Prévia do material em texto
e romanos. Desprezar as severas normas da arquitetura antiga parecia, a esses críticos, uma deplorável falta de gosto — daí terem rotulado o estilo de barroco. Uma das primeiras igrejas barrocas resultante das novas aspirações religio- sas foi a Igreja de Il Gesù (Igreja de Jesus), em Roma, projetada pelo arquiteto Giacomo Della Porta, em 1575 (Figura 2). A recém-fundada igreja da Ordem dos Jesuítas carregava a experiência inédita da nova forma e volumetria das edificações como antídoto à Reforma Protestante. O formato da igreja adota um novo e incomum plano: a ideia renascentista de construção geométrica (frequentemente redonda) e simétrica foi rejeitada e substituída por uma composição simples e engenhosa, posteriormente aceita em toda a Europa. Figura 2. Il Gesù (1575), Roma. (a) Fachada; (b) corte e planta. Fonte: (a) Church of the Gesù (2013, documento on-line); (b) Fazio (2011, p. 361). O modo de planejar as igrejas, a partir da Igreja de Jesus, tem sido lar- gamente utilizado desde então, pois combina as principais características das igrejas medievais — formato alongado, realçando o altar-mor — com as realizações do planejamento renascentista — ênfase aos interiores espaçosos, iluminados através do zimbório (cúpula). Entretanto, é na fachada que se reconhece as primeiras manifestações do estilo Barroco, que serão ampliadas e intensificadas nas edificações religiosas posteriores, especialmente na Itália. Segundo Gombrich (1999, p. 388–389): 5Barroco Nada existe nessa simples e majestosa fachada para sugerir um desafio de- liberado às regras clássicas, em nome de um capricho requintado. Mas o modo pelo qual os elementos clássicos se fundem num padrão mostra que as regras gregas e romanas, e mesmo as renascentistas, tinham ficado para trás. A característica mais impressionante nessa fachada é a duplicação de cada coluna ou pilastra, como para incutir a toda a edificação maior riqueza, variedade e solenidade. O segundo traço que notamos é o cuidado que o artista teve em evitar a repetição e monotonia, organizando as partes de maneira a formar um clímax no centro, onde a entrada principal é realçada por uma dupla moldura. Se retornarmos a construções mais antigas, compos tas de elementos semelhantes, vemos imediatamente a grande mudança no caráter. De fato, a arquitetura barroca (tanto a religiosa quanto a cortesã) incorpora os elementos da arquitetura clássica, reunindo todas as peças formais já conhe- cidas: colunas (novidade na utilização de meias colunas e pilastras), arquitrave e frisos. A distribuição dessas peças formais também emprega características clássicas, como a vasta entrada central emoldurada por colunas e ladeada por duas entradas menores. No entanto, o modo como os elementos clássicos passam a ser arranjados indica que as regras greco-romanas e renascentistas ficaram para trás. Há, por exemplo, a duplicação de pilastras (em outros casos, há duplicação de mais elementos), com objetivo de imprimir maior riqueza, solenidade e variedade de linguagem (GLANCEY, 2001) Uma importante característica da Igreja de Il Gesù é a cenografia. O arqui- teto tratou a fachada de forma a evitar a repetição e a monotonia, organizando as partes de modo a conseguir um clímax no centro da composição, realçando a entrada principal por uma dupla coluna. Sobre esse aspecto cenográfico, Gombrich (1999, p. 389) observa: “Na fachada de Giacomo della Porta para a primeira igreja jesuíta tudo depende do efeito proporcionado pelo conjunto. Tudo está fundido num vasto e complexo padrão”. Uma forma recorrente na arquitetura barroca de igrejas e completamente inédita é o emprego das volutas, ausentes na arquitetura clássica. As volutas laterais realizam a conexão entre os andares inferior e superior, e são justamente essas formas curvas e espirais as responsáveis por grande parte das censuras aos construtores barrocos pelos defensores da pureza das formas clássicas. Na arqui- tetura sacra barroca, as volutas operam de modo a conferir coerência e unidade às complexas composições das fachadas (GLANCEY, 2001; GOMBRICH, 1999). O Barroco é um estilo que abusa dos ornamentos e das decorações, e os inte- riores são notadamente espetaculares, como revela o interior de Il Gesù (Figura 3). A profusão de elementos decorativos marca a estética barroca, criando um espaço cenográfico com forte apelo emocional, no qual arquitetura, a escultura e a pintura se fundem. Fazio (2011, p. 361) destaca o teto da nave central: Barroco6 Olhando para o teto da nave central, é impossível saber com certeza onde termina a arquitetura e começa a escultura ou onde termina a escultura e começa o afresco Adoração do Nome de Jesus, pintado por Giovanni Battista Gaulli, entre 1675 e 1679. Nuvens, drapeados e corpos humanos flutuam no espaço, arrebatando os visitantes com a visão do paraíso. Figura 3. (a) Interior de Il Gesù com (b) afresco do teto da nave central. Fonte: (a) Rom Il Gesu Hauptorgel (2007, documento on-line); (b) Triumph of the Name of Jesus (2015, documento on-line). O trabalho de dois importantes arquitetos e escultores italianos foi fundamental para a magnitude do Barroco em Roma. Rivais profissionais, Gian Lorenzo Bernini e Francesco Borromini competiam constantemente para conseguir os melhores projetos arquitetônicos e deixaram um legado exemplar para a compreensão do Barroco na Itália e sua influência em toda a Europa. Os artistas desenvolveram exímios projetos em Roma. Para aprofundar seus conhecimentos sobre a arquitetura e a escultura barrocas, leia o livro A história da arquitetura mundial, de Michael Fazio (2011). Comparados às formas barrocas da Itália — complexas, floreadas, extre- mamente ornadas e carregadas de apelo emocional —, os edifícios barrocos ingleses e franceses eram mais contidos, exceto nas grandes dimensões e nos 7Barroco