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NARCISISMO E CULTURA 
MIDIÁTICA 
AULA 5 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Profª Isabela Dalle Varela 
 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
Anteriormente, trabalhamos questões referentes ao narcisismo, ao eu 
ideal e ao ideal do eu, ao narcisismo das pequenas diferenças e ao ciberespaço. 
Vimos, de forma isolada, cada um desses temas. Nesta etapa, iremos uni-los. 
Vamos, portanto, trabalhar com o tema algumas reflexões sobre o narcisismo e 
as redes sociais. 
Para organizar nossa reflexão, o conteúdo será dividido da seguinte 
forma: redes sociais como palco para o narcisismo, celebridades como objetos 
narcísicos, validação e reconhecimento, distúrbios de imagem e, finalmente, 
ansiedade e depressão. 
Você pode ver que temos muito o que discutir... Vamos começar? 
TEMA 1 – REDES SOCIAIS COMO PALCO PARA O NARCISISMO 
Vimos, em nossas duas primeiras etapas, que o narcisismo é parte natural 
do nosso desenvolvimento psíquico, mas que pode, sob certas circunstâncias, 
tornar-se patológico, com a necessidade de validação e a vulnerabilidade às 
críticas se fazendo presentes. As redes sociais, nesse contexto, tornam-se locais 
ideais para exibição do narcisista, uma vez que é dada primazia à imagem e 
exposição constante. 
Essa é uma realidade social de que não temos como escapar. Sendo 
assim, vamos entendê-la melhor? 
1.1 Declínio da ordem simbólica 
A ordem simbólica refere-se à estrutura de significados, valores e normas 
que regulam a vida social e psicológica dos indivíduos, sendo essencial para a 
formação da identidade e para a integração do sujeito na sociedade. Podemos 
dizer que é construída e mantida por meio de símbolos, mitos, narrativas 
culturais e instituições que fornecem um senso de estabilidade e continuidade. 
Nesse sentido, Bender (2023, p. 1) irá nos dizer que 
A ordem simbólica da qual emergem as identificações que estruturam 
o Eu é uma construção histórica e cultural que não possui causalidade 
material direta. Sendo assim, o que chamamos de identidade provém 
do campo ficcional, mas trata-se de uma ilusão necessária para que o 
indivíduo possa integralizar a experiência de ser ‘si mesmo’ ao longo 
do tempo, costurando uma narrativa capaz de atribuir um sentido 
apaziguador à sua existência. A força do símbolo, isto é, a crença na 
 
 
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sua legitimidade é o que determina o efeito que produzirá no 
psiquismo. 
Na contemporaneidade, contudo, é possível verificar uma crescente 
relativização dos valores e verdades que, anteriormente, eram considerados 
absolutos. Aliado a isso, temos mudanças econômicas; o advento das novas 
tecnologias, como a internet e as redes sociais; a crise das figuras de autoridade, 
como pais, líderes religiosos e instituições políticas; o crescimento do 
individualismo radical; e, finalmente, a secularização e a perda de influência das 
grandes religiões e filosofias na vida cotidiana. 
Todos esses fatores, somados, contribuíram para a desestabilização de 
estruturas tradicionais de significado e valor, gerando um enfraquecimento 
significativo da eficácia simbólica. As coordenadas simbólicas que antes 
organizavam nossa vida psíquica e social não existem mais. Bender (2023, p. 1) 
nos diz: “Quando a função simbolizante é muito forte, a subjetividade produzida 
tende a ser reprimida por sua crença em verdades vivenciadas como absolutas. 
Diante da relativização dos valores e certezas, diante da dúvida, a eficácia 
simbólica declina.” 
1.2 Impacto das novas tecnologias 
As novas tecnologias, particularmente as plataformas de redes sociais, 
mudaram drasticamente a forma como nós interagimos. A comunicação, que 
antes se baseava em trocas simbólicas mais profundas e significativas, passou 
a ser mediada por plataformas que favorecem a rapidez e a superficialidade. Tal 
mudança tem implicações diretas na ordem simbólica, pois o significado e os 
valores simbólicos dependem de um processo comunicacional mais lento e 
reflexivo, algo que as novas tecnologias muitas vezes não promovem. 
Não é nenhuma novidade dizer que a imagem se tornou o principal meio 
de expressão e comunicação. As redes sociais, em particular, são centradas na 
visualidade, em que a aparência e a performance têm primazia sobre o conteúdo. 
Isso se reflete em uma mudança significativa na ordem simbólica: o simbólico é 
substituído pelo imagético, e o significado profundo é suplantado pela aparência 
superficial. Bender (2023, p. 2) irá nos dizer que, “[...] diante do relativismo 
absoluto e da impossibilidade de simbolização, a ficção das metanarrativas 
institucionais tem sido, em parte, substituída pelo simulacro imaginário.” 
 
