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UMA HISTÓRIA ORAL DO TELEJORNALISTA BRASILEIRO A evolução através dos tempos desde a década de 50 até o século XXI Valquíria Passos KNEIPP, 1 Resumo: Este trabalho pretende realizar um levantamento a respeito da trajetória de formação profissional do telejornalista brasileiro, através de depoimentos de profissionais da área, diplomados, não diplomados e professores universitários. Algumas diretrizes da História Oral serão utilizadas para o balizamento das entrevistas, transcrição e transcriação. Também deve compor o trabalho uma revisão bibliográfica e uma análise documental do material histórico disponível nas emissoras e nos locais que fazem a guarda e manutenção deste acervo. As atividades estão divididas em seis partes, de acordo com cada década, e vão dos anos 50 até o século XXI. O material documental deverá surgir por indicação e sugestão dos próprios entrevistados e será composto de publicações, manuais e gravações de vídeo. Todas as entrevistas serão gravadas em mini-DV e, posteriormente, irão compor um documentário junto com o material de arquivo conseguido. Palvras-chave: telejornalista, história oral, televisão 1. Aspectos Gerais da Pesquisa Esta pesquisa visa realizar um levantamento histórico, através de entrevistas, orientadas pela História Oral2, a respeito da formação profissional da colônia3 identificada pelos jornalistas especializados em televisão, também conhecidos como telejornalistas. Esta colônia estará divida em cinco redes4, através das décadas de 50, 60, 80, 90 e 2000, com especificidades exclusivas em torno de cada uma delas. Este trabalho pretende apresentar um aprofundamento ou uma outra versão, através dos personagens envolvidos, da história da televisão brasileira, tendo como eixo condutor a formação do profissional especializado em televisão: o telejornalista. As histórias profissionais destes personagens, que ajudaram a construir o modelo profissional de telejornalista, poderão trazer conteúdos informacionais mais humanizados, baseados na vivência pessoal e profissional, mais relevantes e até poderão explicar algumas questões importantes na história deste profissional, como é caso da adoção ou não de um modelo padrão baseado nos EUA. Este estudo faz parte do projeto de doutorado que esta pesquisadora desenvolve, dentro da linha de Jornalismo Comparado, tendo como eixo temático o Jornalismo Brasileiro5. Pretende, ainda, resgatar a história do jornalista de TV brasileiro e tratar da sua condição no futuro, num momento simbólico para o audiovisual no país, pois caminhamos para a TV digital ou para mais uma mudança profissional. É necessário não só contar a história da TV no Brasil, mas fazer o resgate do jornalista dentro desta história ou, ainda, conforme Marques de Melo uma ação investigativa articulada de 1 Mestre, Doutoranda Eca/USP, Faculdade da Grande Fortaleza CE 2 História Oral é o conjunto de procedimentos que visam à formação de documentos destinados à análise de depoimentos. 3 Colônia e a coletividade ampla que tem uma comunidade de destino marcada. È através da definição de colônia que se estabelece a rede. 4 Subdivisão da colônia, segmento específico de um grupo com a finalidade pela comunidade do destino. 5 A bibliografia brasileira de Jornalismo tem se caracterizado por três vertentes: a história factual dos sistemas informativos, o memorialismo dos seus protagonistas e a recuperação profissional/didática das experiências peculiares a processos específicos. MELO, José Marques de, 2003, p.13. id22177619 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com modo a registrar a história do jornalismo praticado no Brasil, através do jornalismo brasileiro (MARQUES DE MELO; 2003, p. 13). Existe a necessidade de contar a história da evolução do profissional da TV, sob o ponto de vista jornalístico, pois o país e o mundo vivem um momento de mudança tecnológica, que fatalmente irá alterar o modo da fazer jornalismo na televisão. O resgate da trajetória deste profissional será útil para os pesquisadores e para os futuros profissionais do país. O objetivo é ampliar as fronteiras históricas, através dos depoimentos com os jornalistas que atuaram e atuam como telejornalistas, desde os anos 50 até os dias