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OBJETO E MÉTODO DA CLIMATOLOGIA

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Revista do Departamento de Geografia, 18 (2006) 89-94. 
 89
OBJETO E MÉTODO DA CLIMATOLOGIA 
Max Sorre1 
Introdução 
O que se propõe é fixar com nitidez a individualidade da 
climatologia e, particularmente, da climatologia entre as discipli-
nas que estudam a atmosfera e, dessa forma, chegar a uma 
definição correta da noção de clima. Os fenômenos que tem como 
teatro a atmosfera podem ser estudados sob muitos pontos de 
vista. A condensação do vapor d’água, a chuva, a descarga 
elétrica, o relâmpago são fenômenos físicos cujo estudo pertence 
ao ramo da física que se denomina de meteorologia. Esta se 
preocupa com a medida desses fenômenos, determina as 
condições físicas em que são produzidos, investiga a natureza 
das relações que existem entre eles e os fatores que os 
condicionam e tenta prever a repetição dos mesmos. Aí está toda 
a tarefa da meteorologia sob seu duplo aspecto, estático e 
dinâmico: definição qualitativa dos fenômenos, pesquisa das leis, 
previsão. Quando estudamos as variações geográficas da lâmina 
de água precipitada na superfície do solo, quando comparamos 
as diferenças de ritmo de oscilação térmica de uma região para 
outra, quando caracterizamos a atmosfera de um lugar pela 
combinação dos meteoros, quando investigamos a relação entre 
esses fatos e outros fatos geográficos tais como distribuição dos 
vegetais, animais ou homens, nós trabalhamos imbuídos de outro 
espírito. Fazemos climatologia, geral ou descritiva conforme o 
caso. É claro que o meteorologista por uma tendência natural, 
chega a se preocupar com a repartição geral dos meteoros. Da 
mesma forma, evidentemente, o climatólogo não pode dar um 
passo sem utilizar os resultados gerais e particulares da 
meteorologia. Nas relações que estabelece entre as variações da 
precipitação e a altitude, ele reencontra leis físicas. Porém, esses 
reencontros necessários, indispensáveis, não devem mascarar a 
dualidade dos pontos de vista. 
Insistimos, ainda, que meteorologistas e climatólogos po-
dem fazer observações com os mesmos instrumentos, sobre os 
mesmos fenômenos como a temperatura, por exemplo. Eles 
elaboram séries registradas nos mesmos arquivos. Todavia, a 
apreciação da justeza e sensibilidade dos aparelhos, a crítica 
matemática das séries, o estudo das variações tendo em vista a 
previsão, tudo isso é essencialmente da alçada do meteorologista. 
Ele é preparado para essa tarefa pois a sua formação é a do 
físico. Aos olhos do climatólogo, a variação termométrica aparece 
primeiro como um elemento da particularidade climática de um 
lugar ou de uma região. 
Esta particularidade climática é, por sua vez, apenas um 
elemento das características geográficas, as quais compreendem, 
ainda, a forma do terreno, as águas, o mundo vivo. Ele tem 
constantemente presentes no espírito as relações da interdepen-
dência entre esses elementos, relações que não se exprimem 
absolutamente por fórmulas matemáticas. Se ele estiver, 
sobretudo, preocupado com as relações do clima com os 
aspectos da vida, isto é, se ele é climatobiologista, a formação do 
biologista lhe é indispensável. 
Essas distinções são clássicas. Contudo, insistimos sobre 
elas porque, como diz muito bem Morikofer, a climatologia atra-
vessa um período de crise. A climatologia clássica, à qual 
devemos obras magistrais, como a de Hann, foi, sobretudo, obra 
de meteorologistas. Suas insuficiências se evidenciam claramen-
te. As mesmas tiveram conseqüências desagradáveis. Se a 
geografia botânica se desviou das considerações ecológicas, a 
carência da climatologia não foi estranha a isso. Agrônomos e 
médicos reclamam com insistência o retorno dessa disciplina a 
sua verdadeira vocação. Essa orientação assume uma grande 
importância no momento em que o progresso da navegação 
aérea coloca em primeiro plano a pesquisa da previsão: o estudo 
da atmosfera não é objeto de uma disciplina única; as pretensões 
do climatólogo são tão justificadas quanto as do meteorologista. 
 Foi dito mais acima que eles utilizam o mesmo material 
cientifico. Todavia, é necessário colocar algumas reservas. É 
verdadeiro para o essencial. Porém todas as categorias de obser-
vações não proporcionam exatamente a mesma contribuição para 
ambos. Por exemplo, as observações relativas à alta e à media 
atmosfera, à formação dos sistemas de nuvens, apresentam um 
interesse maior em meteorologia. O climatólogo se atém mais à 
duração, à intensidade da nebulosidade porque esses elementos 
exercem influência sobre o aspecto do tapete vegetal. Encontrar-
se-iam, facilmente outros exemplos. 
1 Este texto corresponde ao capítulo introdutório da obra “Traité de climatologie biologique et medicale” publicado em 1934 em Paris sob a direção de 
M. Piery Masson et Cie Éditeurs. Vol. I, pp. 1 a 9. Traduzido pelo Prof. Dr. José Bueno Conti. Departamento de Geografia/ FFLCH/USP. 
Revista do Departamento de Geografia, 18 (2006) 89-94. 
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A diferença existente entre a meteorologia, ramo das 
ciências físicas, que faz largo uso da linguagem e dos métodos 
matemáticos, e a climatologia, vinculada, por suas tendências e 
sua natureza ao grupo das ciências de observação, leva-nos a 
definir mais exatamente esta última, analisando a noção funda-
mental do clima. 
 