 
4 
Baudrillard (1991) vai nos dizer que simulacros são cópias ou 
representações que não possuem uma referência direta na realidade. Com as 
redes sociais, essa ideia se expande, pois a vida on-line, muitas vezes, se torna 
mais real que a vida off-line. Grande parte das pessoas passa a viver para o 
espetáculo, criando versões idealizadas de si mesmas que pouco, ou nada, têm 
a ver com suas vidas reais. 
Podemos, portanto, pensar que, diante da ausência de uma ordem 
simbólica forte e com a incorporação cada vez maior das novas tecnologias em 
nossas vidas, as identidades criadas on-line (simulacros) irão tomar o lugar das 
realidades simbólicas sociais. Há, portanto, uma retroalimentação do processo 
de declínio, favorecendo o estabelecimento de um ambiente em que o 
narcisismo pode prosperar sem as limitações do mundo físico. 
1.3 Narcisismo e construção da identidade 
Vimos, em etapa anterior, que o narcisismo é uma fase essencial do nosso 
desenvolvimento psíquico saudável, pois permite, por um lado, a construção da 
nossa autoestima por meio de uma identidade sólida e, por outro, o 
desenvolvimento equilibrado de nossas relações afetivas com os outros. Nos 
dias atuais, contudo, há uma intensificação das características narcisistas devido 
à ênfase na imagem e na autoexposição, especialmente nas redes sociais. Isso 
pode levar a uma exacerbação do narcisismo secundário, pelo qual a busca 
incessante por aprovação externa pode prejudicar a capacidade do indivíduo de 
se relacionar de forma saudável com os outros e consigo mesmo. 
Podemos afirmar, sem medo de errar, que, em nossa sociedade, há o 
predomínio de uma cultura em que a individualidade é celebrada e a construção 
da identidade torna-se um projeto central da vida de cada pessoa. Contudo, essa 
centralidade do eu muitas vezes leva a uma fragmentação da identidade, pela 
qual nos vemos, constantemente, moldando e ajustando nossa imagem para 
atender às expectativas externas, uma vez que nos tornamos cada vez mais 
dependentes do olhar do outro sobre nós (Bender, 2023). 
1.4 Cultura do exibicionismo 
A cultura do exibicionismo trata-se de um fenômeno contemporâneo em 
que a exibição da própria imagem, vida e realizações se torna uma prática central 
 