atuais, para tentar entender o processo de especialização deste profissional e estabelecer vínculos com o modelo americano, suprindo, assim, uma lacuna dentro da história da tevê. Através da referida pesquisa poder-se-á entender o processo de evolução profissional do jornalista de televisão e até valorizar figuras que sempre estiveram nos bastidores de todo este processo. Buscar-se-á este outro universo pouco conhecido da história da tevê. No campo prático, esta pesquisa pretende contribuir para o aperfeiçoamento do jornalista televisivo brasileiro que está em atividade e/ou que pretende no futuro se dedicar a esta prática. Este trabalho também visa: 1- analisar o processo histórico que levou ao telejornalismo contemporâneo e buscar um aprofundamento e um questionamento deste momento significativo do jornalista profissional de TV para o país; 2- fazer uma revisão e uma reflexão crítica sobre a história da TV no Brasil, acrescentando a atual fase pela qual o meio passa; 3- promover um mapeamento de toda a trajetória do profissional jornalista dentro de emissoras de TV, enfocando sua formação e as transformações ocorridas no fazer jornalismo televisivo ao longo dos mais de cinqüenta anos de existência deste meio no país. Em relação à prática jornalística, campo onde certamente ocorreu nos últimos dez anos uma mudança na forma de produção, a presente pesquisa pretende: 1-relacionar um conjunto de medidas que poderão auxiliar o novo perfil profissional para o jornalista de TV, tendo em vista a implantação da TV digital; 2-relacionar indicações relativas às futuras exigências do mercado em relação a este novo profissional. 2. Aspectos metodológicos A formação do telejornalista brasileiro, segundo Mattos, deu-se através de quatro momentos distintos, a saber: fase radiofônica, fase cinematográfica, modelo americano e modelo sul-americano. A adoção do modelo americano não se deu de forma absoluta, mas houve uma seleção e uma adequação para o surgimento de um modelo considerado brasileiro. A idéia é refletir sobre algumas questões, como esta, consideradas fechadas, e tentar revisá-las através da ferramenta da História Oral, que busca não esclarecer a verdade absoluta e sim apontar caminhos através da experiência individual de cada um dos entrevistados. A adoção de uma nova ferramenta para tentar de uma forma dialógica, entender, revisar e interpretar a história da tevê no Brasil, pode trazer elementos importantes, inovadores e reveladores, pois não se estará tratando com fontes oficiais e sim com a experiência individual e às vezes até anônima, à luz da história oficial. Através das entrevistas com os profissionais das diversas décadas, como colaboradores6 e não como entrevistados, na forma jornalística usual, abrir-se á uma nova perspectiva para o surgimento de novos conteúdos informacionais. Através da História Oral, o primeiro passo é o estabelecimento da Comunidade de Destino como sendo os comunicadores, que atuam ou atuaram em emissoras de televisão desde a sua implantação no Brasil, no dia 18 de setembro de 1950. Dentro desta Comunidade de Destino de comunicadores, a Colônia será formada pelos jornalistas de TV, ou seja, os telejornalistas. As redes serão organizadas por décadas (50, 60, 70, 80, 90 e 2000) e por sexo masculino e feminino. A área geográfica de cobertura desta pesquisa deverá se restringir às regiões sudeste, nordestee sul, tendo como referências os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Sul. O ponto zero7 foi identificado como sendo o jornalista Gregório Bacic. Ele ajudará na escolha das Redes de entrevistados, que estarão, inicialmente, separados por gerações a partir dos anos 50. A entrevista com Gregório Bacic aconteceu no dia 21 de setembro de 2005, e contou com os seguintes questionamentos: 1- Desde quando você trabalha em tevê? 2- Em quais emissoras você já trabalhou? 3- Quais foram as funções que já exerceu? 4- Quais eram as atividades desenvolvidas em cada uma das funções exercidas? 5- Como você avalia a importância do seu trabalho na tevê? 6- Quais eram as características necessárias para se trabalhar na tevê nos anos 60? 7- E nos anos seguintes, houve alterações no nível de exigências profissionais para a tevê? 8- Comente a sua rotina de trabalho na época. 