A definição clássica de clima e suas insuficiências 
Durante o último meio século, estivemos presos à definição 
de Hann, o estado médio da atmosfera sobre um lugar, mais 
exatamente “o conjunto dos fenômenos meteorológicos que 
caracterizam a condição média da atmosfera em cada lugar da 
Terra”. Esta definição é simples e cômoda. Ela marca bem o 
caráter local desta combinação de elementos meteorológicos que 
compõem o clima. Porém, é insuficiente sob dois pontos de vista. 
Corresponde a uma média, isto é, a uma abstração inteiramente 
destituída de realidade e conduz a um abuso das médias 
aritméticas para caracterizar os elementos do clima. Apresenta 
em segundo lugar, um caráter estático e artificial, pois não 
menciona o desenvolvimento dos fenômenos ao longo do tempo. 
Ora, o ritmo é um dos elementos essenciais do clima. As 
descrições de Hann escapam freqüentemente a esses 
inconvenientes. Ele se mantinha em contacto mais estreito com a 
realidade climatológica do que sua definição poderia supor. 
Todavia, não podemos nos contentar com essa definição. A que 
nós propomos deverá levar em conta o fator tempo (duração). 
Não é, sem dúvida, perfeita. Contudo, corresponde melhor às 
nossas concepções. 
 
