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Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR 37 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade de conservação da natureza: uma reflexão sobre a perspectiva da etnoconservação Indigenous Knowledge as a Possibility of Nature Conservation: a Reflection on the Perspective of Ethno Conservation Bárbara Elisa PEREIRA* Antonio Carlos DIEGUES** RESUMO O quadro ambiental mundial tem sido motivo de preocupação de diversos segmentos da sociedade. Diante deste cenário, novas concepções vêm sendo adotadas com o intuito de alcançar uma proteção efetiva da natureza, as quais geram amplas discussões em diferentes esferas políticas, presentes do nível local ao global. Estas questões passaram a abranger as populações tradicionais e seus respectivos conhecimentos por meio de uma nova perspectiva chamada de etnoconservação, a qual procura associar a conservação da natureza com os conhecimentos tradicionais e manejo dos recursos naturais que proporcionam. A etnoconservação é uma das especialidades da etnociência, que desenvolve trabalhos que abrangem desde elementos da linguística até aspectos culturais e biológicos, visando compreender a classificação e sig- nificação dos recursos e fenômenos naturais. Entretanto, o fato de a etnoconservação estar densamente associada com as populações e conhecimentos tradicionais remete à necessidade de aprofundar-se nestes aspectos, a fim de entender os subsídios desta nova abordagem para a conservação dos recursos naturais. Palavras-chave: população tradicional; conhecimento tradicional; etnoconservação. ABSTRACT The global environmental situation has been a concern of several segments of society. Within this scenario, new conceptions have been adopted in order to reach an effective environmental protection, resulting in wide discussions in different political spheres, from local to global levels. These issues include indigenous people and their respective knowledge, discussed through a new approach called ethno conservation, which aims at associating environmental conservation with indigenous knowledge and management of * Pedagoga. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo e pesquisadora do Núcleo de Apoio à Pesquisa sobre Populações em Áreas Úmidas Brasileiras (NUPAUB). Email: ba.e@usp.br ** Doutor em Ciências Sociais. Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo e Diretor Científico do Núcleo de Apoio à Pesquisa sobre Populações em Áreas Úmidas Brasileiras (NUPAUB). Email: adiegues@usp.br Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR38 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... natural resources. Ethno conservation is an area of expertise from ethno science, based in elements of language, culture and biology, in order to understand the meaning and classification of natural resources. As ethno conservation is strongly related with indigenous people and their knowledge there is a need to take these aspects into consideration, in order to understand the contribution of this new approach to environmental conservation. Key-words: indigenous people; indigenous knowledge; ethno conservation. Introdução Como o mundo é governado das cidades onde os homens se acham desligados de qualquer forma de vida que não a humana, o sentimento de pertencer a um ecossistema não é revivido. Isso resulta em um tratamento implacável e imprevidente de coisas, das quais, em última análise, de- pendemos, tais como a água e as árvores (BERTHRAND DE JUVENEL, in: RIBEIRO, 1987, p. 11). Devido à demanda global a favor da proteção da natureza, juntamente com o crescimento de correntes ambientalistas detentoras de perspectivas diferentes da preservacionista1, as populações tradicionais passaram a ser consideradas importantes como atores responsáveis pela proteção do ambiente natural no qual estão inseridas. Neste sentido, a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92) enfatizou a necessidade de se proteger essas populações, assim como os conhecimentos dos quais são detentoras. Porém, a abordagem de assuntos relacionados com conhecimentos tradicionais implica em uma série de discus- sões desenvolvidas em diversas esferas científicas e políti- cas, geradoras de embates no âmbito local e internacional, visto que estes conhecimentos são alvos de diversos interes- ses. Tais embates envolvem desde a definição de população e conhecimento tradicional até as questões relacionadas com o direito de propriedade, repercutindo na necessidade de uma reflexão sobre quem são os responsáveis pela pro- dução, transmissão e continuidade desses conhecimentos2. Neste cenário conflituoso, adicionam-se as discussões que pontuam a possibilidade do manejo dos recursos natu- rais associado aos conhecimentos tradicionais proporcionar a conservação da natureza in situ. Estas discussões inserem novos direcionamentos para o conservacionismo, princi- palmente nos países em desenvolvimento, configurando um novo enfoque, chamado de etnoconservação, a qual pode ser considerada como uma das soluções capazes de interromper, ou ao menos diminuir, a intensa destruição da natureza ocasionada pelo modelo econômico capitalista de desenvolvimento adotado por diversos países. A discussão acerca da etnoconservação remete ao ano de 1952 e foi iniciada por um estudo desenvolvido por Balick e Cox sobre o uso de plantas por populações indígenas, a partir do qual diversas pesquisas passaram a procurar vínculos entre a conservação e o manejo dos recursos naturais por populações tradicionais. Na busca pelos aspectos conceituais da etnoconservação, este tra- balho procurou inicialmente caracterizar as “populações tradicionais”, para então compreender a difusão dos seus conhecimentos, presentes nos estudos que envolvem a et- nociência, da qual a etnoconservação é originada. A partir deste ponto, a etnociência passa a ser o foco do trabalho, por meio de um breve levantamento da evolução dos estu- dos, assim como de alguns aspectos metodológicos. Este levantamento permite, finalmente, que a discussão sobre a etnoconservação seja desenvolvida, por meio dos aspectos históricos e conceituais que permeiam estes estudos, pos- sibilitando a compreensão desta nova perspectiva para a conservação da natureza. 1 É importante pontuar que a perspectiva preservacionista se difere da conservacionista. Para a primeira, a natureza remete à noção de wilderness (vida natural, selvagem), havendo a dissociação entre homem e natureza, de modo que a mesma deve ser protegida para que permaneça intacta, pois a interferência humana é considerada sempre negativa. O conservacionismo também aponta para a necessidade da proteção dos recursos naturais, mas ultrapassa a perspectiva preservacio- nista ao associar as populações humanas à natureza, pois afirma que manejos sustentáveis possibilitam a interferência humana nos ecossistemas, sem a geração de impactos drásticos (DIEGUES, 2008, p. 25). 