9- Fale sobre a equipe de trabalho. 10- Fale sobre a hierarquia da redação. Ao todo serão seis Redes8 de colaboradores, através das gerações, com 5 entrevistados em cada década, com a seguinte subdivisão: 1ª Rede (anos 50 ) implantação da TV modelo radiofônico; 2ª Rede (anos 60) influência americana X influência cinematográfica; nos anos 60 o acordo entre a Rede Globo e o grupo norte-americano Time Life trouxe tecnologia e treinamento aos profissionais da emissora; em paralelo, profissionais oriundos do cinema acabaram trabalhando nas emissoras de TV, gerando, o que vai se tentar mostrar, a influência cinematográfica no telejornalismo brasileiro; 3ª Rede (anos 70) cópia do modelo americano; quando o acordo entre a Rede Globo e o grupo Time Life terminou, o telejornalismo já estava reproduzindo exatamente o formato e a linguagem americana; 4ª Rede (anos 80) estabelecimento do modelo americano; nesta fase, com a criação de duas novas redes, Manchete e SBT, o modelo americano passou a fazer parte de todas as emissoras; 6 Colaborador é o nome dado ao depoente, que tem um papel mais ativo em história oral, deixando de ser mero informante, ator ou objeto de pesquisa. Meihy, 2005 p.260. 7 Ponto zero: (reserva de memória) todo grupo tem alguém que guarda a memória do conjunto, aquele que saber mais do conjunto. Depositário da memória de conjunto. Meihy, 2005. 8 Rede: subdivisão da colônia, segmento específico de um grupo com afinidades definidas pela comunidade de destino. Meihy, 2005 p.262. 5ª Rede (anos 90) readequações para um modelo latino-americano; acredita-se que nos anos 90, com a chegada de telejornais como Aqui Agora e do primeiro Âncora brasileiro, o telejornalismo recebeu influência da América Latina; 6ª Rede (século XXI ) reconfigurações na era digital e via internet. A perspectiva diferencial do entrevistado, através do viés da História Oral, que apresenta o mesmo acoplado ao projeto como um colaborador, e não como um simples entrevistado, também é fator essencial para esta história que se pretende contar, pois os livros e as pesquisas jornalísticas já contam e mostram a história oficial, sem que se possa perceber a presença e a participação dos envolvidos no processo histórico. A prioridade do projeto é a experiência individual e a participação efetiva do colaborador durante todo o processo. Aqui, busca-se a experiência "da retomada salvadora da palavra de um passado que, sem isso, desapareceria no silêncio e no esquecimento" (GAGNEBIN, 1994). De acordo com Ricardo Marcelo Fonseca: Benjamin distingue a "experiência" - enquanto tradição coletiva, enquanto algo que encontra raízes remotas, como a tradição dos provérbios, do "contar" uma história de pai para filho, como a transmissão da sabedoria dos velhos para os mais novos - da simples "vivência", muito mais fugaz, desapegada e desenraizada, e que progressivamente vai substituindo a primeira. A primeira Rede de colaboradores (anos 50): implantação da TV modelo radiofônico contará com os seguintes entrevistados: Fernando Barbosa Lima, Álvaro de Moya, Fernando Pacheco Jordão, Ciro Del Nero, Edson Almeida (repórter Esso do Recife),Borjalo, Célio Moreira e Mário Fanucci. O critério de seleção será em função das pessoas que poderão ser encontradas, pois boa parte dos jornalistas desta época já faleceu, devido à faixa etária, no entorno de 70 a 80 anos de idade. A lista tem oito nomes como forma de garantir pelo menos cinco entrevistas dentre eles. O questionário a ser utilizado será: 1- Como você foi trabalhar na tevê? 2- Que tipo de experiência era necessária para o trabalho? 3- Como era o trabalho do jornalista naquela época?4- Quais as funções que desempenhou nos cargos que ocupou? 5- Comente o processo de elaboração de um telejornal? 6- Conte histórias da (s) emissora(s) em que trabalhou. A segunda Rede de colaboradores (anos 60) influência americana X influência cinematográfica contará com os seguintes entrevistados: Armando Nogueira, Alice Maria, Eduardo Coutinho, Guga, José Bonifácio Sobrinho (Boni), Carlos Alberto Vizeu, Fabbio Peres, Tico de Moraes (filho do Tico-tico primeiro repórter de tevê), Demétrio Costa e Luiz Lobo. O critério de seleção buscou encontrar profissionais que tivessem trabalhado nas diversas emissoras existentes na época, mas poderá ser readequado, caso alguns profissionais não concordem em ser entrevistados ou não estejam acessíveis. Dos dez nomes apresentados, apenas cinco deverão ser entrevistados, os outros ficarão de stand by. O questionário a ser utilizado será: 1- Como você foi trabalhar na tevê? 2- Qual era a experiência que possuía? 