Clima local 
Denominamos clima à série de estados atmosféricos sobre 
determinado lugar em sua sucessão habitual. Cada um desses 
estados caracteriza-se pelas suas propriedades dinâmicas e 
estáticas da coluna atmosférica, composição química, pressão, 
tensão dos gases, temperatura, grau de saturação, comporta-
mento quanto aos raios solares, poeiras ou matérias orgânicas 
em suspensão, estado do campo elétrico, velocidade de 
deslocamento das moléculas, etc. É o que a linguagem comum 
designa sob o nome de tempo. A palavra tempo corresponde, 
portanto, a uma combinação complexa, na qual, conforme o caso, 
um ou dos elementos que acabamos de enumerar desempenham 
um papel preponderante. Dizemos que o tempo é quente, seco, 
chuvoso ou calmo. Porém, a temperatura, a pressão, o estado 
elétrico, etc., só podem ser isolados por um artifício de análise. A 
noção de tempo, e por conseqüência, a noção de clima, são 
noções sintéticas. Esta observação preliminar é de uma 
importância capital para o biólogo. Ele pode, por uma espécie de 
análise harmônica, considerar separadamente a ação de cada um 
dos elementos do tempo e do clima sobre o ser vivo. Ele não 
deve, porém, nunca perder de vista que esses elementos agem 
todos em conjunto e mesmo através de outros. Consideraremos, 
enfim, como fatores do clima, as circunstâncias que determinam a 
existência e regulama sucessão dos tipos de tempo. Tais são: 
latitude, altitude, situação relativa às massas oceânicas e 
continentais, aos centros de ação e aos movimentos gerais da 
atmosfera, exposição, declividade, etc. 
As definições que acabamos de apresentar provocam 
reflexões importantes. Em primeiro lugar, em cada instante dado e 
em cada ponto do globo, a atmosfera é uma combinação singular 
que tem muito pouca chance de se reproduzir de uma maneira 
perfeitamente idêntica. A árvore de meu jardim não florescerá 
jamais duas vezes nas mesmas condições de temperatura, 
luminosidade, estado higrométrico, etc. Não podemos, contudo, 
nos contentar em selecionar as realidades climáticas sob este 
aspecto de fluxo perpétuo. O ritmo das estações traz estados 
higrométricos comparáveis a vários meses de distância. Estes 
estados se agrupam em torno de formas ou tipos característicos 
de cada período do ano. Os fatores dos quais depende sua 
sucessão, oferecem, senão uma estabilidade rigorosa, ao menos 
uma regularidade relativa. E isso basta para que escapemos à 
impressão de um escoamento indefinido de formas e para que 
tomemos consciência da existência do clima local, realidade fun-
damental da climatologia. 
Entre os estados atmosféricos que se sucedem, há os que 
se distanciam consideravelmente dos estados tipos, que se 
repetem em intervalos muito distanciados, não havendo nenhuma 
regra que permita lhes prever a ocorrência, por exemplo frios 
muito rigorosos dos “grandes invernos” dos quais a história 
guarda a lembrança. Não se pode, racionalmente, fazê-los entrar 
na noção de clima; os valores correspondentes ao que se chama 
em meteorologia extremos absolutos devem ser manejados com 
muita discrição e prudência. Postos de lado esses extremos 
excepcionais, todos os outros, os extremos e os que se 
aproximam dos tipos médios, entram na definição de clima local. 
Tiraremos, mais adiante, desta consideração, regras para o 
emprego das médias. 
 
Clima regional 
Da mesma forma que o tempo (no sentido meteorológico) é 
Revista do Departamento de Geografia, 18 (2006) 89-94. 
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um estado singular da atmosfera, o clima local é uma combinação 
singular; irredutível. Não há talvez, no globo, dois locais cujos 
climas sejam idênticos. Porém, a ação dos fatores do clima 
produz uma generalidade suficiente para que tenhamos pratica-
mente o direito de considerar, acima dos climas locais, os climas 
regionais. A noção de clima regional é uma etapa do caminho da 
abstração. Ela se aproxima o mais possível da realidade concreta 
na região onde o jogo do dinamismo atmosférico é o mais simples 
e onde a topografia é a mais uniforme. As duas condições 
encontram-se realizadas nas regiões intertropicais sobre grandes 
extensões. A uniformidade do clima e a regularidade da sucessão 
dos estados atmosféricos ao longo do ano, de fato, caracterizam 
essas áreas em oposição às temperadas. Por outro lado, quando 
a topografia revela uma grande variedade como nas regiões de 
montanha, o clima regional é simplesmente uma associação de 
climas locais, estacionais, como também se diz. É outro caso 
extremo: seu interesse é muito grande por causa do valor 
terapêutico diferente dos climas estacionais nas montanhas. 
Pode-se, portanto, legitimamente, falar de climas regionais, 
ou, se quisermos, de regiões climáticas, e, dessa forma, somos 
levados a introduzir a idéia de limite climático, tão importante para 
a biogeografia. Essa idéia tem sido freqüentemente concebida e 
utilizada sem espírito de medida. Não se encontra limite climático 
linear – se é que se encontra – a não ser em casos muito raros, 
como o de um obstáculo montanhoso normal ao sentido de 
propagação de influências climáticas. Regra geral, há zonas limí-
trofes, isto é, manchas, onde se fazem e se desfazem combina-
ções de elementos característicos de regiões climáticas em 
contacto. Nessas zonas transicionais, combinações fortuitas de 
fatores podem fazer reaparecer localmente um ou outro clima das 
vizinhanças em toda sua identidade. É dessa forma que nas 
bordas do mundo mediterrâneo, condições estacionais de abrigo 
permitem a reconstituição em locais pouco extensos, de 
verdadeiros oásis mediterrâneos fora da região onde o clima do 
mar interior reina soberanamente. Quem subestimasse esta 
característica dos limites climáticos correria o risco de se 
equivocar sobre o sentido dos limites das associações vegetais. O 
problema dos limites climáticos desperta, aliás, outras questões 
de doutrina. 
 
