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CAPÍTULO 5

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CAPÍTULO 5 
 
Ponto 5: Princípios do Direito do Trabalho. Princípios Constitucionais do Direito 
do Trabalho. Distinção entre Princípios e Norma. 
 
 
1. Norma, princípio e regra: 
 
 
De acordo com doutrinadores pós-positivistas, o ordenamento jurídico é composto não 
só por Regras, como também por Princípios. A Norma é gênero da qual as Regras e os 
Princípios são espécies. 
 
 Norma (gênero): 
a) Regra 
b) Princípio 
 
Diante de tal constatação, é correto afirmar que: 
 
a) Toda regra é uma norma, mas o contrário não é verdadeiro (v.g. princípio). 
b) Todo princípio é uma norma, mas o contrário não é verdadeiro (v.g. regra). 
c) Não é adequado distinguir princípio de norma, pois esta é o gênero daquele. 
d) É possível distinguir princípio de regra, os quais são espécie do mesmo gênero 
(norma). 
 
 
Apesar das regras e dos princípios derivarem do mesmo gênero, inúmeras são as suas 
diferenças sistematizadas por Rui Espinola1: 
i) grau de abstração: os princípios são normas com um grau de abstração 
relativamente elevado; de modo diverso, as regras possuem uma abstração 
relativamente reduzida; 
 
ii) grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios, por 
serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras (do legislador, 
julgador ou administrador), enquanto as regras são susceptíveis de aplicação direta; 
 
iii) caráter de fundamentalidade no sistema das fontes do direito: os princípios são 
normas de natureza ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido à 
sua posição hierárquica no sistema das fontes (ex: princípios constitucionais) ou à sua 
importância estruturante dentro do sistema jurídico (ex: princípio do Estado de Direito), 
o que não acontece com as regras; 
 
 
1ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceitos de Princípios Constitucionais – Elementos para uma 
dogmática constitucional adequada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 65. 
 
iv) proximidade da idéia de direito: os princípios são standards juridicamente 
vinculantes radicados nas exigências de justiça (Dworkin) ou na idéia de direito 
(Larenz); as regras podem ser vinculantes com um conteúdo meramente formal; 
 
v) natureza normogenética: os princípios são fundamentos das regras, isto é, são 
normas que estão na base ou constituem a ratio das regras jurídicas, desempenhando, 
por isso, uma função normogenética fundamentante. 
 
Em resumo, enquanto as regras estabelecem mandados, proibições, ou permissões de 
atuação em situações concretas previstas nas mesmas (permitindo assim uma aplicação 
mecânica); os princípios proporcionam critérios para tomar posição ante situações 
concretas indeterminadas. No conflito de regras, uma é derrogada, já no conflito de 
princípios, ocorre a ponderação, prevalecendo a aplicação de um deles no caso concreto 
 
 
1.1 Funções dos princípios: 
 
 
Os princípios possuem múltiplas funções. Baseado em um paradigma positivista, 
doutrinadores apontavam uma tríplice missão da espécie normativa. Nesta esteira, 
Américo Plá Rodriguez indica como funções dos princípios: “a) informadora: inspiram 
o legislador, servindo de fundamento para o ordenamento jurídico; b) normativa: 
atuam como fonte supletiva, no caso de ausência de lei. São meios de integração de 
direito; c) interpretadora: operam como critério orientador do juiz ou do intérprete.”2 
 
A variedade de funções demonstra a importância dos princípios, principalmente os que 
regem o Direito do Trabalho, devendo ser utilizados pelos juristas, tanto na fase pré-
jurídica, como na jurídica. 
 
Na fase pré-jurídica, também denominada de política, os princípios “atuam como 
verdadeiras fontes materiais do Direito, na medida em que postam como fatores que 
influenciam na produção da ordem jurídica.”3 Exercem a função informadora, 
orientando e influenciando os legisladores no processo de construção das regras. 
 
 
2 Américo Plá Rodriguez apresenta tais funções, tomando como base os ensinamentos de Frederico de 
Castro. (RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. Tradução de Wagner D. 
Giglio. São Paulo: LTr, 1978, p.18.). Para as provas objetivas, adotar a concepção positivista. 
3 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2005, p. 187. 
Já na fase jurídica4, após a elaboração das regras, os princípios desempenham as 
funções normativa e interpretadora. Além de atuar como proposições ideais que 
viabilizam uma direção coerente na interpretação da regra e dos institutos jurídicos, 
iluminando a compreensão dos mesmos (função interpretadora); atuam como fonte 
normativa aplicável ao caso concreto (normativa). 
 
