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Abordagens teóricas dos estudos de grupos SBDG

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CADERNOS DA SBDG CADERNOS DA SBDG CADERNOS DA SBDG CADERNOS 
 
 
 
 
 
 
 
Abordagens 
teóricas dos 
estudos de grupos 
 
 
Carmem Maria Sant’Anna 
Dagmar Vicente de Castro 
Laucemir Silveira Pessine 
Márcia Boiczuk Lacerda Krambeck 
 
 
 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
Tratar de um assunto como Abordagens Teóricas do Estudo de 
Grupo não é tarefa fácil. A profundidade e a complexidade do tema 
tornam o trabalho tão árduo quanto desafiador; ao mesmo tempo, a 
proposição revela-se apaixonante à medida que nela caminhamos e 
evoluímos. 
Certamente não se pretende neste momento esgotar o assunto 
mas aguçar a curiosidade sobre a temática trazendo à tona a diversi- 
dade de entendimentos do termo grupo e sua utilização através dos 
tempos e dos países. 
Inicialmente, vejamos a etimologia da palavra grupo; entre outros 
sentidos, traz a idéia de grupo de iguais. Isto é retratado ao se fazer 
uma retrospectiva histórica e uma análise simbólica da tradição celta 
dos cavaleiros da Távola Redonda. A mesma idéia se repete ao re- 
tomar-se os templos com os altares em forma circular para que os 
cavaleiros estivessem todos na primeira fila durante a missa, conse- 
quentemente todos à mesma distância de Deus. 
Também é de interesse ressaltar algumas resistências epistemo- 
lógicas ao conceito de grupo. O vocábulo groupe tem um sentido con- 
 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 5 
fuso na língua francesa, bem como no inglês e alemão. Em castelha- 
no, o dicionário da Academia diz: “Grupo: Pluralidade de seres ou 
coisas que formam um conjunto, material ou mentalmente conside- 
rado. / 2. Pint. Conjunto de figuras pintadas ou esculpidas”. Pode- 
mos dizer que é um termo recente na história dos idiomas com o 
conceito objetivo de grupo como fundamento da ciência das associa- 
ções, dos comitês e das equipes. 
Outro aspecto dessa resistência refere-se à dificuldade de todo 
ser humano estar centrado em si mesmo; dificuldade bem conhecida 
pelos psicólogos de crianças no campo da percepção e do relaciona- 
mento. O trabalho e a vida em grupo requerem um desprendimento 
de si mesmo. O grupo é útil, inclusive necessário, algumas pessoas 
dizem: se é mais eficaz em conjunto que isoladamente; o grupo é um 
intermediário entre o indivíduo e a sociedade. Em outro plano di- 
zem outras pessoas – o grupo é uma alienação para a personalidade 
individual: é perigoso para a dignidade, a liberdade, a autonomia;
 
pode provocar uma “violação” da personalidade. As relações huma- 
nas em grupos só podem ser relações de manipulador e manipulado. 
Segundo Freud o narcisismo do ser humano criou sólidos obstá- 
culos para o progresso dos conhecimentos: da astrologia, da biologia 
e da psicanálise. Esses conhecimentos só puderam constituir-se em 
ciências depois de haver vencido as crenças segundo as quais a terra 
é o centro do universo; o homem, o rei do reino animal; seu incons- 
ciente o centro da personalidade, essas crenças são, na realidade,
 
uma projeção da idolatria de si mesmo. O antropocentrismo é natu- 
ral para o ser humano. Excluído das ciências da natureza, refugiou- 
se nas ciências sociais. 
Um estudo feito pela Associação Francesa de Aumento à Produ- 
tividade (AFAP), sobre as representações coletivas de grupo, nos diz 
a respeito: “A noção de grupo e inexistente para a maior parte dos 
sujeitos. O grupo é efêmero. [...] Só existem as relações interindivi- 
duais”. As relações psicológicas espontâneas entre pessoas que se 
estabelecem em um marco da vida profissional e social, são vividas 
pelos interessados como se fossem essencialmente resultantes do ca- 
ráter, bom ou mal, dos indivíduos. Os fenômenos de grupo não são 
apreciados no que eles têm de específico: tudo se reduz a questões 
pessoais. As relações interindividuais são percebidas de maneira es- 
tática. A solução geralmente considerada, para os problemas que 
surgem nessas relações, é a necessidade de troca. Não se trata de 
transformar-se a si mesmo, nem de analisar a situação total da parte 
 
 
 
6 / Cadernos da SBDG – 9 
dos protagonistas nem de atuar sobre as variáveis da situação. O te- 
mor de voltar a pensar a própria situação em um novo marco de re- 
ferência, e de ser assim submetido a discussão, constitui um dos as- 
pectos da resistência epistemológica à noção de grupo. O referido 
estudo da AFAP chega à seguinte classificação numa visão mais am- 
pla: “É possível classificar os diferentes tipos de grupos em um ter- 
reno contínuo cujos graus seriam os seguintes: o indivíduo, o grupo 
de amigos, a equipe de trabalho, as instituições, a sociedade. As hi- 
póteses elaboradas a este respeito são: O indivíduo aceita calorosa- 
mente o grupo de amigos, e suporta como uma imposição o grupo 
de trabalho. “Considera seu chefe como a pessoa que protege o gru- 
po das influências do escalão seguinte e que evita a contaminação”. 
É lamentável que os autores desta afirmação não tenham pensado na 
hipótese de Freud, que se impõe de maneira evidente: O grupo se 
apresenta a cada um dos membros como um obstáculo para a obten- 
ção de uma relação privilegiada dual com o líder ou com outro 
membro, como um obstáculo para a realização dos desejos amorosos 
“edípicos”. Recordemos das angústias primitivas (angústia de perse- 
guição, angústia depressiva, angústia das mutilações, temor da des- 
personalização); as angústias são o motivo último da resistência e- 
pistemológica às prática de grupo. 
Levando em consideração alguns desses fatores optou-se por 
realizar uma resenha histórica através dos países e das épocas para 
se distinguir e descrever variedades de grupos típicos por seu fun- 
cionamento. Desconhecemos que já se tenha escrito uma história do 
estudo dos grupos através dos países e das épocas. Se tal tarefa fosse 
realizada, contribuiria para distinguir e descrever variedades de 
grupos típicas por seu funcionamento: as seitas religiosas, os salões 
mundanos, os clubes, primeiros políticos e depois esportivos, o co- 
mitê de especialistas, o academias literárias, a academia erudita, as 
forças militares, as corporações de ofícios, e tantos outros. 
Para a realização desta retrospectiva histórica será usado como 
base o livro La dinâmica de los grupos pequeños, de Didier Anzieu e 
Jacques Ives Martin. 
 
 
A proposta deste trabalho é analisar a evolução do pensamento 
sobre grupos a partir de uma resenha histórica do estudo dos grupos 
remontando a antigüidade Grega, posteriormente a Roma antiga e o 
poder representado pelo Senado Romano, passando para o mundo 
Feudal e Renascença, até nossos dias. 
 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 7 
Em seguida far-se-á uma análise do pensamento dos grupos ini- 
cialmente na França com Charles Fourier e o mito do falanstério, 
Durkheim e a consciência coletiva, Sartre e sua perspectiva dialética. 
Na Alemanha, Tonnies, Smalenback e as categorias sociológicas, 
Freud e a psicanálise, August Ainchorn e o tratamento de grupos de 
jovens delinqüentes. Na Inglaterra Wilfred R. Bion com seu trabalho 
com grupos no Instituto Tavistok. A experiência dos “Quackers” nos 
Estados Unidos e o advento de uma verdadeira psicologia científica 
dos grupos a desenvolver-se a partir de 1925 com diversos teóricos 
como: George H. Mead, Charles Cooley, Frederick Trasher, Willian 
Whyte, Moreno, Elton Mayo, Muzafer Sherif, Kurt Lewin com a 
perspectiva dinâmica. Uma consideração sobre William Schutz que 
desenvolveu o Princípio das Dimensões Básicas que enseja uma 
compreensão mais detalhada da abordagem holística. Após essas 
abordagens tratar-se-á da Psicologia institucional de grupos com Jo- 
sé Bleger, Georges Lapassade, Guilhon de Albuquerque e Max Pa- 
gès. Finalmente uma consideração sobre grupos no Brasil e comentá- 
rios concludentes.HISTÓRICO DO ESTUDO DOS GRUPOS 
 
