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Paleolítico Superior

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O PALEOLÍTICO SUPERIOR1 
Marcel OTTE. 
Concepção 
Na história das civilizações européias, o Paleolítico superior aparece como um fenôme-
no brutal, rápido, profundo e definitivo. Este aspecto é devido às circunstâncias próprias do 
continente europeu, disposto como uma «península» do mundo antigo. Assim, a história das 
pesquisas arqueológicas na Europa acabaram por acentuar a significação evolutiva sobre os 
planos biológicos e culturais. Após dois séculos de pesquisas, uma coincidência marcou esta 
ruptura; o aparecimento de uma nova forma anatômica humana e um novo comportamento. 
Esta coincidência é indicativa de uma migração de populações vindas de fora, como conse-
qüência deste processo, provavelmente fundamental e próprio da espécie humana, fundamen-
tado sobre um desenvolvimento correlato da anatomia e dos aspectos sociais. Tal fenômeno 
foi universal e ocorreu em toda a humanidade, depois que ela se originou mas, nesse caso 
possuindo um aspecto particular devido a ausência de uma transição lenta. Com o Paleolítico 
Superior tratamos com um fenômeno de ordem histórica (o deslocamento de um povo), bioló-
gica (modificações anatômicas secundárias) e antropológica: a adaptação de manifestações 
culturais a seus novos contextos geográficos (a arte rupestre, por exemplo). 
Tradicionalmente, associamos esse período ao homem de Cro Magnon (Les Eyzies, 
Dordonha) descoberto em 1868 que, juntamente com o Homem de Neandertal (1857) garanti-
ram a noção de evolução da nossa espécie, pois já estavam associados a uma civilização mais 
recente. Esta observação «tranqüilizadora» foi, desde então, muitas outras vezes repetida com 
todas as nuances essenciais acerca da determinação taxonômica (classificação das formas de 
vida) que veremos em seus contextos. 
A respeito da técnica de produção de artefatos, o critério mais evidente está na generali-
zação da utilização de lâminas de pedra como suporte para fabricação de ferramentas. Esta 
técnica não era incomum no Paleolítico Médio, mas adquiriu no Superior tal extensão que foi 
muitas vezes utilizada como critério de definição do período. Não é errado admitir que tal 
«explosão de produção de lâminas» possua um sentido histórico preciso, relacionando-a com 
o período aonde sua produção não foi ocasional. Interpreta-se tal sucesso na produção de lâ-
minas como um reflexo da utilização bastante útil do material lítico em função do surgimento 
de uma tecnologia realmente nova, que é a manufatura de artefatos sobre ossos. 
 
1
 OTTE, Marcel. Le Paléolithique Supérieur. in: La Préhistoire. Bruxelles, De Boeck Université, 1999. 123-
154. Tradução Marcus Vinícius Beber, Revisão Jairo Henrique Rogge. 
 
