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Princípios Constitucionais Penais

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2. Princípio da Legalidade e princípio da reserva legal.
A gravidade dos meios que o Estado emprega na repressão do delito, a drástica intervenção nos direitos mais elementares e, por isso mesmo, fundamentais da pessoa, o caráter de ultima ratio que esta intervenção deve ter, impõem necessariamente a busca de um princípio que controle o poder punitivo estatal e que confine sua aplicação em limites que excluam toda arbitrariedade e excesso do poder punitivo.
O princípio da legalidade constitui uma efetiva limitação ao poder punitivo estatal. Embora seja hoje um princípio fundamental do Direito Penal, seu reconhecimento percorreu um logo processo, com avanços e recuos, não passando, muitas vezes, de simples “fachada formal” de determinados Estados. Feuerbach, no inicio do século XIX, consagrou o princípio da legalidade através da fórmula latina nullum crimen, nulla poena sine lege. O princípio da legalidade é um imperativo que não admite desvios nem exceções e representa uma conquista da consciência jurídica que obedece a exigências de justiça, que somente os regimes totalitários o têm negado. 
Em termos bem esquemáticos, pode-se dizer que, pelo princípio da legalidade, a elaboração de normas incriminadoras é função exclusiva da lei, isto é, nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma penal criminal pode ser aplicada sem que antes da ocorrência desse fato exista uma lei definindo-o como crime e cominando-lhe a sanção correspondente. A lei deve definir com precisão e de forma cristalina a conduta proibida. Assim, seguindo a orientação moderna, a Constituição brasileira de 1988, ao proteger os direitos e garantias fundamentais, em seu art. 5º, inc. XXXIX, determina que “não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
Quanto ao princípio de reserva legal, este significa que a regulação de determinadas matérias deve ser feita, necessariamente, por meio de lei formal, de acordo com as previsões constitucionais a respeito. Nesse sentido, o art. 22º, I, da Constituição brasileira estabelece que compete privativamente à União legislar sobre o Direito Penal.
A adoção expressa desses princípios significa que o nosso ordenamento jurídico cumpre com a exigência de segurança jurídica postulada pelos iluministas. Além disso, para aquelas sociedades que, a exemplo da brasileira, estão organizadas por meio de um sistema político democrático, o princípio de legalidade e de reserva legal representam a garantia política de que nenhuma pessoa poderá ser submetida ao poder punitivo estatal, se não com base em leis formais que sejam fruto do consenso democrático.
2.1. Princípio da legalidade e as leis vagas, indeterminadas ou imprecisas
Para que o princípio de legalidade seja, na prática, efetivo, cumprindo com a finalidade de estabelecer quais são as condutas puníveis e as sanção a elas cominadas, é necessário que o legislador penal evite ao máximo o uso de expressões vagas, equívocas ou ambíguas. Nesse sentido profetiza Claus Roxin, afirmando que: “uma lei indeterminada ou imprecisa e, por isso mesmo, pouco clara não pode proteger o cidadão da arbitrariedade, porque não implica uma autolimitação do ius puniente estatal, ao qual se possa recorrer. Ademais, contraria o princípio da divisão dos poderes, porque permite ao juiz realizar a interpretação que quiser, invadindo, dessa forma, a esfera do legislativo”.
Dessa forma, objetiva-se que o princípio de legalidade, como garantia material, ofereça a necessária segurança jurídica para o sistema penal. O que deriva na correspondente exigência, dirigida ao legislador, de determinações das condutas puníveis, que também é conhecida como princípio da taxatividade ou mandato de determinação dos tipos penais.
Não se desconhece, contudo, que, por sua própria natureza, a ciência jurídica admite certo grau de indeterminação, visto que, como regra, todos os termos utilizados pelo legislador admitem várias interpretações. De fato, o legislador não pode abandonar por completo os conceitos valorativos, expostos como cláusulas gerais, os quais permitem, de certa forma, uma melhor adequação da norma de proibição com o comportamento efetivo. O tema, entretanto, pode chegar a alcançar proporções alarmantes quando o legislador utiliza excessivamente conceitos que necessitam de complementação valorativa, isto é, não descrevem efetivamente a conduta proibida, requerendo, do magistrado, um juízo valorativo ara complementar a descrição típica, com graves violações à segurança jurídica.