A Antigüidade Grega, cantou em relatos legendários a fraterni- 
dade dos chefes de guerra alistados numa mesma expedição: o mais 
típico se refere à expedição dos Argonautas, comandados por Jasão, 
para a conquista do fabuloso “Velocino de Ouro”. Na Roma antiga, o 
poder dos grupos pode ser representado pelo Senado Romano, onde 
se decidia o destino não só de homens, mas de nações. O mundo 
feudal vê o reino dos senhores inflamado de poder e brutais costu- 
mes. Grupos de nobres, articulando cruéis massacres para a manu- 
tenção e aumento de poder. 
Com o advento da Renascença, nos séculos XVI e XVII, depois dos 
progressos na arte da navegação e do descobrimento de novas terras,
 
aumenta o grande comércio marítimo, e com isso os depósitos em 
bancos. Os historiadores vêem aí o início do capitalismo moderno. O 
comércio não se fazia sem reuniões de comerciantes de uma mesma 
corporação, que organizavam seu abastecimento, seus investimen- 
tos, as modalidades de venda, que negociavam com os competidores 
estrangeiros, com os membros das corporações vizinhas, com os reis 
e com as municipalidades, para se porem de acordo entre si. 
É desta época o famoso quadro de Rembrandt Os síndicos da cor- 
poração dos tecelões, que perpetuou este novo fenômeno: o apareci- 
 
 
8 / Cadernos da SBDG – 9 
mento dos conselhos de administração. Ao mesmo tempo, esta tela 
renova a arte do retrato coletivo. Até então, os pintores representa- 
vam os membros de uma confraria imóveis, um ao lado do outro, em 
várias filas, da maneira menos natural possível. Rembrandt surpre- 
ende o grupo em plena discussão. É muito interessante conhecer a 
tela, não só pela bela obra de arte, mas pela riqueza de detalhes do 
funcionamento do grupo (papéis, clima) contado através de expres- 
sões faciais e corporais pelo magnífico talento do artista. À esquerda, 
o orador, que já havia concluído, senta-se, cansado como que venci- 
do por antecipação. Seu adversário, no lado direito do quadro, pre- 
para o documento sobre o qual fundamenta sua réplica. Entre eles, o 
presidente se esforça para manter a neutralidade. No extremo direi- 
to, o mais jovem, impulsivo e inexperiente, não suporta a tensão que 
aumenta e esboça a intenção de retirar-se. No extremo esquerdo, o 
mais idoso, adota um ar de fastio, como se quisesse dizer ao jovem: 
“Facilmente te cansas, meu jovem amigo; as reuniões são sempre as- 
sim: cedo ou tarde, os desacordos se expressam com violência, sem- 
pre há um momento em que as coisas ficam feias.” Enfim, até o ser- 
vo, de pé, atrás, meio malicioso, inquieto, eterniza o breve momento 
de silêncio antes da tormenta. 
 
 
Na França 
 
 
Charles Fourier e o mito do falanstério 
 
Na obra de Fourier encontramos enunciados, ao que parece pela 
primeira vez, alguns dos princípios essenciais para fundamentar 
uma ciência dos grupos. Fourier se mostra assombrado com a Har- 
monia Universal que reina no mundo, de acorda com a Lei de Atra- 
ção descoberta por Newton, e o caos da organização econômica e 
social do seu tempo, sobretudo a distribuição comercial que conhecia 
por sua própria experiência profissional. Por outro lado, este não é 
mais que um dos períodos transitórios que sucessivamente atravessa 
a Humanidade. Se o homem tem sido até agora uma exceção dessa 
Harmonia Universal, isso se deve a uma educação moral errônea, 
que reprimiu nele as paixões. Mas, a Lei de Atração, quando nada se 
opõe a seu funcionamento, pode assegurar por si mesma o equilíbrio 
do organismo social. Isto se obterá na era seguinte: a da civilização 
societária. Nessa civilização, os homens seguirão livremente suas 
paixões, o que os induzirá, por um lado, a associar-se (pois a partici- 
pação em grupos satisfaz algumas tendências fundamentais do ser 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 9 
humano) e por outro, a trabalhar de maneira atraente para si mesmo 
(pois cada um desempenhará o trabalho correspondente a suas ten- 
dências pessoais). 
Fourier se situa na seguinte linha: a variedade das paixões hu- 
manas deve permitir o cumprimento natural de todas as tarefas em 
sua variedade. Além disso, o homem é, por sua natureza psicológica, 
um ser social, ou mais exatamente, um ser grupal. Toda a paixão tra- 
ta de satisfazer uma tendência. Segundo Fourier, as tendências são 
doze. Cinco se relacionam com os prazeres dos sentidos (paladar, 
tato, audição, visão e olfato); são individuais, inclusive individualis- 
tas; as sete restantes são sociais. Quatro se relacionam com o desejo 
de estabelecer laços afetivos, portanto são sujeitas à Lei da Atração; 
as duas tendências mais importantes são a amizade (origem do gru- 
pos informais) e a ambição (origem dos grupos corporativos); as du- 
as tendências menores são o amor (origem da vida em casal) e a pa- 
ternidade (origem do grupo familiar). Finalmente, três tendências – 
descoberta pessoal de Fourier – provocam o processo da busca de 
acordo com os demais; são os motores de funcionamento dos gru- 
pos: o espírito de partido, a necessidade de variação de companhei- 
ros e de trabalho, e o entusiasmo. As doze tendências se combinam 
de maneira diferente em cada pessoa de acordo com suas respectivas 
intensidades. Resultam, assim, 810 caracteres aritmeticamente possí- 
veis. A comunidade ideal reunirá cerca de 1620 pessoas, com um re- 
presentante de cada sexo por caracter: é a falange. Viverá em edifí- 
cios comunitários e trabalhará em um território, geralmente agrícola, 
que se chama falanstério. Cada um trabalha ali segundo seus gostos, 
de acordo com as similitudes e complementaridade e simpatias pes- 
soais, inscrevendo-se nas “séries de trabalhadores”. Fourier pode ser 
considerado o precursor da Dinâmica de Grupo, tendo em vista al- 
guns de seus conteúdos, tidos como revolucionários para a época. 
 
 
Durkheim e a consciência coletiva 
 
Ao final do Século XIX, Durkheim, o fundador da escola socioló- 
gica francesa, determina as bases de uma teoria de grupo, no entanto 
sem distinguir entre grupo pequeno ou reduzido e sociedade global. 
A passagem do clã para a sociedade é a da solidariedade mecânica 
para a solidariedade orgânica fundada na divisão do trabalho. Dur- 
kheim define o grupo social como algo mais que a soma de seus 
membros, isto é, como totalidade (definição que Sartre ratificará, à 
luz da dialética): o grupo não é uma totalidade, mas sim a totaliza- 
 
 
10 / Cadernos da SBDG – 9 
ção de um processo. Durkheim forja a hipótese de uma consciência 
coletiva (um grupo tem percepções, sentimentos e vontades pró- 
prias). Esboça a análise das funções psicológicas do grupo: 
‰ Função de integração: o indivíduo isolado é mais frágil que o 
indivíduo integrado em uma comunidade familiar, profissio- 
nal, religiosa, e se encontra mais exposto, por exemplo, ao 
suicídio. 
‰ Função de regulação das relações interindividuais que, liberadas a 
si mesmas, naufragam em desconfiança e hostilidade. 
‰ Função idolátrica: um grupo unido e eficiente tende a adorar, a 
divinizar a força que sente em si, e que é apenas a coesão su- 
jeita a seu código de valores. 
Muitos dos resultados da psicologia social experimental nascida 
nos Estados Unidos por volta de 1930-1935, não são mais que redes- 
cobertas dos trabalhos esquecidos da escola de Durkheim. 
 