Com efeito, o trabalho em chifre de rena, em marfim ou osso exige um domínio das fer-
ramentas em pedra feitas a partir de lâminas lineares, que permitam a precisão do gesto e a fa-
cilidade de encabamento para acentuar a força transmitida, a regularidade das formas e das 
dimensões das partes da ferramenta em contato com os materiais a serem trabalhados. Desse 
modo a proliferação de lâminas líticas é testemunho indireto de uma modificação muita mais 
profunda das relações estabelecidas entre a tecnologia, o homem e a natureza. Doravante, o 
mundo animal está integrado, tanto quanto um objeto, ao mundo culturalizado pelo homem. 
Assim, no plano arqueológico, irão aparecer desde o início até o final do Paleolítico Superior 
um conjunto de armas de caça feitas em osso, refletindo uma diversidade de fases, etnias e 
funções. 
Os sítios conhecidos ou escavados, relacionados ao Paleolítico Superior, manifestam 
uma densidade demográfica muito maior do que a vista anteriormente na mesma região (Eu-
ropa). Observa-se uma forte variação funcional de um sítio para outro, parecendo que estão 
realmente especializados, sendo que suas atividades aparecem com mais nitidez. Este fato po-
de ser entendido como o surgimento de «estilos étnicos». Devido sua grande extensão (na es-
cala de um continente inteiro) estes estilos implicam em importantes movimentos sazonais, 
uma grande mobilidade dos grupos em geral e do estabelecimento de uma rede de informa-
ções em grande escala. Tal mobilidade, agora mais marcada, pode corresponder a um aumen-
to no número de atividades de um habitat em relação a outro, mesmo que a gama de ativida-
des não tenha, em si, sido tão diferente com relação ao Paleolítico Médio. 
Finalmente, esta nova relação do homem com seu ambiente pode se traduzir também 
pelo domínio da imagem. Doravante um mundo paralelo institui sua própria evolução, feita de 
uma sucessão de formas, cada vez mais autônomo e marcado pelo espírito em transformação. 
A arte aparece na Europa com o Paleolítico Superior em diferentes modalidades, tendo como 
origem a natureza e desdobrando-se em seus substitutos metafóricos: as «imagens» animais 
ou humanas. Estamos frente à reflexos tangíveis de uma mitologia, forte, bem construída, às 
vezes espetacular e atualmente comovente, justamente pelo que pode nos dizer. 
Cronologia e Ambiente 
Climaticamente, o início do Paleolítico Superior corresponde a uma fase «inter-
pleniglacial» (período entre dois momentos de intensa glaciação, em um mesmo período gla-
cial) de Würm (entre 45 e 40 mil anos a.p.) e segue ao longo da fase glacial seguinte (ou «ple-
niglacial B»), a partir de 40 mil anos a.p. até a fase Tardiglacial final, há cerca de 10 mil anos 
a.p. 
Início das Fases Climáticas Principais da Glaciação de Würm: 
• Inter-pleniglacial: 40 a 45 mil anos a.p. 
• Oscilação D' Arcy Kesselt: 28 a 25 mil anos a.p. 
• Pleniglacial B: de 20 a 25 mil anos a.p. 
• Tardiglacial: 15 a 8,5 mil anos a.p. 
• Dryas 1: 14 mil anos a.p. 
• Bölling: 13 a 12 mil anos a.p. 
• Dryas 2: 11 mil anos a.p. 
• Alleröd: 10 a 9 mil anos a.p. 
• Dryas 3: 8,5 mil anos a.p. 
 
• Holoceno: posterior a 10.500 a.p. 
 
Durante esse período, uma grande instabilidade climática foi observada através de estu-
dos de palinologia e de microfauna. Estes episódios foram mais ou menos rigorosos, mas a 
tendência geral foi de um clima frio, seco, mas ensolarado, com uma fase especialmente rude 
entre 20 e 15.000, reconhecido como «marcador» principal por toda a Europa (Figura 1). A-
lém disso, diversas variações regionais se fizeram sentir em função da latitude, altitude ou dis-
tância do mar. 
 