 
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na vida social, especialmente mediada pelas redes sociais. Esse comportamento 
está intrinsecamente ligado ao narcisismo moderno, pelo que a necessidade de 
ser visto e reconhecido pelos outros se torna um imperativo quase universal. 
Gomes et al. (2015) vão nos dizer que redes sociais atuam como arenas 
públicas onde as performances de identidade são avaliadas e validadas por um 
público potencialmente global. A busca por visibilidade e reconhecimento se 
torna uma força motriz, impulsionada pelos algoritmos das plataformas, que 
privilegiam conteúdo popular e altamente visível. Esse ciclo de feedback positivo 
(mais visibilidade leva a mais validação, que leva a mais visibilidade) cria um 
ambiente em que a autoexposição se torna quase compulsiva. 
Atualmente, a popularidade é, muitas vezes, confundida com sucesso ou 
valor social e isso é extremamente perigoso, pois sua busca incessante pode 
ocasionar consequências psicológicas negativas quando o objetivo não é 
alcançado. Iremos abordar essa questão um pouco mais adiante.TEMA 2 – CELEBRIDADES COMO OBJETOS NARCÍSICOS 
Quando nos propusemos a desenvolver o tema algumas reflexões sobre 
narcisismo e redes sociais, escolhemos alguns tópicos que consideramos 
fundamentais. As celebridades, sem sombra de dúvida, são um deles. Não 
podemos ignorar que elas são um fenômeno particularmente relevante no 
contexto contemporâneo, em que a constante exibição midiática é fator 
intensificador de identificação narcísica por parte do público. 
Devemos, portanto, buscar compreender um pouco melhor essa relação 
complexa entre o eu e o outro e os impactos psicossociais dessa adoração em 
massa que pode tanto reforçar quanto distorcer a percepção de identidade e 
valor pessoal. 
2.1 Contextualizando 
Para a psicanálise, objeto é um termo que se refere ao alvo da pulsão, ou 
seja, àquilo pelo qual a pulsão se orienta para alcançar satisfação. Os objetos 
não são necessariamente pessoas; podem ser partes do corpo, objetos reais ou 
até representações psíquicas. Na concepção freudiana, o objeto é, em muitos 
casos, secundário à pulsão, que é o aspecto primário da constituição da 
subjetividade. 
 
 
6 
Em Introdução ao narcisismo, Freud (2021) descreve como a libido, 
originalmente direcionada ao próprio eu, pode ser redirecionada a objetos 
externos. Contudo, mesmo quando direcionada a objetos externos, essa escolha 
pode manter um caráter narcísico. Sendo assim, objetos narcísicos seriam 
aqueles escolhidos pelo sujeito por sua capacidade de refletir ou representar 
aspectos do próprio eu. Em uma escolha narcísica, o indivíduo projeta em um 
objeto externo (pessoa, ideia, figura pública...) aspectos de si mesmo, ou de seu 
ideal de eu, ou de suas aspirações. 
As escolhas narcísicas de objeto, para Freud (2021), baseiam-se em o 
que o sujeito é (reflexo de uma autorreferência, em que o objeto é visto como 
uma extensão ou espelho do próprio sujeito); o que o sujeito foi (busca-se no 
objeto uma versão anterior de si mesmo ou uma idealização do passado); o que 
gostaria de ser (ideais que ele ainda não atingiu); em alguém que foi parte de si 
(antiga conexão do sujeito que foi essencial em sua formação). 
Quando um objeto é investido narcisicamente, torna-se um reflexo do eu 
e nossa relação com esse objeto tende a ser marcada por expectativas de 
confirmação e validade da nossa própria identidade. Caso pensemos em um 
narcisismo patológico, teremos relações disfuncionais, em que o outro será 
valorizado não por suas qualidades, mas pelo que ele representa para nosso eu. 
É possível vermos isso em casos de figuras públicas (como as celebridades) 
idealizadas e transformadas em objetos narcísicos por seus admiradores. 
2.2 Celebridades como objetos narcísicos 
As celebridades, em nossa sociedade, se tornaram ícones culturais e 
símbolos de sucesso, beleza, poder e perfeição, que são atributos que boa parte 
das pessoas aspiram alcançar. Esse fenômeno é, ainda, reforçado pela cultura 
do exibicionismo e pelas redes sociais, que criam uma ilusão de proximidade 
entre figuras públicas e seus seguidores. 
Ortiz (2016) destaca outro ponto importante. Segundo ele, numa 
sociedade de consumo (como a nossa), que promove e sustenta a cultura das 
celebridades ao criar um mercado ávido por notícias, imagens e produtos 
associados a essas figuras públicas, tornam tais celebridades em símbolos 
consumíveis, cujas imagens e narrativas são constantemente reproduzidas e 
comercializadas. 
 