 
Sartre e sua perspectiva dialética 
 
Sartre em sua obra O ser e o nada em 1943 deu ao estudo de grupo 
certa nobreza filosófica. Nessa obra trabalha o indivíduo humanos, 
em suas relações consigo mesmo, com seu corpo, com seu destino 
pessoal e com outro companheiro humano. No tomo I da Crítica da 
razão dialética, de 1960, explora campos novos: o homem frente ao 
grupo e a história coletiva. Para Sartre, a reflexão sobre grupo é, sem 
dúvida, a resposta àpergunta: De que maneira foi possível o fenô- 
meno como o stalinismo? Há algum meio para impedir que a força 
da Revolução se perverta desse modo? 
Para ele, a dialética é o caminho do pensamento humano em seu 
enfrentamento com a natureza e a sociedade para transformá-las. é a 
lógica da ação. Procede mediante contradições, negações construti- 
vas e sínteses parciais, nunca acabadas. Se distingue do raciocínio 
científico habitual, analítico e determinista, porque apreende dentro 
de si movimento próprio dos seres e das situações. Assim, para Sar- 
tre, o grupo não é algo estático, sim um “todo dinâmico, em movi- 
mento, por haver relações dialéticas de interioridade entre as partes. 
O primeiro motivo da dialética no campo social, é a luta contra a 
escassez. As relações humanas se constituem sobre esse fundo de 
luta contra a escassez (de alimentação, de mulheres, de trabalhado- 
res, de máquinas, de consumidores). O intercâmbio (intercâmbio de 
mercadorias, de mulheres entre os clãs, etc.) oferece o protótipo es- 
sencial dessas relações. A violência é um outro aspecto dessa luta, 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 11 
em que todo indivíduo é, ao mesmo tempo, um possível sobreviven- 
te e um concorrente a suprimir; a violência é a escassez interiorizada. A 
luta contra a escassez é a fonte da história. 
Em Sartre encontramos a distinção entre aglomeração e grupo. 
Grupo: provém de uma aglomeração e corre o risco de recair nela. 
Aglomeração: constitui uma massa passiva e resignada que sofre o 
seu destino, uma justaposição de solidões. No entanto tem necessi- 
dades, interesses e objetivos em comum, seus componentes se diri- 
gem a seu trabalho, à sua casa ou às suas diversões, são usuários de 
transportes e habitantes da cidade, mas o interesse comum continua 
a ser exterior a eles, imposto de fora, estranhos a eles. 
Condições para passar de aglomeração para grupo: 
‰ Membros devem ter interesses em comum suficientemente 
poderosos. Tomar consciência de que sua interdependência é 
necessária para a satisfação do interesse comum. O conheci- 
mento de todos os membros entre si prolifera no grupo, oca- 
sionando o desejo da comunicação e a passagem das corren- 
tes de simpatia (ou de antipatia). A melhor compreensão re- 
cíproca de todos faz nascer uma estima, ainda que desigual e 
frágil, de cada um dos membros face a cada um dos outros. O 
momento do nascimento de um grupo é quando cada um ex- 
perimenta a humanidade dos demais. 
‰ Passar das comunicações indiretas para as diretas, com retro- 
alimentação. 
‰ Existência, na sociedade global, de grupos que defendam ati- 
vamente interesses antagônicos e que provoquem, implicita- 
mente, luta contra eles. 
Os membros de grupo em fusão vivem experiências de solida- 
riedade, integração a uma nova realidade coletiva, percepção do ou- 
tro como regulador da minha ação na ação comum. Na práxis dos 
grupos, acaba por ocorrer uma analogia com a Revolução Francesa: 
liberdade (quebra da impossibilidade de atuar e modificar a situação 
existente); igualdade (todos são equivalentes a todos, seus semelhan- 
tes homogêneos); fraternidade (todos necessitam de todos para que o 
grupo exista). 
Para sobreviver, o grupo adota medidas: 
‰ persegue a todo o membro suspeito de querer retirar-se da 
ação comum (juramento da fraternidade – “somos irmãos”); 
 
 
 
 
 
 
12 / Cadernos da SBDG – 9 
‰ estabelece regras, se dá uma jurisdição, estabelece seus pro- 
cedimentos de trabalho e de decisão, e omite ou admite al- 
gumas normas comuns. 
A práxis do grupo é efetuar continuamente sua própria reorga- 
nização – o que constitui a essência da dialética. 
 
 
Na Alemanha 
 
 
Tonnies, Smalenbach e as categorias sociológicas 
 
Entre as categorias sociológicas elaboradas no princípio do sécu- 
lo XX, algumas se aplicam indiferentemente ao pequeno grupo e a 
sociedade global, e têm sido utilizadas no primeiro campo de manei- 
ra mais ou menos consciente e clara. 
Tonnies definiu Gemeinschaft e Gesellschaft na obra que leva o 
mesmo título, Smalenbach agregou Bund. As três categorias apare- 
cem sempre dentro de uma organização social preexistente, na que 
constitui uma diferença e com respeito à qual mantém relações do 
tipo figura-e-fundo, ou de interação dialética. Além disso, estas cate- 
gorias constituem abstrações do espírito e raramente existem em es- 
tado puro no concreto; uma realidade social particular as combina 
mais ou menos em diferentes graus. 
Gemeinschaft – corresponde aos agrupamentos de parentesco e de 
lugar, aos fenômenos de uma vizinhança imposta. O indivíduo nasce 
em uma família e em um povo, dados de antemão, não escolhidos 
por ele, que determinam sua participação em uma vida em comum,
 
e junto dos quais desenvolve um sentimento de pertinência muito 
forte. Gemeinschaft é uma maneira de ser que se compartilha com a 
comunidade, maneira de ser espontânea e que exclui a consciência 
clara, a crítica e a justificação. A ferida infligida a um dos seus mem- 
bros, lesiona a comunidade inteira. 
Gesellschaft – é uma associação voluntária, fundada em um con- 
trato, tácito ou explícito, e cuja finalidade é proceder intercâmbios;
 
em primeiro lugar intercâmbio de mercadoria e de dinheiro. A socie- 
dade anônima por ações proporciona um exemplo. Nela todos os 
indivíduos estão isolados, são independentes; buscam seu interesse,
 
seu benefício. Esta tem sido, em todos os tempos, a atitude dos pro- 
dutores e dos comerciantes. A extensão do grande comércio e dos 
bancos no Renascimento, e depois na Revolução Industrial dos sécu- 
los XVIII e XIX a generalizaram: a noção do homo economicus deriva 
dela. Gesellschaft é a sociedade contratual, de acordo com um ideal 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 13 
jurídico e capitalista, em que as relações entre as pessoas se despo- 
jam de todo o calor humano, de toda a afetividade: somente contam 
o cálculo frio e os interesses egoístas. 
Bund – é o grupo, a aliança a que adere apaixonadamente o indi- 
víduo, adolescente ou adulto, para procurar em comum objetivos 
muito valorizados e idealizados. São variantes da Casa dos Homens a 
sociedade de guerreiros em algumas tribos primitivas, a amizade 
compartilhada e a comunhão dos iniciados que vivem juntos a mes- 
ma experiência sobrenatural. A adesão ao Bund é uma decisão livre, 
mas que compromete o indivíduo no sentido mais forte. Disso resul- 
ta que os membros se reconhecem como iguais. Entre eles se desen- 
volvem fenômenos de afinidade, cuja gama vai desde a fraternidade 
viril que exclui as mulheres, até o casamento por amor. O Bund faz 
de seus membros heróis, mártires ou militantes: é igreja nascente, 
seita, exército de moral elevada e cheio de fé em sua missão, movi- 
mento de juventude, grande partido de massa, ordem de pregadores 
ou de assassinos. Mas, o Bund é precário, como todos os estados de 
entusiasmo e exaltação. Se Sobrevive transforma-se em uma comu- 
nidade de vida 
 