Microclima 
Tomamos como ponto de partida o clima local ou 
estacional, porque ele corresponde a uma realidade concreta e, 
num certo sentido, elementar. Não se deve crer, todavia, que esta 
noção de clima local esgota todas as possibilidades de análise. O 
climatólogo pode questionar o que representa exatamente a 
estação, como fizeram antes deles os fitogeógrafos. Falo do clima 
de Clermont-Ferrand: ninguém duvidaria que o mesmo é uma 
realidade. Porém, nem a temperatura, nem os movimentos de ar 
são os mesmos na Praça de Jaude e nas ruas que para aí se 
dirigem. Mais ainda, há diferenças de um lado a outro de uma 
mesma rua. E se nos deslocarmos para o campo? As condições 
variam conforme consideremos, seja o interior de uma lavoura de 
trigo, a sombra ou a obscuridade de uma floresta de árvores com 
muitas folhas ou de um bosque de pinheiros. Vê-se que 
passamos, por gradações insensíveis se considerarmos a uma 
coluna atmosférica sobre um lugar à de um meio atmosférico em 
torno de um ponto, ou, em outras palavras, da noção de clima 
local à de microclima. Esta noção foi introduzida bastante 
recentemente. Foi elaborada na Alemanha por Geiger. O 
importante é notar que ela não representa o resultado de uma 
análise crítica dissociada da noção de clima local: é o 
complemento necessário disso. Como o microclima define as 
condições de vida particulares ao interior de uma estação, o 
mesmo deve ser tomado em consideração seja pelo biólogo, pelo 
agrônomo ou pelo médico. O clima local nem por isso deixa de 
ser fato fundamental. 
 
Definição biológica dos climas 
As considerações precedentes têm um caráter de generali-
dade: são válidas para todos os climatólogos, quer suas preocu-
pações particulares se voltem para a geografia física ou para a 
geografia biológica. Estes últimos, entretanto, têm preocupações 
especiais às quais vamos nos ater, doravante. Não mais 
separaremos a fisioclimatologia e a patoclimatologia dos outros 
aspectos da bioclimatologia. 
Neste ponto, torna-se necessário voltar, por um instante às 
nossas considerações iniciais. Nossa definição abrange os 
aspectos físicos do clima. Os progressos da meteorologia nos 
levaram a isolá-los, a colocá-los em primeiro plano. Simples etapa 
da análise científica. Na ordem do desenvolvimento histórico, a 
idéia de clima apresenta-se de outra forma. Ela é inseparável das 
preocupações biológicas. Os primeiros registradores não foram 
instrumentos de medida, mas sim registradores naturais, em 
particular a sensibilidade do homem. Não se conhecia o calor e o 
frio a não ser por seus efeitos sobre o organismo humano. Sabe-
se o que representa o clima para os sábios gregos. Desta primeira 
indiferenciação, destacam-se duas disciplinas: a meteorologia, 
que se aproxima da física e a climatologia, ramo da geografia. 
Nos tempos modernos fizeram-se notáveis esforços para se 
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definir os climas por parte de meteorologistas como Hann ou 
Angot. Chegou-se a pensar que estudo total da atmosfera era da 
alçada dos meteorologistas. Esse é um ponto de vista errado 
susceptível de conduzir a equívocos graves. Da mesma forma 
isso é da essência geográfica, a idéia de clima é inseparável de 
suas conexões. Se, na sua origem ela é impregnada de biologia 
porque só os sentidos percebemas variações atmosféricas, em 
um estágio bem mais avançado do desenvolvimento científico 
quando se adquire uma idéia mais correta das relações entre o 
meio e a vida, ela reencontra, se assim se pode dizer, sua cor 
biológica. Sua elaboração pertence aos biogeógrafos. Cada uma 
delas contribui com seu estado de espírito. 
Estas considerações explicam, aliás, como pode haver 
diferentes classificações de climas inspiradas em diferentes pon-
tos de vista. 
 
