Buscar

DELUMEAU, J. A. - A Civilização do Renascimento

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 148 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 148 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 148 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

--
J
 
NOVA HISTORIA8
 
o 
~ 
~ 
'Ci Jean Delumeau 
o 
­
~ A CIVILIZAc;AO 
>-" 
o 
DO RENASCIMENTO 
Jean Delumeau considera 0 Renascimento enquanto "pro­ Volume I 
rnocao do Ocidente numa epoca em que a civilizacao da 
Europa ultrapassou , de modo decisivo , as civilizacoes que 
lhe eram paralel as' ' . Encarado numa perspectiva de "desa­ jO'l 
fio e resposta" , 0 Renascimento passa pela "cntica do pen­ o
 
sarnento clerical da ldade Media , pela recuperacao f­
demografica , pelos progressos tecnicos , pela aventura marf­ Z 
tima , por uma estetica nova , par urn cristianismo reelabo­ l1.J 
rado e rejuvenescido". 0 regresso a Antiguidade , "0 l 
aparente regre sso as fontes da beleza, do saber e da reli­
"'" Ugiao foi apenas urn meio de progredir" . Nesta obra em dois rJJ 
volume s encontrarnos a origem dos movimentos e das pro­ ~ 
fundas aspiracoes do nosso tempo. 
Bibliotecas Municipais de '1 
Almada~ Biblioteca Central II
- ......RgM;Uj W" EOOB01001227 ! 
ii i 
\
illlil //~ 11 ~'ll il !' !I~ IIII!!/!ll!llii/JIII ! I II II~ Illi1 IIII
 
"'---- ­
Z 
w 
~ 
o 
c 
c 
I~ 
iJ 
'if 
, 
" 
ISBN 972-33-1000-7 
IIII 1111 
9 " 789723 310.009 
Sa:.=....
 
~,...
 
z 
.
.
.
.
 
~
 
=
 
z 
J 
-
~
 
-
-
=
-
-
,
-
-
,
.
-
.
-
-
-
-
-
-
-
-
­
-
-
-
.
.
.
.
.
-4 
~
 
ro 
Q) 
S
 
~
 
Q) 
O
 
~
 
ro 
Q) 
~
 
0 
o~
 
~<
 ~
 
~
~
<1--4
N
U
1--400
 
=
<
>
Z
 
1--4~
 
U
~
 
<0
 
Q 
-zr 
-
-
.0
 
:::r
.
.,.... 
;! 
~
 
:Ii 
(],) 
S ::i
.
.
­
i! 
e
n
 
"
"
'YoI 
01 
.
.
.
.
 
~
 
:s 
a
:: 
~
 
C
I 
t­i5i 
&a.I 
L 
.
-
.
.
.
.;
,<1 .J" <;» ..:r­'J­
-
-
-
­
-
.
-=
-::
..... 
-
-
~
-
-
~
-
~
 
FICHA TECNICA 
Titulo original: La Civilisation de La Renaissance 
Traducao: Manuel Ruas 
Capa: Jose Antunes 
Ilustracao da capa:	 as Embaixadores (1533), de Hans Holbein, 0 Moco. 
National Gallery, Londres 
Impressao e Acabamento: Rolo & Filhos - Artes Graficas, Lda. 
Deposito Legal n? 80745/94 
ISBN 972-33-1000-7 
Copyright: © B. Arthaud, Paris, 1964
 
© Editorial Estampa, Lda., Lisboa, 1983
 
para a lingua portuguesa.
 
INDICE
 
Volume I
i
. 
J 
f
, 
Agradecimentos	 13
 
Prefacio , .	 15
 
lntroduciio 
A PROMO(:AO	 DO OCIDENTE 
- 0 termo «Renascimento»: uma etiqueta c6moda ... ... ... 19
 
- 0 dinamismo da civilizacao ocidental .. . ... .. . '" . .. .. . 20
 
- 0 melhor e 0 pior .,. ... .., ... ...... . .. '" ... ... ... ... 21
 
-- Relnterpretacao do Renascimento por uma exploracao em
 
profundidade .. . . . . . .. ... ... ... ... . .. . .. .. . ... . .. ... ... 22
 
Primeira Parte 
LINHAS DE FOR~A 
Cap. I - A explosiio da nebulosa crista ... '" ...	 27
 
- Panorama politico da Europa cerca de 1320 . 27
 
- Panorama politico da Europa cerca de 1620 .. 31
 
- Supressao do ideal de uma Cristandade .. . . .. 37
 
- Nascimento das consciencias nacionais ... . .. 42
 
Cap. 11- A Asia, a America e a conluntura europela '" 49
 
- Mundos ex6ticos atraentes e temiveis ... . .. 49
 
- As causas das viagens de Descobrimentos . 53
 
- As etapas dos Descobrimentos ... ... . .. 61
 
- A implantacao iberica na America '" ... ... ... '" 67
 
- Conjuntura econ6mica e producao de metais preciosos ... . .. 72
 
- Coniuntura e movimento demografico na Europa nos se­
culos XIV e XV; a tese «catastroflcas ...... '" '" ... '" 78
 
- Crftica da tese «catastrofica» 79
 
- 0 progresso ap6s 1450 ... 81
 
7
 
Cap. 111- Renascimento e Antiguidade .. 85	 Cap. VII- Um primeiro capitalismo '" 217 
- Urn desprezo injustificado da Idade Media 85 - A «commenda»	 217 
- Idade Media e Antiguidade ... ... ... ... 87 - Companhias com sucursais e companhias com filiais 218 
- A renovacao da arte gotica ap6s 0 seculo XIII ... 89 - A firma Medicis 220 
- Rostos e paisagens ... ... ... ... ... ... ... ... 92~ I - Homeas de neg6cios do seculo XVI: os Fugger '" 223 
- Urn melhor conhecimento dos textos antigos 95 I, - Homens de neg6cios do seculo XVI: os financeiros genoveses 227 
- Renascimento e arqueologia ... ... ... ... . .. 99 r, - Emprestimos reais e dlvida publica ... '" ... ... '" ... ... 228 
- A Antiguidade como fonte de inspiracao ... 102 - Dos «Merchant adventurers. a «Oost Indische Kompagnie» 231 
- Do omamentismo ao purismo ... ... ... ... . .. 106 \ - Estruturas capitalistas . ... ...... ... ... ... ... ... ... ... 232 
- Uma certa falta de respeito pela Antiguidade ... ... ... . 112 - Promocao do quantitativo .. . . . . . . . .. . . . . . .. . .. .. . . .. 236 
- Uma civilizacao nova ultrapassa a civilizacao dos Antigos .. 114 - A grande transferencia no Ocidente '" 239
-\
- Realizacoes do Renascimento no plano artfstico 117 
Cap. VIII - As cidades e 0 campo ... ... ... 247 
Cap. IV - 0 Renascimento como Reiorma da Igreia ... 121 
- A hist6ria rural e uma hist6ria im6vel? '" 247 
- 0 Grande Cisma e a epoca dos concilios 121 '\ - Abandonos e progressos 249 
- Os eabusos» na Igreja .,. ... ... ... . .. 124 - Plantas novas. As trocas botanicas e zoologicas entre a Eu­
- Reforma e «Contra-Reforma» ". .,. ... 126 'I ropa e a America . .. ... .. . . . . .. . . .. . .. .. . .. . . .. .. . .., 252 
- Reves da tolerancia . .. .. . . . . . .. .. . .. . . .. ... .. . 131 - Os rendimentos no Ocidente ... ... ... ... '" ... 253 
- Os «abusos»: explicacao insuficiente da Reforma 134 - 0 desenvolvimento demografico nas cidades .. 255 
- Subida e afirmacao da piedade popular .. . .. . 136 "I - 0 urbanismo: a «commoditas» '" 258 
- A nova importancia dos leigos na Igreja ... . .. 138 - 0 urbanismo: a «voluptas» ... ... '" 261 
- 0 individualismo religioso . . . .. . .. . .. . .. . .. . 141 I' - Paisagens urbanas do seculo XVI: 0 exemplo romano '" 266 
- 0 sentimento de culpa ... ... ... ... ... ... . .. 143 (I - Castelos e jardins '" ... .. . . .. .. . .. . . . . . . . . .. ... 269 
- 0 crescimento das capitais ... .. . . .. . .. . .. . .. .. . 272 
Ii
..
Segunda Parte	 , Cap. IX - Mobilidade social. Ricos e pobres 277 
I 
. IA VIDA MATERIAL	 - Mobilidade horizontal 277 
- Mobilidade vertical .. . . . . . . . . .. . .. .. . .. . .. . . .. 279ICap. V - 0 progresso tecnico ... ... ... 151 
- Alargamento do fosso entre ricos e pobres 282I 
- 0 mundo dos ricos e 0 mundo dos pobres 285 
- Uma civilizacao mais tecnica ...	 lSI 
, I 
- 0 vestuario dos ricos e 0 vestuario dos pobres '" '" 288 
- Os «engenheiros do Renascimento»	 154 
- A mesa dos ricos e a mesa dos pobres ... ... ... ... 290 
- Leonardo, tecnico . 159
 
- Algumas realizacoes espectaculares do Renascimento 161
 
- Os transportes terrestres . . . ., . . .. 163
 
-Navios e navegacao ...... '" ...... 166
 
- Progresso no trabalho dos texteis 172
 
- Os relogios ... ... ... . . 174
 
- Minas e metalurgia . .. 176 I
 
- A artilharia ... ... . .. 181 I
 
- As armas portateis ... . ..	 185 I 
- A fortificacao guarnecida de bastiOes 187 
- Nascimento e progresso da imprensa 190 I 
,
-A gravura . 193
 
- 0 trabalho no vidro . .. 194
 
- Arte e tecnica ... 197
 
Cap. VI - A tecnica dos negOcios ...	 199 
- 0 conservantismo das corporacoes 199 
- 0 seguro marftimo ... ... '" 202 
- A contabilidade e os bancos 204 
- A letra de cambio ... 207 Jl 
- Cambios e especulacao ... 209 
11 
8 
'111
i>
 
•
 
AGRADECIMENTOS
 
r
 
Este livro, obra imperieita, mais imperjeito seria sem os conselhos 
de amigos a quem desejo aqui agradecer. Em primeiro lugar a Jacques 
Le Gof], autor do notcfvel volume que antecede este ('). A nossa amizade, 
que e jd de um quarto de seculo, permitiu-me beneliciar do contributeda sua vasta cultura, do seu conhecimento do Leste europeu e da sua 
biblioteca. Em Rennes, os meus colegas historiadores Jean Meyer e Andre 
Mussat, bem como 0 sr. Rousseau, director da Biblioteca Municipal, res­
ponderam com competencia e gentileza as muitas perguntas que lhes 
liz. Quero manijestar-lhes a minha gratidiio. Hd ainda 0 [acto, recon­
[ortante para um autor, de eu ter entrado em contacto com uma pessoa 
tiio solicita como 0 director literdrio das «£ditions B. Arthaud», Sylvain 
Contou. As nossas longas converses sobre 0 Renascimento e sobre os 
problemas que este livro levantava [izeram-me descobrir nele um amigcfvel 
interlocutor, com quem simpatizei desde 0 primeiro momento. Sorridente 
e eficaz, Dominique Raoul-Duval reuniu os variados elementos que eu 
lhe ia entregando - texto, imagens, mapas, indice documental, cronolo­
gia-, equilibrou-os, completou-os com rara competencia e adaptou-os 
uns aos outros de modo a [ormar um todo homogeneo. Quanto d lcono­
grafia, realizada por Josette Champinot e Ana Pacheco, mostra, bem 
melhor que as minhas palavras, a cultura e 0 senso artistico de quem 
nos proporcionou as belas imagens deste livro. 
o Autor 
{'} A CivilitC/fao do Ocidente Medieval, publicado nesta cole~lio. (N. do E.) 
13 
PREFACIO
 
r:
 