 
Freud e a psicanálise 
 
Na mesma época, Freud propõe enfoques totalmente diferentes 
para explicar os fenômenos dos grupos, que ele relaciona com os 
processos propostos pela psicanálise. Seus trabalhos fundamentais 
sobre o tema são: “Totem e tabu” (1913) e “Psicologia coletiva e aná- 
lise do eu” (1920). 
Diferentes trabalhos antropológicos (Darwin, Robertson, Smith) 
sugerem uma mitologia psicanalítica que explica a transição da famí- 
lia para o grupo. No princípio, era o pai de família, tirano violento 
que se reservava a posse de todos os membros e expulsava os filhos 
quando cresciam para evitar que eles atentassem contra o direito de 
propriedade. Os irmãos expulsados terminam por rebelar-se, unin- 
do-se, procedem em comum, pois nenhum pode excetuar-see todos 
devem ser cúmplices do assassinato do pai e da festa em que devo- 
ram o morto. Esta comunhão totêmica materializa a identificação de 
todos com o antepassado, simboliza a igualdade e a solidariedade de 
todos, funda a sociedade nova que repousará sobre os tabus, isto é,
 
sobre uma moral: renunciar a matar e a comer o animal totêmico 
(substituto do pai morto idealizado), renunciar a ter relações sexuais 
 
 
 
 
14 / Cadernos da SBDG – 9 
com as mulheres ou com as filhas do pai, suas parentes (origem do 
tabu do incesto e da regra da exogamia). 
Este relato legendário e intemporal repete vários componentes 
das relações humanas descobertas mediante a experiência psicanalí- 
tica: ambivalência (mescla de admiração e de raiva) dos filhos diante 
da imagem paterna, assim como dos subordinados diante dos que 
exercem a autoridade; identificação e/ou idealização da imagem pa- 
terna; ensaio de uma sociedade democrática, na qual todos os mem- 
bros, filhos deste pai agora simbólico (autoridade) seriam irmãos e 
iguais, inventariam a justiça entre si e o respeito mútuo por suas vi- 
das; eficácia do assassinato cometido em comum para coesionar um 
grupo. 
O mito freudiano responde as perguntas: “Existe, do ponto de 
vista psicológico, outra fonte de autoridade e de organização do 
grupo que não seja a autoridade patriarcal? Podemos forjar uma or- 
ganização social que respeite a justiça sem que ela se introduza, me- 
diante a imagem paterna?” Freud, em seu segundo trabalho, de- 
monstra que esta organização existe em todos os lugares em que os 
indivíduos, que se encontram em situação de rivalidade, transfor- 
mam suas diferenças em solidariedade, renunciando a dominação 
dos demais e fazendo desta maneira impossível que todos os demais 
aspirem a esta dominação. O progresso social parece estar represen- 
tado pela passagem do grupo social fundado na autoridade patriar- 
cal e na identificação com o chefe para uma sociedade de irmãos 
fundada na identificação mútua, na solidariedade, no compromisso 
recíproco de respeitar-se e de ajudar-se, a renúncia ao poder absolu- 
to, à posse exclusiva dos bens, isto é, fundada em tendências real- 
mente sociais. Mas, este progresso não se alcança de uma vez por 
todas. Por um lado, as imagens arcaicas subsistem, com toda a sua 
força, no inconsciente individual e na cultura trazendo um retorno a 
fenômenos como: a necessidade de um chefe, o desejo de divinizar 
ídolos e a tendência a regimes mais fortes. Por outro lado, a organi- 
zação fraternal está minada pelas rivalidades, por orgulhos pessoais 
e desejos de dominação, e pela fragilidade das tendências sociais. 
De tudo isso resulta que, para os grupos e as sociedades, o estilo 
de autoridade tem uma evolução de ritmo cíclico. O grupo extrai de 
si mesmo sua força e sua unidade. Não é apenas o fruto de um herói 
fundador, nem filho de um chefe superior. É o seu próprio pai, com 
sua própria legislação e justiça, substitui a genealogia familiar pela 
criação social. 
 
 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 15 
August Ainchorn 
 
Pedagogo de profissão, havia protestado contra a introdução do 
regulamento militar na educação austríaca e decidiu organizar uma 
casa de reeducação para rapazes perto de Viena. 
Encontrou na psicanálise o caminho para uma ação reformadora 
de jovens delinqüentes. Esta experiência serviu de modelo para mui- 
tas tentativas posteriores e inaugurou o verdadeiro tratamento da 
delinqüência juvenil. 
Para Ainchorn, não há outro modo de reeducação a não ser o 
manejo da transferência, e os resultados satisfatórios obtidos por edu- 
cadores não psicanalistas são, na verdade, causados por uma utiliza- 
ção hábil, ainda que inconsciente, deste manejo. 
Primeiramente, nos indivíduos em que predominam os fatores 
neuróticos, ou em que a figura paterna é severa, a transferência é, em 
geral, espontânea mas negativa. É necessário fazê-la positiva o quan- 
to antes: 
‰ não repetindo a atitude dos pais que a provocaram, precisa- 
mente, as reações negativas;
 
‰ aliviando a culpabilidade do jovem;
 
‰ adotando a atitude diferente à adotada pelo jovem;
 
‰ falando do que interessa a ele e não dos erros que ele come- 
teu. 
O êxito de Ainchorn no tratamento de grupos de jovens delin- 
qüentes consistiu em transladar a experiência psicanalítica individu- 
al à organização de uma escola de readaptação: proibindo castigos 
corporais (separando os casos patológicos que exigem o emprego da 
força); dando-lhes permissão para entrar ou sair; separando os jo- 
vens em grupos, de tamanho menor possível, que reunam o mesmo 
tipo de dificuldade; demonstrando interesse e afeto; ganhando sua 
confiança mediante uma mesa bem provida e uma atmosfera otimis- 
ta; encontrando, para cada um, uma ocupação conveniente; resol- 
vendo os conflitos fazendo com que o jovem, através da conversa em 
grupo, descubra suas emoções. 
 
 
Nos Estados Unidos 
 
 
A experiência dos quackers 
 
Os quackers surgiram no século XVII na Inglaterra, herdeiros dos 
buscadores que, diante da proliferação das seitas, praticavam um cul- 
 
 
 
16 / Cadernos da SBDG – 9 
to inteiramente livre e se reuniam em pequenos grupos em que ora- 
vam e falavam em pé de igualdade, sem nenhuma organização hie- 
rárquica. 
Fox, o fundador dos quackers pregava a ressurreição do cristia- 
nismo primitivo: formar grupos de crentes unidos organicamente 
por laços viventes; mediante a participação nos grupos, conseguir 
que a conduta de todos mude efetivamente. Se intitulam Sociedade 
de Amigos. Suas reuniões baseiam-se na liberdade da inspiração e 
da criação (sem clero, nem sacramentos, nem credos impostos de 
antemão), na igualdade dos participantes, incluídas as mulheres 
(nem superior, nem presidente, todos são “sacerdotes”), na busca 
direta, por parte de todos, da verdade divina, sob a vigilância da 
inspiração coletiva. Suas reuniões começam em silêncio, que perma- 
nece até que alguém se encontre em estado de falar com absoluta 
sinceridade. Todos os participantes são co-responsáveis pela manu- 
tenção da disciplina e do exercício das diferentes funções necessá- 
rias. As discussões de ordem prática estão abertas para todos, com a 
condição de falar de acordo com o espírito da verdade e não para 
impor sua vontade. 
Nas nascentes colônias americanas, um grande número desses 
grupos contribui para expandir, no século XVIII, as idéias de tolerân- 
cia religiosa, de justiça social, de anti-escravidão, de pacifismo, de 
igualdade das mulheres, etc. A realização mais espetacular dos quac- 
kers foi a fundação de Filadélfia (cidade do amor fraternal) no centro 
da Pensilvânia, América do Norte, levada a cabo por William Penn, 
de comum acordo com os índios. 
No século XIX, outro quacker, o psiquiatra Tuke, abriu, no campo,
 
uma casa de retiro para tratamento de alienados mentais mediante a 
convivência com pessoas sãs. 
Herdeiros do espírito dos quackers, mas sem reivindicar sua filia- 
ção, os Grupos de Oxford se constituem a partir de 1921, sob o im- 
pulso de Frank Buchman. A concepção dos quackers de grupos de- 
mocráticos, fermento de valores morais e espirituais, agente de mu- 
dança individual e social, é a origem da ideologia que acompanha o 
nascimento da Dinâmica de Grupos nos Estados Unidos. 
Alexis de Tocqueville, escritor francês, em sua obra A democracia 
na América (1835 a 1840), observou a importância da vida em grupo 
nos Estados Unidos: “Os norte-americanos de todas as idades, de 
todas as condições e de todo o espírito, se unem continuamente, em 
associações comerciais e industriais e de outras espécies (religiosas, 
 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 17 
morais, sérias, frívolas, para organizar festas, fundarseminários, al- 
bergues, levantar igrejas, distribuir livros, hospitais, prisões e esco- 
las). 
“Encontrei na América alguns tipos de associações que, confesso, 
não tinha sequer idéia, e admirei muito a infinita arte com que os 
americanos chegam a determinar um objetivo comum para os esfor- 
ços de um grande número de homens, e, acima de tudo, a fazê-los 
marchar livremente.” 
 