 
Figura 1. Europa durante o máximo glacial, em cerca de 20.000 anos aP. 
A extensão dos glaciares, variáveis segundo a época, determinaram a existência de uma 
certa quantidade de «corredores» entre os Alpes e a Europa do Norte, facilitando os contatos 
ao longo destes eixos. O nível marinho estava bastante abaixo do atual e as plataformas conti-
nentais estavam expostas e os climas notadamente mais secos. Por exemplo, não existia o Ca-
nal da Mancha nem o mar do Norte e uma vasta planície ligava a Inglaterra à Alemanha e à 
França. As «zonas» geográficas se alinhavam em linhas paralelas, estendidas mais ou menos 
na direção norte-sul: 
1. Tundra: área mais setentrional, bordeando os glaciares. Vegetação composta de mus-
gos, liquens e de árvores de pequeno porte; a fauna compreendia a rena e o bisonte; 
2. Taiga ou Estepe arbustiva: área que bordeia a tundra, com vegetação de pinheiros, 
salgueiros e bétulas, com uma fauna de cavalos e antílopes, mamutes e rinocerontes lanudos; 
3. Área Florestada: em regiões mais meridionais, apresentando uma fauna de cavalos, 
javalis e veados; 
4. Zonas Úmidas: com veados; 
5. Zonas Montanhosas: especialmente com cabrito montês. 
Anatomia 
Antes do Cro-Magnon (1858) já haviam sido descobertos restos humanos modernos as-
sociados ao Paleolítico Superior, com a forma Neandertal, mas estas descobertas foram rapi-
damente esquecidas. A "Red Lady" de Paviland, Inglaterra, foiencontrada em 1834 e recen-
temente datada do início do período. O crânio moderno de D'Engis (descoberto em 1823 em 
Liège, França) está associado aparentemente ao Paleolítico Superior e contrasta com o Nean-
dertal encontrado no mesmo sítio. Entretanto, uma data recente de C14 o coloca no Período 
Neolítico. 
As características gerais do Cro-Magnon são uma grande estatura (superior a 1,65 m) e 
um crânio do tipo «evoluído»: uma fronte direta, uma face alta e plana, um queixo saliente e 
uma redução alveolar, além de uma caixa craniana alta, com uma capacidade de volume idên-
tica a atual (Figura 2). 
As diferenças são, portanto, bastante claras em comparação com os neandertalenses e, 
no entanto, ambos foram parcialmente contemporâneos. Todavia, tais características são so-
bretudo evidentes nos grupos migrantes do exterior, que são os Aurignacienses. As formas de 
mestiçagem aparecem na fase média do período (Gravetiense, da Moravia) ao passo que os 
indivíduos neandertalenses subsistem ao início do Paleolítico Superior local (Chatelperronien-
se; tradição de pontas foliáceas) e ao Musteriense mais ocidental. Ainda mais, os homens do 
tipo moderno já estão presentes no Musteriense do Oriente Próximo. Enfim, as outras evolu-
ções parecem autônomas, como as das populações da África do Norte, que não se assemelham 
nem aos neandertalenses nem ao homem moderno europeu (homem de Mechta El Arbi, Figu-
ra 3). 
 
Figura 2. Crânio humano moderno Cro-Magnon. 
 
 
 
 
Figura 3. Crânio humano de Mechta El Arbi. 
 
No plano teórico, existem muitas interpretações quanto ao significado destas diferenças. 
Segundo alguns, as diferenças se dão pela ação de espécies diferentes, umas sobre as outras. 
Para outros, tratam-se de variações no interior de uma mesma espécie. Para os defensores da 
primeira teoria, as formas modernas serão de origem africana. Para os segundos, trata-se de 
uma população de origem asiática, com maior densidade demográfica que os neandertais lo-
cais. Cada uma das teorias concorda em considerar um influxo de origem externa e a dissoci-
ação necessária, fora da Europa, entre as conquistas culturais e a forma anatômica neste mo-
mento crucial da história da humanidade. Por fim, veremos mais tarde que as outras formas 
arcaicas (Homo erectus de Java, da África do Sul, da China) parecem ter seguido sua própria 
evolução para o estado moderno das respectivas populações paleolíticas. 
Tecnologia 
No Paleolítico Superior, os materiais líticos são tratados de uma forma bastante elabo-
rada, a partir de blocos, antes da extração de lâminas: produz-se uma curvatura das bordas do 
núcleo para a formação de uma «crista», oblíqua ao plano de percussão (Figura 4). As lâminas 
são geralmente extraídas por percussão direta, com percutor macio. Este método de tratamen-
to da rocha proporciona de 6 a 8 metros de gume útil (contra 2 metros do método Levalois, 
Paleolítico Médio). Os blocos então podem ser trazidos até o sítio, para a retirada de lâminas 
conforme a necessidade. Com isso tem-se uma maior flexibilidade em relação a localização 
das rochas de boa qualidade necessárias para a elaboração de instrumentos, ainda que se co-
nheça igualmente os sítios de lascamento. 
 