Esta Civiliza~iio do Renascimento, que [icamos a dever a Jean Delu­
meau, vem agora inserir-se entre os dois volumes que Jacques Le Goff 
e Pierre Chaunu jci publicaram nesta colecciio, dedicados, respectivamente, 
d Idade Media e d Europa Classica. Embora, nos aspectos gerais, esteiam 
todos em conformidade com a estrutura escolhida para a totalidade da 
serie «Grandes CivilizafOeS» (''), estrutura que corresponde aos desejos e 
necessidades do leitor e the permite sentir-se numa paisagem que the e 
jci familiar, cada um destes livros tem a sua face peculiar. De facto, slio 
produto da rejlexiio de historiadores com temperamentos bem diferentes. 
Sempre abarcando os assuntos em toda a sua amplidiio, cada um deles 
iluminou 0 seu de modo original e pessoal. Isso corresponde perfeitamente 
ao proprio espirito desta colecciio. Era nosso proposito que a clareza da 
exposiciio e a riqueza dos injormes niio excluissem nem sequer ocultassem 
a originalidade das opinioes. As pesquisas recentemente realizadas vieram 
abrir novas perspectivas que mostram a uma luz por vezes imprevista 
os problemas ainda niio resolvidos. Niio era iusto que se pudesse deplorar 
a sua ausencia nestes trabalhos. 
Devido aos seus anteriores estudos, que tinham incidido sobre a vida 
economtca e social da Roma do seculo XVI, J. Delumeau estava espe­
cialmente habilitado a renovar um assunto que jci [oi centro de tantos 
ensaios e de tantas sinteses. 0 plano que ele adoptou para tratar esse 
vasto movimento de civilizafiio coberto pelo termo Renascimento e de 
uma nitidez e de uma clareza verdadeiramente classicas. 0 triptico da 
Historia, das realidades da vida de todos os dias e da mentalidade e 
aspirafOes novas permitiu-lhe ordenar harmoniosamente os conhecimentos 
e as reflexbes que colheu no seu passado de erudito. 0 que na sua expo­
(1) Coleccao das Editions B. Artaud, a que pertence esta obra. (N. do T.j 
15 ~
 j' 
sir;iio impressiona e, sem duvida, a escrupulosa prudencia que transparece 
ao longo de todos os capitulos e de todas as pdginas. Dar iuizos de 
conjunto sabre situ~oes muito complexas e que, em tal ou tal aspecto, 
ainda siio imperjeitamente conhecidas parece-lhe perigoso e, muitas vezes, 
temerdrio e ele sente necessidade de matizar a apreci~iio para que ela niio 
va alem dos limites impostos pelo presente estado das iniormacoes dis­
ponlveis e pela complexidade dos [actos. Logo Ii partida, 0 proprio termo 
Renascimento, que devemos ao humanismo italiano, parece-lhe insu­
/iciente e quase inlusto. Renascimento pressupl'Je, pelo menos, um tor­
por, um sono previa. Ora e ilusorio buscar uma nltida ruptura na trama 
continua dos tempos. Portanto, 0 valor extensivo do termo sera limitado 
d ideia, justa e precisa, da promociio do Ocidente e do avanr;o que este 
rapidamente tomou sobre as civilizar;i5es paralelas. 
Dd satisf~iio que J. Delumeau tenha acentuado como convinha as 
ligar;i5es com 0 passado sem ignorar 0 valor da renovaciio. Assim se pode 
medir melhor a importdncia do progresso material e tecnico do seculo XVI 
europeu e se aprecia com maior iusteza 0 impeto surpreendente das 
naveg~Oes e a multlplicidade das grandes descobertas planetarias que 
alargaram, quase brutolmente, 0 limitado horizonte dos seus con­
tempordneos, 0 aparecimento da imprensa, que veio, no momenta exacto, 
dar resposta a um profundo apelo da curiosidade humana, 0 progresso, 
enlim, da civllizaciio urbana com 0 desenvolvimento de tecnicas destina­
das a um grande futuro, como a da banca. Esta rejlexiio, salda da boca 
de um observador espantado, «a arte da guerra e agora tal que e preciso 
aprende-Ia de novo de dois em dois anos», tem um sabor terrivelmente 
moderno. De facto, nessa epoca, 0 aperfeir;oamento do armamento obri­
gava a constantes modificar;oes da tdetica e da estrategia e os rapidos 
progressos da utiliz~iio do canhiio forr;aram a invenr;iio de novas e efi­
cazes formas de amuralhamentos e fortific~Oes. 
Talvez seja, precisamente, esta nor;iio de modernismo que. no fim 
do estudo, aparer;a com maior evidencia e com mais viva claridade. 
o Renascimento, ligado por numerosas fibras aos seculos anteriores, mos­
tra, porem, na figura dos seus homens e das suas obras, trar;os e cores 
que preludiam de forma espantosa os caracteres do nosso tempo. Sem 
dUvida que se niio deve procurar alhures a origem dos movimentos e das 
profundas aspir~oes do nosso tempo. Promor;iio do indivlduo, da pessoa, 
reabilit~iio da mulher, reforma da edue~iio - que se pretende que 
seja uma verdadeira form~iio do homem e id niio uma inutil sobrecarga 
do esplrito, esmagado por um fardo de conhecimentos -, revaloriz~iio 
do corpo e da educar;iio fisica, reflexiio pessoal e livre sobre 0 homem, 
a sua natureza e a sua religiiio, Impeto entusidstico, enfim, para as con­
quistas literarias e tecnicas e gosto apaixonado da g16ria que faz reviver 
as mais belas tendencias da Grecia e de Roma, pois niio e verdade que 
tudo isso, que pertence verdadeiramente ao seculo XVI europeu, nos 
surge ao mesmo tempo como as:runto nossa? 
16 
,­
(
 
j
 
(j 
{
 
\ 
, 
.. 
~
 
,
 
/>
 
o movimento humanista e 0 regresso ao antigo niio devem ter para 
nos uma ressondncia apenas artistica e literaria. No [undo, e toda uma 
nova [ilosojia da vida que se elabora e se define. Os Antigos servem, 
neste aspecto, de modelos e de inspiradores e a ligar;iio com eles e muito 
projundamente sentida. Mas aquila que [undamenta de novo modo a 
valorizaciio do corpo humano e pl:Opoe como objectivo supremo da vida 
um equilibrio harmonioso entre 0 desenvolvimento da alma e 0 desen­
volvimento do corpo e uma rejlexiio viva e pessoal. A pedagogic de 
Rabelais, e depots a de Montaigne, prenunciando a de Rousseau, mode­
lam-se na natureza humana e dejinem com clareza 0 objectivo funda­
mental de toda a educaciio: niio mutilar 0 hom em, mas desenvolve-lo 
harmoniosamente na sua totalidade; e a educaciio [isica e os cuidados com 
o corpo tem de encontrar 0 lugar que merecem. 
Quanta Ii instruciio propriamente dita, os principios de um Montaigne 
siio validos hoje como 0 eram ha perto de quatro seculos; e 0 nosso ensino 
tenta, sem sempre 0 conseguir, conjormar-se a eles. Formar a capacidade 
de iutzo, evitar, antes do mais, sobrecarregar a memoria com um amdl­
gama de conhecimentos tantas vezes inuteis - eis as regras que todos 
aceitamos mas que ainda hoje e bem dijicil levar Ii pratica. E no entanto 
o ensino s6 desempenhara verdadeiramente 0 seu papel quando a crianr;a 
puder passar tudo pelo crivo da sua inteligencia sem «arrumar nada na 
cabecaapenas pela autoridade de quem lho diz». 
Hti muito quem hoje se sinta pouco Ii vontade na leitura de Mon­
taigne por causa do cardcter ainda arcaico do frances da epoca, desse 
frances que 0 ardor apaixonado dos poetas da PIeiade contribuiu para 
impor ao seu seculo. Mas e preciso ler e reler Montaigne, saborear a 
apetitosa frescura do seu estilo, 0 rebrilhar das suas palavras e das suas 
frases. E preciso observd-Io, como ele desejava e como nos convida a 
faze-Io, na sua «mane ira simples, natural e corrente, sem contenr;iio nem 
artificio». A sabedoria a que ele aspirava e que soube alcanr;ar e, real­
mente, aquela que convem Ii condir;iio do homem. Qual niio e 0 prazer 
que sentimos ao reler esta definir;iio de um ensino que tem de ensincir 
a pensar: «Quem vai atrds de outrem nada segue e nada encontra: nada 
procura mesmo. Non sumus sub rege, sibi quisque se vindicet (')>>? No 
dia em que todos os povos - mas estara proximo esse dia? - se confor­
marem a semelhante regra poderemos certamente falar tambem de um 
verdadeiro Renascimento. 
Raymond Bloch 
(') Niio dependernos de urn rei; Que cada urn seja senhor de si proprio. (N. do T.) 
17 
Gabriel
Realce
Gabriel
Realce
Gabriel
Realce
Gabriel
Realce
INTRODU~AO 
A PROMO<;AO DO OCIDENTE 
I 
i 
\ 
,I; 
.) 
A nossa compreensao do perfodo que vai de Filipe, 0 Belo a Henri. 
que IV ficaria muito facilitada se fossem suprimidos dos livros de His­
t6ria dois termos solidarios e solidariamente inexactos: «Idade Media» 
e «Ren~~~!!!lS8JB~:..J:om isso se..a~r!~_!?E,g.2!!!l.~9.'lil,l~_.P!~­
~o.nq~it~~. Ficar-se-ia, especialmegte•. )j.YXe_ q!l,ilieia-de...1eL. baYidQ...!!m 
corte bru~~Q=:que:::ieio. ...separaI:.,..u.ma..~.e,ee8'· de -~...de Jim petiQdo de 
treyM. 
Criada pelos humanistas italianos e retomada por Vasari, a nocao 
de uma ressurreicao das letras e das artes gracas ao reencontro com a 
Antiguidade foi, seguramente, fecunda como fecundos sao todos os mani­
festos lancados em todos os seculos por novas geracoes conquistadoras. 
Essa no~~p si&!ljfica j\lH,ntwje,..diWlW;§w'a.. v~Dtade dS reu~a£&>. Teve 
em si a inevitave! injustica das abruptas declaracoes de adolescentes, que 
rompem ou creem romper com os gostos e as categorias mentais 'dos 
seus antecessores. Mas 0 termo «Renascimento», mesmo na acepcao estrita 
dos humanistas, que 0 aplicavam, essencialmente, a literatura e as artes 
plasticas, parece-nos actualmente insuficiente. Parece rejeitar, como bar­
baras, as criacoes simultaneamente solidas e misteriosas da arte romanica 
e aqueloutras, mais esbeltas e dinamicas, da idade g6tica. Nao da conta 
nem de Dante, nem de Villon, nem da pintura flamenga do seculo XV. 
E, principalmente, ao ser alargado as dimensOes de uma civilizacao pela 
historiografia romantica, mostrou-se inadequado. Nao afirmou Burckhardt 
- que nao tinha em conta a economia -, ha ja urn seculo, que, no 
essencial, 0 Renascimento nao fora uma ressurreicao da Antiguidade? 
Ora, se dermos aos factos da economia e a tecnica 0 lugar que lhes cabe, 
o jufzo de Burckhardt ganha ainda mais verdade. Pois 0 regresso a Anti­
. gui~n.ada influiu~a....j!1~..daJmm:ens;l-ou-~-:relQiio- mecl.­
nico, nem no iperrei~6amel1to-da·at't1lhafla,....uem..JlQ.~!!!~!!<c.Yw:n.to.....da
 