Todavia, não é mais possível entender a função normativa como no período positivista, 
quando os princípios serviam como elemento integrador. Com o modelo pós-positivista, 
tornaram-se fonte primária de normatividade, corporificando os valores da ordem 
jurídica. Perderam o caráter supletivo, passando a ser utilizados como fonte imediata do 
Direito e aplicados a diversos casos concretos. 
 
Portanto, o princípio deve ser aplicado mesmo na hipótese de haver regra regulando o 
caso concreto, sendo desnecessária a existência de lacunas no ordenamento para a sua 
utilização. 
 
Apesar da pluralidade de funções, os princípios normalmente as exercem de forma 
cumulada. Um único princípio pode ser utilizado tanto na fase pré-jurídica, como na 
jurídica propriamente dita, influenciando os legisladores na elaboração das leis, 
servindo como norte interpretativo e como norma contida no ordenamento apta a ser 
aplicada ao caso concreto. 
 
 
2. Princípios aplicados no Direito do Trabalho: 
 
 
O Direito do Trabalho, assim como qualquer ramo jurídico, é composto de regras e 
princípios. 
 
Os princípios aplicáveis ao podem ser classificados em três classes: 
 
a) Princípios gerais do direito; 
 
4 A função informativa apesar de encontrar-se, cronologicamente, inserida na fase pré-jurídica, ou seja, na 
fase de elaboração das normas-regras, não deixa produzir efeitos jurídicos. Por esse motivo, é preferível 
acrescentar a expressão propriamente dita à denominação fase jurídica (fase jurídica propriamente dita). 
b) Princípios constitucionais trabalhistas; 
c) Princípios peculiares ao Direito do Trabalho. 
 
 
a) Princípios gerais do direito 
 
Os Princípios Gerais do Direito são valores que tendem a incorporar às diretrizes 
centrais da própria noção de Direito ou dos sistemas jurídicos contemporâneos. Por 
permear todo o ordenamento jurídico, acaba por influir em seus ramos, em especial no 
Direito do Trabalho. 
 
A sua aplicação no Direito do Trabalho, não se dá de forma incondicionada. É 
necessário conferir a sua compatibilização com os princípios e regras peculiares da 
seara trabalhista. 
 
São exemplos típicos de princípios gerais do direito utilizados no âmbito laboral: a) 
inalterabilidade dos contratos de trabalho (pacta sunta servanda); b) lealdade; c) boa-fé; 
d) não alegação da própria torpeza; e) vedação do abuso do direito; f) razoabilidade; g) 
dignidade da pessoa humana; h) proporcionalidade; i) não discriminação; j) igualdade; 
justiça. 
 
Podem estar positivados ou de forma implícita no ordenamento. Quando estiver 
expressamente na Constituição Federal, além de princípio geral do direito, também será 
considerado um princípio constitucional (ex. dignidade da pessoa humana). As 
classificações não se excluem. 
 
 
b) Princípios constitucionais trabalhistas; 
 
Os princípios constitucionais são as sínteses dos valores mais relevantes daordem 
jurídica. Podem ser classificados em: 
 
a) Princípios fundamentais: sãos os princípios constitucionais que contem 
decisões políticas estruturais do Estado; 
b) Princípios gerais constitucionais: são os princípios gerais que foram 
constitucionalizados 
c) Princípios constitucionais setoriais: são os princípios constitucionais que 
estão vinculados a certos ramos jurídicos. 
 
 
Dentre os princípios constitucionais setoriais, encontram-se aqueles que estão 
relacionados diretamente com o ramo laboral. 
 
Ao Direito do Trabalho são aplicadas as três classes de princípios constitucionais, não 
só os setoriais. 
 