 
 
Figura 4. Técnica de lascamento e produção de lâminas. 
 
A partir destas lâminas de pedra, diferentes categorias de instrumentos são possíveis, a 
partir de retoques secundários (Figura 5). Dentro da gama de artefatos «domésticos» citamos 
os raspadores destinados ao trabalho em peles; os buris, utilizados para o trabalho com o ma-
terial ósseo e os furadores para materiais duros, como sementes ou osso (as peles são perfura-
das com a ajuda de furadores em osso, Figura 6). 
 
 
Figura 5. Modos de retoque secundário em lâminas. 
 
 
Figura 6. Principais artefatos do Paleolítico Superior (1,2: lâminas; 3,4: buril; 5: raspa-
dor; 6: furador; 7: faca; 8,9,10,11,12,13: pontas de projétil). 
Estas lâminas foram empregadas como suporte para a fabricação de artefatos pontiagu-
dos: pontas pedunculadas, pontas à cran, foliáceas (Solutrense) etc. 
O material ósseo foi intensamente utilizado em diversas funções. A partir de chifres de 
rena ou cervo, foram produzidas pontas de azagaia (lança), resistentes e flexíveis (Figura 7). 
Os modos de encabamento destas pontas de azagaia variam conforme o grupo cultural: base 
fendida em bisel ou fusiforme (Figura 8). As pontas de arpão com farpas ocorrem na segunda 
metade do período (cultura Magdaleniense, Figura 9). Os «bastões perfurados» serviam pro-
vavelmente para endireitar tais pontas de arpão (Figura 10). Estas funções se observam entre 
os esquimós contemporâneos de forma bastante semelhante. A reparação se faz justamente 
antes da caçada e o instrumento fica suspenso na cintura do caçador. Finalmente, o propulsor 
(atlatl) aparece na segunda metade do Solutrense (20.000 anos a.p.) e são formados por um 
bastão terminado por um gancho, facilitando o lançamento de azagaias (Figura 11). Qualquer 
destas peças apresentam uma soberba decoração na forma de entalhes. 
 
 
 
Figura 7. Etapas de manufatura de uma ponta óssea. 
 
 
 
 
Figura 8. Encabamento de pontas ósseas. 
 
 
Figura 9. Pontas ósseas de arpão. 
 
 
 
Figura 10. Preparação de um bastão perfurado. 
 
 
 
 
Figura 11. Modo de utilização de um propulsor. 
 
Dentro da gama de artefatos domésticos, os artefatos feitos em osso são recortados em 
lâminas a partir de quebras longitudinais; em seguida, essas são raspadas e polidas da mesma 
forma e eventualmente perfuradas para fabricação de agulhas ou pingentes (Figura 12). As 
lâminas de osso com extremidades curvas também foram transformadas em espátulas utiliza-
das para amaciar peles e para o esmagamento do ocre. As hastes de ossos maciços estão apon-
tadas (furadores) e serviam para furar o couro. As agulhas foram feitas à partir dos ossos lon-
gos dos herbívoros, dos ossos ou chifres de renas e eram perfurados, bem polidos em pedras 
de arenito (grês). As crinas de cavalo provavelmente foram usados como fios e foram ocasio-
nalmente encontradas protegidas em estojos feitos de tubos de osso (ossos de aves como gan-
so e grous). Rodelas entalhadas em osso, formando pratos, ocasionalmente apresentam gravu-
ras artísticas de «contornos entalhados». 
 
 
 
Figura 12. Modo de manufatura de agulhas. 
 