. contahilidade por partjdas dgln'adas, nem no da _ktra..de ambie ..eu-das
 
~~s bancarias, Mas as palavras temmuita vida. Impoem-se-nos contra
 
Gabriel
Realce
Gabriel
Realce
a nossa pr6pria vontade. Com que haveriamos de substituir a palavra 
«Renascimento))? Com que outro vocabulo designariamos essa grande 
evolucao que levou os nossos antepassados a mais ciencia, mais conhe­
cimentos, maior dominio do mundo natural, maior amor pela beleza? 
Na falta de melhor, conservei, portanto, ao longo de todo este trabalho, 
a palavra consagTada pelo uso. Mas que fique entendido:esta palavra ja 
nao pode ter 0 sentido original. No ambito de uma Historia total, significa 
(e nao pode significar outra coisa) a pr~mor;iio do Ocident« numa~~llOca 
em que a civiliza~ao da Europa ufiropassou, de modo decisivo, as£!Y..iP­~qiirrFli'iram-parareras. No teiiipo" cfaspiiiildrasc:ri.lZadas:' atecnica ftUIa"d~'Arabese Chineses igualavam, e suplantavam ate, a tecnica
 
e a cultura dos Ocidentais. Em 1600 ja nao era assim. Propus-me, pois,
 
estudar 0 porque e 0 como da ascensao do Ocidente no momento em
 
que ele elaborou uma civilizacao de tal modo superior que, seguidamente,
 
se imp6s pouco a pouco a todo 0 mundo. 
*
 
Os diversos espacos atribuidos ao Renascimento slio tantos quantos 
os historiadores. Na minha optica, os J2!,.oblemas da periodiEl£ao - um 
dos pesadelos da historiografia ao debrucar-se sobre a epoca mtermedia 
que separou a idade feudal da era de Descartes - perdiam acuidade. Optei 
por .uffill hlSi6ria longa, sem tentar estabelecer cortes artificiais. Tudo 0 
que se mostrasse como elemento de progresso seria chamado a figurar 
numa vasta paisagem que se estende do fim do seculo XIll ate a aurora 
do seculo XVII e que vai da Bretanha "8," Mosc6V:ia':"'-Em-'contr-apartida, 
visto 'que "t,(j(Jli- a construcao hist6rica tern, necessariamente, rejeicoes e 
silencios, deixei de lado, as mais das vezes, os factores de estagnacao­
que indiscutivelmente pesaram Duma civilizaCao, apesar deles, rica de 
inovacOes. 0 quadro geral estava assim delineado e era evidente que 0 
Renascimento aqui proposto nao se revelaria especialmente artistico nem 
particularmente italiano. 0 acento t6nico !:5;~i~, n<:> d}Jlam~mo de .~Q!Ja 
a.Europa. A ciencia pict6rica "98 Van Eyell; e as miniaturas do rei Rene, 
a lnvencao do alto forno e a realizacao da caravela, as antecipacOes pro­
feticas de Nicolau de Cusa e 0 irenismo de Erasmo pareceram-me signifi­
car a promocao do Ocidente no mesmo pe que os estudos de perspectiva 
de Piero della Francesca e de Leonardo. E certo, no en~lQ.JlUe-.a..l!AAi.!l, perosseush~"maiiiStas._:ii.iQs":seus artistas, pelos seus homens de neg6­cio~~ios seusu~Q.&Cn~irQL~lcis seus '~.a~~!!i~.s; .!2tD!!fji.~.~­
guardll,O. principal..reSllOnsa.vcLpe1D..&flUl4e .l!.y~.europA. 
o historiador fica confundido perante 0 dinamismo que hi um 
milenio 0 Ocidente tem vindo a mostrar. Durante 0 perlodo abrangido 
pelo nosso estudo, nem 0 peso das estruturas e tknicas rurais nem 0 
conservantismo das corporacOes nem a esclerose das tradicOes escolasti­
cas conseguiram equilibrar as forcas de movimento, cuio poder se mani­
10 
festou sempre com nova energia. Porque essa energia? 0 legado da civi­
lizacao greco-romana, 0 contributo fecundante do cristianismo, 0 clima 
temperado, as terras ferteis - eis at outros tantos factores, sem duvida 
a juntar a muitos outros, que favoreceram os homens que se tinham 
concentrado no Oeste do continente euro-asiatico. Mas tambem nao fal­
taram as provacoes: umas naturais, como a Peste Negra; outras provo­
cadas pelo ioso das competicoes politicas, economicas e religiosas. Entre 
-:::> 1320 e 1450 abateu-se sobre a Europa uma co91uncao de desgra~Lpri­
'0i~oes, ep1dem1aS; guei'rl!~,gYm~AfO:-_~.m!al da mOrtaIfaaae;'dlininuiCao 
da producao de metais preciosos, avanco dos-'TiiICOS;desafios'essesque 
foraw vencittos com coragem e'·com genio:-A'hist6fia do Renascimento 
e a hist6ria desses desafios e dessas respostas. A crftica do pensameiill> 
clerical da Idade Media, a recuperacao demograflca~"osprogreSsos-i~cni­
cos;ii'l\vell.tura: maritima; \iiiia"e-sfehca nova, urn cristiaiiISiiio'reeIabolido 
.i"'rejiivenescldo":-'eli"'os'principais elementos da resposta do Ocidente as 
tao variadas dificuldades que no seu caminho se haviam acumulado. 
«:Qt:~!i.2...~--(t:~PQS~: pode-se aqui reconhecer a terminologia de A. Toyn­
bee, e eu penso que ela traduz admiravelmente 0 fen6meno do Renas­
cimento. Mas nao vou mais alem na esteira desse grande historiador 
Ingles, Vistas a uma certa distancia, a historia da Humanidadeem geral 
e, mais especialmente, a da humanidade ocidental parecem menos uma 
sucessao de crescimentos e de desagregacoes que uma marcha para diante, 
entrecortada, e certo, de paragens e regressoes; mas paragens e regressoes 
apenas provis6rias. E verdade que houve porcoes de humanidade local­
mente falhadas, mas a Humanidade, globalmente considerada, nunca 
deixou de progredir de seculo em seculo, e isso tambem nos perlodos de 
conjuntura desfavoravel, Assim, e sem negligenciar 0 estudo da conjun­
tura na epoca do Renascimento, insisti principalmente nas modificacoes 
das estruturas materiais e mentais que permitiriam a civilizacao europeia 
avancar, entre os seculos XIII e XVII, no caminho do seu extraordi­
nario destino. 
*
 
Identificar urn caminho nao implica acha-lo sempre belo, como nlio 
implica que nao haja outro possfvel. Como ao historiador compete com­
preender e nao julgar, nao procurei saber se 0 perlodo do Renascimento 
deveria ser preferido a «idade das catedraiss ou privilegiado em relacao 
ao «grande seculos. Para que essa estranha mas frequente distribuicao 
de premios? Por isso olio apresentei um Renascimento em que tudo fosse . 
exitos e beleza. Pelo contrario, a mais elementar obrigacao de lucidez 
conduz-nos a declarar que os seculos XV e XVI viram, de certo modo, 
um aumento de obscurantismo - 0 obscurantismo dos alquimistas, dos 
astrologos, das feiticeiras e dos cacadores de feiticeiras. Continuaram a 
dar relevo a tipos de homens - por exemplo, os condottieri - e de sen­
21 
Gabriel
Realce
Gabriel
Realce
Gabriel
Realce
timentos, como 0 desejo de vinganca, que durante muito tempo foram 
tidos por caracteristicos do SY.lla§.£ipI~.nt()_ quando, na verdade, consti­
tuiam heranca do periodo anterior. Tempo de 6dios, de lutas terriveis, 
de processos insensatos, aepoca de Barba-Azul.e Torquemada, dos 
!!1~~g~~-AQ.~..E9j~Qs_~li",n9i.~~--dQi.~~Ut.9~e~t~; impr~ssiOM.~.Qlb~m 
o historiador do seculo XX pela dureza da sua vida social. Nao s6 
'" ._~_n' .--"'-'- ~ 
inaugl/l"ou a deportacao dos_Negr~s Pa.I."a. 0 Novo .. Mundo como tambem 
alargou, na-pr6prIa'Europa~ 0 fosso que separava()s· humildes dos privi­
Iegiados, Os ricos tomaram-se mais ricos, os pobres passaram a ser mais 
pobres. Nlio se repisou ja muito a ascensao da burguesia na epoca de 
Jacques Coeur, dos Medicis ..e..D.Q$¥.u~n~er? A realidade e mais cODlpli~~a, 
pois os novos-ricos .IlPJessa.ram"sc a pa.ssar-.Lricliia.a::qiie-'j~jID 'se' viu 
renovada e insuflada. Claro que ela foi cada vez mais d6cll eni-rela~ao 
ao Principe. Mas"'ii~m por isso deixou de ser ..a.. classe..possuidora. E, ao 
converter-se a culture - fen6meno cuja-'lmportancia ainda nao foi bas­
tante salientada -, impcs a civilizacao ocidental uma estetica e uns gos­
tos aristocraticos que tinham por contrapartida 0 desprezo pelo trabalho 
manual. 
Raramente numa fase da Hist6ria 0 melhor ombreou tanto com 0 
pior como no tempo de Savonarola e dos Borgia, de Santo Inacio e do 
Aretino. Por isso 9-..E£!1.ll~.sItto_~'!..~~...a.~... I!0.ssos olhos. .c01l!0 um 
o£~~_Wl..de._contradj~, um concerto por vezes estridente de aspiracoes 
divergentes, uma diffcil concomitancia da vontade de poderio e de uma 
ciencia ainda balbuciante, do desejo de beleza e de um apetite malslio 
pelo horrivel, uma mistura de simplicidade e de complicacoes, de pureza 
e de sensualidade, de caridade e de 6dio. Recusei-me, portanto, a mutilar 
o Renascimento e a nao ver nele, como H. Haydn, senao um espirito 
anticientifico ou, em sentido oposto, como E. Battisti, senao a caminhada 
para 0 racional. Nisso residem 0 seu caracter desconcertante, a sua com­
plexidade e a sua inesgotavel riqueza. Por exemplo, ao dar ao numero, 
na tradicao dos pitagoricos, urn caracter quase mistico e religioso, 0 
Renascimento foi, todavia, condnzido, por esse caminho indirecto, para 
o quantitativo e para a no~iio cientificamente fecunda segundo a qual a 
Matematica constitui 0 teeido do Universo. 
*
 
o Renascimento tinha 0 gosto dos caminhos escusos. E por isso que 
ainda hoje 0 regresso a Antiguidade obceca certos espiritos que preten­
dem avaliar a epoca de Leonardo em fun~ao desse aspecto e Ihe repro­
yam ter-se deixado atrasar por aquele passado ja de h3. muito suplantado. 
Na verdade, 0 aparente regresso as fontes da heleza, do saber e da reli­
giao foi apenas urn meio de progredir. Alegremente se «pilhou os templos 
de Atenas e de Roma» para omamentar os de Fran~, de Espanha e de 
Inglaterra. A partir do seculo XVI identificou-se em Miguel Angelo 0 
22
 
maior artista 'de todos os tempos. Demoliu-se Arist6teles com base em 
Platao e Arquimedes. Colombo descobriu as Antilhas gracas aos erros 
de catculo de Ptolomeu. Lutero e Calvino, julgando restaurar a Igreja 
primitiva, deram uma face nova ao cristianismo. 0 Renascimento, que 
se comprazia com os «emblemaes e os criptogramas, dissimilou a sua 
profunda originalidade e 0 seu desejo de novidade por tras de um hie­
r6glifo que ainda causa ensanos: a falsa imagem de um resresso aopassado. 
Atrave, de contradiCOes, e por caminhos complicados, mas sempre 
sonhando com paraisos mitol6gicos ou com impossivei" utopias, 0 Renas­
cimento deu um extraordimirio saito para diante. Nunca uma civilizacao 
dera tao grande lugar a pintura e a musica, nem erguera ao ceu tao 
altas cupulas, nem elevara ao nivel da alta Iiteratura tantas hnguas 
nacionais encerradas em tao exiguo espaco. Nunca no passado da Huma­
nidade tinham surgido tantas Invencces em tao pouco tempo. ~ 
Renascimento foi, especialmente, progresso tecnico, deu ao homem do 
OCidente malOr-dOiiiIiiTo·sobre Um-'milttdo"mairbem cOIilieddo:-EnsIDou_.iheaarravessarOS·6~etthos;'afabri~tfetro fundido, aservir-se das armas 
de fogo, a eontar as horas com Urn motor, a imprimir, a utilizar dia a dia 
a-Teria'de cambici e"oseguro rnarltimo.
 --~~~esm~ t~~po~:::"':'progress.o__espiritual paralelo ao progresso mate­
rial -, iniciou aliberta~ao do individuo ao tira-lo do seu anonimato
medievare-oomeCandoa"Qesemoai'a¢ii~r(nfasTimltlrCQe"S" coTecHvas: Burck­
hardt observoii-delormageiilaI'estil'ClITaeteristie-lf (fa-epoca'-que estuda va.
 