 
George H. Mead 
 
Entre 1925 e 1935, uma verdadeira psicologia científica dos gru- 
pos começa a desenvolver-se nos Estados Unidos. É paralela a uma 
reflexão filosófica que exalta a relação com o outro na formação da 
personalidade humana. Segundo Mead, a personalidade da criança 
se desenvolve em relação aos “próximos significativos” representa- 
dos pelos membros da família e os companheiros de brincadeiras 
e/ou jogos. A criança não aprende apenas as regras do jogo; interio- 
riza as atitudes dos outros mediante uma disposição natural para 
aprender em contato com os outros, e pode, desta maneira, tomar 
consciência de si como diferente dos demais. 
 
 
Charles H. Cooley 
 
Com Cooley, podemos dizer que o homem se define como um 
animal grupal: “Não é necessário crer que a unidade do grupo pri- 
mário está constituída apenas sobre a harmonia e o amor. Esta uni- 
dade implica sempre em diferenciações e geralmente rivalidades; 
supõe a afirmação de si mesmo e das diferentes paixões individuais; 
mas estas paixões estão socializadas mediante a simpatia e se sub- 
metem, ou tendem a submeter-se, a disciplina de um espírito co- 
mum. A vontade de um indivíduo pode ser ambiciosa, mas o objeto 
principal desta ambição será algum objeto desejável no pensamento 
dos demais e experimentará um sentimento de fidelidade diante das 
normas comuns que recomendam o serviço aos outros e o proceder 
leal.” As primeiras pesquisas científicas que se levam a cabo simul- 
taneamente, tratam da delinqüência juvenil e das relações humanas 
na indústria. 
 
 
 
 
 
 
 
 
18 / Cadernos da SBDG – 9 
Frederick Trasher 
 
Na década de 1920, Trasher recolhe observações sobre 1.100 
bandos de jovens delinqüentes de Chicago, baseando-se em infor- 
mações policiais e em conversas com seus ex-membros. “A gang é 
um grupo primário. Desdobra todos os tipos de comportamento de 
corpo, inclusive o da deliberação e o estabelecimento de planos com 
o maior sangue frio. Alem disso, pode desenvolver uma tradição e- 
laborada, quase uma cultura particular, e, neste sentido, é como uma 
sociedade em miniatura.” 
 
 
William Whyte 
 
Por volta de 1930, Whyte orienta sua investigação em direção a 
colônia italiana de Boston e focaliza sobre um pequeno número de 
bandos, aos quais estuda intensamente, em forma de observa- 
dor/participante. Se trata de bandos que se formam nas esquinas 
dos bairros pobres, e que não são, necessariamente, delinqüentes. 
Whyte observou, nestes grupos, um ponto em que a multifacetada 
imagem de suas confirmações convergem: os membros destas ban- 
das semelhantes, cujo campo de atuação são as ruas, têm muito pou- 
co interesse ou atividade em sua família ou em seu trabalho; são 
“desocupados” que tratam de passar o tempo juntos, pessoas sem 
objetivos que se aborrecem, e para quem o grupo, pelos prazeres que 
lhes permite compartilhar, é, em si, o objetivo. 
 
 
J. L. Moreno – a sociometria 
 
Em 1930, Moreno, que já havia criado o psicodrama, realiza uma 
pesquisa em uma instituição de adolescentes delinqüentes, e, ao cur- 
so desta pesquisa, verifica e ajusta a técnica sociométrica. Segundo 
Moreno, os seres humanos estão relacionados entre si mediante três 
relações possíveis: simpatia, antipatia e indiferença. As relações po- 
dem medir-se com a ajuda de um questionário em que cada membro 
do grupo indica as pessoas do grupo: as que escolhe e as que rejeita 
como companheiros. O escrutínio das respostas permite estabelecer 
uma espécie de radiografia dos laços socioafetivos dentro do grupo; 
o sociograma e suas representações gráficas. Algumas configurações 
destes laços explicam certos fenômenos de grupo. Por exemplo: uma 
cadeia de simpatias constitui uma rede de comunicação na qual a 
informação circula rápida e eficientemente. 
 
 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 19 
Elton Mayo – as relações humanas na indústria 
 
Elton Mayo (1880-1950) era um professor de filosofia australiano 
que se interessou tanto pela psicologia do trabalho que chegou a o- 
cupar diferentes cargos na indústria. Prosseguiu sua carreira nos Es- 
tados Unidos, onde dirigiu, de 1926 a 1947, o Departamento de In- 
vestigação Industrial da Universidade de Harvard. A primeira pes- 
quisa de Mayo (setembro de 1923 a agosto de 1925) se refere a insta- 
bilidade do pessoal (taxa de rotatividade: 25% ao ano) em um dos 
departamentos de uma fábrica em Filadélfia (taxa de rotatividade 
média do resto da fábrica: 5 a 6% ao ano). Depois de muitas dificul- 
dades, devidas principalmente a forte oposição dos capatazes, Mayo 
combina e faz impor pela direção um sistema de pausas intercaladas 
de dez minuto, dois de manhã e dois a tarde, durante as quais os o- 
perários podem descansar e conversar à vontade. A taxa de rotativi- 
dade se estabiliza em 5 a 6%, o absenteísmo diminui, o clima melho- 
ra, o rendimento supera a norma a um grau nunca antes alcançado 
por este departamento. Em sua obra O problema social da civilização 
industrial, escrita em 1945, Mayo dá uma interpretação psicossocio- 
lógica desta experiência: o interesse manifestado pela direção em 
relação aos trabalhadores concedendo-lhes a pausa, e, mais tarde, a 
decisão de confiar aos próprios trabalhadores a organização de suas 
pausas, modificaram a psicologia do trabalhador frente ao seu traba- 
lho e a respeito de seus colegas. O sentimento de responsabilidade, 
no primeiro caso, e de solidariedade, no segundo, estavam desper- 
tos. Esta ação, disse Mayo, transformou “uma horda de solitários 
num grupo social”. 
 
 
Muzafer Sherif – o começo das experiências em laboratório 
 
Em 1935, a experiência de Sherif sobre a ilusão autocinética cons- 
titui-se na primeira pesquisa feita em laboratório com um grupo arti- 
ficial. Tendo como estímulo um quarto escuro onde era introduzida 
uma luz em movimento, o objetivo da pesquisa era comparar a esti- 
mativa da amplitude do movimento em situação individual e em 
situação de grupo. Uma pesquisa por introspeção dirigida permitiu 
precisar alguns aspectos deste processo. Na situação autocinética, 
não estruturada, indefinida, incerta, o sujeito se acha incomodo; o 
estabelecimento de uma norma tem a função de diminuir este inco- 
modo; mas, em situação individual o sujeito duvida sobre a exatidão 
de suas avaliações, enquanto que no grupo, as normas deste outor- 
gam uma maior segurança. 
 