 
O fogo foi intensamente utilizado nestas técnicas e completamente dominado. Encon-
trou-se uma espécie de «isqueiro» feito de blocos de marcassita percutida, lamparinas (de-
pressões com marcas de queima) na rocha, traços de resina queimada e modelagem em terra 
cozida. 
Alimentação 
Sobretudo baseada na caça, a dieta alimentar no Paleolítico Superior foi progressiva-
mente complementada com a pesca e posteriormente com a coleta intensiva de mariscos (Fi-
gura 13). Contrariamente aos caçadores-coletores atuais e provavelmente às populações pré-
históricas anteriores, a coleta de vegetais não poderia ser um aporte calórico substancial em 
razão do ambiente generalizadamente frio que reinara na Europa. Entretanto, este aporte pode 
ter sido mais considerável durante os períodos de oscilações climáticas. No entanto, tais evi-
dências são, naturalmente, difíceis de serem observadas. 
 
 
Figura 13. Fauna caçada durante o Paleolítico Superior europeu. 
 
Em todo o caso, a implantação de um sítio na paisagem foi ditado, essencialmente, pelas 
práticas de caça: trilhas de grupos migratórios, pontos de observação ou passagem por rios. 
Estes sítios se apresentam, na realidade, como verdadeiros espaços de abate e consumo de 
carne. 
Os artefatos, abundantemente representados, comportam diferentes categorias de aza-
gaiasfeitas em osso (essencialmente de chifres de rena), mas as ferramentas líticas também 
são freqüentes: lâminas com dois gumes, fixadas lateralmente sobre uma haste, flechas etc. As 
armas mais freqüentes, empregadas na caça, são o uso esporádico do arco, ao lado do uso sis-
temático da azagaia e do propulsor. 
O ambiente de estepe, frio mas bem ensolarado, favorecia as grandes manadas de herbí-
voros, que deviam constituir a base econômica humana. Os animais destas manadas poderiam 
ser facilmente caçados nos grande espaços abertos formados pelas paisagens estépicas: renas, 
cavalos, bisontes. 
Diversas práticas de caça em grupo, próprias a cada tradição, eram usadas conforme os 
períodos do ano. Com efeito, tais manadas de herbívoros provavelmente obedeciam, como 
ocorre atualmente, um ciclo migratório sazonal, de tal forma que a caça abatida variava con-
forme a região, o ambiente e a estação considerada. 
Uma outra arma «clássicas» usada a partir da propulsão eram os arpões, que foram bas-
tante utilizados na pesca bem como na caça de pequenas espécies de mamíferos (lebres, rapo-
sas). Poderiam ter sido utilizadas, ainda, muitos tipos de armadilhas. 
Os territórios de exploração de cada grupo eram vastos e compostos, incluindo as áreas 
de apropriação de material, lugares cerimoniais para encontros temporários e espaços reserva-
dos para a caça, para partilha e para o consumo dos alimentos obtidos. 
Cada grupo, cada cultura, cada momento da evolução, cada região européia possuía as-
sim suas razões para um tipo particular de assentamento, designados pelo termo «habitat». Es-
tas particularidades são difíceis de serem estudadas, já que oscilam entre duas variáveis: o 
quadro natural e a sua exploração pelo homem. Em todo caso, trata-se de uma escolha particu-
lar e deliberada, realizada por uma tradição totalmente diferente proposta por outra sociedade, 
respeitadas as mesmas condições. Disso resulta que um habitat não pode ser abordado como 
um limite, uma vez que a região natural e a tradição em questão devem ser consideradas. I-
numeráveis exemplos podem ilustrar as diferentes situações conhecidas no continente euro-
peu: a cultura Magdaleniense na bacia parisiense, Hamburgiense nas planícies do norte, Gra-
vetiense nas planícies russas, o Aziliense da cordilheira Cantábrica. Dependendo da cultura 
considerada, a sua área de extensão varia igualmente. O grupo de cultura Gravetiense da bacia 
de Neuwied se opõe, por exemplo, à grande extensão da cultura Aurignacense através da Eu-
