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Plantas Alucinógenas Professora: Maria Carolina Anholeti Universidade Federal Fluminense Curso: Medicina Disciplina: Biologia Geral – Botânica Aplicada Plantas alucinógenas • Alucinação é a percepção real de um objeto inexistente. Dizemos que a percepção é real, tendo em vista a convicção inabalável que a pessoa manifesta em relação ao objeto alucinado, portanto, será real para a pessoa que está alucinando; • Plantas alucinógenas são assim chamadas por possuírem em sua composição substâncias capazes de distorcer os sentidos e comumente produzir alucinações; • Embora a maioria dos alucinógenos sejam visuais, eles também envolvem os sentidos de audição, toque, cheiro, ou gosto – e ocasionalmente diversos sentidos estão envolvidos. Substâncias alucinógenas • Também chamadas de psicoticomiméticas por “mimetizar” um dos mais evidentes sintomas das psicoses – as alucinações; • Alguns autores também as chamam de psicodélicas. A palavra psicodélica vem do grego (psico = mente e delos = expansão) e é utilizada quando a pessoa apresenta alucinações e delírios em certas doenças mentais ou por ação de drogas; • A alucinação e o delírio nada têm de aumento da atividade ou da capacidade mental; ao contrário, são perturbações do perfeito funcionamento cerebral; • Um grande número de drogas alucinógenas vem da natureza, principalmente de plantas. Elas foram “descobertas” por nossos ancestrais que, as consideravam “plantas divinas”, isto é, que faziam com que quem as ingerisse recebesse mensagens dos deuses. Até hoje em culturas indígenas de vários países o uso dessas plantas tem significado religioso. Substâncias alucinógenas • Alguns alucinógenos agem em doses muito pequenas e praticamente só atingem o cérebro e, portanto, quase não alteram nenhuma outra função do corpo: são os alucinógenos propriamente ditos ou alucinógenos primários. Exemplo: O THC (tetraidrocanabiol) da maconha; • Existem outras drogas que também são capazes de atuar no cérebro, produzindo efeitos mentais, mas somente em doses que afetam de maneira importante várias outras funções: são os alucinógenos secundários. Exemplo: Espécies do gênero Brugmansia sp; • No Brasil algumas plantas alucinógenas, ricas em alcalóides derivados da triptamina são consumidas por comunidades indígenas na forma de vinho, chá ou rapés. Pode-se dizer que o consumo destas plantas deu origem a cultos e religiões. Jurema preta - Mimosa hostilis Benth. (Fabaceae) • Espécie rica em N,N-dimetiltriptamina (DMT), um neurotransmissor químico presente naturalmente no corpo humano bem como em muitas plantas; • Pode ser consumida através da ingestão da bebida ou do ato de fumar o cachimbo; • A bebida é preparada pelos indígenas por maceração das raízes em água, e o material do cachimbo com as raízes e folhas secas da espécie vegetal; • Em diversas obras literárias envolvendo personagens indígenas o uso de Jurema é descrito, como na obra Iracema, de José de Alencar. Jurema preta - Mimosa hostilis Benth. (Fabaceae) • Dentre os efeitos provocados pela Jurema podem ser citados: alterações de humor com euforia e depressão, ansiedade, distorção de percepção de tempo, espaço, forma e cores, alucinações visuais, ideias delirantes de grandeza ou de perseguição, despersonalização, midríase, hipertemia e aumento da pressão arterial; • Essa bebida é utilizada em rituais religiosos por vários grupos por proporcionar experiências místicas e visões extáticas. DMT Efeitos do DMT no organismo em função do tempo • Primeiros instantes: ▫ Visões e pensamentos muito rápidos; ▫ Objetos perdem as formas; ▫ Objetos se dissolvem; • Após os primeiros 5 minutos: ▫ Pupilas dilatadas; ▫ Batimento cardíaco acelerado; ▫ Pressão arterial aumenta; • Após 10 minutos: ▫ Alucinações de olhos fechados e abertos; ▫ Grande movimentação do globo ocular ▫ Dificuldade nas expressões e pensamentos; ▫ Pressentimentos que podem levar ao medo. • Após 60 minutos os efeitos já