Todos os seus sucessores 0 tem de seguir nesse caminho, mas sublinhando
 
quao doloroso foi esse nascimento do homem modemo, acompanhado por
 
um sentimento de solidao e de pequenez. Os contemporaneos de Lutero
 
e de Du BeIIay descobriram-se pecadores e frageis, sujeitos as ameacas
 
do Diabo e das estrelas. Houve uma melancolia do Renascimento. E tal­
vez nao tenha sido errado - sob condicao de se nao tomar a f6rmula em
 
mau sentido - 0 definir-se a doutrina da justifica~ao pela fe como urn
 
«romantismo da consolaCao». Mas falar apenas de descoberta do Homem
 
e dizer muito pouco, A historiografia recente demonstrou que 0 Renas­
cimento foi tambem descoberta da erian~a, da familia, no sentido estrito
 
da palavra, do casamento e da esposa, A civilizacao ocidental fez-se entao
 
menos antifeminista, menos hostil ao amor no lar, mais sensivel a fragili­
dade e a delicadeza da crianca, 
o cristianismo viu-se nessa altura perante uma nova mentalidade, 
uma mentalidade complexa, feita do receio da danacao, da necessidade 
de devocao pessoal, da aspira~o a uma cultura mais laica e do desejo 
de integracao da vida e da heleza na religiao. 0 anarquismo religioso 
dos seculos XIV e XV levou, sim, a uma ruptura, mas tambem a um 
cristianismo rejuvenescido, mais estruturado, mais aberto as realidades 
do dia a dia, mais habitflveI pelos leigos, mais permeavel a beleza do 
corpo e do mundo. 0 Renascimento foi, sem duvida, sensual; e optou, 
23 
Gabriel
Realce
Gabriel
Realce
por vezes, especialmente em Padua, por uma filosofia materialista. Mas 
o seu paganismo, mais aparente que real, iludiu certos espfritos que bus­
cavam, principalmente, 0 aned6tico e 0 escandaloso. Deslumbrado com abeleza do corpo, pede restituir-lhe 0 seu legftimo lugar na arte e na 
L­ vida. Mas, com isso, nlio aspirava a romper com 0 cristianismo. A maioria 
dos pintores representou com igual conviccao as cenas bfblicas e os nus 
mitol6gicos. Ao faze-lo, nlio tinham 0 sentimento de estar em contra­
dieao consigo pr6prios. A mensagem de Lorenzo Valla foi compreendida: 
cristianismo nao significava, forcosamente, ascetismo. A laicizacao e a 
humanizacao da religiao nao constitufram, nos seculos XV e XVI, urna 
descristianizacao, 
Esta explicacao convida a outra, de natureza diferente. Ambas, 
porem, provem do mesmo desejo de explorar em profundidade um 
perfodo que tern sido fascinante principalmente pelo seu cenario, as suas 
festas e os seus excesses. Pois nao irfamos aqui ceder A facilidade e apre­
sentar urn Renascimento em que 0 veneno dos Borgia, as cortesas de 
Veneza, os casarnentos de Henrique VITI e os bailes da corte dos Valois 
tivessem posicao de primeiro plano. Em vez disso, 0 que deve chamar as 
atencoes sao as transformaeoes de incalculavel alcance, escondidas por 
falsas perspectivas como as que todas as epocas tem. Seguindo John 
U. Nef, acentuei, portanto, a promocao do quantitativo e a elevacao do 
espirito de abstraccao e de organizacao, a lenta mas firme consolidacao 
de uma mentalidade mais experimental e mais cientifica. 
Fugindo a caminhos muito trilhados, A anedota e ao superficial, 
desejoso de oferecer uma sintese nova e de empreender uma reinterpre­
tacao do Renascimento, tive todavia a constante preocupacao de evitar 
o paradoxo e as formulas, que atordoam mas nao convencem. Procurei, 
em vez disso, demonstrar, esclarecer, fomecer ao leitor uma documentacao 
tao vasta quanto possivel. Quando estava a escrever este livro veio-me 
muito A mem6ria uma frase de Calvino. No fim da vida, ao dar uma 
olhadela as suas obras, Calvino disse: «esforcei-me por alcancar a simpli­
cidades. Tambem euprocurei fazer 0 mesmo. 
Estas poucas paginas de introducao tiveram a finalidade de criar 
uma ligacao, uma cumplicidade entre 0 leitor e 0 autor. Eu devia a quem 
viesse a ler-me as explicacbes necessarias, Chegou agora 0 momento de 
recolher-me e dar Iugar ao assunto que tratei; mas nao sem mostrar 0 
plano seguido. A primeira parte constitui uma colocacao dos principals 
factos nos quatro dominios: politico, econ6mico, cultural e religioso. 
A segunda e uma penetracao no interior das realidades concretas da vida 
quotidiana. A terceira, paralela A segunda, mas na ordem espiritual, pro­
cum identificar uma mentalidade diferente da do passado e captar a vinda 
a superficie de novos sentimentos. 
'4 
PRIMEIRA PARTE
 
LINHAS DE FOR~A
 
I 
L ._ 
CAPITULO I
 
A EXPLOSAO DA NEBULOSA CRISTA
 
A importancia da Europa na epoca do Renascimento nao esta no 
plano_~..!!!o&rlifi~o.-A- sua .populacao, em-tlSOO;--atfidii imcnitiilgia cern 
milhoes de habitantes, quando, segundo parece, era este 0 mimero de 
habitantes cia india no principio do seculo XVI: 30 ou 40 milh6es no 
Decao e 60 milhoes no Norte. A China, por volta de 1500, teria ja 
53 milh6es de almas; e 60 em 1578. Claro que a Africa e a America 
tambem eram pouco povoaclas em relacao a imensidao dos seus territ6­
rios: arrisca-se a calcular em relacao a Africa uns 50 milhoes de habitantes 
no principio do seculo XVI; quanto a America, hesita-se entre os 40 e os 
80 milhoes, Mas em ambos esses continentes havia vastas zonas desertas 
a separar nucleos de povoamento muito intenso. A plataforma vulcanica 
mexicsna (cerca de 510000 km") teria 25 milh6es de habitantes quando 
Cortez • C) e os Espanh6is irromperam nesse mundo ate entao desconhe­
cido dos Europeus. 0 Imperio inca, no inicio do seculo XVI, reuniria 8 a 
10 milhoes de siibditos. Ora a Franca, considerada nos seus actuais limites 
territoriais, tinha menos de 15 milhoes de habitantes em 1320; e nao e 
certo que, em 1620, tenha ultrapassado os 18 milhoes, Entre estas duas 
datas, por causa das pestes, das fornes, das guerras, 0 progresso demogra­
fico cia Europa foi muito fraco. A Italia passou, talvez, de 10 a 12 milhoes 
de almas; a Alemanha (nas fronteiras de 1937) de 12 a 15 milh6es; a 
Espanha de 6 rnilhoes e meio a 8 milh6es e meio; a Inglaterra e a 
Esc6cia, juntas, de 4 a 5 milh6es e meio. Vale ainda a pena fazer notar 
que, no principio do seculo XVI, as mais importantes cidades do mundo 
estavam fora da esfera cia civilizaeao ocidental. Assim, Constantino­
pla> e Mexico, duas capitals que se ignoravam mutuamente, teriam, a 
primeira, 250 000 habitantes e a segunda 300000, mais, portanto, que 
Paris (talvez 200 000 almas) e Napoles> (cerca de 150000). Mas era 
na Europa, e mais especialmente no Oeste do continente, que estavam 0 
dinamismo e as chaves do futuro. 
{I} As palavras assinaladas no texto com urn asterisco correspondem artigos do 
«Indice Documental» no fim desta obra. (N. do E.) 
17 
---
Descobrir-se-a uma primeira prova desse dinamismo ao comparar 
dois mapas da Europa: 0 de 1320 e 0 de 1620. Entre estas duas datas, 
quantas transforma~oes! No iniSio .99.-s-ec.YJ.QJgY1..a,,~C:$s!JJa, Jb~!"ica 
esta repartida em cinco estados: Navarra, Aragao, _Castela, portugal e 0~~I.!!~]f~rr~nada"P.9rtu~al nao pOs -amd-a pe'-e-m:-Africa. S6em 14fs,
1-.--. ao apoderar-se de ~,{f- fara, Castela, rasgada por querelas intestinas 
ao longo de todo 0 seculo XIV, e derrotada em 1319 por Granada e em 
1343 por Algeciras. Em contrapartida, Aragao, mais vigoroso, tenta criar 
urn imperio mediterranico. 
_ A Fr~de..Yili~_ VI· de _Valois -:- que sobe ao trono em 1328­~~Bru~~!!iiiS..iiaojnduiMetz. nem Gr~nQble. nem _Mar· 
selha nem Montpellier, sem falar, naturalmente, de Estrasburgo ou de perpIgnari~ryon"es~' na fronteira do ducado da Sab6ia. Bordeus, Baiona 
e toda a ~.~~m comQ•.o-ponthieu....estio em maos iiiglesas,'embOfa 
orel deInglaterra ainda aceite prestar homenagem ao seu suserano de 
Franca. A Bre~1)h.l!._~_JJJJU!!1g~,J;Lm;l.!t9!tueIlte.- iDdepende.nte.
Quaritl,i tnglaterra, conseguiu, nlio sem dificuldade, anexar 0 Pais 
de Gales _ que, porem, s6 no reinado de Henrique VIII· sera total­
mente absorvido. Esta, no entanto, em mas relacoes com 0 reino da 
Esc6cia, vizinho e rival. A Irlanda ja e uma especie de co16nia inglesa, 
mas uma co16nia desprezada, cuja costa oriental e a unica regiao efecti­
vamente dominada por Eduardo III·, feito rei de Inglaterra em 1327. 
o Imperio esta entregue, de uma forma cronica e duravel, ~ anar­
quia e ~ impotencia. Mas a Liga Hanseatica, nascida em meados do se­
culo XII da penetracao germanica nas costas do Baltico, constitui uma 
potencia. Em 1370 formara urna federa~lio de setenta e sete cidades, 
capaz de impor ao rei da Dinamarca, pela paz de Stralsund, a isencao de 
direitos alfandegarios aos navios hanseaucoe que atravessassem 0 Sund. 
Em 1375 0 imperador Carlos IV consasrara a grandeza da Hansa· diri­
gindo-se a Lubeck em visita solene. Mas, na Alemanha do principio do 
seculo XIV, 0 Brandeburgo ainda nao pertence aos Hohenrollern, que s6 
em 1415 0 adquirirlio. Quanto aos Habsburgos, duques da Austria e da 
Estiria, sofreram derrotas nas lutas contra os Sui~os - a Confedera~lio 
data de 1291 _ e nlio possuem ainda a Carlntia, nem 0 Tirol nem a 
Carniola. S6 em 1440, com Frederico III, obteriio a coroa imperial. 
A noroeste, os Paises Baixos ainda nlio nasceram como unidade politica. 
A leste, 0 seculo XIV e urna epoca brilhante para 0 reino da Boemia, 
parte integrante do Imperio ~ qual estao Iigadas a Moravia e a Silesia. 
A dinastia dos Luxemburgos instala-se em Praga em 1310. S6 se extin­
guira em 1437. 0 seu apogeu situa-se no reinado de Carlos IV, rei da 
Boemia de 1347 a 1378, rei da GennAnia desde 1346, coroado imperador 
em 1355, que foi 0 fundador da Universidade de Fraga. 
Os imperadores, teoricamente, tern direitos de tutela numa parte da 
Italia; mas esta, na realidade,escapa-se-lhes. As viagens de Henrique VII. 
em 1312, e de Luis de Baviera, em 1328, ~ peninsula redundaram em 
1& 
mm Domlnio das Ordens 
Will TeutOnicas 
ffi@l ~~~1Jo Bd~a~.:Jo XIV 
m:m Domlnios Otomanos 
Ilttttl cerea de 1350 
~ PossessOes dos reis I' 
~ de Inglaterra 
~ Possessdes dos Habsbur: 
l1li Possessees venezianas 
Bremen Cidades hanseatlcas­
~!!!! Possesslles genovesas 
IE KIPTCHAK: _~RElNO ~-T 
M!!!!~tro~ ~ Caft'a ~ ---­
REINO REINO
 