São exemplos de princípios constitucionais trabalhistas: a) dignidade do trabalhador 
(art.1, III); b) valores sociais do Trabalho e da livre iniciativa (art. 1, IV e art.170); c) 
busca do pleno emprego (art.170, VIII); d) redução dos riscos a saúde (art. XXVI); e) 
liberdade individual; f) isonomia entre os empregados (art. 5 caput); g) não-
discriminação (art. 5, XXX); h) proteção contra a não contratação e dispensa arbitrárias 
ou sem justa causa; i) reconhecimento das convenções e acordos coletivos. 
 
 
c) Princípios peculiares ao Direito do Trabalho. 
 
Os Princípios Peculiares do Direito do Trabalho são linhas, diretrizes ou postulados 
que inspiram o sentido das normas trabalhistas e configuram a regulamentação das 
relações de trabalho, conforme critérios distintos dos que podem encontrar-se em outros 
ramos do direito. 
 
Não há uniformidade quanto a terminologia e a quantidade de princípios peculiares 
trabalhistas5, o que dificulta uma classificação. 
 
A classificação mais adotada é a elaborada por Américo Plá Rodriguez, a qual elenca 
como princípios peculiares do Direito do Trabalho: 
 
i) Princípio da proteção; 
ii) Princípio da irrenunciabilidade; 
 
5 Américo Plá Rodriguez, indicando a variedade das denominações conferidas aos princípios do Direito 
do Trabalho, assevera que: “entre 14 autores que abordavam alguma enumeração de princípios, havia 
podido contar 25 princípios diferentes. O mais curioso é que nenhum autor aceita mais de seis ou sete, 
havendo alguns só admitem dois ou três. Isto revela que, às vezes, se englobam vários em um só. Outras 
vezes se desdobra um em vários princípios diferentes. Alguns negam o que os outros enumeram. Outros 
se defrontam com concepções absolutamente diversas.” (RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de 
Direito do Trabalho. Tradução de Wagner D. Giglio. São Paulo: LTr, 1978, p. 25). 
 
iii) Princípio da continuidade; 
iv) Princípio da primazia da realidade; 
v) Princípio razoabilidade; 
vi) Princípio da boa-fé. 
 
 
Faz-se necessário, salientar, que na concepção de parte da doutrina, os princípios da 
razoabilidade e da boa-fé não são peculiares ao Direito do Trabalho, mas sim, 
aplicáveis a todos os ramos, uma vez que se caracterizam como princípios gerais do 
direito. 
 
I. Princípio protetor 
 
O princípio protetor é a pedra de toque do Direito do Trabalho. Tem como fundamento 
a própria essência e a razão de existir desse ramo jurídico. 
 
Diante da desigualdade fática existente entre os sujeitos da relação de emprego 
(empregado x empregador), fez-se necessário a intervenção Estatal. A produção de 
normas direcionadas a proteção das relações laborais, impôs a sua separação do Direito 
Civil, o qual era centrado na igualdade formal e na autonomia das partes. A criação de 
um ramo jurídico pautado na proteção do hipossuficiente (em regra, o empregado), teve 
como objetivo alcançar a isonomia substancial, ou seja, o equilíbrio entre a força 
econômica do empregador e a proteção jurídica atribuída ao empregado. 
 
O princípio da proteção é subdividido em três regras6, denominadas de: a) in dúbio pro 
misero ou pro operario (interpretação); b) norma mais favorável (aplicação); c) 
condição mais benéfica. (aplicação) 
 
a) Regra do in dúbio pro misero 
 
A regra do in dúbio pro misero é uma regra de interpretação. Existindo dúvida quanto a 
interpretação mais adequada ao caso concreto, deve-se adotar aquela que seja mais 
favorável ao empregado. É também conhecida como in dúbio pro operario, uma vez 
 
6 Alguns autores preferem denominá-los de princípios (Pinho Pedreira). Independentemente da sua 
qualidade de regra ou princípio, o entrelaçamento destes preceitos com o princípio da proteção é 
indiscutível. Esta vinculação que é importante ter em mente para as provas objetivas. 
 
que o empregado é, em regra, o hipossuficiente da relação jurídica de emprego7. É uma 
adaptação da regra do in dubio pro réu, utilizada no Direito Penal. 
 