3- Como era o trabalho diário? 4- Qual era a hierarquia da redação? 5- Conte histórias de trabalho. A terceira Rede de colaboradores (anos 70) cópia do modelo americano contará com os seguintes colaboradores: Sandra Passarinho, Marisa Raja Gabaglia, Marília Gabriela, Carlos Nascimento, Neusa Rocha, Sérgio de Castro, Paulo Roberto Leandro, Paulo Mário Mansur e Gabriel Romero. O critério de seleção baseou-se nas funções exercidas por cada profissional. O questionário utilizado terá o mesmo conteúdo da rede anterior. A quarta Rede de colaboradores (anos 80) estabelecimento do modelo americano contará com os seguintes colaboradores: Vera Íris Paternostro, Luiz Antonio Malavolta, José Carlos Azenha, Celso Pelosi, Boris Casoy, Hélio Costa, Pedro Bial, Luiz Gonzáles e Woile Guimarães. O critério de seleção buscou encontrar profissionais que tivessem exercido as diferentes funções já estabelecidas: editor de texto, repórter, chefe de reportagem, chefe de redação e diretor de jornalismo. O questionário utilizado terá o mesmo conteúdo da segunda rede. A quinta Rede de colaboradores (anos 90) readequações para um modelo latino-americano contará com os seguintes colaboradores: Amauri Soares, Willian Bonner, Luiz Cláudio Lategê, Ali Kamel, Albino de Castro, Celso Filho, Humberto Candil, Marcos Humel, Lillian Witte Fibe e Fátima Bernardes. O critério de seleção se baseou nas principais emissoras de tevê aberta de acordo com a audiência e existência de departamento de jornalismo. O questionário utilizado terá o mesmo conteúdo da segunda rede. Esta quinta rede poderá contar também com os professores de telejornalismo, pois nesta fase já se tem os cursos de jornalismo estabelecidos com contribuições relevantes na formação destes profissionais. Deste período foram selecionados os seguintes nomes: Sebastião Squirra, Laurindo Leal Filho, Luiz Fernando Santoro, Aline Greco entre outros. O questionário a ser utilizado é o seguinte: 1-) Como você foi lecionar telejornalismo? 2-)Que tipo de experiência era necessária para ensinar esta disciplina? 3-) Como você se tornou professor de telejornalismo? (cursos/ especialização/ mestrado / doutorado) 4-)Comoeram as aulas de telejornalismo quando você começou lecionar ? 5-) Qual a metodologia você adotou para ensinar os conhecimentos práticos? 6-) As aulas eram mais teóricas ou práticas? 7-) Quais os autores (bibliografia) que você adotou? 8-) Quais os equipamentos disponíveis na universidade para que os alunos pudessem praticar telejornalismo? 9-) Como era feita a avaliação dos alunos? (baseava-se em teoria ou em prática) 10-) Comente o processo de elaboração de um telejornal na universidade? 12-) Que tipo de exercício prático os alunos desenvolviam? 13-) Na sua opinião, o telejornalismo brasileiro copiou o modelo americano e mantém até hoje? Por quê? 14-) Conte histórias da (s) universidade (s) em que trabalhou? A sexta Rede de colaboradores do século XXI reconfigurações na era digital e via internet, ainda não tem seus colaboradores definidos, pois buscará abranger todos os tipos de emissoras: abertas, a cabo e via internet. O questionário será definido em função dos colaboradores a serem encontrados. A metodologia da História Oral, que, segundo Meihy não procura a verdade, mas a experiência traz uma perspectiva dialética com base em três momentos após a entrevista: a primeira fase, a transcrição literal da entrevista gravada por meio eletrônico; a segunda fase, a textualização, que consiste basicamente na retirada das perguntas; e a terceira fase, denominada de transcriação, onde se faz um rearranjo do texto, pois, de acordo com Meihy, na tradução do oral para o escrito não é possível traduzir sem mudança. Uma etapa posterior consiste na negociação com o colaborador, onde o texto lhe é enviado, para que o mesmo possa autorizar ou opinar, em parceria com o pesquisador, sobre o quê e como deve ser apresentado o material final. 