Na verdade, uma técnica legislativa correta e adequada ao princípio de legalidade deverá evitar ambos os extremos, quais sejam, tanto a proibição total da utilização de conceitos normativos gerais como o exagerado dessas cláusulas gerais valorativas, que não descrevem com precisão as condutas proibidas. Sugere-se que se busque um meio-termo que permita a proteção dos bens jurídicos relevantes contra aquelas condutas tidas como gravemente censuráveis, de um lado, e o uso equilibrado das ditas cláusulas gerais valorativas, de outro lado, possibilitando, assim, a abertura do Direito Penal à compreensão e regulação da realidade dinâmica da vida em sociedade, sem fissuras com a exigência de segurança jurídica do sistema penal, como garantia de que a total indeterminação será inconstitucional. Outra questão que sempre suscitou um amplo debate na doutrina se refere às dúvidas quanto à constitucionalidade das leis penais em branco. Tema que, mesmo estando relacionado com os princípios de legalidade e de reserva legal, será analisado, por questões didáticas, quando do estudo das normas penais. Vários critérios, arrolados por Claus Roxin, vêm sendo propostos para encontrar esse equilíbrio, como, por exemplo: 1º) Conforme o Tribunal Constitucional Federal alemão, a exigência de determinação legal aumentaria junto com a quantidade de pena prevista para o tipo penal (como se a legalidade fosse necessária somente para os delitos mais graves) e a consagração pela jurisprudência de uma lei indeterminada atenderia ao mandamento constitucional (ferindo o princípio constitucional da divisão dos poderes e a garantia individual). 2º) Haveria inconstitucionalidade quando o legislador, dispondo da possibilidade de uma redação legal mais precisa, não a adota. Embora seja um critério razoável, ignora que nem toda previsão legal menos feliz pode ser tachada de inconstitucional. 3º) O princípio da ponderação, segundo o qual os conceitos necessitados de complementação valorativa serão admissíveis se os interesses de uma justa solução do caso concreto forem preponderantes em relação ao interesse da segurança jurídica. Este critério é objetável porque relativiza o princípio da legalidade. Os pontos de vista da justiça e da necessidade de pena devem ser considerados dentro dos limites da reserva legal, ou estar-se-ia renunciando o princípio da determinação em favor das concepções judiciais sobre a Justiça. Enfim, todos esses critérios sugeridos são insuficientes para disciplinar os limites da permissão do uso de conceitos necessitados de complementação mediante juízos valorativos, sem violar o princípio constitucional da legalidade.
 Por esse motivo, estamos de acordo com Claus Roxin quando sugere que a solução correta deverá ser encontrada mediante os “princípios da interpretação em Direito Penal”. Segundo esses princípios, “um preceito penal será suficientemente preciso e determinado se e na medida em que do mesmo se possa deduzir um claro fim de proteção do legislador e que, com segurança, o teor literal siga marcado os limites de uma extensão arbitrária da interpretação”. No entanto, a despeito de tudo, os textos legais em matéria penal continuam abusando do uso excessivo de expressões valorativas, dificultando, quando não violando, os princípios de legalidade e da reserva legal.
Mais recentemente, a Lei n. 10.792/2003, que altera dispositivos da Lei n. 7.210/84, de Execução Penal, ao criar o regime disciplinar diferenciado de cumprimento de pena, viola flagrantemente o princípiode legalidade penal, criando, disfarçadamente, uma sanção penal cruel e desumana sem tipo penal definido correspondente. O princípio de legalidade exige que a norma contenha a descrição hipotética do comportamento proibido e a determinação da correspondente infração penal. É intolerável que o legislador ordinário possa regular de forma tão vaga e imprecisa o teor das faltas disciplinares que afetam o regime de cumprimento de pena, submetendo o condenado ao regime disciplinar diferenciado. O abuso no uso de expressões como “alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal” ou “recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação” (art. 52), sem declinar que “tipo de conduta” poderia criar o referido “alto risco” ou caracterizar “suspeitas fundadas”, representa, portanto, uma flagrante afronta ao princípio de legalidade, especialmente no que diz respeito à legalidade das penas, como demonstramos ao analisarmos as penas privativas de liberdade.
Autor: Cezar Roberto Bitencourt
Livro: Tratado de Direito Penal Parte Geral I

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