2 Buscou-se aqui o desenvolvimento de uma revisão acerca de aspectos conceituais referentes à etnoconservação. Ainda que as discussões sobre o tema no contexto político gerem reflexões e críticas importantes e necessárias, optou-se por não incluí-las neste trabalho, pois se considera que diversos aspectos desta discussão provocam a elaboração de trabalhos direcionados para estas questões. É possível verificar a dimensão política que permeia os assuntos relacionados às populações e conhecimentos tradicionais em alguns trabalhos recentes. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR 39 PEREIRA, B. E.;DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... Populações tradicionais: conteúdos e processos O termo “população tradicional” está no cerne de diversas discussões e sua implicação ultrapassa a procura pela teorização, envolvendo uma série de problemáticas relacionadas às políticas ambientais, territoriais e tecnoló- gicas, uma vez que os diversos organismos multilaterais que trabalham em torno deste assunto apresentam dificuldades e discordâncias na tentativa de indicar uma definição aceita universalmente, o que facilitaria a proteção dos conheci- mentos tradicionais difundidos pela tradição oral destas populações3. No Brasil, o decreto n.º 6.040, de 7 de fevereiro de 2007, refere-se ao termo populações tradicionais como povos ou comunidades tradicionais4, os quais são definidos pelo Artigo 3 como: I – Povos e Comunidades Tradicionais: grupos cultu- ralmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, ino- vações e práticas gerados e transmitidos pela tradição (BRASIL, 2007)5. Apesar da existência da definição legal para “po- pulações tradicionais”, é preciso considerar que, segundo Almeida e Cunha (1999, p. 3), este termo é permeado por aspectos semânticos e está sujeito a modificações. Partindo deste pressuposto, procurar-se-á assinalar algumas de suas características, a fim de possibilitar uma melhor compre- ensão das questões inseridas no cenário que envolve as populações tradicionais e respectivos conhecimentos (COL- CHESTER, 2000, p. 230; MACAULY; MAXWELL, 2006, p. 1), entre as quais são evidenciadas a transmissão oral, a existência de uma ampla ligação com o território habitado, os sistemas de produção voltados para a subsistência e o caráter econômico pré-capitalista (ARRUDA, 2000, p. 274; CUNHA, 1989, p. 3; IBAMA, 2008). Dentre estas, a utilização dos recursos naturais ocupa um lugar de destaque, uma vez que tem relação direta com a ocupação dos territórios, assim como a fixação nos mes- mos esteve diretamente acoplada aos ecossistemas locais, devido ao desenvolvimento das atividades culturais e de subsistência dessas populações: Na concepção mítica das sociedades primitivas e tradicionais existe uma simbiose entre o homem e a natureza, tanto no campo das atividades do fazer, das técnicas e da produção, quanto no campo simbólico. Essa unidade é muito mais evidente nas sociedades indígenas brasileiras, por exemplo, onde o tempo para pescar, caçar e plantar é marcado por mitos ancestrais, pelo aparecimento de constelações estelares no céu, por proibições e interdições. Mas ela também aparece em culturas como a caiçara do litoral sul e ribeirinhos amazonenses, de forma menos clara talvez, mas nem por isso menos importante (DIEGUES, 2008, p. 63). Nesta perspectiva, o manejo desses recursos está dire- tamente ligado com mitos, regras, valores e conhecimentos, que definem a maneira e período como tais recursos serão utilizados, podendo ser considerados “elementos culturais regulatórios”, pois determinam as atitudes das pessoas pe- rante o meio ambiente (CULTIMAR, 2008). Nesse sentido, Lévi-Strauss analisa alguns sistemas de classificação dos recursos naturais por populações indígenas e sua relação com seus conhecimentos e manifestações sociais: 3 Uma das dificuldades da utilização do termo “populações tradicionais” se encontra na diversidade étnica mundial (a qual contempla muitos povos e populações que não se autoidentificam dentro da generalização que se refere aos mesmos como indígenas ou tradicionais), e nas traduções do termo em inglês indigenous people, que apresenta múltiplos significados de acordo com o idioma e o contexto no qual é traduzido (DIEGUES, 2008, p. 82). 4 Utilizar-se-á neste trabalho “população tradicional” devido à sua maior abrangência em relação a outros termos mais específicos, como sociedades, culturas ou comunidades tradicionais. Diegues (2008, p. 77) aponta a importância em definir cada um destes termos para que se evite o uso equivocado dos mesmos. Porém, visto que essa definição depende das diversas vertentes antropológicas, faz-se necessário um estudo com maior aprofundamento sobre o assunto. 5 Este decreto contribui muito para as discussões ao não atribuir a mesma definição para populações tradicionais e povos indígenas, visto que tanto a legislação que discorre sobre estes grupos quanto as várias pesquisas científicas deixam claro que estes dois grupos apresentam diferenças. No caso brasileiro, Almeida e Cunha (1999, p. 4) pontuam as questões territoriais como um dos principais divergentes entre estes grupos, visto que os povos indígenas têm a propriedade das terras habitadas reconhecida por meio da historicidade de sua ocupação; já as populações tradicionais (exceto quilombolas) ainda estão em processo de busca por este reconhecimento. É importante ressaltar também que os povos indígenas possuem línguas específicas que diferem do idioma oficial do país, enquanto alguns grupos de populações tradicionais difundem dialetos próprios, mas que não são adotados como oficiais pelos mesmos. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR40 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... De fato, descobre-se mais, a cada dia, que, para inter- pretar corretamente os mitos e os ritos e, ainda, para interpretá-los sob o ponto de vista estrutural (que seria errado confundir com uma simples análise formal), a identificação precisa das plantas e dos animais que se mencionam ou que são utilizados, diretamente sob a forma de fragmentos ou de despojos, é indispensável (LÉVI-STRAUSS, 1989, p. 68). Concomitantemente, Marques (2001, p. 162) demons- tra que são a partir destes elementos que a população age com o meio natural e desenvolve seus sistemas tradicionais de manejo. Existe uma relação de respeito, gratidão, medo e cumplicidade com a natureza, o que se apresenta como causa direta da preservação ambiental das localidades nas quais as populações tradicionais habitam. Cunha (1992, p. 77) assinala a existência da indissociabilidade entre o ho- mem e a natureza, já que o meio ambiente significa “o meio essencial de sua sobrevivência social – fonte de sua vida e de sua identidade cultural – e, por conseguinte, significa a possibilidade de continuarem vivendo na história”. O fato de o modo de produção não se enquadrar completamente aos padrões da sociedade urbano-industrial e ser caracterizado em parte como de subsistência remete ao sistema de manejo de recursos naturais que estas populações utilizam. Ainda segundo Diegues (2008, p. 84), este manejo é diferenciado, uma vez que, fundamentalmente, não visa ao lucro, mas está interligado com a reprodução social e cultural, adicionado de percepções acerca da natureza e seus ciclos. Por meio de uma perspectiva marxista, é possível associar a dependência parcial das populações tradicionais do mercado com a definição do modo de vida das mesmas como pré-capitalista: Dentro de uma perspectiva marxista, as culturas tradi- cionais estão associadas a modos de produção pré-capi- talistas, próprios de sociedades em que o trabalho ainda não se tornou mercadoria, onde há grande dependência dos recursos naturais e dos ciclos da natureza, em que a dependência do mercado existe, mas não é total. Essas culturas distinguem-se daquelas próprias ao modo de produção capitalista, em que não só a força de trabalho, como a própria natureza, se transformam em objeto de compra e venda (mercadoria) (DIEGUES, 2008, p. 84). O caráter pré-capitalista das populações tradicionais está igualmente relacionadocom as questões territoriais, o que pode ser exemplificado pelo caso brasileiro da fixação destas populações, as quais, de acordo com Diegues (2008, p. 19), são descendentes dos grupos que durante o período da colonização do território se estabeleceram em regiões isoladas de centros econômicos e de desenvolvimento. Estes grupos constituíram um modelo de cultura diferenciado, baseado na relação intensa com o território habitado, na qual a exploração equilibrada dos recursos naturais possibilitou a sobrevivência dessas populações “através da observação e experimentação de um extenso e minucioso conhecimento dos processos naturais, até hoje, as únicas práticas de mane- jo adaptadas às florestas tropicais” (ARRUDA, 1999, p. 83). Partindo desses pressupostos, Castro (2000, p. 169) apresenta a relação entre os diversos elementos que com- põem a cultura das populações tradicionais com o território habitado pelas mesmas. Colchester (2000, p. 239) corrobora com a autora ao pontuar que a forte ligação desses grupos com os seus territórios pode ser expressa pelo “sistema simbólico e pelo conhecimento detalhado dos recursos naturais”, os quais são decorrentes da ocupação perpetuada pelas gerações anteriores. Transversal às demais características intrínsecas às populações tradicionais expostas anteriormente, encontra- -se a transmissão oral como mecanismo de difusão, a qual estabelece uma relação contínua com os conteúdos disseminados: “Oralidade é simultaneamente conteúdo e processo. Ela impõe maior atenção aos movimentos de audição, percepção e memória, coerência de pensamento e criatividade como desenvolvimento do enredo narrado”6 (REVEL, 2005, p. 6, tradução da autora). Sendo assim, é possível afirmar que a transmissão oral dos conhecimen- tos dessas populações remete diretamente ao modo como se perpetuam as demais características, uma vez que, de acordo com Lenclude (1994, p. 31), é a partir da oralidade que os conhecimentos, valores, linguagens, representa- ções, visões de mundo e práticas são transmitidos entre os sujeitos, permitindo a continuidade do tempo passado no tempo presente. 6 “Orality is simultaneously context and process. It sets into motion attentive hearing, perception and memory, coherence of thought and creativity as the plot unfolds in the sung uttered”. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR 41 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... Para Becquelin (1992, p. 34), a transmissão oral en- volve outros processos durante seu desenvolvimento, tais como a interpretação e a construção de ações constantes, o que garante a transformação do conteúdo propagado. Além disso, Mello (2008, p. 44) enfatiza as questões existentes entre a transmissão oral e o contexto no qual ocorre, visto que se observa a influência deste sobre aquele, o que está as- sociado com a composição dos conteúdos e suas alterações, as quais, no entanto, não interferem na sua legitimidade, pois a identidade fundamental do mesmo é preservada: Enquanto está sujeito à constantes variações, estas histórias parecem ser sustentadas por vários padrões subjacentes de narração (o que J. Goody [1977, 1987] tem chamado de “enredos” da tradição oral) que adqui- rem uma certa estabilidade através do tempo, e assim preservam a identidade geral de uma tradição […]. Muitos antropólogos têm descrito as performances rituais nas quais certo equilíbrio é estabelecido entre o que é sujeito a variações e alguns pontos cruciais (o que seria denominado como o foco das performances ri- tuais), onde a improvisação desempenha um papel menos importante7 (SEVERI, 2002, p. 23, tradução da autora). Goody e Watt (2006, p. 17) conectam a transformação do conteúdo transmitido com os aspectos mnemônicos, de modo que esta ocorre por meio do esquecimento de alguns aspectos e adição de outros, havendo a contribuição das experiências individuais para a formação da tradição oral de uma sociedade e da linguagem como a principal ferramenta utilizada nesse processo. Os autores denominam este pro- cesso de memória e esquecimento como “organização ho- meostática da tradição cultural em sociedades não letradas”. Para Menget e Molinié (1992, p. 12) são estes os aspectos que permitem a recriação de certos pontos do conteúdo e caracterizam a historicidade própria que a tradição possui. A tradição, de acordo com Vansina (1985), é composta pelo produto resultante da memória e do esquecimento, mas também pelo processo que produz este conteúdo, e por isso, antes analisar o conteúdo de uma tradição, é necessário ponderar as formas pelas quais tais conteúdos foram transmitidos. A expressão “tradição oral” é aplicada tanto ao processo quanto aos produtos. Os produtos são mensagens orais baseadas em mensagens orais prévias, pelo menos uma geração mais velha. O processo é a transmissão dessas mensagens por boca a boca até o desaparecimento da mensagem8 (VANSINA, 1985, p. 3, tradução da autora). Lenclud (1994, p. 28), por outro lado, apresenta algumas reflexões na tentativa de encontrar uma definição para tradição, nas quais o autor aborda diversas maneiras da utilização desta palavra. Estas reflexões, porém, conduzem ao fato de que a definição de tradição ainda é uma discussão não finalizada nas diversas áreas do conhecimento, o que conduz aos múltiplos conflitos existentes ao redor