3. Transcriação da entrevista com Gregório Bacic Entrevista realizada no dia 21/09/2005 Eu comecei a trabalhar em televisão em março de 1967, quando a tevê Bandeirantes estava se preparando pra ir ao ar. Fiz parte da primeira equipe de jornalismo da tevê Bandeirantes. A equipe era chamada de titulares da notícia, e inaugurou a tevê Bandeirantes no dia treze de maio daquele mesmo ano. Antes, eu trabalhava na rádio Bandeirantes. Trabalhei como jornalista lá na Bandeirantes, fazendo o telejornal. Trabalhei na tevê Globo em 1968, num jornal que era uma espécie de antecessor do espírito do Jornal Nacional, que veio a existir em 1969. Ele era feito ao meio dia, em São Paulo e no Rio de Janeiro, com trocas de matérias em vídeo tape do Rio que vinham pra cá de avião e daqui, que íam de avião para o Rio de Janeiro no dia anterior. Trabalhei, ainda, na TV Cultura, não como jornalista, como diretor de programa, mas em alguns casos eu fiz alguma coisa jornalística. Nada oficialmente, extra- oficialmente, eu ajudei, fiz algumas matérias mesmo para o telejornal. O primeiro telejornal da TV Cultura, que era o Hora da Notícia, quando existia uma vez por semana. Algumas vezes me pediam, eu era muito amigo das pessoas que faziam jornalismo. Cheguei a fazer algumas matérias, mais nada oficialmente. Depois, jornalisticamente, vim a trabalhar na TV Globo, no Globo Repórter, em São Paulo, que situava-se numa área do jornalismo, apesar de eu achar que o que nós fazíamos lá não era necessariamente jornalismo. Nós fazíamos documentários. Em 1979, eu fui chefe de jornalismo da Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Em termos de jornalismo é isso. Atualmente estou no programa Provocações, que não é um programa jornalístico, ainda que muita gente insista que é. No jornalismo, eu fui redator. A função era um pouco diferenciada naquele tempo, a gente está falando de um período de quarenta anos atrás. Eu fui redator, fui editor. Fui repórter algumas vezes. Basicamente isso: fui diretor de programas na TV Globo. Naquele tempo, o texto era muito importante. Porque era uma época em que o maior número de figuras que trabalhavam no jornalismo eram redatores. No rádio e na televisão. Na televisão começou a haver um número maior de repórteres, mas eram repórteres que trabalhavam basicamente com o texto e também gravavam texto no local do acontecimento. Seria quase uma espécie de transmissão externa, filmada, revelada e posta no ar. Então era um texto fluente, bom, um texto compreensível, um texto enxuto. Mais para frente escassearam-se as minhas atividades jornalísticas. Então eu não posso te dizer exatamente o que mudou. O que houve, o que eu percebi, pela minha vivência muito próxima dentro das emissoras de televisão, é que houve uma valorização, um crescimento da equipe de repórteres. Houve de lá pra cá, em minha opinião, um empobrecimento, vamos dizer assim, da necessidade de redatores. Isso, porque as coisas já vem prontas, nós estamos assim numa espécie de fast food jornalístico, em que as assessorias de imprensa, as agências noticiosas, esses serviços todos já mandam textos que muitas vezes são colados e colocados no ar. Nos anos 60, no telejornal da TV Bandeirantes, existia um chefe de jornalismo. O diretor de jornalismo era Alexandre Kadum. Existia um chefe de reportagens que era geralmente um repórter, mas os repórteres não possuíam uma formação jornalística diferenciada pra televisão, porque essa ida pra fora era feita com câmeras filmográficas, as famosas câmeras Auricom, eram coisas pesadas, etc. Era muito limitado o trânsito do jornalista, por questões de equipamento e de tempo, porque ele tinha que voltar logo para a emissora para revelar o filme, que seria secado e montado até a noite. Além do mais, estávamos sob a ditadura militar. A gente não metia o nariz em tudo quanto é lugar. Tínhamos que nos comportar e muito bem, dentro da cartilha das emissoras, do governo, da censura, etc... Por isso, o repórter era geralmente uma pessoa que aparecia e que fazia uma transmissão externa do local onde havia acontecido alguma coisa, falava um texto bem comportado, voltava, revelava aquilo e pronto. O chefe de reportagem, a chefia de reportagem era uma coisa que o diretor de jornalismo supervisionava um pouco e às vezes o secretário