 
7 
Aliado a isso, temos Bender (2023), que afirma que o vazio identitário é 
preenchido por figuras que fornecem uma ilusão de identidade e completude, 
como as celebridades, que são consumidas não apenas por suas habilidades ou 
talentos, mas pelo que representam no imaginário social. As celebridades 
funcionam, portanto, como emblemas sociológicos na medida em que encarnam 
ideais culturais e sociais. São, assim, investidas de um valor simbólico que 
transcende sua individualidade, tornando-se ícones culturais que influenciam as 
dinâmicas sociais e psíquicas. 
A identificação com essas figuras se dá muitas vezes em um nível 
inconsciente, pelo que o indivíduo projeta seus desejos e aspirações sobre a 
celebridade. Essa dinâmica é explicada pela teoria freudiana dos objetos de 
identificação, na qual o eu se forma por meio da introjeção de qualidades 
observadas em figuras idealizadas, de acordo com Coelho Jr. (2001). 
Tal forma de identificação é fundamental para a compreensão de como 
as celebridades podem exercer uma influência tão poderosa sobre o 
comportamento e a autoestima das pessoas. No contexto do narcisismo, 
contudo, essa identificação pode se tornar compulsiva, com o indivíduo 
constantemente buscando se alinhar com os ideais representados pelas 
celebridades. 
TEMA 3 – VALIDAÇÃO E RECONHECIMENTO 
Em nossa etapa sobre narcisismo, vimos que, para a teoria freudiana, um 
desenvolvimento psíquico saudável depende de um equilíbrio adequado entre a 
libido investida no eu e nos objetos externos. Para Kohut (citado por Etchegoyen, 
2007), quando os objetos do self (p. ex., pais) fornecem respostas empáticas e 
consistentes, a criança desenvolve um self saudável. A falta dessa resposta leva 
a um self frágil, que busca, incessantemente, validação externa. Diante disso, 
podemos afirmar que a validação e o reconhecimento dos outros ajudam a mover 
a libido do narcisismo primário para um relacionamento mais equilibrado com os 
objetos externos. Caso essa validação não ocorra, serão utilizados mecanismos 
de defesa para proteger o eu, tais como a projeção e a formação reativa. 
Ao pensarmos em uma pessoa que necessita de validação e 
reconhecimento constantes, o mundo digital, com suas múltiplas plataformas e 
redes sociais, cria um cenário ideal, pois o sujeito pode explorar infinitas 
 
 
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possibilidades de ser sem ser, no sentido de que ela adotará identidades 
performáticas e superficiais, desconectadas de uma essência autêntica. 
De acordo com Giordano Filho (2019, p. 5), “o principal objetivo dos 
indivíduos é a busca por admiração e amor, de modo tão instantâneo que nem 
ocorre uma reflexão se ele se sentirá melhor após muitas curtidas e elogios, 
prevalecendo o imaginário sobre o simbólico.” A busca incessante por validação 
pode levar a um comportamento compulsivo, pelo qual o indivíduo estará sempre 
à procura da próxima “dose” de reconhecimento, de modo similar a uma 
dependência. A aprovação digital torna-se uma moeda de troca, uma forma de 
medir o próprio valor, mas que nunca realmente satisfaz de maneira duradoura. 
Nesse sentido, Benilton Bezerra Jr. (citado por Bender, 2023, p. 2-3) nos 
diz que: 
Numa sociedade tradicional, você sabe o que você é, quem você é, 
porque a sociedade lhe diz isso. Não é algo que caiba a uma instância 
interna definir. O seu lugar na hierarquia social é determinado para 
além das suas vontades. Numa sociedade individualista radical esse 
princípio se torna fluido. Vivemos em um imaginário em que cabe a 
cada um se fazer valer, se fazer reconhecer e, portanto, ficamos cada 
vez mais dependentes desses mecanismos de reconhecimento, cada 
vez mais dependentes do olhar do outro sobre nós, o que faz com que 
o sujeito viva permanentemente na busca de ser reconhecido, cada 
vez mais atravessado por essa insegurança que o olhar do outro 
precisa compensar. Isso é a essência do fenômeno do narcisismo nas 
sociedades contemporâneas. Não é tanto o mito de narciso que se 
encanta com a própria imagem; é mais o espelho da bruxa da branca 
de neve para o qual ela pergunta constantemente ‘existe alguém mais 
bonito do que eu’? 
Ao sermos, sem ser, experienciamos um vazio existencial que, com o 
tempo, se agrava e nos aliena. Estamos sempre em busca de algo que nunca 
realmente encontramos. O ciclo de insatisfação e busca incessante de validação, 
além de nos fragilizar, pode ser determinante no desenvolvimento de alguns 
transtornos e sofrimentos psíquicos.É o que veremos nos próximos tópicos. 
TEMA 4 – DISTÚRBIOS DE IMAGEM 
Diante de tudo que já trabalhamos até agora, não temos dúvidas que a 
cultura do narcisismo, aliada ao uso excessivo dos meios digitais, em que a 
primazia da imagem e a exposição constante são hipervalorizadas, podem levar 
a transtornos e sofrimentos psíquicos, tais como ansiedade, depressão e 
diversas questões relacionadas à autoimagem e autoestima. 
 