deste assunto e coloca limitações nas tentativas de definir o co- nhecimento gerado pela tradição destas populações. Porém, apesar das limitações existentes, faz-se necessário articular tais conhecimentos com as características das populações tradicionais, descritas acima, uma vez que ambos coexistem e são dependentes entre si. Conhecimentos tradicionais e a etnociência A associação das características das populações tra- dicionais, principalmente no que se refere à utilização dos recursos naturais e ao processo oral de transmissão, são partes constituintes do conhecimento destas populações, que, segundo Arruda e Diegues (2001, p. 31), é composto pelo “conjunto de saberes e saber-fazer a respeito do mundo natural e sobrenatural, transmitido oralmente, de geração em geração”. Schmidt (2001, p. 73) acrescenta que a construção dos conhecimentos tem vasta relação com o ambiente físico e social habitado por estas populações e Allut (2001, p. 113) exemplifica esta relação ao expor alguns elementos prove- nientes dos conhecimentos que pescadores detêm sobre o meio marítimo, com o intuito de demonstrar que o conheci- 7 “While being subjected to constant variations, these stories appear to be sustained by a number of underlying patterns of narration (what J. Goody [1977, 1987] has called the ‘plots’ of oral tradition) that acquire a certain stability through time, and thus preserve the general identity of a tradition […]. Many anthropologists have describes ritual performances where a certain equilibrium is established between what is subjected to variation and a certain number of crucial points (that we could call the foci of ritual performances), where improvisation plays a much less important role”. 8 “The expression ‘oral tradition’ applies both to a process and to its products. The products are oral messages based on previous oral messages, at least a generation old. The process is the transmission of synch messages by word of mouth over time until disappearance of the message”. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR42 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... mento tradicional depende da junção entre os “saberes dos antigos” com o cotidiano dos mesmos, exigindo uma série de percepções e práticas necessárias para o sucesso da pesca e mesmo para a sobrevivência do pescador.Desse modo, o conhecimento, além de estar ligado a um savoir-faire, como um ter jeito, relaciona-se com uma rede conceitual de conhecimentos espaciais e ambientais tão ou mais essenciais que na cultura manual e técnica. Tudo isso surge de um processo que pressupõe um su- jeito cognitivo em constante interação entre o trabalho mental e manual, e entre este e seu entorno (ALLUT, 2001, p. 113). Para Cunha (1999, p. 156), a interdependência entre os “saberes dos antigos” e o cotidiano das populações conduz à compreensão dos conhecimentos tradicionais como “produtos históricos”, constituídos pela continuida- de e transformação dos seus conteúdos. A inserção destes elementos na composição dos conhecimentos tradicionais coloca a transmissão oral como um dos pontos imprescindí- veis para o processo de produção dos mesmos e demonstra a intensa conexão que existe entre as características das populações tradicionais e seus respectivos conhecimentos com o mecanismo de difusão utilizado. Este aspecto per- mite considerar que os conhecimentos tradicionais não se limitam ao conteúdo, bem como o processo de transmissão não pode ser entendido como um transporte de informa- ções, pois ambos são dependentes do contexto no qual se propagam (BECQUELIN, 1992, p. 34; ELLEN, 1997, s/p.; MELLO, 2008, p. 44; TOLEDO, 2001, p. 458). Neste sentido, Cunha (1999, p. 156) adiciona aos conhecimentos tradicionais “[...] uma combinação de pressupostos, formas de aprendizado, de pesquisas e de experimentação”. De acordo com Lévi-Strauss (1989), estes conheci- mentos compõem a “Ciência do Concreto”, a qual se dis- tingue da ciência ocidental moderna, ainda que se encontre no mesmo padrão conceitual e metodológico. Enquanto esta última possui um objeto para investigação definido, que tem como finalidade a satisfação das necessidades humanas, a ciência do concreto busca o conhecer pelo conhecer e, tal como a ciência ocidental, fundamenta-se em constatações empíricas: Como na linguagem profissional, a proliferação concep- tual corresponde a uma atenção mais firme, em relação às propriedades do real, a um interesse mais desperto para as distinções que aí podem ser introduzidas. Este apetite de conhecimento objetivo constitui um dos aspectos mais negligenciados do pensamento daqueles que nós chamamos de “primitivos”. Se é raramente dirigido para realidades do mesmo nível que aquelas às quais se liga a ciência moderna, implica diligências intelectuais e métodos de observação semelhantes. Nos dois casos, o universo é objeto de pensamento, ao menos tanto quanto meio de satisfazer necessidades (LÉVI- -STRAUSS 1989, p. 21). Por outro lado, admite-se que uma das diferenças pri- mordiais entre o conhecimento produzido pelas sociedades orais e pelas sociedades letradas se refere principalmente ao modo de transmissão empregado, uma vez que enquanto a primeira baseia-se na oralidade, a segunda utiliza a es- crita como ferramenta para a transmissão e continuidade dos conhecimentos (LENCLUDE, 1994, p. 39). Inseridos nesta reflexão, faz-se necessário que os conhecimentos tradicionais sejam interpretados a partir do contexto no qual foram produzidos, para que não sejam padronizados e frag- mentados como aqueles originados pela ciência moderna (ELLEN, 1997, s/p.; TOLEDO, 2000, p. 2). Ainda abordando as questões relacionadas ao caráter científico dos conhecimentos tradicionais, Lévi-Strauss apresentou as taxonomias de folk como a descrição de di- versos sistemas de significação e classificação de recursos naturais, desenvolvidos por comunidades indígenas. O autor enfoca a lógica incutida nestes sistemas, visto que os conhecimentos acerca do meio natural não têm a utilidade singular de identificação, mas contemplam inúmeros signi- ficados, entrelaçados com aspectos culturais (1989, p. 76). Arruda e Diegues (2001, p. 36) indicam Lévi-Strauss como um dos precursores da etnociência, devido ao seu estudo analítico dos sistemas indígenas de classificação de recursos naturais, o qual proporcionou a percepção acerca da lógica e complexidade existentes nestes sistemas clas- sificatórios, de modo que direcionou a algumas reflexões que possibilitaram estudos mais aprofundados sobre estes conhecimentos9. 9 Apesar de a sua visibilidade ter sido ampliada a partir de Lévi-Strauss, o início dos estudos dos conhecimentos tradicionais como pressupostos da ciência moderna ocorreu por volta do ano de 1954, com a tese de Harold Conklin, intitulada The Relations of Hanunoo Culture to the Plant World, que procurou analisar o conhe- cimento tradicional desta população indígena das Filipinas por meio da semântica (NAKASHIMA; ROUÉ, 2002, p. 3). Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR 43 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... De acordo com Moran (1990, p. 70) e Schmidt (2001, p. 75), estes estudos promoveram um novo padrão de aná- lise científica, baseado no levantamento do conhecimento humano sobre o ambiente natural, chamado de etnociência10, para a qual, segundo Roué: [...] fundamental é explicar, com uma visão externa, as categorias semânticas, os conhecimentos e a visão do mundo indígena, no âmbito de uma dada sociedade e, por conseguinte, de uma certa organização social, a única que permite compreender, com uma visão interna, como natureza e cultura se articulam (ROUÉ, 2000, p. 70). A etnociência exige a articulação entre o natural e o social, utilizando como metodologia a investigação das no- menclaturas designadas pelas populações tradicionais para os elementos e fenômenos naturais, assim como os valores culturais que transportam. Posey (1987, p. 15) indica que a partir desta percepção se desenvolve a hierarquização destes elementos e fenômenos, na tentativa da organização de um sistema taxonômico contemplado por categorias cognitivas, relacionadas à percepção da natureza por meio da cosmo- logia (influência mítica sobre a visão da natureza, recursos e fenômenos naturais), dos conhecimentos (dinâmicas, relações e utilidades dos recursos naturais transmitidos por meio da tradição) e das práticas (a práxis entre o conhe- cimento e sua utilização como garantia da sobrevivência). O autor enfatiza que a etnociência envolve um volumoso intercâmbio entre culturas distintas e que a análise dos dados coletados carece de uma perspicácia capaz de envolver as limitações que os conhecimentos tradicionais carregam. A interação das populações tradicionais com o exten- so ambiente natural pelo qual se reproduzem culturalmente reflete na necessidade de estudos que priorizem determi- nadas especialidades, o que, consequentemente, ramifica a etnociência de acordo com o objeto de pesquisa, originando diversos campos – como a etnobotânica, etnofarmacologia, etnoecologia, entre outras11. Os estudos que a etnociência desenvolve proporcio- nam o levantamento de conhecimentos sobre a natureza, acumulados no decorrer de longas gerações e raramente registrados por meios escritos, mas que mesmo assim mui- tas vezes ultrapassam os conhecimentos alcançados pelas sofisticadas metodologias da ciência ocidental. Diante do panorama ambiental decorrente das ações da sociedade humana que segue o modelo econômico capitalista e da ausência de alternativas eficazes para a proteção da natu- reza, a valorização dos conhecimentos tradicionais surge como uma alternativa capaz de auxiliar na conservação de áreas naturais remanescentes. Porém, para que isto aconteça, faz-se necessário que estes conhecimentos sejam compreendidos e analisados como uma probabilidade para a conservação da natureza, o que determina uma nova especificidade para a área da etnociência, designada por etnoconservação, difundida recentemente e por isso ainda em processo de definição econsolidação de alguns dos seus aspectos. Conhecimentos tradicionais e conservação da natureza: etnoconservação Ao articular as características das populações tra- dicionais e a produção dos seus conhecimentos, tornam- -se perceptíveis a relação de dependência entre ambos e a dependência dos mesmos com os recursos naturais. A partir de 1990, as questões ambientais contemporâneas influenciaram o desenvolvimento da análise dessa relação por meio de uma perspectiva mais abrangente, gerando a possibilidade da associação entre a conservação de alguns recursos naturais com os conhecimentos e práticas dessas populações (BERKES, 1999, p. 17). A constatação dessa possibilidade surge de uma análise do sistema econômico capitalista, difundido na maioria dos países do mundo e que, além de gerar diversas desigualdades sociais, resulta em fatores como a pobreza para grande parte da população e passou a ser considerado como um dos responsáveis pela crise ecológica sem pre- cedentes que vem sendo fortalecida desde o final do século XIX (MARTÍNEZ-ALIER, 2007, p. 9). A crise ecológica está relacionada com a escassez e a finidade de grande parte dos recursos naturais e consequente ameaça à sobrevivência da espécie humana que, apesar de aparente evidência e 10 Roué (2000, p. 71) discorre sobre a diferença entre a etnociência e a etnologia: “Em etnobiologia ou etnociências, eles reconhecem efetivamente ‘etnos’, o povo, e ‘biologia’ ou ‘ciências’. Mas os pesquisadores fazem mais ou menos biologia ou ciências em meio a um povo. Já os etnólogos interessam-se pelo que Lévi-Strauss denominou de ‘o pensamento selvagem’ ou a ‘ciência do concreto’, isto é, para exemplificar, a ciência de um povo”. 11 A Suma Etnológica Brasileira (1987), dividida em sete volumes, traz alguns trabalhos desenvolvidos pela etnociência, de diferentes especialidades e autores. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR44 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... diversas confirmações científicas, tem sua existência negada por parte de muitas autoridades: A natureza se converteu em um problema ético; tão degradada está por ações humanas que nossa relação com ela transformou-se em questão decisiva, que afeta as condições de vida social e a possibilidade de sobrevivência futura da espécie e clama por uma nova ética de responsabilidade, informada por um saber que ilumine as consequências deliberadas da ação humana (DUPAS, 2008, p. 23). Martínez-Alier (2007, p. 41) afirma que a expansão econômica e a conservação do meio ambiente se enfrentam constantemente e propõe que analisar a crise ambiental a partir da perspectiva econômica conduz à tentativa de compreender a relação entre a sociedade capitalista e os recursos naturais. Leff (2001) corrobora com Martínez- -Alier ao considerar que: A problemática ecológica questiona os custos socio- ambientais derivados de uma racionalidade produtiva fundada no cálculo econômico, na eficácia dos sistemas de controle e previsão, na uniformização dos comporta- mentos sociais e na eficiência de seus meios tecnológicos (LEFF, 2001, p. 133). Neste sentido, Dupas (2008, p. 45) coloca algumas ponderações acerca do modelo econômico vigente e seus impactos sobre a natureza, juntamente com as amplas consequências destes sobre os seres humanos. De acordo com o autor, o conceito de “progresso”, sustentado pela lógica de produção e tecnologia, está intimamente ligado com esses impactos e suas consequências, sendo que visa ao lucro privado e não prioriza os interesses e necessidades da