de redação. Existia a figura do secretário de redação, que era o cara que era o editor do telejornal. Além dele existiam aí os redatores: o redator do internacional, o redator do nacional e o redator do local. Existia uma pessoa que dava o suporte de imagem, porque naquela ocasião toda vez que se citava alguém que era recorrente nos jornais, existia um arquivo de slides, e se colocava a fotografia da pessoa no ar. Então, as imagens colhidas fora eram em pequeno volume e eram limitas por essa questão telecinematográfica. Não é uma questão de ser uma influência maior, mais era, era cinema. Existia um departamento de jornalismo na Globo, que tinha uma área que se chamava Globo Repórter, que tinha os seus editores no Rio de Janeiro e em São Paulo. Eles eram ligados e administrados pelo jornalismo, mas eram departamentos à parte, com autonomia. Esse departamento no Rio de Janeiro e nacionalmente, era comandado pelo Paulo Gil Soares, que era um cara de cinema, trabalhou inclusive com Glauber Rocha, etc. Aqui em São Paulo, o Globo Repórter era feito pela Blimp Filmes, que pertencia ao Guga, irmão do Boni, que sempre trabalhou com cinema. Cinema e televisão, mas coisas mais elaboradas para televisão, mais em linguagem de cinema, isso dentro ou fora do jornalismo. O jornalismo, na época em que eu estive lá, era comandado por Fernando Pacheco Jordão, que era um jornalista, mas que eu considero uma pessoa acima das denominações e das categorias de todas essas caixinhas, de todas essas políticas. Era uma questão de cabeça. Ele entendeu claramente que os grandes trabalhos que se poderiam fazer eram trabalhos de documentário, e documentário à maneira como ele via na Europa, que eram feitos, na verdade, com uma cabeça cinematográfica.Ele fazia Globo Repórter, era departamento de jornalismo, etc. Mais o que você pega daquela ocasião é uma linguagem elaborada de grande reportagem, no caso. Havia alguma preocupação artesanal de cinema, no fazer, na carpintaria do trabalho, vamos dizer assim. Eu fazia documentário. Tanto que você veja que as pessoas que faziam documentário naquela ocasião e que estão por aí hoje ainda, quem são né, além de mim, por exemplo, e que passou a fazer documentário. Tem o Eduardo Coutinho, que é cineasta, o Hermano Pena, que é um cineasta, tem o João Batista de Andrade, que é cineasta. Todos esses praticamente eram cineastas, eram muito poucos aqueles que se poderiam dizer jornalistas, que fizeram algum trabalho que tenha ficado, que tenha tido uma vida mais longa. 4. Considerações Iniciais A experiência com a História Oral deverá proporcionar ao trabalho amplo que se pretende com a pesquisa, um caminho onde a experiência possa ser útil para revisar e comparar alguns aspectos, através das fases da história da tevê. Ao se trabalhar com a história do profissional de TV, é importante ter em mente algumas possibilidades a serem aferidas durante o processo de formação deste jornalista, como a cópia do modelo americano ou o desenvolvimento de um modelo próprio com características peculiares à cultura e condição social do país. A pesquisa poderá traçar também um panorama futuro deste profissional, visto que a TV digital e a TV pela Internet ainda são embrionárias. Outra possibilidade é relacionar a formação do jornalista televisivo, através dos tempos, com quatro diferentes pontos centrais, que estariam presentes em cada uma das fases diferentes de formação do jornalista, como segue: a primeira seria totalmente calcada no modelo radiofônico; a segunda estaria mais voltada para o modelo cinematográfico; a terceira seria a adoção do modelo americano e uma padronização geral das emissoras; e a quarta seria o rompimento com o modelo americano e a despadronização, que poderá acontecer com a tevê digital e pela Internet, como também da identificação do poderá a ser o telejornalismo brasileiro. Referências BRASIL, Antônio. A revolução das imagens uma proposta para o Telejornalismo na Era Digital. Rio de Janeiro: Ciência Moderna, 2005. BONAVITA, Maria Elvira. História e comunicação rádio e TV no Brasil. Rio de Janeiro: Vozes, 1982. CAPPARELLI, Sérgio, LIMA, Venício A. de. Comunicação e Televisão desafios da pós-globalização. São Paulo: Hacker, 2004. 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