 
 
20 / Cadernos da SBDG – 9 
Kurt Lewin – a perspectiva dinâmica 
 
Psicólogo da escola de Berlim, Kurt Lewin (1890-1947) emigrou 
muito jovem para os Estados Unidos. Sua grande contribuição ao 
estudo dos grupos foi ter transportado, primeiro ao estudo da per- 
sonalidade humana, e depois ao dos grupos, os princípios da Teoria 
de Gestalt ou Psicologia da Forma. Esta havia demonstrado que a 
percepção e o hábito não se apoiavam em elementos e sim em “estru- 
turas”, organizações ou reorganizações de sensações ou lembranças. 
De maneira semelhante, Lewin explica a ação individual a partir da 
estrutura que se estabelece entre o sujeito e seu ambiente em um 
momento determinado. Essa estrutura é um campo dinâmico, um 
sistema de forças em equilíbrio; quando se rompe o equilíbrio se cria 
a tensão no indivíduo e o seu comportamento tem por finalidade o 
restabelecimento deste equilíbrio. Uma tarefa interrompida antes de 
sua finalização deixa o sujeito num estado de insatisfação e, em con- 
seqüência,recorda mais uma tarefa interrompida do que uma tarefa 
similar que tenha podido terminar e que a tensão tenha sido comple- 
tamente resolvida (efeito Zeigarnik). A tensão provocada por uma 
frustração conduz o sujeito a uma descarga agressiva da tensão, ou a 
um retraimento frente às necessidades cuja satisfação esperava: prin- 
cípio da satisfação (frustração agressão ou regressão) (Experiências 
de Barker e Dembo). Os fracassos ou êxitos obtidos durante o cum- 
primento de uma tarefa repetitiva modificam nossa atitude dinâmica 
frente a essa tarefa: trata-se do “nível de motivação” que pode ele- 
var-se, porque o êxito traz confiança e para compensar a decepção 
de um fracasso (e pode diminuir por razões paralelas). 
Chegado aos Estados Unidos em 1930, Lewin continua suas in- 
vestigações, mas a psicologia social experimental que está nascendo 
influencia cada vez mais o seu trabalho. Lewin utiliza uma represen- 
tação gráfica topológica para dar conta das relações que seguem i- 
guais dentro do campo psicológico em perpétua evolução do indiví- 
duo; põe assim em evidência as noções de: (1) espaço vital de um 
indivíduo, (2) locomoção do indivíduo através deste espaço frente ao 
objetos de suas necessidades, (3) distância psicológica entre o indiví- 
duo e as pessoas e os objetos do campo e (4) barreiras que se inter- 
põem entre os elementos do campo. 
A partir de 1938, Lewin dedica-se a estender aos grupos peque- 
nos a noção de campo dinâmico, aplicando-lhes, de maneira rigoro- 
sa, o método experimental, segundo ele, o único capaz de verificar a 
autenticidade de suas hipóteses. Reúne, de maneira artificial, grupos 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 21 
de estudantes, durante um período bastante prolongado, e, quando 
desenvolvem as atividades lúdicas que se propõe, introduz variáveis 
na situação, variáveis cujos efeitos estuda. Como resultado destas 
pesquisas se estabelecem três climas sociais: autoritário, democrático 
e laissez-faire. Ao final desta pesquisa, chegou-se a uma conclusão: a 
frustração ocasiona a agressão. Calculou-se, então o nível de agressi- 
vidade em cada um dos três climas e obtiveram-se os seguintes re- 
sultados: Havia-se previsto que o clima autoritário, muito frustrante, 
faria aparecer um alto índice de agressividade. Em verdade, obtive- 
ram-se dois tipos de reação: sessões sem nenhuma agressividade (a- 
patia), e sessões com grandes erupções de ira coletiva, com destrui- 
ção de material. Portanto, o autoritarismo provoca dois tipos de rea- 
ção: a obediência passiva, na qual a inércia é um modo de resistência 
à agressividade, e as rebeliões violentas, nas quais a acumulação da 
agressividade latente alcança o ponto de ruptura. Pensava-se que no 
clima democrático seria mais baixa, o que efetivamente aconteceu; 
porém não é nula, mas se descarrega gradualmente, o que permite 
mantê-la em um índice regular relativamente baixo. Este manejo da 
agressividade permite ao grupo democrático ser mais produtivo em 
suas tarefas. Para o clima de laissez-faire havia-se previsto uma taxa 
de agressividade média. Pelo contrário, encontramos ali a média 
mais elevada. Os estudantes partiam para a realização de um traba- 
lho que necessitava da ajuda do monitor, com a qual contavam. A- 
contecia o fracasso pelo abandono do monitor; desta frustração mui- 
to intensa nascia uma reação de agressividade muito forte entre eles 
e contra o monitor. Em conclusão, a frustração ocasiona reações a- 
gressivas, mas estas adquirem variações particulares segundo o cli- 
ma dos grupos. Lewin concebe os grupos como uma realidade sui 
generis irredutível aos elementos que o compõe, e a similitude de 
seus objetivos ou de seus temperamentos. O grupo é um determina- 
do sistema de interdependência: (a) entre os membros do grupo; (b) 
entre os elementos do campo (finalidades, normas, percepção do 
meio externo, status, etc.). O sistema de interdependência, próprio de 
um grupo em determinado momento, explica o funcionamento do 
grupo e sua conduta, tanto o funcionamento interno, como a ação 
sobre a realidade exterior. Nisso reside a força do grupo, ou melhor, 
o sistema de forças que o impulsionam à ação, ou que o impedem de 
agir. Assim surge a expressão “Dinâmica de Grupo” para designar 
este método de estudo. Lewin a utiliza pela primeira vez em 1944, 
em um artigo, com o mesmo sentido que na física se distingue a está- 
 
 
 
22 / Cadernos da SBDG – 9 
tica e a dinâmica de um sistema. Devido a sua força imaginativa, a 
expressão terá êxito. Para Lewin, tinha um sentido mais austero: em 
um meio definido, certa distribuição de forças determina o compor- 
tamento de um objeto que possui propriedades definidas. 
 
 
William Schutz – as Dimensões Básicas 
 
O Princípio das Dimensões Básicas é, provavelmente, mais ex- 
clusivo do autor do que qualquer outro dos princípios abordados. 
Foi primeiramente apresentado em 1958 e vem sendo aperfeiçoado 
através de vários livros e trabalhos subseqüentes. O Princípio das 
Dimensões Básicas enseja uma compreensão mais detalhada da a- 
bordagem holística. Para que o grupo possa existir, deve definir-se 
como grupo. Os limites devem ser estipulados, de modo a deixar 
claro quem está dentro e quem está fora dele. Em algumas tribos an- 
tigas e em algumas contemporâneas, os ritos de iniciação, de passa- 
gem e outros, estabelecem a entrada do indivíduo como membros 
das tribos. Nos agrupamentos modernos existem cerimônias seme- 
lhantes: votar, pagar débitos, passar em testes, pertencer a uma certa 
estirpe, ter determinados pais, seguir determinados princípios. Seja 
qual for a técnica, o grupo é formado por meio de um procedimento 
específico que define a inclusão grupal. 
Independente da eficiência do grupo, para que o mesmo possa 
sobreviver devem ser criados vínculos pessoais entre seus membros. 
Se não for dada nenhuma atenção aos sentimentos que as pessoas 
tem uma pelas outras, crescem as rivalidades, os desejos pessoais 
não são satisfeitos, as pessoas sabotam ou abandonam o grupo e a 
vida grupal está encerrada. Os vínculos afetivos da família, questões 
sociais, compartilhamento, ou benefícios sociais, devem ser levados 
em consideração pelo grupo, para que este possa sobreviver. 
As três dimensões básicas – inclusão, controle e afeto – ocorrem 
nesta ordem no desenvolvimento dos grupos. as questões da inclu- 
são, a decisão de quem está fora ou dentro do grupo, são as primei- 
ras a surgir, seguidas pelas questões de controle (estar por cima ou 
por baixo) e, finalmente, pelas questões afetivas (estar próximo ou 
distante). Esta ordem não é rígida, mas a natureza da vida em grupo 
é tal que as pessoas tendem primeiro a determinar se querem ou não 
ficar num grupo, depois a determinar que grau de influência irão 
exercer e, finalmente, a decidir quão pessoalmente próximas irão se 
tornar. 
 