não existem mais, apenas em casos raros pessoas tiveram alguns sintomas na segunda hora do uso. DMT Outras plantas ricas em DMT • Algumas plantas da Amazônia, ricas em DMT utilizadas como alucinógenos são o cipó caapi - Banisteriopsis caapi Morton (Malpighiaceae) - e as sementes moídas das espécies Anadenanthera peregrina L. Spreng. (Fabaceae) e de A. colubrina (Vell.) Brenan (Fabaceae); • O cipó caapi que contém também os alcalóides β-carbolínicos: harmalina, harmina e tetraidro-harmina e as folhas de Psychotria viridis Ruiz & Pavón (Rubiaceae), conhecida como chacrona e também rica em DMT, são utilizados para o preparo de uma bebida chamada Ayahuasca. Banisteriopsis caapi Anadenanthera peregrina Outras plantas ricas em DMT • Sobre a Ayahuasca, há uma farta literatura botânica e antropológica, alguns estudos específicos sobre sua farmacologia ressaltam que a psicoatividade oral do DMT depende da inibição da enzima MAO, causada pela ingestão simultânea de β-carbonilas; • Na Ayahuasca, o princípio simbólico feminino é constituído pela folha da chacrona, portadora de DMT; e o princípio masculino, pelo cipó caapi, que contém harmina e harmalina, inibidores que geram a psicoatividade. Porém, em teoria nem a folha nem o cipó são psicoativos tomados separadamente; • Outra descoberta notável é que consumido via oral acima de 25 mg o DMT é psicoativo por si só, não precisando de inibidores, justificando o efeito da jurema. Psychotria viridis Alcalóides β-carbolínicos harmalina harmina tetraidro-harmina Contra-indicações e efeitos colaterais da Ayahuasca • Está comprovado que a dieta influencia diretamente na qualidade da experiência e, sem dúvida, o maior perigo físico ao ingerir ayahuasca está relacionado com os efeitos dos alcalóides inibidores da enzima (MAO); • A tiramina é um aminoácido que normalmente é metabolizado pela MAO no intestino. Ao utilizar inibidores da MAO, a tiramina que se encontra em certos alimentos já não pode ser metabolizada pelo organismo, o que pode causar um acréscimo dos níveis de tiramina no sangue; • Altos níveis de tiramina podem afetar a produção natural de noradrenalina, levando a uma crise hipertensiva que pode se complicar chegando a produzir hemorragias, infartos, problemas neurológicos, entre outros; • A tiramina se encontra em queijos, vinhos e geralmente em tudo o que é fermentado. Maconha – Cannabis sativa L. (Cannabaceae) • Devido aos seus efeitos analgésicos, antieméticos e tranquilizantes, a planta Cannabis sativa tem sido utilizada com propósitos medicinais por séculos; • As preparações da Cannabis sativa, tais como a marijuana, o haxixe ou o skunk, possuem um longo histórico como drogas de abuso; • Os efeitos típicos da planta são amnésia, sedação e sentimento de bem-estar descrito como “felicidade”; • Na metade do século passado foi identificado o ∆9-tetraidrocanabinol (∆9-THC) como o principal ingrediente psicoativo da planta. Hoje sabe-se que a espécie contém mais de 60 substâncias semelhantes, denominadas fitocanabinóides. THC Maconha – Cannabis sativa L. (Cannabaceae) • O processo neurofarmacológico do THC é ainda pouco conhecido; • Altas densidades dos receptores de THC são encontrados no córtex cerebral; hipocampo, cerebelo e gânglios basais, o que corresponde aos efeitos clínicos do uso da maconha sobre a coordenação, memória e pensamento; • Os receptores aos quais o THC se liga são os chamados de receptores canabinóides, que parecem estar relacionados a diversos processos fisiológicos, tais como regulação do metabolismo, dor,ansiedade, crescimento ósseo e imunidade. Imagem: http://www.virtual.epm.br/material/depquim/10flash.htm Neurônios dopaminérgicos do Sistema Límbico Imagens: http://www.virtual.epm.br/material/depquim/10flash.htm Sistema Límbico → Emoções Ação do THC Imagens: http://www.virtual.epm.br/material/depquim/10flash.htm • Sabe-se que o THC age indiretamente nos neurônios dopaminérgicos do sistema límbico através de uma interação entre esses