Apesar da regra do in dubio misero ser explicita em alguns países (v.g Uruguai, 
Argentina, Venezuela, El Salvador, Colômbia, México, República Dominicana), no 
Brasil, a mesma encontra-se de forma implícita no mandamento da justiça social. Sua 
utilização está condicionada a existência de dúvida (pluralidade de interpretações 
razoáveis) e ao respeito à vontade do legislador. 
 
O questionamento mais freqüente quanto esta forma de interpretação, está relacionada 
com a sua aplicação no processo do trabalho. 
 
Há doutrinadores, em especial Carlos Henrique Bezerra Leite, que defendem a adoção 
desta regra no âmbito processual, por entender que o processo deve instrumentalizar o 
direito material, acabando por incorporar alguns de seus princípios. Afirmam ainda que, 
as mesmas razões de desigualdade compensatória que deram origem à aplicação desta 
regra no direito substancial, justificam a sua adoção na seara processual, uma vez que o 
trabalhador, além de estar normalmente desempregado, tem mais dificuldade em se 
desincumbir do seu ônus probatório. 
 
No entanto, existem outros juristas (v.g. José Augusto Rodrigues Pinto) que não aceitam 
a utilização de princípios do direito material no âmbito processual. Para eles, o processo 
do trabalho é um ramo do Direito Público, decorrente da Teoria Geral do Processo, 
com princípios próprios, como o da isonomia processual. 
 
 
Os sujeitos do contrato de trabalho seriam desiguais no plano fático, sendo necessária a 
aplicação dessa face do princípio da proteção. No entanto, esses sujeitos ao ajuizar uma 
reclamação trabalhista passariam a ser parte processual, com igualdade jurídica e 
 
7 A singularidade desta regra de interpretação consiste na inversão da diretriz geral do Direito Privado de 
favorecer o devedor quando da hipótese de dúvida interpretativa. Se o Direito Privado aceita o princípio 
do favor pro reo é porque, na generalidade das relações civis ou comerciais, o devedor é mais débil e 
necessitado. Mas nas relações de trabalho ocorre exatamente o contrário, porquanto a generalidade dos 
casos o trabalhador, cuja situação em face do empregador constitui pressuposto básico do Direito do 
Trabalho, se apresenta como credor diante de seu empregador (devedor) (SILVA, Luiz Pinho Pedreira de. 
Principiologia do Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1999.p. 30). 
 
proteção do Estado-Juiz. No processo, por serem iguais, as partes teriam o mesmo 
tratamento, sob pena de ferir o equilíbrio já estabelecido no plano processual e a 
imparcialidade do julgador. 
 
É valido ressaltar que grande parte da doutrina não aceita a aplicação da regra do in 
dúbio pro misero no campo probatório, pois este já possui regras próprias de 
julgamento. Na hipótese de dúvida, devem ser aplicadas as regras do ônus da prova, 
estabelecidas no arts. 818 da CLT e 333 do CPC, bem como na súmula nº 6, VI do TST. 
 
O empregado possuindo dificuldade em se desincumbir do ônus probatório,em face da 
sua hipossuficiencia, poderá pleitear a inversão do ônus da prova, consubstanciado nas 
normas consumeristas, aplicadas supletivamente ao direito processual do trabalho. 
 
Os Tribunais do Trabalho têm adotado o entendimento doutrinário majoritário: 
 
TRT-PR-04-03-2005 PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO OPERARIO- 
ALCANCE-APLICAÇÃO. 
O princípio do In Dubio Pro Operario, corolário do Princípio da Proteção, 
aplica-se no âmbito de interpretação das normas de direito material do 
trabalho. No entanto, não tem aplicação no plano processual, onde as 
partes são tratadas sem qualquer distinção (à exceção das hipóteses 
legamente previstas). (TRT-PR-03736-2003-005-09-00-3-ACO-05409-2005, 
Relator: SERGIO MURILO RODRIGUES LEMOS, Publicado no DJPR em 
04-03-2005). (TRT 8º, 2005). 
 