 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 23 
Fase da inclusão. A fase da inclusão no desenvolvimento do grupo 
começa na sua formação. Enquanto membro de um novo grupo, 
quero descobrir primeiro onde me encaixo. Minhas primeiras preo- 
cupações são decidir se quero estar dentro ou fora, estabelecer-me 
como elemento distinto dos outros e verificar se vão me dar atenção 
ou se serei ignorado. Quando estas questões me deixam ansioso, mi- 
nha tendência é manifestar comportamentos centrados em mim 
mesmo, falar exageradamente, retrair-me exageradamente, exibir- 
me, dizer minha biografia. No transcorrer do processo de formação 
do grupo, minhas principais preocupações são as questões de trans- 
gredir ou não os limites do grupo, e de pertencer ou não a ele. Ques- 
tões relativas a limites são problemas de inclusão. 
Fase do controle. Assim que estiver relativamente delineada a no- 
ção de estar reunido o grupo, asquestões relativas ao controle pas- 
sam ao primeiro plano. As questões de controle incluem tomadas de 
decisão, compartilhar responsabilidades, distribuir poder. Durante o 
estágio do controle, o comportamento grupal característico inclui a 
luta pela liderança e também a competição. Enquanto membro do 
grupo, neste momento, minhas ansiedades básicas centralizam-se 
em ter responsabilidade demais ou de menos e me ter muita ou pou- 
ca influência. Tento me estabelecer no grupo de tal modo que venha 
a ter a quantidade de poder e de dependência que me for mais con- 
veniente. 
Fase do afeto. Depois de resolvida a questão do controle, os temas 
afetivos ganham maior destaque. Os indivíduos já estão formando 
um grupo. Diferenciam-se no que se refere a responsabilidade e ao 
poder. Agora investigam a questão de se tornarem emocionalmente 
integrados. Neste estágio são típicas as manifestações de sentimen- 
tos positivos, de hostilidade pessoal direta, de ciúme, de formação 
de pares, e, em geral, de um aguçamento de emoções entre pares de 
pessoas. Na qualidade de membro de um grupo, minhas ansiedades 
básicas focalizam-se em não ser querido, em não estar próximo o su- 
ficiente das pessoas, e em ser íntimo demais. Estou me esforçando 
para obter uma troca afetiva cuja intensidade pareça satisfatória e a 
posição mais agradável no que diz respeito a iniciar uma relação afe- 
tiva e receber afeto. Como os porcos-espinhos de Schopehauer que 
tinham o problema de se amontoar para dormir juntos numa noite 
fria, quero ficar perto o suficiente para receber calor, mas longe o 
bastante para evitar a dor dos espinhos mais pontiagudos. 
 
 
 
 
 
24 / Cadernos da SBDG – 9 
A hipótese de desenvolvimento do grupo afirma que certas áreas 
de interação são enfatizadas em determinados momentos do cresci- 
mento grupal. Todas as três áreas estão sempre presentes, porém 
não são sempre igualmente destacadas. Da mesma forma, algumas 
pessoas não acompanham sempre as questões centrais do grupo. Pa- 
ra algumas pessoas, uma dimensão particular será tão totalmente 
importante que transcenderá o tema que está sendo focalizado pelo 
grupo. Para cada pessoas, a área de interesse num dado momento é 
resultante de suas próprias áreas problemáticas, juntamente com a- 
quelas que estão sendo focalizadas pelo grupo, na fase em que se 
encontra. 
 
 
Na Inglaterra 
 
 
Wilfred Bion 
 
Wilfred Ruprecht Bion foi um psicanalista excepcional que mere- 
ceria figurar nos dicionários e nas enciclopédias logo após os nomes 
de Sgmund Freud e Melaine Klein. Ele propôs, após a última guerra 
mundial, uma teoria de grupos que conserva a mesma pertinência 
que tinha à época de seu aparecimento. Dotado de um prodigioso 
senso clínico, colaborou em seguida para aumentar os nossos conhe- 
cimentos sobre os processos da psicose. Não hesitou em reformular a 
epistemologia psicanalítica, após ter proposto uma verdadeira teoria 
do pensamento. Por último, próximo ao final da vida, elaborou um 
relato intrigante da mesma (a vida) e escreveu uma trilogia de ficção. 
Seus escritos suscitaram tanto admiração entusiástica quanto irrita- 
dos rechaços. Foram, no mais das vezes, ignorados ou então julga- 
dos à base do “ouvir dizer”, já que demandam um grande esforço de 
atenção e reflexão. Revelou-se um personagem fora do comum, para 
todos aqueles que dele se aproximaram. Não poderia ser comparado 
a ninguém mais em seu modo de falar, de escrever e de agir. Iniciou 
seu trabalho quanto a grupos no Instituto Tavistok. Com o advento 
da Segunda Guerra Mundial, passa uma boa parte de sua vida no 
Exército. Assim que a guerra terminou, Bion voltou a trabalhar na 
Clínica Tavistok. Um pouco após a guerra, a Clínica Tavistok foi in- 
tegrada ao Serviço Nacional de Saúde e Bion retira-se. Apesar desta 
retirada, conseguiu, em alguns anos, aperfeiçoar uma terapia de 
grupo que teve grande repercussão. Introduzia conceitos alheios à 
psicanálise por duas razões: por um lado, o material observado era 
diferente; por outro, deixando de lado as teorias analíticas sobre o 
 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 25 
grupo, ele poderia constatar se suas idéias pessoais as complemen- 
tavam ou as contradiziam. Tratava-se de “convencer grupos de do- 
entes a aceitar como tarefa o estudo de suas tensões”. O psiquiatra 
não estabelecia nenhuma regra, nem apresentava nenhuma pauta do 
dia. Como, aparentemente, o grupo não tinha nada a fazer, tinha 
tempo para observar um fenômeno análogo ao da associação livre. 
Os participantes se voltavam, para ele esperando que ele fizesse al- 
guma coisa. A tensão mantida dessa forma favorecia as trocas ver- 
bais entre os participantes. Bion trabalhou com a vida emocional dos 
grupos. Interessou-se mais pelo clima afetiva que acompanha as tro- 
cas verbais, do que propriamente pelos conteúdos. Bion afirma a co- 
existência permanente, em qualquer grupo, de duas categorias de 
atividade mental: a do grupo-de-trabalho e a do grupo-de-base. 
O termo grupo-de-trabalho recobre somente uma certa forma de 
atividade mental (não se refere aos indivíduos que a ela se entre- 
gam). Mesmo quando constituído ao acaso, um grupo sempre se re- 
úne para levar a bom termo uma tarefa. Todos os indivíduos que o 
compõe cooperam voluntariamente nesta atividade. O grupo-de- 
trabalho é dotado de características análogas aquelas que Freud atri- 
buía ao ego (racional, temporal, analítico). 
O Grupo-de-base depende de uma participação involuntária e 
inevitável. Os participantes sonham em poder chegar perfeitamente 
equipados, como seres adultos que sabem instintivamente como vi- 
ver e agir num grupo. Sofrem a influência do que Bion chamou de 
pressupostos básicos. Estes se opõem a qualquer evolução que pode- 
ria resultar de uma compreensão. Em contrapartida dão um senti- 
mento de maior vitalidade. 
Bion conseguiu reduzir o polimorfismo dos pressupostos básicos 
a três tipos: dependência; acasalamento; luta-fuga. Segundo o pri- 
meiro pressuposto, o grupo busca apoio de um líder de quem espera 
receber alimento material e espiritual assim como proteção. Está 
convencido de que uma pessoa, de quem ele depende totalmente, 
poderá satisfazer todas as suas necessidades. Para este tipo de gru- 
po, o poder vem da magia e não da ciência: eles gostariam de ter por 
líder um feiticeiro ou alguém que se comportasse assim. 
O segundo pressuposto se refere ao objetivo pelo qual o grupo se 
reuniu. No momento que se instala esta situação, uma atmosfera de 
esperança irracional contrasta com o aborrecimento e a frustração 
habituais. O grupo pensa que uma pessoa, ou uma idéia, virá salvá- 
lo, fazendo desaparecer todas as dificuldades atuais. 
 