neurônios e os neurônios do sistema de opióides endógenos; • A ligação do THC aos receptores opióides transmite um sinal aos neurônios dopaminérgicos localizados no sistema de recompensa cerebral; • Há uma maior liberação de dopamina na fenda sináptica, o que é responsável pelo efeito clínico de euforia e prazer relacionados ao uso da maconha; Em 1992 foi descoberta a anandamida – também conhecida como “substância da felicidade” – uma substância produzida pelo organismo humano que se liga aos receptores opióides e pode ter efeitos analgésicos, ansiolíticos e antidepressivos, semelhantes aos do THC. Farmacologia do THC • Biodisponibilidade: Maior por inalação do que por administração oral; • Os efeitos associados à administração oral demoram mais tempo para serem instalados, porém têm maior duração e envolvem efeitos psicoativos mais poderosos; • Por inalação atravessa os alvéolos pulmonares, entra na circulação e atinge o cérebro em minutos. Ao chegar à corrente sanguínea os níveis de THC diminuem rapidamente devido ao metabolismo hepático; • Altamente lipossolúvel, o THC e seus metabólitos tendem a acumular-se nas células adiposas e têm uma meia-vida de aproximadamente 50 horas; • Dentre os metabólitos o 11-hidróxi-THC é potencialmente mais potente que o THC; • Aproximadamente 25% dos metabolitos são eliminados na urina, porém a maioria é liberada no intestino pelo fígado e pode ser reabsorvido através da circulação entero-hepática, prolongando a sua ação ou eliminado nas fezes. A eliminação total pode demorar até 30 dias. Problemas associados ao uso da maconha • O fumo de cigarros de Cannabis está relacionado com a dificuldades respiratórias, porém isso não está relacionado exclusivamente ao THC e deve-se principalmente à presença de hidrocarbonetos tóxicos e carcinogênicos provenientes da queima da matéria orgânica; • A dose letal em humanos não é ainda conhecida e não existem relatos de morte em seres humanos por intoxicação aguda com Cannabis; • No cérebro, o consumo agudo pode desencadear efeitos passageiros psicóticos, cognitivos e no controlo psicomotor. A gravidade e duração dos sintomas variam com a susceptibilidade do indivíduo e com a frequência e intensidade do consumo; Problemas associados ao uso da maconha • O uso prolongado é capaz de alterar a personalidade do usuário (efeito psicológico?), que passa a experimenta pouco prazer em atividades não relacionadas com o consumo da planta. • Existem relatos comprovando o risco de malformações fetais e de danos cognitivos devido ao consumo de Cannabis; • Um estudo sobre a fisiologia reprodutiva realizado pela Universidade em Buffalo diz que homens que fumam maconha freqüentemente têm menos fluido seminal, uma contagem de esperma total mais baixa, e seus espermatozóides se comportam anormalmente, o que pode afetar a fertilidade adversamente. Trombeta – Brugmansia suaveolens Humboldt & Bonpland ex Willdenow (Solanaceae) • Os efeitos alucinógenos provocados pelo chá da planta conhecida como trombeta, deve-se à presença de alcalóides tropânicos como a hiosciamina e a escopolamina; • As substâncias em questão têm ação anticolinérgica e em doses elevadas são capazes de causar perturbações psíquicas intensas, principalmente alucinações e delírios, em geral visões de bichos e pessoas, além de sensação de perseguição. Os efeitos podem durar de dois a três dias; • Os sintomas psíquicos são acompanhados de alterações físicas como dilatação das pupilas, boca seca, taquicardia, constipação intestinal, e dificuldade para urinar. Pode ocorrer ainda hipertermia, confusão mental e coma. (-)-hiosciamina (-)-escopolamina Ação dos anticolinérgicos no SNC • A acetilcolina é um neurotransmissor que apresenta papel relevante em várias funções do SNC como a memória, por sua atuação no hipocampo e outras áreas de função cognitiva, e do sistema nervoso periférico, como a movimentação neuromuscular; • As drogas que bloqueiam a acetilcolina podem produzir déficits de