DO~ ZElANmAS ~ DOS HAFSIDAS
 
~~ 
1. A EUROPA NO IN/C/O DO SECULO XIV. 
fracassos. A urn tempo esplendorosa e dividida, a Italia e formada por 
muitos pequenos estados que fazem, cada urn, 0 seu pr6prio [ogo. A si­
tuacao, portanto, e muito fluida: vai modificar-se muitas vezes entre 1320· 
e 1620. Depois das Vesperas Sicilianas de 1282, a Sicilia pertence a Ara­
gao, que anexa a Sardenha em 1325. Mas s6 a partir de 1442 havera urn 
Reino das Duas Sicflias, estendido, portanto, ~ Italia do SuI. Mais a norte, 
os feudais parecem senhores do «Estado eclesiastico», que 0 papado aban­
donou ao instalar-se, em 1309, em Avinhlio. Em Florenca ", onde Dante, 
exilado em 1302, nlio podera voltar, as lutas intestinas nlio estorvam os 
negocios. A cidade do Arno, porem, grande centro bancario e thtil, 
ainda domina apenas urn pequeno territ6rio e s6 tera acesso ao mar em 
1406 depois de veneer Pisa. Em Millio·, os Visconti· comeearam uma 
carreira que sera brilhante - principalmente no fim do seculo XIV e na 
primeira metade do seculo XV. Em 1395-1397, Gian Galeazzo recebera 
do imperador os titulos de duque de Millio e da Lombardia. Bloqueada 
por terra pelos Apeninos, Genova. e no seculo XIV uma rica cidade 
29 
maritima, orgulhosa des suas Ieitorias do Mar Negro e do EgeIJ. CaITa. 
na Crimeia, onde ternnnam as rotas terrestres do Extreme Oriente, per. 
tence-lhe uesde 1286. Em frente da costa ce Asia Menor, usOO5, Chio! 
e Sames cacm tambem em seu poder entre 1340 c 1360. Genova passa a 
dominar a produc;ao e a venda do alumen .. oriental, especialmente 0 de 
Foglia, a antiga Poceta. A .rumiga de Genova, Yeneza ., inccre,.<iS«-se tarn­
bern, antes de tude, pelo Mediterraneo Oriental, pels a IV cruzada Iizera 
do doge «senncr de urn quarto e meio & Romania... Em 1320. a Sere­
mssima domina a lstria e a costa dalmata, possui 0 coo.dado de Cefal6nia, 
o Negroponto (a Eubeia), 0 ducado de Naxos c a llha de Creta. 0 seu 
comercio em Ccnstantinopla e activo. Tera de abandonar 0 Negrcponto 
em 1470, mas Ja antes drssc tent ocupado Corfu, M6don e ebron. Insta­
tar-se-e ern Chipre em J489. 
No centro da Europa, a Hungria e, no seculn XIV. uma grande 
poteocla, nas maos de uma dinastia angevina desde 1308. Esse vasto 
conrucrc de terrucnos inclui, a1em da Huugeta actual, a B6snia, a Cree­
cia, a Eslcvaquia e a Transilvania. 0 rei diipi5e de recursoe regularea e 
de urn forte exercito. Os Luxcmburgcs sucederac aos Angevinos em 1397. 
Depots di~, a ameaca turca e as crises Internes jevarao ao irene Matias 
Corvino (rei de 1458 a ]490), que :JCfa um btj(hante mecenas. 
A primeira metade do secure XIV ve, alem disso, desenvctver-se uma 
grande servia, que aproveilou os re~'eses do Im~rio Rizantino, estenden~ 
do-se do Damlbio ao Adrititieo e alca~ando 0 apogeu na epoca de 
Estevao IX Du9.an (1331-1355). que tetminou a c:onquisla da Maced6nia, 
ocupou a Albania, 0 Epiro e a Teisalia, dominou a Bulgaria e sonhou 
conquistar Constantinopla. A sua morte, porem, foi a ruina desse efemero 
imperio stnio, que se demloronaria definitivamente eIll Kossovo (1389) 
sob os golpes dos Otomanos. 
o Imperio Grego, restaurado em 1261, nao encontrou 0 poderio de 
outros tempos. COlllinuando a Jutar contra 00 Latinos, Que se mantinham 
no Peloponeso, os Basileus afastaram-se da Asia Menor. Ora a1 nasceu 
o perigo. No principio do seculo IV, urna triho (urea, recltac;ada paia 0 
litoral pelo.9 Mong6is ., come~u a dar que faJar: eram 0.9 Otoman05·. 
Cerca de 1350 oeupavam, em frente de c.onstanlinopJa. toila a parte 
oriental do Mar de Marmara. ES$C territ6rio, eentrado em Brousse, tern 
born ace~so ao Mar Negro e ao Egeu. Passando a Europa, os Otomanos 
apoderam-se i1e Andrin6polis em 1362, veneem os Servios em Kossovo 
em 1389 e esro8gam em Nic6polis, em 1396, rn cruzados ocidentais, indis­
dplinados e comandados por loao Sem Medo, A Bulgaria e oonquistada; 
~ Valal.luia pagat.6 tributo. A ineursao hrulal de TamerJao· na Asia 
Menor e a derrota que cle innige a Bajazeto I em 1402 em Ankara dar1io 
ao lmptrio Bizantino urna rootat6ria de cinquenta anos. 
No (mal da ldade Media, a &cand"in4via tern 1.llJ'l papel apagado 
apesar da uniio de Kalmar, conc1ufda em 1397 sob a egide da Dinamarca 
e que jl.lntou os tJ!s reinos. Em eontrapartida. os steuJes XIV e XV 
JO 
assistiram A aseensao de Pol6nia e ao eecuo da Ordem Teut6n.ica, que 
POr breve tempo dominara toea a costa do Baltieo, da PomerAnia ao 
Narva. Em 1386. 0 duque pagio da Lituinia-um Jageliio~casou com 
a herdeira do trono palaco e coeverteu-se ao ensuenamo. Assim se viram 
unidas para qualm secujos uma pequena Pol6nia, repartjda pelos dois 
Lades do Vistula, entre Cracovia e Torun, e uma vesta Lituania, que tinha 
o Dniepre como efao e cuja! cjdades principals eram Vilna e Kiev. Em 
1410, os cavaleiroa teutoruecs sotreram serja decreta em Grunwald 
(Tannenberg), Em 1454, Dantzig cotocou-se sob a proteccao da Polonia. 
Esse porto de mar esrava destinado a urn grande desenvolvlmenro. 
No inlcic do seculo XIV e ainda demasiado cedo para fatar da 
RUssia. Novgorod deve a sua prcsperidade a Hansa e 0 principado de 
Moscovo e vassalo dos Mongols da Herda de ouro '. Apesar da preaenca 
em Moscovo, a partir dessa epees, de urn patriarea ortccoxo nilo depen, 
dente de Constantinopla, sera precise esperar ate Ivan )11 (1462.1505), 
eo unificador das terras russas», para que a Mosc6via se impcnha a 
Novgorod e se Jiberte da tutela mongol. 
*
 
- vbemcs as paginas da Histona. Voltando eo mapa da Europa nas 
vesperas da Guerra dos Trinta Anos, encontramo-Io proflUldamente sim~ 
plifjcado. autcllle-"A;ii·4oiJnrram_~ em 1-479, 0 reino de Granada 
desapareceu--em"i491:'-NaVafl'lf"fDtlnreIiaa-'em iS12. Entre 1580 e 1640, 
a Espariiii--e-Vortugal tl'v1:!Mi:IiI:""tilD.9lD.O soberano:- Com- a foro;a das rique­
zas dO MbJCoe-(fo-'pe-ril,'"Seiiiion,,--das'16ii.!r/nquas Filipinas, disj'.Ondo 
momentanearnente do ~m.oerio POrtllil.lh no Extremo Oriente e no Bea­
si/, ~~I}.I!.a".apesar .das SI.l.3.9 derrotas e~.f.ranca_c:._na £Iand~es e,_d:" 
destrUlcilo da InvendveJ Armada 0581I), continua em (6'!Oa set a prJ­mer~_'p<lte:nS.i.~_~~E:~ia1. P6S5Ui na turopa ·od·aiSi:ilJaJXos -ri1eiiiJloiiaTs~ 
o tranco-Condado, a -Charoles, 0 Milanb, presidios na costa toscana, 0 
reino de r~apoles, a Sjcilia e a S3rdenha. 
A Franca que Henrique IV reergueu e mais rnodesta Que a Espanhamas,~a5to. mats_hO.§.2&~ea. a'remo ocupa: j~' q~lro~JJtOi-dete:m_ 
torio aclual. 0 DeJfJnado foi recl.lperado"em-n-;r9, Montpellier em 1382, 
a ?roveii~a e~_1411L Seis'-an~':::'~lit~-o~~i·'jjt~)!l~!!!Eria:.ieliunera!j"" A 
coroa de Fnm~ e atodas as suas possessoes no eontinenle, com excepCao 
de oifitls, que-jO em J559 valcou A Fran~. Ana da Bretanba casou com 
Carlos VIII· em 1491; em .1532, 0 seu genm'Fi;ij:iciclLLlIiJiij-defmitiva_ 
meniiodUcado ao reine. 'Em'-eonLrajiartIda, a firani;3., sob Carlos VIII, 
abandmioi.l 0 ArtOis, O"-Praneo-Condado e 0 Rossilhiio, adqtlirido por 
Luis XI: en, 1argar uma boa pcesa em tn:xa da sombra italiana. Mazarino 
e Luis XIV virio depois a reparar 0 erro. Mas, em 1559, I)S trl! bispad09 
de lingua {ran,esa, Metz, Toul e Verdun, foram ane:rados e, em 1601, 
Henriql.le IV, para libertar Lyon, adquiriu a B~sse, 0 Bugey e a regUlo 
de Gex. Ape!lar da crise da guerra dos Cern Anos, do trocuso das expe~ 
31 
_ Limhet tc6ricoo 60 Imperio 
E§l ReiDo d& DiN"'ore. 
[[[]] 1.""'0 do Sdc:il~l a POSIe"s <los HobeuoIlen.l 
~-- ­ [2Zl Poss. dos HobsbUlI doe v­
B Po.....s6es dos HobsbU!1l 
de Modrid U Posse..oes de Veneu 
ROSSIA 
,",' 
.. 
4>" 
2. A EUROPA CERCA DE 1620. 
dit;5es a Italia e do drama <las guerras religiosas, a Fnm!W8-, no inldo do 
secure XVII, e um pais unido e rcbustc contra 0 qual nada puderam 
Carlos V nem Filipe II. Em 1620, a Inglaterra e a nscocta, de hi multo mutmunente hDStiJI, 
tf:J;D.,-lW' d~Zi.iitC"Wi·os, 0" mesmc sOberano. Estes reinos, tei:J.~bOs 
adoptado a' lieforma, 'ffearao -tifiidos para '0 -futuro. Ainda do pouco po­
voedos, mas 0 destine dos BritAnicos estA ja eacedo com nitidez. A partir 
de 1570 os ileUS aevics mercantes invadem 0 Med.iterrineO; .em~~ 
marinheiros de Isabel desfazem a orllllhosa e _poderosa tentativa da- - '._~ 1G~..ArlZWdA. Em 1620, euetamCOte, os cPadres peregrinos. desem­
barcam na Am6rica do Norte:.o lDlp6rio c;:omerva a sua estrutura balora e, OS seus m61tipll» ,~cIOll 
e priiicpisb, tluJloS quanaiS 65- dia.A do ana. Mas as duas grandes flliiir­
12 
liJ~ que virram a dominnr a cena da Europa Central ate 1918 estao jll. 
a Iorjar 0 seu pcderio. A casa eleitoral dos Hohenzollern. nas vt..s~ras da 
G.~rra dos Trina~ a~-h,j -d~·-.adlf;itilociYa-~·P9s.ses~~ les1~--~-a 
oeste: de urn Jade, 05 ducados de Cleves e a Marc.a (1614); e do outre a 
Prussia, exterior aos limites do Imperio (J (18). Quanto aos Habsburgos 
de Viena. comam na Burooa. nlio tapto por urna coroa -iinpe-riaf,-que-Ules 
nao da nepbllm real.pad.e£".. mOOD peJe hleep que pac~mente consti­
tnfr';'; a moir dQ stcylo ,X.I.V. em,..~olta d9~ w.u:ilstQS da k-stria e da 
Bstfna. Reinam, pais, num conjunto <ie- territories que se estendem do 
Adnatico as fronteiras da Polonia, do vorarlberg a exrremidade oriental 
da Eslovaquia. Possuem ainda varies territories mais a oeste, especialmcnte 
na Alsacia. A Boemia, que no infcio do seculo XVII se fez maioritaria­
mente protestante, desejaria retomar a antiga independencia. A derrota 
da Montanha Branca (1620) fe-Ia soudarta, para tres seculos, do destine 
dos Habsburgos de Viena. 
A Hansa perdeu ja, no principia do secure XVII, muito do seu pres­
tigio e do seu poderio. A Guerra des Trinta Anos vai dar-lhe urn golpe 
mortal. Os navies holandeses tomam, eada vez mais, 0 lugar des hensea­
ncos. As .ProyJm:ias U nid~_sAo_-,.!!,I!!. ,!lQ.s ..P'!.r:a.d.o.xClS.d!...hist6!",iA..J<w:()~ia 
do secUlQ XVII. Em 1609, a Espanha, de f61ego perdido co_[[l_~_~~~rra 
d1----.f'landresll. quea rneu comQ..Jlm cancr£::.-acertou-uma trigua que 
r~ecia. a titulo provi's6rio: a _iE-d~nJ~!!~_~!l:_~i§~~~CE~~~ 
calvinista. Em 1648 serA preciSQ-reconhecer a evidencia: 2 milh5es de 
~e~manos, apinhados em 25000 km", estarao de posse do maier 
imperio jamais vistc no mundo. Quanto A Belgica, existe ill. virtualmente 
na Europa de 1620. Entre 1579 e 1585, Alexandre Famesio reconquistou 
a Espanha os Parses Baixca meridionais, que passaram a ser um doe 
baluartes da reforma catolica. Mas, em 1598, Filipe II faz deles urn 
esrado autonomo, confiado a arquiduques. Quer dependente de Madrid 
quer, mais tarde, de viena, a futura Belgica, fortalecida pelas tradkees 
e hitos provenientes da sua prosperidade medieval, constitui it uma 
unidade A parte. 
Tambem a Sult;a confirmou a sua originalidade, quase atmgindo, a 
partir do fim do secuto XV, as fronteiras actuaia Os sew scldadoe nzeram 
tremer a Europa no tempo de Carlos, 0 Temerario s. A Sufca foi urn des 
centres da Refonna. A paz ca vestefalla separa-ta-a ofidalmente do Im­
perio. 
P_a_~--!!_'!.~_N~JL..!--.1~--.Son!in '!8_di~ll.....&W1iriIl....JlQLYQlta 
de 15~..L.~~~R..~ em lI1gUDS. aspectos de ponncpOf.......\l"s__f!.I!..I!.teirns que h*.­
-de conservar ate A c.ampanha _de Bona,NJ1e em 17~ Depcis da paz de 
Lodi" (r~ci'1ou:seum·-equllJl,rio-jt.;li~o que ja enta~ prefigurava 0 
equilfbrio europeu do s6culo XVll ao sleulo XIX. Cinco estados mais jm_ 
portantcs....Q.ll~~~. ()~!~ 5!=:, d~tl!~.!D: 0 du.cado..d.c M),liQ".a Rell~~(jca de 
Vene~dL!_()~~!!a (feila gfao-ducado em 1569 em proveito dos M&lids); 
os do_~os !emporais do papa e 0 reino de N6.po!~. A Espanha domina 
11
 