Os princípios gerais das definições climáticas do ponto 
de vista da biologia humana 
Na pesquisa dos fatos necessários a servir de base a uma 
definição dos climas, algumas regras de método devem ser 
observadas. Decorrem, em parte, das considerações preceden-
tes. 
(1) Os valores numéricos que devem ser guardados para as 
escalas são os valores críticos para as principais funções 
orgânicas. Esta regra encontra sua aplicação particularmente na 
análise dos elementos do clima. Tomemos o caso da temperatura. 
Acostumamo-nos a observar a escala térmica como sendo 
determinada por dois fenômenos físicos correspondentes às 
mudanças do estado da água. Ora, nenhum fenômeno biológico, 
nem a alteração dos protoplasmas, nem a constante orgânica 
representada pela temperatura interna, nem o jogo dos 
mecanismos destinados a manter essa constante apesar das 
variações do meio, nem o limite da sensação térmica têm relação 
com esses fatos. Encontramo-nos, então, na obrigação de definir 
previamente um zero termo-biológico, seja por intermédio de 
considerações teóricas, seja pelo testemunho da sensibilidade 
térmica, seja pelo estudo do metabolismo. Uma vez estabelecido 
esse zero, a busca de limites diferenciadores levaria à 
determinação de valores críticos secundários. Enfim os pontos 
extremos seriam determinados pelos momentos, nos quais o jogo 
das sensações orgânicas torna-se impotente para manter a 
constante térmica interna. À primeira vista, tudo isso parece fácil. 
Na realidade, o ponto de neutralidade térmica é mais difícil de se 
fixar, do que parece. O confronto entre trabalhos de Rubner, 
Attwater e Lefèvre deixa o climatologista hesitante, tanto mais que 
ele não é absolutamente seguro de que os pontos críticos não se 
desloquem conforme as zonas. Não podemos, aqui, expor todos 
os termos de um problema extremamente delicado. O que se 
pode tirar de mais nítido disso é que dois níveis apresentam um 
interesse especial, um entre 15 e 16oC e outro ligeiramente 
superior a 20oC. Para os climas frios, Köppen adotou um nível 
auxiliar de 10 graus cuja escolha foi mais arbitrária. Para nós, 
trata-se menos de oferecer resultados definitivos do que mostrar 
em que sentido as pesquisas devem ser orientadas, no futuro. 
(2) Uma definição climatológica deve abranger a totalidade 
dos elementos do clima susceptíveis de agir sobre o organismo. 
Considera-se geralmente a temperatura e a umidade cuja ação 
sobre o metabolismo humano é evidente. Porém, a riqueza do ar 
em radiações luminosas e químicas oferece igual interesse, 
embora sejam menos estudadas. Ocorre o mesmo com o estado 
elétrico. 
A necessidade de não se limitar a estudar os elementos 
clássicos é cada vez mais evidente para os médicos. Veremos 
através dos artigos de M. Morikofer, de M. Baldit, de Maurain e de 
M. Salles qual é o balanço de nossos conhecimentos sobre 
actinometria, ionização e radioatividade da atmosfera. 
(3) Os elementos climáticos devem ser considerados em 
suas interações. Esta necessidade, reconhecida cada vez mais, 
tanto pelos biologistas como pelos geógrafos, determina a procura 
de funções nas quais entram como variáveis dois elementos do 
clima ou mais. Não se deve, aliás, exigir mais do que elas podem 
dar. A medida que se aumenta o número de variáveis o sentido do 
resultado numérico torna-se cada vez mais difícil de precisar. 
Entre as relações empíricas, onde entram ao mesmo tempo 
a temperatura e a umidade, pode-se citar o índice de aridez de De 
Martonne, que é de uso cômodo para o estudo das formas de 
erosão. Há já algum tempo que os fisiologistas têm se orientado 
para as pesquisas de funções fisiológicas que comportam como 
variáveis a temperatura, a umidade e a velocidade do vento. 
Encontrar-se-á no artigo de M. Baldit sobre os elementos 