TST - RR - 2554/2001-003-02-00 - DJ - 03/03/2006 - PROVA ORAL 
CINDIDA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PERSUASÃO RACIONAL 
DO ARTIGO 131 DO CPC EM DETRIMENTO DA APLICAÇÃO DAS 
REGRAS DO ÔNUS SUBJETIVO DA PROVA. 
I - Malgrado o Regional bem se orientasse sobre a inaplicabilidade do 
duvidoso princípio do in dubio pro operario, na hipótese de a prova oral 
se mostrar contraditória, não se houve com acerto ao adotar a tese de que 
nessa circunstância impõe-se priorizar a aplicação das regras do ônus 
subjetivo da prova. [...]. Recurso provido.”(TST, 2006). (grifo nosso) 
 
 
Por fim, há de ressaltar que parte da doutrina majoritária vem aceitando a aplicação da 
regra do in dubio pro operário, apenas na hipótese de “prova empatada”, isto é, quando 
ambos os litigantes se desincumbiram do seu ônus probatório, mas mesmo assim, 
restou-se dúvida quanto à valoração das provas. 
 
Diversas vezes julgamos casos em que nos defrontamos com “prova 
empatada”, isto é, em que não houve negligência do empregado, pois 
desincumbiu-se do seu ônus, levando a juízo testemunhas no mesmo número 
e de credibilidade igual às apresentadas pela parte contrária `a das 
testemunhas do trabalhador, em processos nos quais não havia possibilidade 
de outra espécie de prova. Pelas maiores dificuldades com que arca o 
empregado para a produção de provas, numa situação como esta, a dúvida 
gerada no espírito do julgador há de ser dirimida pro operario e foi sempre 
nesse sentido nosso pronunciamento8. 
 
Outro debate travado pelos juristas é quanto a aplicação da regra do in dubio pro 
operário no âmbito do Direito Coletivo do Trabalho. O dissenso se justifica em razão 
do princípio da equivalência dos contratantes em matéria de Direito Coletivo, o que 
afasta o componente da debilidade e, conseqüentemente a adoção da regra do in dubio 
pro misero.9 
 
 
b) regra da aplicação da norma mais favorável 
 
 
A regra da aplicação da norma mais favorável ganha relevo no contexto de pluralidade 
de fontes do Direito do Trabalho, pois esta consiste no procedimento de opção pela 
norma mais vantajosa ao obreiro quando, para uma mesma situação, encontram-se 
vigentes mais de uma norma jurídica. Ou seja, havendo pluralidade de normas, com 
vigência simultânea, aplicáveis à mesma situação jurídica, deve-se optar por aquela 
mais favorável ao trabalhador. 
 
Assim, não se deve confundir a regra do in dúbio pro misero, que é adotada no processo 
de interpretação, com a regra da aplicação da norma mais favorável, que é utilizada no 
processo de aplicação. Neste último, não há uma única norma com diversas 
interpretações aplicáveis ao caso concreto, mas sim, diversas normas regulando o caso 
concreto, em sentidos diferentes, devendo jurista adotar aquela que seja mais benéfica 
ao empregado. 
 
É comum se afirmar que esta regra é utilizada como critério para estabelecer a 
hierarquia flexível das normas trabalhistas, prevalecendo, no caso concreto, a norma 
mais favorável, desde que a superior não seja proibitiva. 
 
8 SILVA, Luiz Pinho Pedreira de. Principiologia do Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1999. p. 58. 
9 Murilo Sampaio ressalta que a equivalência entre os entes coletivos brasileiros é apenas formal. A noção 
de equivalência dos contratantes, além de não se materializar na realidade social brasileira em virtude do 
contexto de crise do Direito do Trabalho, limita-se apenas ao momento da elaboração da norma 
(negociação coletiva). Na oportunidade de sua interpretação, o que ocorre normalmente no conflito 
individual demarcado pela hipossuficiência, há que se, na dúvida, conferir interpretação mais favorável ao 
obreiro, tornando válida o princípio in dubio pro operario em matérias de normas autônomas. 
 
No entanto, em analise mais apurada, a regra da norma mais favorável não afeta a 
hierarquia das normas, mas a preleção de sua aplicação; não modifica a ordem rigorosa 
em que as normas se colocam e que tem seu ápice na Constituição, mas que, com 
respeito a essa hierarquia e sem alterá-la, determina qual, em caso de coexistência e 
colisão de normas, deve ser aplicada no caso concreto, sendo esta a mais proveitosa para 
o trabalhador10. 
 