 
9 
Dessa forma, resolvemos inserir dois tópicos sobre tais questões. Agora, 
iremos trabalhar alguns pontos sobre os distúrbios de imagem. 
4.1 Definição 
Para podermos entender o que são distúrbios de imagem, torna-se 
essencial, primeiro, entender o que é imagem, para a psicopatologia. Para 
Dalgalarrondo (2019, p. 260), imagem ou esquema corporal são definidos como 
[...] a representação que cada indivíduo faz de seu próprio corpo. Essa 
percepção do próprio corpo é construída e organizada tanto pelos 
sentidos corporais externos e internos como pelas representações 
mentais, afetivas e cognitivas, referentes ao organismo. Assim, a 
diferenciação entre o corpo físico, objetivo (corpo anatômico), e o 
vivenciado, percebido subjetivamente pelo sujeito (esquema corporal), 
é de suma importância. 
Nosso esquema corporal é construído ao longo da nossa história de vida 
e envolve a forma como nossos pais, irmãos e pares nomeavam, significavam e 
valorizavam suas partes e funções. Nesse sentido, “o esquema corporal está 
sempre ligado à experiência afetiva, imposta pela relação com o outro, além da 
história de vida e experiências culturais do indivíduo”, de acordo com 
Dalgalarrondo (2019, p. 261). 
Podemos compreender que os distúrbios de imagem, no contexto 
psicopatológico, referem-se a alterações na percepção ou na representação que 
o indivíduo tem do próprio corpo, ou seja, nas distorções em sua aparência física, 
particularmente quanto ao tamanho, forma e proporções. É importante ressaltar 
que tais distorções não estão alinhadas com a realidade objetiva, mas sim com 
uma visão subjetiva e frequentemente negativa que pode influenciar 
profundamente o comportamento, as emoções e a autoimagem do indivíduo. 
Normalmente, quando falamos em distúrbios de imagem, as pessoas os 
associam aos transtornos alimentares, tais como: anorexia nervosa e bulimia. 
Contudo, não há essa restrição, uma vez que tais distúrbios também podem ser 
observados em outras condições, como o transtorno dismórfico corporal, pelo 
qual a pessoa é obcecada por um defeito imaginário ou uma pequena 
imperfeição na aparência física que, geralmente, passa despercebida pelos 
outros, mas é uma fonte de grande angústia para o indivíduo. 
A definição de distúrbios de imagem, portanto, está intrinsecamente ligada 
à percepção subjetiva que o indivíduo tem de si mesmo e a como essa 
percepção distorcida pode influenciar negativamente sua vida. A cultura 
 