 
 
 
26 / Cadernos da SBDG – 9 
No terceiro pressuposto básico, o grupo se reúne para lutar con- 
tra um perigo ou para fugir dele. Escolhe diferentemente uma ou 
outra maneira de agir, de onde vem a denominação luta-fuga. O 
grupo aceita um líder, cujas exigências lhe dão oportunidade de fu- 
gir ou agredir. 
Bion não parou de se interessar, durante toda a sua vida, pelos 
grupos, mesmo que, desde o fim dois anos 40, a experiência direta 
do grupo terapêutico não fosse mais objeto de sua reflexão teórica. 
O período grupal de Bion teve a vantagem de ser exposto de 
uma maneira muito acessível, já que escrevia em função de uma ex- 
periência humana que ele desejava compartilhar. 
 
 
América Latina 
 
 
José Bleger – Psicologia institucional de grupos 
 
Desde a década de 60, José Bleger tornou-se um autor conhecido 
entre nós, por seus trabalhos sobre Psicanálise, Psicologia, Grupos e 
Instituições. Sua marca está, sobretudo, na proposta de uma atuação 
profissional que extrapola os limites do consultório e lida com a saú- 
de mental ou com a psico-higienenos grupos e nas atividades de 
vida diária: uma proposta que se forma num esforço de articulação 
teórica entre Psicanálise e Materialismo Dialético. Estando sua for- 
mação muito ligada a Pichón-Rivière, Bleger é, no entanto, aquele 
que recupera nos processos grupais, a dimensão institucional e polí- 
tica. Sua proposta é a de fazer a Psicologia sair dos consultórios e 
dos limites terapêuticos para abarcar a realidade cotidiana; e esse 
trajeto deve ser científico, a função social do psicólogo será sempre 
traçada como uma intervenção investigadora. Nela, levanta hipótese 
e atinge conclusões parciais retomadas por novas hipóteses que, por 
sua vez, permitem a relatividade de outras afirmações, e assim se vai 
indefinidamente. O conhecimento descontínuo e inacabado é um 
desafio constante. 
 
 
No Brasil – como e com quem 
começou o estudo da dinâmica dos grupos? 
 
Em 1963 a I Conferência Nacional de Administração Pública, rea- 
lizada no Rio de Janeiro, onde no tema “Novos métodos de ensino e 
treinamento” apareceram comunicações sobre o emprego de método 
de laboratório de sensibilidade na renovação do ensino de Adminis- 
 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 27 
tração Pública nas Escolas de Administração das Universidades do 
Rio Grande do Sul, Bahia e da Fundação Getúlio Vargas, pelos pro- 
fessores Édela Pereira, João Eurico Matta e Fela Moscovici. Outros 
laboratórios estavam sendo realizados sem divulgação; o que culmi- 
nou com a realização de um levantamento e um mapeamento do 
emprego do método no Brasil, publicado no livro Laboratório de Sen- 
sibilidade, de Fela Moscovici (1965). Isso faz com que alguns autores 
afirmem que ela foi a precursora dos princípios da Dinâmica de 
Grupo no Brasil. Outros afirmam que Lauro de Oliveira Lima foi o 
introdutor da DG no Brasil em cursos de treinamento, adaptado à 
psicologia de Piaget à DG. 
 
 
CONCLUSÃO 
 
No início do trabalho vimos como o tema grupo pode ser capta- 
do através das eras e seus respectivos povos. O termo grupo tem his- 
tória recente como ciência das associações e de equipes. Pudemos 
analisar também a resistência epistemológica ao conceito de grupo 
tida mais como relação interindividual e de maneira estática. O te- 
mor de voltar a pensar a própria situação em um novo marco de re- 
ferência e de ser assim submetido a discussão, constituem um dos 
aspectos da resistência epistemológica à noção de grupo. Porém os 
maiores motivos da resistência epistemológica são as angústias pri- 
mitivas. 
Passando pela França vimos por assim dizer não só um aspecto 
histórico mas pré-histórico da dinâmica dos grupos com Fourier, 
trazendo à tona até mesmo um critério de seleção dos componentes 
do grupo em seu falanstério. 
Vimos como a influência do pensamento de Freud, apesar de sua 
teoria centrar-se essencialmente na análise do indivíduo, sua preo- 
cupação científica o levou a trazer determinadas proposições no 
campo do comportamento social e grupal. Apesar de sua extensa e 
significativa obra, analisamos unicamente. “Totem e tabu” e “Psico- 
logia coletiva e análise do eu”. 
Ao analisarmos a experiência dos Estados Unidos vimos os quac- 
kers vindos da Inglaterra no século XVII, com a concepção de grupo 
democrático, fermento de valores morais e espirituais, agente da tro- 
ca individual pela troca social, é a origem da ideologia que acompa- 
nha nos Estados Unidos o nascimento da dinâmica de grupos. Então 
consideramos o pensamento de Lewin aplicado aos grupos. Foi tão 
importante para Lewin o fenômeno grupal que levou-o a afirmar 
 
 
28 / Cadernos da SBDG – 9 
que “no grupo é o único lugar em que uma pessoa se sustenta” 
(1940, p. 101), com o qual é impossível pensar a pessoa sem o grupo 
na evolução do pensamento lewiniano. 
Na Inglaterra Wilfred R. Bion um dos autores mais interessantes 
e carismáticos dentro da psicologia dos grupos. Contemporâneo de 
Lewin, com quem manteve contato, resulta pedra angular para o de- 
senvolvimento da psicologia de grupos na Europa. Durante a Pri- 
meira Guerra aprendeu experiencialmente que um oficial tem de le- 
var em conta as relações interpessoais do grupo que dirige. Em 1921, 
entrou como analista na clínica Tavistock que desde 1920 funcionava 
oferecendo serviço aberto de terapia de orientação psicanalítica. Em- 
preende em Tavistock grupo de formação de líderes dedicado à in- 
dústria e às organizações, reunindo altos executivos e diretores. 
Desde esta iniciativa, sua técnica para a formação de líderes se intro- 
duz na indústria. Por último se interessou pelo que ele chamou de 
grupos de trabalho especializado, especialmente grupos de militares 
e religiosos. 
Wiliam Schutz introduz O Princípio das Dimensões Básicas. Com 
isso enseja uma compreensão mais detalhada da abordagem holísti- 
ca. Para que o grupo possa existir, deve definir-se como grupo. Os 
limites devem ser estipulados, de modo a deixar claro quem está 
dentro e quem está fora dele. São três dimensões básicas: inclusão, 
controle e afeto, ocorrendo nesta ordem no desenvolvimento dos 
grupos. 
O homem é supostamente considerado gregário pela necessida- 
de de agrupar-se para assegurar a sua identidade e preservar a pró- 
pria espécie. Consegue com isso garantir sua unidade institucionali- 
zando-se, tema sobre o qual tratamos na psicologia institucional de 
grupos enfocando José Bleger, Georges Lapassade, Guilhon de Al- 
buquerque e Max Pagès. 
Analisamos alguns aspectos da natureza humana, da influência 
do meio, a emotividade e a relação familiar, que foram objeto de es- 
tudo de muitos observadores e cientistas. Por fim trouxemos um pe- 
queno relato do desenvolvimento da teoria dos grupos no Brasil, 
traduzido pelos trabalhos de Fela Moscovici, Édela Pereira, João Eu- 
rico Matta e Lauro de Oliveira Lima. 
Concluímos, considerando oportuno reafirmar nossa crença na 
importância desta via de análise da origem das orientações teóricas 
para o estudo da dinâmica de grupo e nossa expectativa de que no- 
vos trabalhos sejam realizados com o objetivo de aprofundar o nível 
de compreensão do universo do fenômeno dos grupos humanos. 
 
 
 
Abordagens teóricas dos estudos de grupos / 29 
Referências 
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