. ' _~_ ~., __ ":'",,:.~,~._- -"".. ..~- ..... .,. .......xt..w:r'i""""~~-,· --~..,-~' ,- :-"".::,,~,
 
..-------.:oII;,.~.:.:".:eH;;. .... -;;. ',,;',;,,_•.J. loe j"'tkd' t±·,"'it....."'---'--""'-....."',"",.. tntd;Wt6iftt'A>H _., 
r· 
, 
L 
, 
I 
o primeiro e 0 ultimo destes cinco estadoa, de modo Que a liberdade 
de accao des Quiros tres. c. com mais forte razac, dee pequenos pond­
padcs, esHI. muito Iimitada. veneza suporta com humnr este protectorado 
d05 Habsburgos, mas preccupa-se gravemenle com a ameaca otomana. 
Durante a guerra de 1469-1479, teve de ceder aos Turcos 0 Negruponto, 
vanes ilhas do Mar Egeu e hastantes ponlos de apoio na Moreia e no 
Epiro. Em 1571 _ no pr6prio ano da vit6ria de Lepanto -, veneza sat de 
Chipre. Entendeu hastante cedo a gravidade do perigo otnmano e pro­
curou soluCOes de compensacao. A grande expans3.o veneziana na Terra 
Finne data dQ principia do seculo XV; Vicenza e Verona foram anexa­
das em 1406, Udine em 1421, Brescia e Bergamo em 1428. Mas 0 que 
e Veneza _ e, mais, 0 que e Genova, privada das feitorias orientais­
34 
"' • ".~,._"'. .~ ......__,._~, 'k1l!'\W" 
·pt'Wltfher
.......... 
..... . . 
..... '\ iWhW· t .
 
J. A FRANCA EM /328, 1360 1]/J0 E 1429. 
(S"s""do J. Le Goff, Le Moyen Age.) 
no tempo da preponderancia espanhola? No mapa, muho pouco. Mas, 
no plano da civihzacllo, 0 papel da Italia continua a ser muito importante, 
mesmo ainda em 1620. Na verdade, a Italia dominou - e muito - os 
tres seculos que van de Dante a Gafileu. Na peninsula, os estados mais 
importantes nao sao, Ioreosamente, os mais brilhantes. Urbino foi a Ate­
nas do seculo XV e Ferrara - foi urn cos maiores focos do Renascimenro. 
Do lado de Iii dn Adrililico_,~(!l 0 muodo olomano, ~p!!'hado 
por tres cootmentes, de Buda a Bagdade, do Nilo a Crimeia, estendendo 
mes'tiID a sua d~mmar;:iio a uma parte do Norte de Africa. A cooquista 
de 9}ns!I:l.!l_~.PJtl.a..--'1453), 0 fim do pequeno imperio grego de Trebi­
zenda (1461), ~~~~o _~~}.£~2•.i!ID), a ocupacao de Belgrado (152l), 
a derrota infligida em K'iobacs 0526) aos cavaleims hungaros e ao seu 
rei Luis, que la ficou morto, a metodfca anexacao das Hhas do Egeu entre 
1462 (Lesbos) e 1571 (Chipre) f~e.r~l!!-.4Q.jl.lltA9.uro.D.~e;w~i,,_~~"A.J.I8.\!lito 
muculrnano ..~9. mesma._1emPO.sucessor de Mao::nt, «servidor das cidades 
sanras». Na Europa e senhor dos Balcas, a sui do Save e do Danubio, 
e da maior parte da Hungria. A Transilvama, a Moldavia e a valaquia 
pagam-Ihe trtbuto. Em 1480, uma rorca turca desembarcara em Otranto. 
Esquec~-se muitil:LYm~....9!!~JLbrilhim.I&.J~_do .Rer~mento tremeu 
perante Q. p<;riK<!.J.\lt~Q..e".Qll~_.o apogeu..dos...alOllWW.~aemJl],no 
secuJ£~~.JQR--S9.l!J;q~o,~Q...M.agnifil:o,"',j~~.~,¥.».Os corsarlos turcos e 
barbarescos coctiuuaram, mesmo depois de Lepanto, a visitar as costas 
tirrenas. Lela-se 0 Didrio de Montaigne durante a sua viagem pela Italia 
em 1581. Falaodo da regiao de Ostia, diz ele: «Os Papas, e em especial 
este (Gregorio XIII -), fizeram erguer nesta costa maritima grandes lor­
res, ou atalaias, a cerca de uma milha umas das outras, para prover as 
arremetidas que os Turcos aqui faziam frequentemente, ate no tempo das 
vindinras. a fim de tomar gados e homens. Com estes torres, que estao 
a urn tiro de canhac entre si, vao transmitindo os avlsos com t30 grande 
rapidez que 0 alarme depressa voa ate Romas. 
Os Jagel6es -, soberanos da Polonia e da Lituania reunidas entre 
1386 e 1572, nem sempre forum Ielizes nos seus esrorcos de reststencia 
aos Turcos: em 1444, Ladislau III foi derrotado per eles em Varna; no 
infcio do seculo XVI, foi torccso entregar-lhes a Moldavia e a Bucovina. 
Mas os reis da Pol6nia reinam, no seculoXVI, sobre urn vasto territ6rio 
- demasiado vasto -, sem defesas naturals, que vai de Poznan ao baixo 
Dniepre e das frontciras da Transilvania it actual Estonia. Houve uma 
idilde de ouro polaca na epoca do Renascimenlo, especialmente sob Segis­
mundo I, que reinou de 1506 a 1548. Sua esposa era uma Sforza e a 
COrle real era urn foco de humanismo. Mas, depois da extlncao da dines­
tia des Jagelces e do reinado de Bstevac Bl1thory (1576·1586), 0 pais, a 
cujos destinos preside agora urn ramo da famflia Vasa·, encaminha-se 
para diJjculdades cada vez maio res. A indisciplina da nobreza combina-.'le 
com os perigos exteriores. A Pol6nia cstA rodeada de inimigos: Turcos, 
Suecns, Moscoviw. 
35 
l
"" ">,;;z""j:kJ4¥l!Itio<'iiiiiI&wW oIl*'*"'..·dJa/¥' ......,:& "i ' 
, 
-t. as CINCO GRANDIES EST,tDOS ITALIANOS EM /41}4.HU 
(Segu"do " Delumeau ~ J. Hee". La Fi.D du Moyen Age, lcs XVI' et XVII" 
REINO 
DA HUNGRU. 
• 
' <Z!J' 
COlSElG,t, -..,;.- • 
(deGht .~" >-
,;.-
, --
MAR 71RRBNO 
....." 
~1t:I.) 
Em 1523, a guecia, seguindo Gustavo vasa, separou-se da Dina­
marca. A uniao de Kalmar sempre fora fragi}. Muito mais frAgil foi a 
uniiio (1592-1595) da Po16nia e da Suecia no tempo de segisroUDdo I Vua. 
Este rei, cat6lico, feria ~ convic¢es de urns Suecia muito ligada A 
Reforroa. A1em &550, os dois paises eram rivais no Bftltico. Em 1612, 
36 
-"~"~'I"!'.~·'uo: ) - .;. • .. ," .-""'¥'Iii'f/\-s'-5* 
- ..:-:",: 
! -'6&.'1 " md fj-'WN&fHli£ithfit---d6hF-'&ttt - '_,,'" t dW,w<),i' 
GustS'lO Adolfo reina hA ja onze anos, aonhando transformar 0 Baltico
 
Dum $"Iago suecc», e ja tirou aos RUS503 a Ingria e a Cerelia Oriental.
 
No inlclo do seculo XVII, Suecos e Polaeos enfrentam, de facio,
 
uma Russia que se vai afirmandc. Ivan III (1462-1505) cason com a
 
sobrinha do ultimo Besileus. Tomou insignias impertais e ree-se cbamar
 
«autocraras e esenhcre Em 1522, as Russos tiraram SmoJensk a Pojoma.
 
Depois disso, sotrem reveses a oeste mas, aprovenenoo-se da desagregaeao
 
des canatos mong6i:s. ocupam Kazan em 1552 e Astraca em 1554.
 
E a epoca de Ivan IV, 0 Terrfvel (1533~lS84). que, 300 subir ao trono,
 
tcmou 0 tftulo de «czar de todas as Russiass. A sua morte Ioi seguida
 
de perturbar;6es, como tambem 0 foi a morte de BOris Godunov em 1605.
 
Mas, oitn anos depois, Miguel 111 (J6JJ-I645) funda a dinastia dos Rcma­
nov. Enquanto a Polcnia e a Suecia se viio apagando, e precise contar
 
cada vez mais com a Russia . 
*
 
No prmctpro do seculo XIV, a Europa em ainda uma nebuloSli de 
rormae indecisas e de futuro incerto. Em 1620, pelo coorreno, as divisorias 
pounces do continente aparecem, se nao finnes, pelo menos c1arificadas 
e consolidadas nas sues grandes linhaa, Apesar do moment<1neo desapa, 
recimeneo da Pol6nia no final do seculo XVIII, da independencia da Gre­
cia alguns anos depois e de vanes retoques aqui e atem, 0 mapa da Europa 
nao ha-de ser em 1850 radicalmenle diferente do que era na ocasiao em 
que rebentou a Guerra cos Triota Anos. Em resume, a epoca do Renas­
cimento, quer di2cr, esse grande perfodo de mutal;no que comecou no Ji­
reinado de Fjlipe Vl de Valois e terminou no de Luis XIII, e aquela 
em que a Europa se define politicamente, descobrindo, pelo exemplo 
italiano e pelo jogo da resistenda rrancesa as ambil;Oes doe Habsburgos, 
a regra de ouro do eQuiLlhrio entre potencies. 0 ideal da unidade eurc­
peia, reafizada sob a autoridade do imperador, foi substitufdo per uma 
retacso de rorcas. 
Dante, em De monarchic, escrevia cerca de 1320: «Onde ja nada mnis 
hi a desejar nao pode subsistir a cobka. Urna vez destrufdos os oblectos 
que podemos cobiear, desaparecem tambem oa mcvimentos que com eles 
se relacionam, Ora 0 Monarca (e assim que Dante designa 0 eimperador 
da terra»j nada tern a deseja-, pais a sua jurisdilj:ii.o .'16 e limitada pelo 
oeeano, 0 que nao e 0 caso dos outros principes, culos senhorios cordi­
nam com outros senhorios, como, per exemplo, 0 reino de Castela conflea 
com 0 rcino de Aragao. 0 Monarca e, pols, entre todos os mortais, aquele 
que maie sincemmente pede estar submetido A jusliCa-. Mas, no meio do 
seculo XVI, 0 ingles John Cork, retomando as f6nnulas dos jurist~ 
de Filipe, 0 Bela, dizia orgu]hosamente: ll"Todas ns nal;oes sabem que 0 
muito poderoso rei de Inglaterra e imperador no seu pr6prio reino e nao 
depende de ninguem». Ser «imperador no .'leu pr6prio reino» queria dizer 
37 
L __ 
..,-----­
que se repudiava, no fundo, a hierarquia feudal, que noutros tempos dis­
tinguia suseranos e v.assalos, sendc 0 imperador 0 suscrano des suseranos­
A Guerra dQS cern ADos ...eio provar que 0 sistema feudal nao se adaP­
tava jA a rcalidade. No momenla em que Eduardo Ill, em 1337. diri­
giu 0 desafio a Pilipe VI. seu suserano pela Guiana e pelo poothieu,
 