 
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midiática, com sua ênfase em padrões estéticos idealizados e frequentemente 
inalcançáveis, pode exacerbar essas distorções, contribuindo para a sua 
manutenção e agravamento. 
4.2 Características 
Os distúrbios de imagem podem estar presentes em diversos transtornos 
e condições distintas. Sendo assim, não há como tecer um rol taxativo de suas 
características e nem afirmar que se alguma delas estiver presente teremos 
diante de nós, necessariamente, uma pessoa com distúrbio de imagem. 
Ressaltamos ainda que essas características podem variar de intensidade e 
manifestação e requerem uma abordagem terapêutica multifacetada para que 
possam ser compreendidas em toda a sua extensão. 
Cientes de tal complexidade, vamos a algumas características: 
• Distorção da percepção corporal. O indivíduo tem uma visão irrealista 
e geralmente negativa de seu corpo, acreditando que partes de seu corpo 
são maiores ou menores do que realmente são. 
• Preocupação excessiva. Pessoas com distúrbios de imagem 
frequentemente demonstram uma preocupação obsessiva, com o peso e 
a forma física, que pode dominar seus pensamentos diários e influenciar 
suas decisões e comportamentos. Há uma busca constante por um corpo 
ideal, frequentemente inspirado por padrões irreais promovidos pela 
mídia. 
• Comportamentos compensatórios e restritivos. Devido à distorção e à 
insatisfação com o próprio corpo, é comum que os indivíduos com 
distúrbios de imagem adotem, para supostamente corrigir o que 
percebem como falhas, comportamentos extremos que serão 
frequentemente acompanhados por um ciclo de culpa e vergonha, caso 
não consiga mantê-los. 
• Impacto na autoestima e identidade. Pessoas com esse tipo de 
distúrbio tendem a basear grande parte de sua autoestima e valor pessoal 
em sua aparência física, levando a uma autoavaliação negativa 
constante. Essa dependência da aparência pode resultar em sentimentos 
crônicos de inadequação, vergonha e até desespero, especialmente se a 
 
 
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pessoa não conseguir atingir os padrões de beleza que internalizou como 
centrais. 
• Isolamento social e dificuldades interpessoais. É muito comum, 
devido à percepção equivocada da imagem, que situações que envolvam 
exposição do corpo sejam evitadas. O medo de críticas e julgamentos 
pode levar a um isolamento cada vez maior, ocasionando conflitos tanto 
na esfera familiar quanto na profissional. 
• Comorbidades psicológicas. Tais distúrbios coexistem com outros 
transtornos mentais, tais como: depressão, ansiedade, transtorno 
obsessivo-compulsivo, transtornos alimentares, transtorno dismórfico 
corporal, entre outros. 
• Resistência à mudança. Uma das características mais desafiadores dos 
distúrbios de imagem é a resistência do indivíduo à mudança de 
percepção mesmo quando é confrontado com evidências reais que o 
contradizem. Isso se deve, na maior parte das vezes, à natureza 
enraizada de tais distorções, uma vez que são sustentadas por padrões 
de pensamento rígidos. 
4.3 Tratamento 
Vimos que os distúrbios de imagem englobam diversos tipos de 
transtornos e sofrimentos psíquicos. Então, não há como apresentar aqui um 
tratamento padrão ou formas específicas para cada espécie de transtorno. 
Devemos ressaltar, contudo, que a melhor abordagem é a multidisciplinar, 
envolvendo intervenções psicológicas, psiquiátricas e médicas. 
O objetivo principal do tratamento será auxiliar o sujeito a desenvolver 
uma percepção mais realista e saudável de seu corpo, além de tratar as 
possíveis comorbidades correlacionadas. É extremamente importante que o 
tratamento seja adaptado às necessidades individuais levando em consideração 
(além dos aspectos clínicos) o contexto social e cultural do paciente. 
TEMA 5 – ANSIEDADE E DEPRESSÃO 
Diante de todo o conteúdo já trabalhado por nós, vimos como nossa 
relação com o meio digital é complexa. De um lado, ele nos auxilia ao possibilitar 
novas formas de ser, ajudando a conhecer novas culturas, a interagir com 
 