população em geral e nem a correta manutenção dos recursos naturais. Como o meio ambiente não pode mais sustentar este modelo predatório, faz-se necessária a busca por soluções mais concretas, capazes de direcionar o sistema para práticas sustentáveis: A crise ambiental gerou novas orientações para o pro- cesso de desenvolvimento e novas demandas para os movimentos sociais (ecologismo/ambientalismo). Seus objetivos mostram a necessidade de incorporar uma “dimensão ambiental” no campo do planejamento eco- nômico, científico, tecnológico e educativo, induzindo novos valores no comportamento dos agentes sociais [...] (LEFF, 2001, p. 100). Inseridas nesta procura por soluções que conciliem a sociedade humana e os recursos naturais estão as verten- tes dos movimentos ambientalistas, que se diferem pelas perspectivas particulares sobre as relações existentes entre os seres humanos e a natureza, sendo designadas como ecologia profunda, ecoeficiência e ecologia social (DUPAS, 2008, p. 24). Na ecologia profunda estão aqueles que defendem a natureza intocada e a sacralidade da mesma, na tentativa de preservar o que resta de ambientes naturais livres da interferência humana, preocupados com o crescimento de- mográfico e desfavoráveis ao crescimento econômico, fun- damentados cientificamente pela biologia conservacionista (DIEGUES, 2008, p. 32; MARTÍNEZ-ALIER, 2007, p. 23). A outra corrente ambientalista, a ecoeficiência (tam- bém denominada por Martínez-Alier como “evangelho da ecoeficiência”), caracteriza-se por tentar estabelecer uma relação compatível entre os recursos naturais e o sistema econômico capitalista, enfatizando o manejo sustentável desses recursos através de teorias desenvolvidas pela eco- logia industrial e pela economia ecológica. Inseridos nesta vertente, os economistas ecológicos vêm se firmando desde a década de 1980, buscando associar o sistema econômico predominante com o meio ambiente, ou seja, a relação entre produção de bens de consumo e a demanda de recursos naturais para tal, por meio de análises e soluções capazes de beneficiar os dois lados, ainda que isso não aconteça na mesma proporção (DUPAS, 2008, p. 56), uma vez que a proteção do meio ambiente ainda é considerada como um custo a ser agregado no processo produtivo. E por último, difundida mais recentemente, a ecologia social – ou “ecologismo dos pobres” – está diretamente conectada com o conceito de justiça ambiental e as relações existentes entre as populações dos países em desenvolvi- mento com o manejo e a preservação dos recursos naturais. Esta corrente ambientalista foi originada em consequência dos conflitos ambientais (em níveis local, regional, nacio- nal e global) gerados pelo crescimento econômico e pela desigualdade social (MARTÍNEZ-ALIER, 2007, p. 38). Apesar de essas correntes apresentarem pontos di- vergentes em suas concepções de natureza e mecanismos para a proteção da mesma, é possível afirmar que existe certa concordância em relação ao objetivo principal de Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR 45 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... suas ações, ou seja, todas pretendem proteger a natureza de ações humanas destrutivas. No entanto, Arruda (1999, p. 85) afirma que os mecanismos de proteção da natureza que as duas primeiras correntes difundiram não se mostraram eficientes no cumprimento dos seus objetivos, de modo que a ecologia social trouxe novas reflexões na tentativa de preencher as lacunas que estabeleceram uma dicotomia entre homem e natureza. Influenciada por alguns dos pressupostos da ecologia social e posicionando-se contrária à ecologia profunda, a etnoconservação da natureza direciona seu foco para as questões relacionadas às áreas naturais protegidas e às populações tradicionais, de modo que possibilita a inserção de uma nova perspectiva, sensível à percepção de que o manejo sustentado dos recursos naturais desenvolvidos por essas populações contribui para a conservação dos mesmos (ARRUDA; DIEGUES, 2001, p. 30; DIEGUES, 2000, p. 40). Acrescenta-se também a intensa ligação que a etnocon-servação apresenta com os conhecimentos da etnobiologia e etnobotânica, pois a relação sustentável que as populações tradicionais mantêm com o meio no qual estão inseridas depende do amplo conhecimento que possuem acerca dos diversos elementos naturais com os quais constantemente interagem (ELLEN, 1997, s/p.)12. Entretanto, como os estudos da pesquisa científica moderna se baseiam em análises fragmentadas, a etnocon- servação encontra diversas barreiras para sua difusão no meio acadêmico e nos vários segmentos que este influencia. Romper com os padrões clássicos dessa ciência reducio- nista não é tarefa fácil, pois nossas próprias instituições de pesquisa e ensino são, em geral, unidisciplinares, discriminadoras dos saberes tradicionais, marcadas por “correias de transmissão” que nos ligam aos grandes centros, dentro e fora do país, onde são gerados modelos científicos reducionistas que, transformados em práticas (ou ideologias), levam a uma conservação hegemônica, autoritária e pouco eficaz (DIEGUES, 2008, p. 184). A busca por esta ruptura foi iniciada pela etnociência e, no caso específico da etnoconservação, proporcionada por percepções geradas a partir da etnobotânica em um estudo de Balick e Cox, Plants, People and Culture, desen- volvido em 1952, sobre os usos de plantas por populações indígenas e tradicionais: “Uma nova e muito importante ramificação da etnobotânica pode ser denominada como ‘etnoconservação biológica’ – a incorporação do modelo de conservação indígena no manejo de áreas naturais”13 (BALICK; COX, 1996, p. 199, tradução da autora). Estas constatações permitiram a constituição da etnoconservação a partir da associação da conservação da natureza in situ com os conhecimentos tradicionais e o manejo dos recursos naturais que estes proporcionam, posicionando-se como uma alternativa para a conservação de áreas naturais: [...] baseada, entre outros pontos, na importância das comunidades tradicionais indígenas e não indígenas na conservação das matas e outros ecossistemas presentes nos territórios em que habitam. A valorização do co- nhecimento e das práticas de manejo dessas populações deveria constituir uma das pilastras de um novo conser- vacionismo nos países do Sul. Para tanto, deve ser criada uma nova aliança entre os cientistas e os construtores e portadores do conhecimento local, partindo de que os dois conhecimentos – o científico e o local – são igual- mente importantes (DIEGUES, 2000, p. 42). Berkes e Folke (1998, p. 3) afirmam que, ao levantar informações dos aspectos culturais e biológicos, compo- nentes do entorno das populações tradicionais, os estudos desenvolvidos pela etnoconservação procuram analisar como determinado grupo social