cognição, em doses tóxicas, além de sintomas psicóticos; O chá de trombeta é considerado umas das drogas mais perigosas do mundo, devido aos altos teores de escopolamina... A seguir alguns relatos do uso de uma dose elevada de escopolamina por um homem de 35 anos... Efeitos provocados pela ingestão de 7 g de escopolamina • 30 min: Início dos sintomas periféricos anticolinérgicos: boca seca, visão turva, midríase, febre, rubor, sudorese na face, dificuldade de ordenação do pensamento e na construção de frases; • 1 hora: Delírio de fixação, substancial diminuição do tônus muscular, andar de zumbi, redução brutal da lateralidade, esbarrão em qualquer coisa, taquicardia; • 2 horas: Músculos quase completamente relaxados, agora é impossível andar (o sujeito apenas rasteja, com dificuldade). Hipertermia, disritmia cardíaca, audição prejudicada, midríase completa, alteração na percepção das cores que são agora muito ricas e brilhantes, como na intoxicação por maconha. A percepção visual é insuficiente, o texto é borrado e não importa quanto o sujeito tente se concentrar, ler qualquer coisa é impossível. A percepção de profundidade fica severamente prejudicada, o que torna impossível mensurar as distâncias de modo que chegue perto de objetos sem bater ou ficar aquém do ponto determinado; Efeitos provocados pela ingestão de 7 g de escopolamina • 3 horas: As paredes parecem estar respirando, os objetos são um turbilhão de vida e formas, criando um cenário assustador ao redor do indivíduo. O efeito sobre a personalidade é aterrador; • 4 horas e em diante: Os músculos estão tão fracos que parece necessitar de uma força sobre humana a mera ação de levantar um dedo. O sujeito sente uma força opressora apertá-lo. Como se viesse um dedo de Deus gigante e o forçasse para a cama, paralizando-o. O campo visual é completamente coberto por diversas formas vivas e uma espécie de espuma de embaçamento que surge de modo aleatório. A garganta está seca, a língua parece ter areia. O sujeito já não sabe onde ele está, não não sabe quem é, se está dormindo ou acordado. O Sujeito oferece a sua alma ao demônio que está sentado sobre ele em troca de um refrescante e singelo copo de água. O demônio aceita o trato. Captura a sua alma, mas não lhe concede o desejo – a água. O sujeito aceita pacíficamente que é burro e que está fadado a maldição eterna; Efeitos provocados pela ingestão de 7 g de escopolamina • 16 horas: O sujeito encontra-se no local de trabalho, absolutamente perplexo. Ele sabe que ele está no meio de uma conversa com alguém, pede para que a pessoa a repetir aquilo que foi dito. De alguma maneira ele consegue lidar com tudo no trabalho sem dar bandeira.Vagamente ele se lembra da manhã até o momento em que se deu conta de onde estava. Felizmente, não há lesões, com exceção de alguns hematomas leves. Conclui que ele deve ter caído nas escadas enquanto perambulou zumbificado pelo prédio. Mais tarde, ainda no mesmo dia, o sujeito fica chocado ao descobrir que ele havia terminado uma considerável quantidade trabalho. Trabalho bem complexo, que exigiu muita atividade intelectual para fazer. Porém ele nem sequer se lembra que lhe tenha sidodelegada essa tarefa. Devido a visão ainda meio borrada, a leitura é um pouco difícil; Efeitos provocados pela ingestão de 7 g de escopolamina • 20 horas: O sujeito vai para casa, vê uma tigela de arroz cozido na geladeira. Ele não se lembra de sequer ter preparado arroz. Também encontra uma escova de dentes e alguns fios dentais (mais do que usa de costume) amarrado ao redor do criado-mudo. Há também um controle remoto no banheiro. O sujeito começa a ter uma paranóia sobre diversas entidades que se ocultam em toda a sua casa. Ele vê criaturas fugazes na sua visão periférica; • 48 Horas: a memória e a sanidade do sujeito estão de volta ao normal, mas ele está profundamente abalado e arrependido de ter experimentado um delírio anti-colinérgico.
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