 
12 
pessoas que estão distantes de nós, a trabalhar em locais que as barreiras 
físicas não permitiriam, entre tantas outras experiências. De outro, o ciberespaço 
também é considerado como fonte importante de sofrimento. A exposição 
contínua a imagens e narrativas idealizadas nas redes sociais pode criar um ciclo 
de comparação prejudicial à saúde mental e tem sido apontada como um fator 
significativo para ansiedade e depressão. Tendo isso em mente, vamos agora 
conversar um pouco sobre esse assunto. 
5.1 Definição e características 
Em nossa clínica, é muito comum nos depararmos com analisandos com 
quadros de ansiedade e depressão. Devemos, portanto, compreender um pouco 
melhor o que elas são e quais suas características. 
Dalgalarrondo (2019) define a ansiedade como um estado de humor 
desconfortável em que há uma apreensão negativa em relação ao futuro e uma 
inquietação interna desagradável. Aliado a isso haverá, também, manifestações 
somáticas, tais como desconforto respiratório, taquicardia, tensãomuscular, 
tremores, entre outras. 
A depressão, por sua vez, é caracterizada por Dalgarrondo (2019) por um 
humor triste, prostração profunda, desespero e uma incapacidade de sentir 
prazer (anedonia) e uma série de alterações na esfera volitiva, como desânimo 
acentuado. Essas características são desproporcionalmente mais intensas e 
duradouras do que as respostas normais de tristeza que ocorrem ao longo da 
vida. Sintomas adicionais podem ser agrupados em diferentes esferas 
psicopatológicas (afetivas, de volição e somáticas); mas, em casos graves, é 
possível incluir, também, sintomas psicóticos como delírios e alucinações. 
5.2 Ansiedade, depressão e redes sociais 
As redes sociais têm gerado, nos últimos anos, grande interesse e 
preocupação por parte de especialistas em saúde mental, uma vez que são 
plataformas que podem gerar/ampliar sintomas de ansiedade e depressão, 
principalmente em adolescentes e adultos jovens. Vimos, anteriormente, que a 
necessidade permanente de validação e reconhecimento e o modo como as 
redes sociais são projetadas podem resultar em uma necessidade compulsiva 
 
 
13 
de se estar sempre conectado, postando conteúdos interessantes que serão 
repostados e comentados, recebendo likes, curtidas. 
Barlow, Durand e Hofmann (2021) apontam que os estressores sociais, 
como a pressão para se conformar às expectativas das redes sociais, podem 
desencadear vulnerabilidades psicológicas que contribuem para o 
desenvolvimento da ansiedade e da depressão. A constante exposição a 
conteúdos que destacam a vida idealizada de outras pessoas pode intensificar 
a sensação de inadequação e desamparo, levando a um ciclo vicioso. Outro 
aspecto importante é o da solidão, que pode alimentar significativamente a 
depressão. Embora as redes sociais possam proporcionar conexões, elas muitas 
vezes promovem interações superficiais que não têm a profundidade emocional 
necessária para construir relações significativas, levando a sentimentos de 
isolamento e solidão. 
A relação entre redes sociais, ansiedade e depressão é complexa e 
bidirecional. Conexão social, acesso à informação, apoio, espaço para 
expressão pessoal e criatividade são alguns dos aspectos benéficos apontados 
que justificam o uso cada vez maior das redes sociais. Outros podem achar que 
o uso das redes sociais aumenta seus sentimentos de isolamento e desconforto 
emocional. Não temos dúvidas que as duas formas de olhar estão corretas e que 
o ideal seria o uso equilibrado das plataformas sociais, o que não é, contudo, 
feito pela maioria das pessoas. Devemos, portanto, aprofundar nossos estudos 
sobre o assunto, uma vez que, apesar de o impacto negativo ser mais evidente 
em pessoas mais vulneráveis, todos sofremos, em alguma medida, seus efeitos. 
Dessa forma, o impacto negativo das redes sociais na saúde mental não 
pode ser subestimado e não podemos nos esquecer que o suicídio é um 
desfecho trágico que está frequentemente associado a transtornos de humor, 
como a depressão, e que podem ser exacerbados por fatores relacionados ao 
uso das redes sociais. A sensação de desamparo e desesperança, intensificada 
por interações on-line negativas, pode aumentar o risco de suicídio, 
especialmente entre os jovens, que são mais vulneráveis à pressão social digital. 
Dalgalarrondo (2019) afirma que estudos epidemiológicos indicam que de 
15% a 40% das pessoas com depressão já tentaram alguma vez o suicídio. 
Outros estudos mais completos sobre suicídios revelam que 60% de todos eles 
são realizados por pessoas com depressão. Ter a doença aumenta em 20 vezes 
o risco de suicídio. 
 