ropa central. Em uma escala macro-regional, observamos portanto aspectos como: fontes de 
água, pontos de passagem da caça, abrigos naturais e ainda, fontes de matéria-prima. 
Os dados obtidos através do estudo dos pólens, por sua vez, informam as condições do 
ambiente vegetal no momento das ocupações: prados ou estepes (favoráveis aos herbívoros), 
florestas ou tundras. As informações sobre a sazonalidade (crescimento dentário ou os chifres 
de veados) estabelecem um «calendário» dos deslocamentos pela paisagem e do período de 
predação. 
No nível micro-regional, as áreas de atividade são reconstituídas no interior dos habitats 
através da espacialidade e natureza dos vestígios. As reconstituições feitas a partir dessa abor-
dagem mostram a existência de uma dinâmica e uma cronologia e além disto, pode-se saber 
quais foram os métodos empregados por uma população e, mais ainda, podemos conhecer o 
seu desenvolvimento no tempo, além de sua dispersão no espaço doméstico. O caso do sítio 
de Meer, na Bélgica, foi exemplar: associar estudos de marca de utilização de instrumentos. 
Tal reconstituição possibilitou a organização da sucessão das diferentes atividades desenvol-
vidas no sítio durante a fase tardiglaciar (fase de Alleröd): debitagem de chifres de cervídeos, 
trabalhos em peles, consumo e processamento de alimentos. Feitas ao ar livre, estas atividades 
se revelaram pela natureza dos vestígios que estão dispostos espacialmente: no sítio de Pince-
vantnos podemos «ver» a área de consumo e distingui-las das áreas de preparação de lâminas 
e debitagem do material lítico, áreas de fogueiras e zonas de descanso. 
No nível intermediário, o habitat propriamente dito, consiste em uma estrutura de prote-
ção (frio, vento, umidade) de natureza variada, segundo os recursos naturais locais e as quali-
dades de observação do escavador. As grandes categorias foram classicamente reconhecidas 
através do espaço europeu, sem que sejam apontadas como exclusivas de algum grupo ou al-
guma região. Os abrigos ou as entradas das cavernas foram intensamente utilizadas (como ho-
je para os piqueniques): La Madaleine na Dordonha, Le Petersfels na Alemanha, Chaleux na 
Bélgica. Desde então a sedimentação prosseguiu durante a ocupação (por erosão das paredes). 
Estes espaços são favoráveis à pesquisa arqueológica, com todas as instalações consolidadas 
de uma maneira contínua. A maior parte dos abrigos do sudoeste francês «funcionam» desta 
maneira e constituem sítios arqueológicos de primeira importância. Entretanto, por serem fa-
cilmente localizáveis, estes abrigos tornaram-se alvo de escavações rápidas e precoces. As ca-
banas para moradia são reconhecidas pelos traços que deixaram, em arcos de círculo vazios, 
junto aos vestígios observados sobre o solo (Figura 14). Em Ahvernsburg, no norte da Ale-
manha, as peles dispostas em círculos estavam calçadas com pedras, ainda visíveis no solo. 
Em Pincevant (próximo à Paris), as tendas estavam instaladas junto à uma passagem (Figura 
15). Na forma de um cone oblíquo, testemunham uma instalação sazonal, localizada ali em 
função da passagem de manadas de animais pelo rio. 
 
 
 
Figura 14. Planta baixa de uma área de cabanas. 
 
 
 
Figura 15. Reconstituição de uma tenda. 
As cabanas conhecidas como «yourte», semelhante às existentes hoje entre os habitantes 
da Ásia central, possuíam paredes verticais com um teto cônico (Figura 16). Em Gönnerdorf 
(Renânia), um sítio foi reconstituído com base nas marcas de estacas e no diâmetro interno 
das cabanas. O interior das mesmas estava «ladrilhado» com placas xistosas, que serviam 
também como suporte para diferentes decorações. Trata-se, aparentemente, de um abrigo sa-
zonal ou de atividades particulares (rituais, artísticas), realizadas regularmente. 
 