meteorológicos do clima, indicações úteis sobre os trabalhos de L. 
Hill e de Dorno. Estes trabalhos são do mais alto interesse para a 
climatologia médica. 
As funções climatológicas em questão conduzem a uma 
expressão numérica. Pode-se, também traduzi-las graficamente. 
Os agrônomos têm feito, há algum tempo, curiosas tentativas 
nesse sentido. Um fisiologista, Dorno, fez um experimento da 
mesma ordem. 
(4) Qualquer classificação climática deve acompanhar de 
perto a realidade viva. Disso decorre que, em climatologia, deve-
Revista do Departamento de Geografia, 18 (2006) 89-94. 
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se fazer maior uso possível das observações brutas. As tempe-
raturas corrigidas não têm nenhum valor para nós. Além disso, 
esta regra limita o emprego das médias. Seus extremos, suas 
amplitudes, suas freqüências, suas ordens de sucessão são 
dados capitais. 
Encontrar-se-á no artigo de M. Baldit todas as informações 
úteis sobre o emprego das médias. A crítica de sua significação 
biológica decorre disso. Elas têm sua importância como modo de 
expressão, porém o que um organismo vivo sofre, o que registra, 
não são puras abstrações aritméticas. Tudo isso, é um a questão 
de nuances. Uma figura composta de duas curvas das máximas e 
mínimas diárias de um ano qualquer dá uma idéia, bem 
satisfatória das condições térmicas de uma estação tropical por 
causa da regularidade dos fenômenos meteorológicos. Não 
decorre de maneira nenhuma o mesmo em nossas latitudes. 
(5) O fator tempo (duração) é essencial na definição dos 
climas. Esta regra decorre da precedente. Uma característica 
climática não tem a mesma significação para os seres vivos se ela 
atua com continuidade ou se exerce por intervalos. Considerando 
a mesma amplitude, uma variação que se produz lentamente não 
tem o mesmo interesse que uma variação brusca. Enfim, a 
constância de um estado atmosférico dado não pode ser 
negligenciada. A cada momento do processo, é sobre um terreno 
fisiológico modificado pelas ações anteriores que se exerce a 
influência do meio climático. O organismo não é somente um 
registrador como se tem dito freqüentemente. É um integrador. 
A ecologia vegetal vem se orientando, desde há muito, 
nesse sentido. A integral das temperaturas é, desde de Candolle, 
a mais conhecida dessas funções onde a variável tempo 
(duração) desempenha um papel. Experiências análogas foram 
tentadas na Índia a propósito da ação retardada das 
precipitações. Fórmulas mais complexas foram elaboradas na 
América. Não posso dizer, a priori, se pesquisas desse gênero 
dariam resultados para o estudo da fisiologia normal ou patológica 
do homem. Porém, um aparelho matemático complicado não 
pode ser talvez indispensável (ao menos no estágio em que 
estamos) para a introdução do fator tempo. Quando se pensa que 
a duração dos períodos sem chuva no clima mediterrâneo não foi 
jamais estudada em detalhe, passa-se a ter pretensões modestas. 
 
Conclusão 
As regras que acabamos de apresentar aplicam-se à 
definição dos climas. É evidente que uma classificação satisfatória 
resultaria naturalmente de uma definição correta. No presente 
estado de nossos conhecimentos, quando desejamos definir um 
clima, do ponto de vista médico verificamos que nosso 
vocabulário técnico tem justamente a mesma riqueza e a mesma 
precisão que o de Hipócrates. Porém nós ganhamos por melhor 
ver o sentido das pesquisas necessárias e isso, por si mesmo, é 
um progresso apreciável. 
 
 
Max Sorre / Revista do Departamento de Geografia, 18 (2006) 89-94. 
 94
SORRE, M. (2006). Object and metod of climatology.Revista do Departamento de Geografia, n. 18, p. 89-94. 
 
Recebido em 30 de março de 2006, aceito em 15 de maio de 2006.

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