 
14 
É imperativo, portanto, que continuemos a estudar profundamente tais 
questões. Não podemos, nunca, desvincular o aspecto social da nossa clínica, 
por mais que existam especialistas da nossa área que defendam que psicanálise 
é essencialmente individual. 
NA PRÁTICA 
Veremos, agora, um recorte clínico de como questões de imagem estão 
presentes em nossa clínica. Ressaltamos que todos os dados e nomes foram 
alterados para que a privacidade e a confidencialidade fossem preservadas. 
Jaqueline e Filipe, casados, procuram Teodora para iniciar uma análise 
de casal. Questões financeiras estão minando a relação, apesar de Filipe não 
entender o motivo, pois ambos trabalham e têm bons salários. Jaqueline é a 
responsável pelas contas domésticas e afirma que realmente o salário dos dois 
não é suficiente. Após algum tempo, Filipe vai sozinho a uma sessão para contar 
que Jaqueline havia feito uma grande cirurgia plástica escondida dele, mas que 
não havia dado certo e ela estava internada em estado grave. Ela estava 
desviando dinheiro de casa havia algum tempo, pois seu objetivo era ficar com 
o corpo de uma modelo, pois acreditava que assim ele a amaria. 
FINALIZANDO 
Nesta etapa, foi possível perceber como as redes sociais funcionam como 
um palco privilegiado para a exibição narcisista, exacerbando a busca 
incessante por validação e reconhecimento. A cultura do exibicionismo, ao lado 
do culto às celebridades, reforça uma dinâmica social em que o eu é 
constantemente moldado para atender às expectativas alheias, muitas vezes em 
detrimento de uma identidade autêntica e saudável. Além disso, essa exposição 
constante, aliada à pressão para atender a padrões de beleza e sucesso muitas 
vezes inalcançáveis, pode resultar em distúrbios de imagem, ansiedade e 
depressão. A necessidade compulsiva de aprovação digital reflete uma 
fragilidade do self, que se vê dependente do olhar do outro para sentir-se 
validado. 
Esperamos que tenhamos conseguido mostrar a você a necessidade de 
aprofundar seus estudos (não apenas da psicanálise), além de termos uma visão 
 
 
15 
crítica dos diversos fenômenos da hipermodernidade. Vamos para nossa última 
etapa? 
 
 
 
16 
REFERÊNCIAS 
BARLOW, D. H.; DURAND, V. M.; HOFMANN, S. T. Psicopatologia: uma 
abordagem integrada. 3. ed. São Paulo: Cengage, 2021. 
BAUDRILLARD, J. Simulacros e simulação. Lisboa: Relógio d’Água, 1991. 
BENDER, L. G. Narcisismo na contemporaneidade: declínio da ordem simbólica 
e desamparo identitário. Círculo Psicanalítico do Rio Grande do Sul, 27 out. 
2023. Disponível em . Acesso em: 27 ago. 2024. 
COELHO JR., N. E. A noção de objeto na psicanálise freudiana. Ágora, v. 4, n. 
2, jul./dez. 2001, p. 37-49. Disponível em: 
. 
Acesso em: 28 ago. 2024. 
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