Produzindo efeito apenas na aplicação e não na determinação da hierarquia das fontes, 
não é adequado atribuir ao processo de determinação da norma mais favorável a 
derrogação – no sentido da invalidade – da norma preterida. Tem-se apenas uma eleição 
pontual e momentânea para o caso em discussão, porque a subsunção do caso concreto à 
norma inferior mais favorável não derroga a norma superior menos favorável, que 
continua a reger as hipóteses para as quais não seja pertinente a primeira.11 
 
Portanto, quando uma norma inferior excluir direitos sociais previstos em norma 
superior, aquela deverá ser declarada inconstitucional ou ilegal, bem como, ser excluída 
do ordenamento jurídico. Nesta hipótese, não haverá a adoção da teoria da hierarquia 
flexível das normas trabalhistas, mas sim os critérios da revogação ou da não recepção. 
 
Um dos questionamentos relacionados à regra em questão reside no método adequado 
de determinação da norma mais favorável. Os principais são: a) do conglobamento; do 
conglobamento por instituto e; c) da acumulação ou atomista. Para um estudo sobre o 
tema, remetemos os leitores para o Capítulo 3, item 2. 
 
 
c) regra de observância da condição mais benéfica 
 
 
A regra de observância da condição mais benéfica também é considerada uma regra de 
aplicação. Existindo uma situação já concretamente estabelecida pela norma 
preexistente, deve prevalecer sobre a que vier a ser criada pela nova norma, desde que a 
situação anterior já tenha sido reconhecida e se mostre mais favorável ao 
hipossuficiente. 
 
10 SILVA, Luiz Pinho Pedreira de. Principiologia do Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1999. p 70. 
11 SILVA, Luiz Pinho Pedreira de. Principiologia do Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1999. p. 72. 
 
É, portanto, uma regra de aplicação intertemporal. E justamente, por ser aplicado em 
hipóteses de sucessão normativa, que esta regra se distingue das anteriores. 
 
Na regra do in dubio pro operario, tem-se uma única norma frente a uma pluralidade de 
interpretações. Na regra da norma mais favorável, a pluralidade aloca-se nas fontes, 
havendo mais uma norma vigente relativa ao caso concreto, que a colidem entre si. 
Enquanto que na regra da condição mais benéfica, há pluralidade de normas no processo 
de sobreposição temporal (sucessão). Daí o entendimento de que o princípio da 
condição mais benéfica resolve o fenômeno de direito transitório ou intertemporal12 
 
Por estar atrelada à eficácia temporal das normas trabalhistas, remetemos o leitor ao 
Capítulo 5, item 1.4.4, para o estudo da teoria da aderência irrestrita (ou da 
ultratividade), a qual melhor se adéqua com a presente regra.II. Principio da continuidade da relação de emprego 
 
 
A relação de emprego é a categoria jurídica básica do Direito do Trabalho. É dessa 
relação jurídica que o empregado subtrai a sua remuneração, fonte de subsistência 
individual e familiar. Não deve possuir natureza efêmera, mas sim resistir no tempo. 
 
A durabilidade do vínculo empregatício não só interessa ao obreiro, mas também ao 
Estado (interesse social), uma vez que gera estabilidade nas relações produtivas, 
implicando em maior harmonia social. 
 
Teoricamente, a durabilidade do contrato de trabalho interessa ao Estado, ao 
Trabalhador e até ao empregador. Tanto o empregado como o empregador deveriam 
satisfazer-se com uma pactuação demorada, incidindo maior fidúcia, intimidade, 
produtividade, enfim, acarretando vantagens recíprocas às partes.13 
 
 
12 SILVA, Luiz Pinho Pedreira de. Principiologia do Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1999. p. 90. 
13 DUARTE NETO, Bento Herculano. Manual de Direito do Trabalho. Estudos em Homenagem a 
Cássio Mesquita Barros Júnior (Coord), São Paulo, LTr, 1988, p. 134. 
 
Em face dos benefícios atrelados à durabilidade do contrato de trabalho, de ordinário, os 
mesmos são pactuados por prazo indeterminado, sendo admitida, excepcionalmente, a 
sua celebração por prazo determinado. 
 
O princípio da continuidade da relação de emprego faz presumir que todo contrato de 
trabalho é por prazo indeterminado. As exceções a essa regra são mitigações ao referido 
princípio fruto da flexibilização trabalhista. Estão previstas em lei e devem ser provadas 
em juízo, sob pena de serem aplicadas a estas hipóteses excepcionais as regras previstas 
para o contrato por prazo indeterminado. 
 