queria, principalmente, sublrair os seus domlnios continenLais a todo e
 
qualquer race de dependencla. De facto, DO rratado de Bretigny lI360),
 
loao 0 Bom .., prisionciro, teve de ceder ao seu antigo vassalo, em total
 prop~iedade _ e, portanto, sem homenagem -, quase todo 0 Sudoeste da
 
pranca. Nao rnenos significativo e 0 rrarado de Arras, ccnciufdo em 1435
 
entre Carlo~ VH" e Pilipe, 0 Born, duque da Borgonha. Este aceitava
 
abandoner a ahanca inglesa e, em rroca, Carlos Vll dava-Ibe variaa
le, 
ecidades reais». em especial no Somme, e diepensava-v- vitaliClamen de 
toda e qualquer horaenageru ao rei de Franca. 
como e que, em tais condtcoes, poderia 0 imperador conservar auto­
ndade efecliva sobre os sooeranos da Europa'! Claro que 0 mito imperial 
nnha mona forca e continuava a inquielar os espirilm. Francisco I e 
Carlos de Espanh,l foram concorrentes na ramose eleio;:lo de 1519. }'{a realidade.l-£ar!<1i-Y~_J.!IDl;I~Y!LjL .s~u.,j'l(l4_I!,:.4, nio. UP. _tit \llode ,im~radormaSIiQ~faeu;:'J1e..ser ..secbor..~ctivo de _i.mportaILtes -t.eJrHQriQs. ~.~tlO'i:19res
.j, ~ A~rceb«1J~se. a .partir de 1522, de ser dific~~overnar ao 
mesm leIUPD. 0 centre e o. ~ da Europa e cedeu a seu irrnao' Fernando 
o.os territarios austriacoii. da casa dos Habsburgos. Em 1556, desmoraIizado 
por nao ter conseguido sequer conse:rvar a unidade religiosa da Alemanha, 
partilhou os seus dominios, dei,;ando a Fernando a Europa central e a 
coroa imperial e a Filipe II a E:ipanha, os Paises Baixos, 0 Franco­
_Condado, as POSSe&'ioes italianas e a America. Conjunlo ainda demasiado 
vasto para poder durar muito. 0 futuro pertencia, de facto, as conslruo;:6es 
territorJilis baseadas num autentico sentimenlo nacionaL 
Evidcntemenle que nem todas as colectividades nacionais conscgui­
ram vinl:ar no final da ldade Media e no inicio d~ tempos modernos. HA insuce~',IJs a registar, especialmente naquela parte do territ6rio que a vaga 
otom cobriu. Ai, as populao;:6e.s clobraram-se sobre si prQprias e espe­
raram,
ana 
mais ou menos silenciosamente, por mdhores tempos. No que a 
Botmia diz respeito, este esquema e roais matizado. A Boemia e5CapoU 
a ocupao;:iiO lurca. A identidade national comeo;:ou a afirmar-se no tempo 
de earliJS IV, 0 benfeitor de Praga, e ainda mais se afirmou na epoca 
de Joao Hus:s, que pregava em checo e contribuiu para a eMJulsao (1409) 
dos Alermles da Universidade da capital. As guerras hU5silas do stXuJo XV 
tiveram leeS aspeclos: religioso. social e nacional. No principio do se­
'!-­ culo XVlJ, 0 reino da Boemia, tendo na sua maior parle adoptado a Re­
forma, gozava de urn lugar privilegiado no coniunlo de lerrlt6rios gover­
naJo, pelos Habsburgos na Europa cenlral; e 0 soberano gostava de resi­
dir em Praga. A brutal politica religiosa de Fernando n. a revolta checa 
que elaprovocou (1618), 0 esmagamento BOs Checos na Montanha Branca 
38 
,. ""'''''''''7'''1,,",1» }lPO ••,.,. "'"' 4=_. Wi;;; i,e §K''''''''­
(620) e a repressao que se Jhe seguiu causaram urn eclipse dosennmeme 
national da Boemia, onde a corte deixou de ser elecuva. E certo que (.I 
reino conservou, teoricamenle, a independencia; Praga, principalmente. 
transformou-se, all. epoca da reforma catolica, nJJIlJa cidade uarroca culos 
rnonumentos conservam emocicnante beleza. Bstabeleceu-se uma especie 
de colaboracao entre as camadas de elite checa e germanica, de tal modo 
que e hlstoricamente Jatso falar-se, quanto aos secures XVII e XVlll, de 
«ocupacao aterna» do pais. Mas a accao de rcao Huss • e a repreSSao que 
veio depois da derrota da Montanba Branca tinham deixado recorda~5es 
bastantes para se poder dar depois a rcoovacao nacional do seculo XIX. 
em boa verdade, na Europa do Renascimento, Iorurn mais os exitos de 
expansao nacional que os fracassos, quer nos paises ccidentais quer na 
Russia ou na Suecia. 
Obk£~.r:!~~;'...JQda.'ci<l...o .. caso da. ltAlia.· Uaquiavel, 00 Prmcipe 
(1516), damou e!Ilj;ij9 pelo !!oificadoi: que wobjljzassl!,:. esenergias naco, 
nals·' e-',ii-;lutinasse.0 J2ais. Efectivamcnt~,!l_. t~lia., _~nb.e.l;.eJ!,---j!JlartiLdos 
fiiiii"iJ6-secuio' XV;-nios6-0-vaiv~m:ma:l~ '.O"Q.ue, emaa gra..ve~.~. insta_ 
lacao de exercncs eStni.n!!~i~o;"~ di~~ Iocais. Em 1494, Carlos-VIII 
passou os Alpes e, «novo Ciro», entrou triunfante em Milao, em Parma, 
em Florenca, em Roma c no SuI. Fez-se coroar «rei de Napoles, da Sicilia 
e de Jerusalem». Mas, meses depots, os prtncipes de Italia e de ourros 
parses coligaram-se conlra ele. Cados Vlll teve muita sorte ao conseguir. 
em Fornua (Julho de 1495), a custa dc violenta batalha, abrir cammho 
de regr~ a Fran~a. E apesar disso ja em 1499 Luis XII· mandava 
outra vez. 0 cxercito frances para ltAlia. As for~as francesas ocUparaOi 
Milao, cujo duque, Ludovico, 0 Mouro·, foi preso e deportado para 
Loches, onde morreu. Senhor de Genova e da Lombardia, 0 rei de FranIOa 
e~magou os Venezianos em 1509 em Agnadeilo. E facto quc, cinco anos 
anres, tjvera de abandonar 0 sonho de Carlos Vlli c deixar 0 reino de 
Napoles a Fernando de Aragao·. Em 1512, a «Sanla LigaQ, quc Julio II·, 
ja reconciliado com os Venezianos, tinha erguido, expulsava de Milao os 
Francescs dpesar da vitoria sem futuro de Gaston de Foix em Ravena. 
Os reis de Fran~a teimaram nas ambi~ocs sobre Italia. 0 ana de 
1515 viu com~ar 0 reinade de Francisco [ com a brilhante vilOria de 
Marignano. Milao voltou a ser franccsa, mas nlo por muito tempo. Seis 
anos depois, a cidade fugia 010 Roi Tres Chretien, cujos soldados foram 
rapidamenle esmagados em Pavia (1525): 8000 Franceses morreram em 
combale ou ficaram afogados no Tessino; os imperiais perderam apenas 
700 homen:s, Com 0 tralado de Madrid (Janeiro de 1526), Francisco I 
pareceu renunciar A ItAJia. Mas, pouCQs mcscs passados, criava COntra 
Carlos V a Liga de Cognac e aproximava-se do Papa. 0 saque de Roma 
provocou nova Olrremetida francesa - a de Laulrec - na Lombardia e 
em direco;:ao a Napoles: novo fracasso, sancionado pela paz de Cambrai 
(l529). Em 1535, porem, morreu 0 ultimo duque Sforza·, que sO nomi­
nalmente governava 0 Milanes, e cste passou para 0 domfnio directo de 
39
 
... --1 j 
Carlos V. A modo de protesto, c para ter LIma base dcnde pudesse partir 
para ruturae tncursees no Sui, Francisco I manccu em 1536 ocepar a 
Sabola e 0 Pie monte. onde as tropes rrenceses iicaram durante rnais de 
vinte aeos. Francisco 1 linda em 1542 pcnsava em retornar Mili\o. Sob 
Henrique II ., os soldados do rei de Franca guerrearam multas vezes em 
Italia, Em 1551 lutavam contra Julio Ill· na regjao de Parma e de 
Mirandola. No ano seguinte, Siena revoltou-se contra os do Imperio aos 
gruos de Francia, Franc/a! E, em 1557, Francisco de Guise, cnamscc 
peJo Papa Paulo I V • - ameecacc pdDII Espanhcis -r-, apareceu em Roma 
e renton, sem resulrado, uma «ultima viagem a Napoles». A paz de 
Cateau-Cambresis pes rim as cavalgadas rrancesas, mas nao acabou com 
a presenva de tropes esrrangeiras em solo italianc, pois os Bspanhoie, que 
ali tinbam chegado em 1504, ficaram ainda per mats de dais seculos. 
Desk modo, a peninsula leve de sofre r, eo secujo XVI, a passagem 
e a pesada pre.ell>;il de soldados Iranceses, sujcos, atemaes e espanh6is. 
Assistiu, impctente, ao saquc de Roma em 1527, Ccrnandadas por urn 
trances, as tropes imperiais - au seia, lausquenetes alemiles, muitoe deles 
luteranos, Espanhois e ate Itajianos - tiveram enuto 0 sadtco prazer de 
pilhar, violar e avntar uma ctdade que era consuferada a «Batli/ooja 
modernas mas que toda a Europa invcjava, A Halia, porem, olio perdeu 
alento. Nessa epees, apesar de Maquiave), nao aspirava a unidade polftica 
mas tinha consciencia da sua unidade espintual e sabia que os Alpes 
eram a sua frcnteira natural. Julio n expr irnia os senumentos dos seus 
ccmpatrinras ao distlnguir os Italianos des «Barhamn que convmha 
expulsar. Meio seculo depcis, tambem Paulo IV se esfcrcou per «libertar 
a Italia des exercuos cstrangeirosa 1::!~s lent.:lthas falharOIl1. :Mas os 
E1;panJJ6is (laO coeseguiram, e nem sequcr tentaram, assimilar 0 Milafles. 
(J reino de Napoles e a Sicflia- que coaservararn a lingua, 0 parrimonio 
cultural c a mdiviuualldade que !hes eram prOprios. Ou nao e com 
excessiva preesa Que se Iala da eltalia espanhclae dos secures XVI e 
XVII? A realidade e muitc mais compnceda, prmcipairnerue quando pen­
samcs que Rome, Veneza e Floren~a c:ontinuaram illdepcndellles, m~mo 
lendo de contar, no plano das reJa,6es exteriores, com 0 poder espanhul. 
Foi por isso que a me e v cspirito italianos puderam continuar a expan­
dir_se Iivremente nesses lees baluartes da civili:zacao ocidenlal. Seria por 
acaso que tantos arlislas lombardos vinham instalar-se em ROlna na 
~egu[lda metllde do s«ulo XV[? a novo esplendor e a crescente irradia­
.,;ao emanada da Cidade Etema na epoca da rdorma cal61ica e num 
momenlo em que os papilll, ~pecUtIIDente Siirto V (1585-1590), procum­
vam rdorcar a liberdade de aCl;aO da Santa se e do Estado edesiastico, 
testemunham que a Ihilia tinha oonservado 0 essencial do seu genio e 
l:ont.inuavll fiel ao grande passado que noutros tempos a colocou a cabelj:a 
do mundo. Dividida, manttnha uma coerenc:ia interna que nl.lfica h<.tuvc:: 
na heter6clita rc~niao de lerrit6dos que a FiJipe 11· ohedecia. Tarnbem 
a Alemanha, iragmenJada, cntregue it guerra civil, conservava fronteil'3S 
• 0 
,."-",",.~."~.",,.......~,.-, ""''''''''''''''''''-P,'~..,RJj41.\ ." ,;,1..0'''''' 1.Q, 4.$2!;ZP;,k"04¥..J£$jj$L_~ '."""
 