 
Figura 16. Reconstituição de uma tenda da Ásia Central. 
 
Na Europa central e oriental foram identificadas cabanas feitas de ossos maciços, sobre-
tudo de mamutes, mas também de outros grandes herbívoros, formando conjuntos circulares 
superpostos, como os blocos de gelo dos iglus, mais ou menos permanentes e facilmente loca-
lizáveis a longa distância, na estepe aberta (Figura 17). Tais habitações são encontradas em 
Spadzita, na Polônia, nas planícies Russas (Gagarino) e Ucranianas (Mezine e Mizerichi). Es-
tão enterrados no löess (sedimentos soprados pelo vento glacial) e resistem muito bem às 
condições frias e ventosas destas regiões, onde os ossos pesados tomam o lugar dos materiais 
de construção, na ausência de abrigos naturais. 
Sociedade 
No Paleolítico Superior, podemos observar traços sociais inexistentes anteriormente. 
Por exemplo, a presença de centros de arte rupestre sugere lugares cerimoniais de concentra-
ção humana, ajudando a regular o conjunto de informações que circulam entre grupos disper-
sos. 
 
 
 
Figura 17. Reconstituição de uma cabana feita com ossos de mamute. 
 
Em outros lugares, conchas fósseis transportadas à longa distância demonstram a exis-
tência de redes de troca, de caráter religioso ou social. Nesses lugares, no Paleolítico Superior, 
surge o uso de pingentes e de decoração corporal (Figura 18). Isto indica claramente a identi-
ficação com o grupo, seja por idade ou status social. 
 
 
Figura 18. Colares usados na decoração corporal. 
Feitos em concha,em dentes de animais (dentes de cervo e de rena), estes pingentes são 
algumas vezes feitos em marfim e podem também ter formas bastante elaboradas. Nas sepul-
turas, estes pingentes adornam o morto, marcando sua identidade eternamente. Encontramos 
assim colares, braceletes, o pó de ocre e os enterramentos que seguem um ritual elaborado. 
Certos objetos de uso prolongado possuem uma decoração personalizada: os propulso-
res de azagaias e os bastões perfurados possuem entalhes de figuras animais. Belíssimas ex-
pressões técnicas e artísticas. Estas esculturas estabelecem entre si uma relação entre a ativi-
dade de caça, a etnia e o proprietário do objeto. 
Modos de Vida 
A partir dos materiais recuperados e com base nas espécies animais caçadas, as áreas 
geográficas percorridas pelos caçadores eram imensas. Os laços sociais poderiam unir os gru-
pos espalhados sobre estes vastos territórios. Parte destes grupos deveria provavelmente se u-
nir a fim de seguir as migrações sazonais das manadas (renas, cavalos, bisontes). Os ciclos sa-
zonais possuíam uma grande importância para tais modos de vida, tanto para predação como 
para o desenvolvimento das cerimônias. Certas lâminas de osso foram interpretadas como ca-
lendários lunares e não há dúvidas de que um controle do tempo fosse crucial para prevenir a 
mudança das estações, organizar as migrações, reunir as populações para as cerimônias. 
Os restos ósseos encontrados nos sítios de habitação provam que havia práticas de es-
quartejamento da caça. Uma regra de distribuição deveria ser estabelecida entre os membros 
do grupo de caça, a fim de consolidar a solidariedade social. A escolha das espécies a serem 
abatidas, os momentos e locais de caça, a partilha da caça entre os caçadores deveria estar, as-
sim, definida previamente. As marcas gravadas sobre as pontas de flecha foram, por exemplo, 
um testemunho desta organização que designa as funções de cada indivíduo nas atividades de 
caça. A estimativa calórica obtida pelo peso da carne de caça consumida possibilita uma indi-
cação da densidade demográfica e da importância do grupo. 
A extensão da área geográfica ocupada implica em práticas de segmentação do grupo, 
relativas a funções diferentes dispersas na paisagem. Esta segmentação parcial e provisória, 
combina uma vida nômade com habitats diversificados. Os ciclos de deslocamentos regulares 
estabelecem redes de contato e trocas de longa distância. 
Os grandes grupos sociais, com estrutura mais complexa e flexível, organizam encon-
tros periódicos para fins de intercâmbio (de bens, esposas, informações). Estimativas demo-
gráficas são bastante aleatórias, mas estima-se cerca de vinte mil pessoas para o território 
francês, por exemplo. Cada grupo nômade pode reunir entre 50 e 100 pessoas. A partir dos 
vestígios encontrados em sítios arqueológicos, estes assentamentos deveriam ser curtos, mas 
densos (como os dos índios das planícies norte-americanas, por exemplo). Os freqüentes re-
tornos aos sítios de acampamento regular testemunham a gestão do tempo e do espaço pelos 
costumes dos caçadores e o duplo princípio de ciclos e redes de relações. 
Religião 
Presente desde o Paleolítico Médio, os traços de religiosidade são extremamente ricos e 
variados no Paleolítico Superior. A arte rupestre (Figura 19 e 20), suporte evidente dos ritos 
religiosos, opera sobre um mundo de preocupações espirituais coerentes, significativas, ex-
tremamente variadas de acordo com os grupos étnicos, mas todavia elaboradas e estruturados. 
As mitologias explicativas de mundo foram criadas, instituídas e difundidas pelos caçadores 
paleolíticos, se expressando sob a forma de imagens monumentais, que deveriam reger os 
comportamentos cotidianos e refletir-se nos valores, mentalidades e regras sociais. 
 