O TST consagra o princípio da continuidade da relação de emprego na sua súmula nº 
212: 
 
DESPEDIMENTO. ÔNUS DA PROVA (mantida) - Res. 121/2003, DJ 
19, 20 e 21.11.2003 
O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a 
prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da 
continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao 
empregado. 
 
A adoção do FGTS como regime obrigatório e da indenização compensatória (art. 7º, I, 
da CF/88), também deve ser considerada como uma mitigação ao principio em questão, 
uma vez que converteu a dispensa sem justa causa num mero ato potestativo do 
empregador. 
 
III. Princípio da primazia da realidade. 
 
 
Em regra, o contrato de trabalho é consensual e informal. Consensual, pois não 
necessita de qualquer formalidade, bastando o consentimento das partes para se formar. 
Informal, pois não é necessária solenidade para sua celebração, salvo nos contratos 
especiais em que a lei exigir. 
 
Por ser consensual e informal, é comum haver divergência entre as condições ajustadas 
para a relação de emprego e as verificadas em sua execução. Nessas hipóteses, deverá 
prevalecer a realidade dos fatos, já que existe uma primazia da realidade sobre os fatos. 
 
No entanto, é valido ressaltar que, para que haja a prevalência dos fatos sobre o 
formalizado, é necessária a produção de provas, não bastando a simples alegação, como 
pode ser observado na súmula nº 12 do TST: 
 
Nº 12 CARTEIRA PROFISSIONAL (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 
20 e 21.11.2003 
As anotações apostas pelo empregador na carteira profissional do empregado 
não geram presunção "juris et de jure", mas apenas "juris tantum". 
 
 
No Direito do Trabalho, o princípio da primazia da realidade é utilizado para combater 
as tentativas de fraudes, em especial, a de mascarar a relação de emprego existente. O 
artigo 9 º da CLT, cominado com o referido princípio, caracteriza-se como uma das 
munições que o magistrado do trabalho possui no combate às fraudes trabalhistas, 
podendo ser aplicada em qualquer fase contratual (pré-contratual, contratual e pós-
contratual). 
 
 
IV. Princípio da irrenunciabilidade 
 
Entende-se o principio da irrenunciabilidade como a inviabilidade técnico-jurídica de 
poder o empregado despojar-se, por sua simples manifestação de vontade, das 
vantagens e proteções que lhe asseguram a ordem jurídica e o contrato. 
 
Os direitos trabalhistas são indisponíveis. Essa característica dos direitos laborais tem 
fundamento na desigualdade existente entre empregado e empregador. Não possível dar 
liberdade enquanto não houver igualdade. 
 
Apesar de alguns doutrinadores adotarem a terminologia princípio da 
irrenunciabilidade, o termo mais adequado é princípio da indisponibilidade, já que este 
a transação e renúncia. 
 
A transação é a concessão recíproca de direitos incertos. Por existir res dúbia na 
transação, cada uma das partes cede um pouco. Já na renuncia há a abdicação de um 
direito certo por apenas uma das partes. 
 
A indisponibilidade dos direitos trabalhistas não é absoluta. É possível transacionar 
bens relativamente disponíveis. Já a renúncia é vedada pelo ordenamento jurídico. 
 
Podemos assim concluir: é vedado renunciar, bem como transacionar bens 
absolutamente indisponíveis, bens considerados patamar civilizatório mínimo (direitos 
fundamentais, normas constitucionais, normas internacionais), salvo as hipóteses de 
flexibilização autorizadas pela própria constituição, por meio de negociação coletiva 
(art. 7, incisos VI, XIII, XVI da CF/88). Só é possível transacionar bens relativamente 
indisponíveis. 
 
Essa conclusão pode ser observada na Súmula 437 do C. TST: 
 
SÚM 437 DO TST - INTERVALO INTRAJORNADA PARA 
REPOUSO E ALIMENTA-ÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 71 DA 
CLT (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 307, 342, 
354, 380 e 381 da SBDI-1) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 
25, 26 e 27.09.2012 
[...] 
II - É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho 
contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada 
porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do 
trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 
7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva

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