A busca aqui é por um entendimento da Natureza Humana. ―Os filósofos ingleses 
colocam as premissas de todas as pesquisas que procurarão fundar, no século 
XVIII, uma ‗moral natural, um ‗direito natural‘, ou ainda uma ‗religião natural‘‖ (p. 
57). 
- Esse era o projeto de um conhecimento positivo, científico, sobre o homem, que 
Laplantine vai dizer que constitui um evento importante na história. Um evento que 
se originou no Ocidente, no século XVIII e que acabou por se tornar, 
gradativamente, constituinte da idéia de Modernidade. 
- Então ele questiona – mas o que mudou efetivamente, quais as diferenças que 
podemos perceber entre o estudo do homem iniciado no século XVI e o do século 
XVIII? 
- 1. A primeira questão que ele vai salientar diz respeito à natureza dos objetos 
observados. No século XVI, o objeto de observação era sobretudo o cosmos, a 
Natureza – a flora, a fauna, o céu e a terra. Havia tímidas incursões a respeito de 
costumes ou ―inclinações‖, temperamentos etc. mas o foco não recaía aí. Já no 
4 
 
século XVIII se coloca mais claramente o interesse pelo ser humano, pelo 
―Homem‖, e suas variabilidades. 
- 2. A segunda diz respeito à própria atividade de coleta e de observação. No 
século XVI, ele vai dizer, observava-se e coletava-se ―curiosidades‖. ―Exotismos‖, 
aquilo que era grotesco, curioso. Surgem os ―gabinetes de curiosidades‖ 
[Lembrete: como falamos que a chamada pré-história da Antropologia era ―de 
gabinete‖ – conhecimento meio que museológico no mau sentido da palavra; sem 
contato direto; lembrar de Sir. James Fraser – ―Deus me livre!‖]. No século XVIII, já 
se busca ordenar esses achados, essas observações. A questão do método 
utilizado para coletar dados sobre as populações estudadas passa ser levada em 
conta. Organização e elaboração dos materiais. Em 1789, surge o termo etnologia 
como referência a esse saber. 
- É no século XVIII que se forma o par do viajante e do filósofo – o viajante coleta 
as informações. Ex.: James Cook [O capitão James Cook FRS RN (Marton, 27 de 
Outubro de 1728 — Havaí, 14 de Fevereiro de 1779) foi um explorador, navegador 
e cartógrafo inglês no final alcançando a posição de Capitão na Marinha Real 
Britânica. Cook foi o primeiro a mapear Terra Nova antes de fazer três viagens 
para o Oceano Pacífico durante a qual ele conseguiu o primeiro contacto europeu 
com a costa leste da Austrália e o Arquipélago do Havaí, bem como a primeira 
circunavegação registrada da Nova Zelândia] exemplo de viajante. O filósofo vai 
buscar ―esclarecer‖ com suas reflexões as observações trazidas pelos viajantes. 
Ex.: Rousseau. 
- Há mesmo uma espécie de disputa entre viajantes e filósofos. Para os ―filósofos 
naturalistas do século das luzes, se é essencial observar, é preciso ainda que a 
observação seja esclarecida. Uma prioridade é portanto conferida ao observador, 
sujeito que, para apreender corretamente seu objeto, deve possuir um certo 
número de qualidades‖ (p. 59). 
[Interessante: separação entre Etnografia e Etnologia no século XX tem a ver com 
isso]. 
- Busca-se orientar, a partir de manuais de investigação, o olhar do observador. 
Dá o exemplo de uma obra de De Gerando, de 1800, chamada Considerações 
sobre os Diversos Métodos a Seguir na Observação dos Povos Selvagens. Essa 
nova ciência, chamada de ciência do homem ou ciência natural, é sobretudo uma 
ciência da observação, devendo o observador participar da existência dos grupos 
sociais observados. 
- Laplantine vai dizer que esse projeto ainda não pode ser considerado ciência 
antropológica. Em primeiro lugar, porquenão se distinguia, ainda, entre um saber 
científico e um saber filosófico do Homem. É importante termos em mente que 
esse conceito de unidade e universalidade do homem, pela primeira vez 
claramente afirmado no século XVIII, coloca condições para um novo saber sobre 
o homem. Mas ainda não era um saber propriamente científico. Porque? Porque o 
5 
 
conceito de homem do século das Luzes ainda é por demais abstrato. Não se 
estudam indivíduos pertencentes a uma época e a uma cultura, e o sujeito que 
observa não é visto como alguém que, ele também, faz parte de uma época e de 
uma cultura específicas. Conceito de homem ainda é por demais abstrato e 
―transcendental‖. Em segundo lugar, porque o discurso antropológico do século 
XVIII não pode ser separado de seu contexto. E qual é ele? A concepção de uma 
história natural, já liberada da teologia, mas que ainda acredita na marcha das 
sociedades a caminho de um progresso universal, portanto, único. Essa 
concepção vai desembocar, no século XIX, na noção do evolucionismo [Lembrete: 
Morgan, história única, unilinear e universal]. 
- Capítulo seguinte – algumas ponderações. 
- Século XVI – Descobrimento e exploração de espaços desconhecidos. Discurso 
―selvagem‖ sobre o Outro. 
- Século XVIII – Organização desse discurso sobre o Outro. Ele é ‗iluminado‘ pelos 
filósofos. É só no Século XIX que vai se constituir a Antropologia enquanto ciência. 
Objeto: sociedades primitivas, em todas as suas dimensões (biológica, técnica, 
econômica, política, religiosa, lingüística, psicológica etc). 
- Europa – Revolução industrial (Inglaterra) e política (França) – século XVIII-XIX. 
Constituição daquela polaridade. Outro negativoxnós positivado; Outro 
positivoxnós negativo (Rousseau). Para Rousseau, a infelicidade está do lado da 
―civilização‖, não da Natureza. 
- Século XIX: o indígena não é mais o selvagem do século XVI, XVII e XVIII – 
torna-se o primitivo (ancestral do civilizado, destinado a reencontrá-lo) (p. 65).

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