utiliza o conhecimento tradicional dos recursos naturais locais para o desenvolvi- mento das práticas de manejo sobre os mesmos e quais os mecanismos sociais presentes em todo o processo. É importante ressaltar que a existência do manejo sustentável dos recursos naturais, proporcionada por meio dos conhecimentos tradicionais destas populações, não está vinculada a uma visão romântica da realidade (TOLEDO, 2001, p. 461). A idealização de que a relação das populações tradicionais com a natureza é harmoniosa e equitativa está vinculada ao mito do “bom selvagem” (DIEGUES, 2008, 12 A etnoconservação, assim como outras ramificações da etnociência, foi difundida principalmente por antropólogos e biólogos, que procuraram articular os conhecimentos gerados por estas duas áreas da ciência a fim de compreender as relações existentes entre homem e natureza com maior consistência teórica. Entre estes pesquisadores, podem-se citar, entre outros, Willian Balée (antropólogo), Michael Balick (biólogo), Darrel Posey (antropólogo e biólogo), Antonio Carlos Diegues (antropólogo). 13 “A new and very important branch of ethnobotany might be termed ‘ethno conservation biology’ – the incorporation of indigenous conservation models into wildlands management”. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR46 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... p. 99; HOROWITZ, 1998, p. 372), também denominado por Almeida e Cunha (1999, p. 1) como “mito do ecologi- camente bom selvagem”. Contudo, apesar da relação entre população tradi- cional e natureza não se radicar nesta visão romântica do “bom selvagem”, ela também não pode ser colocada no outro extremo, como um agente determinante na destruição de áreas naturais, pois a contextualização entre população tradicional e natureza remete à necessidade de uma reflexão acerca da coexistência de ambas e os efeitos gerados, o que recentemente tem se transformado em objeto de estudos de várias pesquisas. Toledo (2001) expõe alguns dados que procuram articular a presença de populações tradicionais em áreas naturais protegidas, acrescendo informações sobre a existência de espécies endêmicas nas regiões apontadas e o elevado nível da diversidade biológica14. Por meio desses dados, o autor consegue indicar a coexistência desses elementos como benéfica para a natureza, visto que o manejo dos recursos naturais desenvolvidos pelas populações tradicionais e proporcionado pela acumulação dos conhecimentos transmitidos ao longo do tempo entre as gerações contribui para o fortalecimento e aumento da biodiversidade. Colchester (1995, p. 27) também afirma que “existem poderosas razões para acreditar que muitos sistemas indígenas de emprego dos recursos são relativa- mente benignos”15. Deve-se considerar ainda que, embora tais práticas proporcionem a conservação dos recursos naturais, o con- servacionismo, fortemente difundido na sociedade urbana, não está presente nas concepções intrínsecas às populações tradicionais (GADGIL et al., 1993, p. 154), sendo que uma interpretação generalizada das relações entre populações tradicionais e natureza pode ocasionar percepções equivo- cadas acerca da maneira como tal relação procede e insere a ideologia conservacionista na percepção “êmica”16 das populações: Pode-se ter práticas culturais conservacionistas sem uma ideologia conservacionista. Neste caso, temos populações que, sem ter uma ideologia explicitamente conservacionista e que, não obstante, seguem regras culturais para o uso dos seus recursos naturais de maneira sustentável (ALMEIDA; CUNHA, 1999, p. 1). O que existe, porém, é a noção de que homem e natureza não são independentes, visto que o vínculo entre eles constitui uma relação simbiótica, na qual ambos de- sempenham funções para a manutenção do meio, sendo as ações humanas desenvolvidas neste contexto permeadas por diversos valores e regras, próprios da cultura pela qual são difundidos (DIEGUES, 2008, p. 63; ELLEN, 1997, s/p.). Inseridos nesta perspectiva, os estudos da etnocon- servação se direcionam para a classificação dos elementos naturais segundo os mitos, valores e visões de mundo das populações tradicionais. Ao cogitar este sistema de classi- ficação por meio da abordagem cognoscitiva, procura-se a compreensão do modo como estes elementos culturais influenciam ou até mesmo determinam o manejo dos re- cursos naturais, ao mesmo tempo em que proporcionam a conservação dos mesmos: O livro Global Biodiversity Assessment reconhece que, “onde populações indígenas mantêm dependência com o meio ambiente local para a provisão dos recursos por longos períodos, eles têm frequentemente desenvol- vido um interesse na conservação da biodiversidade” (HEYWOOD, 1995, p. 1017). Baseando-se em Gadgil et. al. (1993), o volume inclui exemplos de práticas tra- dicionais que conservam a biodiversidade: manutenção de áreas sagradas e outros refúgios ecológicos; proteção de determinadas espécies através de tabus e outros me- canismos; protegendo estágios críticosde vida; e usando a sabedoria local para conduzir o emprego do meio ambiente17 (BERKES, 1999, p. 32, tradução da autora). 14 De acordo com o Artigo 2.º da Convenção sobre a Diversidade Biológica, diversidade biológica “significa a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistema” (MMA, 2000, p. 9). 15 “Existen poderosas razones para creer que muchos sistemas indígenas de empleo de los recursos son relativamente benignos”. 16 Segundo Ribeiro (1987, p. 11), “êmico” refere-se às percepções e expressões próprias das populações tradicionais perante seus conhecimentos. O pesquisador, ao observar essas percepções e expressões, desenvolve uma análise “ética” das mesmas a partir de suas próprias percepções. 17 “The book Global Biodiversity Assessment recognizes that ‘where indigenous people have depended on local environments for the provision of resources over long periods of time, they have often developed a stake in conserving biodiversity’ (HEYWOOD, 1995, p. 1017). Borrowing from Gadgil et. al. (1993), the volume includes examples of traditional practices that conserve biodiversity: maintaining sacred areas and other ecological refuge; protecting selected species through taboos and others social mechanisms; protecting critical life history stages; and using the guidance of local experts as environmental stewards”. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR 47 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... A função normativa que determinados elementos culturais apresentam no manejo dos recursos naturais tem relação com o sucesso da adaptação das populações tradicio- nais em seus territórios, pois se percebe que a constituição física e biológica dessas áreas é determinada pelo modo de vida propagado. Toledo (2001, p. 455) afirma que, devido à sua inserção em áreas naturais, as populações tradicionais procuram adaptar o meio às suas necessidades, ao mesmo tempo em que se adaptam às condições oferecidas. O sucesso da adaptação humana em meio ambiente florestal depende das suas habilidades para manter as relações terra-população a um nível que permitirá ex- trações sustentáveis, que depende da sua capacidade de organizar e aplicar o conhecimento sobre a estrutura e composição da floresta18 (ELLEN, 1997, s/p., tradução da autora). As ações que modificam o ambiente natural habitado procuram favorecer a disseminação de algumas espécies da fauna, em detrimento de outras, de acordo com a utilidade que apresentam na dieta alimentar, por exemplo. Ou ainda pode-se citar o sistema itinerante de agricultura, que utiliza a queima e a diversidade de cultivos, originando mosaicos florestais, os quais podem ser considerados colaboradores ativos para o aumento do nível da diversidade biológica local. Cabe ressaltar que ações como estas são permeadas pelos conhecimentos tradicionais acumulados sobre o meio, que permitem que a resiliência19 necessária para a continui- dade do equilíbrio local não seja interrompida. Sob múltiplas estratégias de uso, produtores indígenas manipulam as paisagens naturais de maneira que duas características principais são mantidas e favorecidas: habitat e heterogeneidade, variação biológica e genética. […] Este mosaico representa o campo no qual os produ- tores indígenas, bem como suas múltiplas estratégias de uso, atuam no jogo da subsistência através da manipula- ção de componentes e processos ecológicos (incluindo sucessão florestal, ciclos de vida e movimento de ma- teriais)20 (TOLEDO, 2001, p. 460, tradução da autora). Diante da constatação do intenso manejo que as populações tradicionais desempenham nos lugares em que estão presentes, recusa-se a possibilidade da existência de áreas naturais intactas, pois se percebe que tais áreas são produtos de ações desenvolvidas por estas populações durante longos períodos (COLCHESTER, 1995, p. 13), o que remete a estudos que seguem a mesma linha daquele desenvolvido por Toledo (2001), já citado anteriormente neste trabalho. Simultaneamente, coloca-se a ideia de que o manejo dos recursos naturais, típico do modo de vida das popu- lações tradicionais, é permeado pela necessidade do uso racional desses recursos (ALMEIDA; CUNHA, 1999, p. 1), mas transcende a existência desta noção pelo simples existir, pois alcança a práxis, sendo uma das poucas práticas humanas atuais que consegue se caracterizar como sustentá- vel21. É possível considerar ainda que a necessidade do uso racional dos recursos naturais configura-se também como um requisito para a perpetuação das populações tradicionais nos ambientes nos quais estão inseridas, ao mesmo tempo em que a diversidade biológica das áreas nas quais estas populações estão presentes depende da continuidade do manejo tradicional dos recursos. Considerações finais A etnoconservação da natureza, mais que uma área do conhecimento cientifico, é uma possibilidade em potencial para a proteção dos recursos naturais, principalmente para os países em desenvolvimento. Enquanto ciência, os estudos no campo da etnocon- servação são capazes de levantar dados importantes que, além de propiciar conhecimentos científicos relevantes, 18 “The successful adaptation of humans to rainforest environments depends on their ability to maintain population-land ratios at a level which will permit sustainable extraction, which in turn depends on their capacity to organize and apply knowledge of rainforest structure and composition”. 19 Berkes e Folke definem resiliência como “capacity or the ability of a system to absorb perturbations; the magnitude of disturbance that can be absorbed before a system changes its structure by changing the variables and processes that control behavior” (1998, p. 6). 20 “Under the multiuse strategy, indigenous producers manipulate the natural landscape in such a way that two main characteristics are maintained and favored: habitat patchiness and heterogeneity, and biological as well as generic variation. […] This mosaic represents the field upon which indigenous producers, as multiuse strategists, play the game of subsistence through the manipulation of ecological components and processes (including forest succession, life cycles and movement of materials)”. 21 Neste trabalho, sustentável refere-se ao conceito de sustentabilidade utilizado por Sachs (2005, p. 286), o qual está baseado em Costanza e Patten (1995): “the basic idea of sustainability is quite straightforward: a sustainable system is one which survives or persists”. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010. Editora UFPR48 PEREIRA, B. E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade... auxiliam na proteção de áreas naturais. Os conhecimentos difundidos pelas populações tradicionais se referem ao meio no qual foram produzidos, no geral, ecossistemas tropicais com elevado grau de biodiversidade. Apesar das muitas pesquisas realizadas, estes ecossistemas ainda pos- suem muitos detalhes desconhecidos pela ciência ocidental moderna, mas que são contemplados pelo cotidiano das populações humanas que sobrevivem por meio da interação que desenvolveram com estes locais. Neste sentido, estes conhecimentos trazem importantes contribuições para a compreensão do funcionamento destes sistemas comple- xos e, por conseguinte, para melhorias na administração e proteção dessas áreas. É importante ressaltar as populações tradicionais como importantes agentes para a proteção de áreas naturais e a necessidade que existe em protegê-los, visto que apresentam um dos modos de vidahumana capaz de coexistir dentro de certo equilíbrio com a natureza. A articulação entre meio natural e social, propor- cionada pela etnociência, com enfoque na relação entre conhecimentos tradicionais e conservação dos recursos naturais, por meio de subsídios da etnoconservação, con- duz a uma reflexão sobre a ideia de natureza como uma construção cultural de algumas sociedades humanas que, ao desenvolverem esta noção como algo externo, longínquo, digno de observação e contemplação, não consideram que também são uma das partes desta “natureza” e que apresen- tam intensa dependência de todo o ciclo que é perpetuado constantemente. Referências ALLUT, A. G. O conhecimento dos especialistas e seu papel no desenho de novas políticas pesqueiras. In: DIEGUES, A. C. (Org.). Etnoconservação: novos rumos para a proteção da natureza nos trópicos. 2. ed. São Paulo: Hucitec e NUPAUB, p. 101-123, 2001. ALMEIDA, M.; CUNHA, M. C. Populações tradicionais e conservação. In: Programa Nacional da Diversidade Bioló- gica – Seminário de Consulta. 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