Qitf'nWt Tit1:zrf('mn,( Yt'xf<r,tt Ov 'tTwnrr'.,-*±irftrt.u' 
relalivamente e~tl':veis que rrcteseram urn capital cultural e urea esp~cie 
de conscienda colecliva testemunbecos per Lutem COm eoqusncta. 
Niio sera a falta de uma tal consci!lll.:ia l:oJectiva, tao Iortemente 
desenvolvida nos Coniederados 5Uk:o!, cue explka em profundidade 0 
_ Liorlte do S8lll<> Inpt'n" 
~ PtlsseSll6es do Duqlle de Bo~hl ~JID advano de Fllipe+hn. (1419) 
mm4~~s de Pllipe+&mfl'i!if& (1419.1467) 
5!m!IAql4is~ de (&rIo5­wwa -o-Temmm (1467-1477) 
~TerritOr»s l\1blJle1idos! 
It& iDrh~lIda da BorRonh; 
q'" 
o 
f$
,: 
\' 
~~ ~ .. _._,_.__ 
;r. ·.~HU~ ........
€ ~d 
, 
• 
> 
~ 
• 
o 
, 
~ 
~ 
'"., 
o 
'. 
5. 0 PODEIUO IJA. BORGONIfA. NO SECULO XY. 
n 
L 
nacassc da nova LoIaTingia que os duques da Borgonha • quiseTam erguer 
no rim do secuto XIV e no seculo XV? Bxtraindo as consequencias das 
sncessivas amplia\Oes do dominio hurguinhao e Iiel 11. linha polilica de 
Filipe, 0 80m, Carlos, 0 'temerano (l467-1477) qurs, 0.0 ocupar a Atsacia, 
a Lorena e a Champagne, juntar as sues possess6es do norte as do sul 
e renner tim bloco imico, do Zuiderzee a Macoll e a Basileia. Luis XI· 
e os Sllfl;os encarregaram-se de lho vedar. Mas, seja como for, essa cons­
rrucao territorial uemasiado apressada podia patecer artificial. Os habi­
tanres des Pafses Baixcs nunca se unham sentido cburguinhoes»:pro­
vam-no as repetidas revouas de Liege, Bruges c Ganci contra Pilipe, 0 
Born, contra Carlos, 0 'remerano, contra Fijipe, 0 Belo e contra carlos V. 
o Iracasso de tal consrrucnc deixava pressagiar 0 futuro desmembramento 
do uuperio curopeu do. Espanha. As perturba\Ot:s verificadas a partir de 
1560 nos Paises Baixos uveram, sem duvida, mouvos rehgiosos; mas 0 
atraso dos Estados Gerais, por obra dos ministros de Piiipe II, e a 
Itostilidade para com os mihtares espanhcis explicam tamb(:m, em parte, 
a revolta da Plandres. Se, pelo eontrano, os diversos territories dados pela 
partrlha de 1556 aos Habsbnrgos de Viena vieram a constituir, durante 
varies seculos, urn agrupamenlo relalivamenle solido, foi porque no seu 
centro havia unl forte nueleo Que se esfor\ou por germanizar as regiOes 
perifericas. 
Tao revelndor como 0 afundamenlo do. nova Lotaringia do s~culo XV 
t 0 do. monarquia franco-inglesa, que nao p6de nascer do. Guerra dos 
Cem Anos, Em 1337, .Eduan.lo III, que tinha no continente a Guinea e 0 
Ponthieu, nao conteote com desafiar 0 seu suserano, Filipe VI, conlestou­
-Jhe a coraa de Fran<;a e rcdamou-a para SI. t: verdade que, no Tralado 
de Bret.igny, de 1360, Eduardo HI renunciou a essa coroa, mas Joao-o­
Born deu-Ihe peTto de urn ter~ da Fran\a. Sessenta anus mals tarde. 0 
Tratado de Troyes deserdava 0 delfim Cados -0 futuro Carlos VIl­
e dava em casamento, 0.0 filho de Henrique V, Catarina, filha de car­
los VI·. t'odia-sc ler (\0 texlo do tratado: ~A~ duas coroas, de Fran<;a 
e de Inglaterra, ficario juntas para sempre e pertencerao a mesma pessoa, 
a saber: nosso filho, 0 rei HenriQue, enQuanlo ele viver, e, depois dele, 
aos se.lI~ herdeiroslI, Mas, em 1453, os ingleses ja 56 tinham Calais. 
* 
~C.~I~£ao .d2~J~~.!£~'i_~2~..s..!a!_e!!.a e~nse9!lenc.jl!dQ_.!lt:KIlYDI. '!tIE~I}.~Q......~m-_T~a.-,.de UlIl.a _~Q~~i~j(e-coJlscle'l9~L().actonaI, ..da._quaL 
Joana de Arc foi comoventl: e-nobre.intt[]llt1l:... Joana eserevia em 1429 
0.0 duque de' Bedford:' «Dai a Doozela, aqui envia'da por Deus, Rei do 
Ceu, as chaves de todas as boas cidades que: teodes tornado e violado 
em Fran\a. Eu vim aqd da parte de Deus, Rei do Ceu, para os escor· 
ra\ar para fora de toda a Fran\a... E nao julgueis que mais alguma vel 
tereis de DeliS 0 reino de Fran.;a.~ 
42 
_""~"'""",,"~,_.,..< ~>~!""'Ii\~."._r~.;_ .''"'*'' ,'*Vi84iij:,"".. 
iWZtffW snM'··C".t"tfe nWe t ; ""e 'k t' '-- ,,~":",'leu' .... -, ';'-+ 'iri'tMiEti!ttiWi'MtiiPh '_ 
Iogteses e Francese$. estavam, de facto, a descobrir tude aquilo que 
os separava. 0 dito acerca do. efalsidades dos Ingleses parece ter nasctdo 
no seculo XIV E foram-Ihes ainda encoorrados outros deteuos. Jean Le 
Bel, conego de Liege (1290-1369), que de resto era revoravel a Eduardo Ill, 
nao hesitava em julgar os Jnateses «commumente invejoSQs de todos OS 
esl,rangeiros, quando estes lhea estiio acima, mesmo oos seus paJses... 
A inveja alnda nao rot morta ern Ingjaierras Cerra de 1450, rot escrito 
por urn frances 0 Debat des heraurs d'armes de France et d'Ang/elerre, 
em que os senlimenlos anti-ingleses, acumutados ao Iongo do. Guerra dos 
Cern Anos, nnharn redea solta: «A sombra da divisiio da Franca, rendes 
pilhado e perturbado este reino e fizestes inumercs males». Acusacao 
esta de que se faz eco 0 Livre de fa description des povs, de Gilles Le 
BOUVier, escrirc na mesma epoca: eEssa nao;ao (a Inglalerra) tern gentes 
creels e gentes sanguinarias.. E fazcm guerra a todos os povos do 
mundo, tanto no mar como em terra». Tambem sao cupidos, mas habeis 
roercadores. «Tudo aqu:lo que ganham nos paises estranhos onde vao, 
enviam-no para 0 seu reino. E e per isso que este e rices. 
No ja cnacc Dibal, cada urn des dois arautos husca os motives do. 
supenoridade do seu pais. 0 da Franl;a invoca a geografia e 0 clima e 
deelara ao seu rival Ingles: KO reino de rranp esta muito mals bern 
situado que 0 vosso, pols esta entre as regl5es quentes e as regi6es frias; 
as quenles, que estao para la dos monIes, sao dificcis de suportar. pelos 
geandes e eitcessivos carores; e as frias, em que vos estais, sao muito 
nocivas ao corpo humano, pois 0 Inverno come.;a Iii tao cedo e dura tanto 
lempo, que as pes~oas vivem a sofrer de frio e nao pode la crescer qua~e 
nenhllm fWlo, e 0 que cresce e mal formado e mal amadurecido. Mas em 
Fran\a, que esla eutrc ambas, e no meio e onde repousa a virtude. e 
onde 0 aT e doee e agrad:i.ve/; e lodos os frutos Ii crescem abundantem~nte 
e sao virtuosos e deliciosos, e as pessoas vivem alegremente e com mode­
ra\30, ~em demasiado calor nem demasiado Frio". Como es(amos longe do 
seculo II, quando a Inglaterra parecia aos lelrados do Ocidente uma lIAtria 
comum! Urn monge, Richard de Cluny, morto em .1188, nao Iinba pa.la­
veas 'ufjeientemente elogiosas para a lnglaterra, em cuia homa escreveu 
um poema latino: 
[l1g/a/erra, gleba fecunda, recanto fhlii do mundo...
 
[n/?lalerra, pais dM iogM. povo livre, nascido para a folia,
 
Pais (JJ?raddvel, que digo?, pars que e s6 alegria,
 
Que muLtI deve GOs Gau/eres, mas a quem II GdJia deve
 
l'udo 0 auf' ndn no de calf)'ante e de {lmtJrtivel,
 
Ao Dp!>rzl, cornrosto por urn frances em meados do seculo XV, res­
ponde, cern anos depois, 0 Debale between the heralds of Engl(Uld ami 
France de John Coke. 0 aulor insular elogia, naluralmente, pela boca do 
seu arauto, 0 que h.:i de agradavel, de valoroso e de rico em Inglaterra. 
4J
 
T P •.• ", ­
Dona Prudencla, encarregada de ajuizar, nao pede deixar de se prcnun­
cjar comra a Franca: «A minba sentence e que 0 reino de jnglaterre 
devera sec conduzido para junio da Hcnra, de preferencla A prance. e 
tomar Iugar a sua rlirerta; que vos, senhor araurc da Franca, em rcdas 
as assembleia!i ondc ncnra se deva mosrrar, rcconhecais para sempre 0 
vosso dever dando 0 Iugar ao arauro da Inglaterra.» 
No rim do seculo XVI, 0 orgulbo nacional ingJes viria a lee em 
Shakespeare urn vale genial. Em Ricardo II (cerca de 1595), Jcao de 
Gand, antes de morrer, exaua a Inglaterra: cBle augusto irono de refs, 
esta llha porta-ceptro, esra terra de majestade, estc a5senW de Marte, 
este segundo Eden, este semiparaiso. esra rortalem construida para se 
defender da tnvasao e das proezas da guerra, esta feliz raca dc hcrnens, 
esrc pequenc universe, esta pedra preciosa enga~lada num mar de pruta 
que a defendc como urna rnuralha, ou como 0 rossc protector de urn 
easteto, contra a inveja dos parses menos felizes .. ,», lsto e depois da 
derrota da InvendvcJ Armada! 
,0 que temos de coDlpreender que estA por tras das..inj~!:ji!sJ.c!;,tL~ba-
ne ro~~e das ~lP~r~~t,Ji_C:_Q~cienw de"'S{to ((os outrns. a 03 Cpoca 
do Renasdmento, sqrg~_J\~ ma~oriadQS.PQ:Vos.,.l:.UtOp""'S-Sabem jtt que 
sacnlil'erentes. Os Francescs tern reputacao de jevianos, fervenles, incons' 
tantes. No seculo XIV, Jean Le Bel asse"'era: «:, •• sempre prometerarn e 
scmpre cumpriram mal». Duzento, anos depOlS, 0 embaixador veneziano 
Marcanlonio Barbaro ddine-os assim: (Os Franceses sao naluralmenle 
brioso.'i e orgulhosos. muito audazes nas ac~Oes de guerra; por isso 0 seu 
primeiro emhate e muito difieil de aguentar ... Nos seus exercitos hi\. rnuilO 
entusiasmo e pouca ordem. Se pudessem dominar 0 seu ardor, os Fran­
ceses seriam invendveis.; mas a sua falta de ordem provem de 'lhes ser 
imposslvei suponar por muito tcmpo as fadigas e os inc6modos~. No 
sell Livre de la description des JXJYS, Gilles le Bouvier esforca-se por 
caraclerizar povos, na¢CS e provincias. Os Sui~os sao dados como {(genIe 
cruel e rude». Quanto aos Escandinavos e aos Polacos, diz ele que saO ,gente~ terriveis e furiosas, gentes sanguinarias que ferem antes ainda 
daquel que estao cheios de vinho~. Os Sicilianos sao ,grandrs crisHios 
es 
e muito ciurnentos das suas mulheres», os Napolitano! .gente grosseira 
e rude. maus cat6licos e grandcs pecadorcs». Os Caste/hanos

Outros materiais