 
Figura 19. Painel com pinturas zoomorfas. Lascaux, França. 
 
 
 
Figura 20. Pintura de bisão. Altamira, Espanha. 
Se os traços da mitologia estão presentes na grande quantidade de pinturas, no entanto a 
expressão gestual dos rituais está fora de qualquer registro arqueológico mais acessível. Os 
traços de práticas xamânicas são evidentes: a título de exemplo, em bastões (ou baquetas) de 
tambor recuperados em uma sepultura em Brno e nas figuras de homens fantasiados de ani-
mais, nas grutas francesas. Se a relação com a natureza perpassada pela existência de um sa-
cerdote é universal entre os grupos caçadores da atualidade, sua origem paleolítica torna-se 
bastante lógica. Para certos pesquisadores, a arte parietal por si só demostra práticas xamâni-
cas realizadas sob o efeito de êxtase (provavelmente induzido pela ingestão de alucinógenos). 
As práticas mágicas são igualmente semelhantes como sugerem certas figuras. Co isto a van-
tagem sobre o mundo animal pode ser obtida de uma forma simbólica (a flecha exprime o po-
der do homem) e figurativa (o animal pintado não é necessariamente o animal caçado). 
Os rituais de iniciação, igualmente universais, parece ocorrer na penumbra das grutas; 
as provas a superar e os mitos a descobrir, os instrumentos musicais (tambores, flautas), as fi-
guras encontrados deveriam acompanhar estas cerimônias. 
Freqüentes e bem conservadas, as sepulturas do Paleolítico Superior possuem um abun-
dante acompanhamento funerário, atestado de uma grande variedade de práticas rituais, se-
gundo as etnias e o nível social do morto. As posições podem ser fletidas ou estendidas, o 
morto pode estar protegido por uma sepultura com paredes revestidas com lages (Sain-
Germain, La Rivière) conforme percebemos nas tumbas megalíticas, ou dispostas em fossas 
sob um amontoado de pedras (Laugerie Basse), freqüentemente pintado com ocre vermelho, 
com muitas conchas e pingentes (Grimaldi, La Madaleine), indicando roupas costuradas.

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