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Histeria no Brasil

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(...) M. J. , 29 anos, branca, brasileira, casada, internada na casa de Saúde Dr. Eiras em 27 de maio de 1896. M J. foi submetida à observação do 
Dr. Vicente Maia que a diagnosticou como histero-epilética. Antecedentes pessoais: vivacidade precoce durante a infância, teve suas primeiras 
manifestações histéricas e epiléticas aos 14 anos, quando menstruou pela primeira vez. A partir dos 21 anos, depois de ter casado, apresentou 
sensíveis melhoras do estado psicopático, revelando extrema dedicação ao marido, ao qual, contudo, repudiaria mais tarde abandonando o lar 
doméstico e entregando-se sucessivamente a três homens de baixa classe. (...) Nos três primeiros dias posteriores a sua internação apresentava-se 
muito loquaz, exaltada, relatando, em linguagem demasiado livre, os seus amores e lamentado a ausência do marido; exigia a sua liberdade e 
denunciava as condições do estabelecimento no qual estava internada. Além disso, a punição representada pela internação não foi suficiente para 
que ela mudasse seu comportamento. Continuando a dar livre vazão a seus sentimentos e desejos, lançando olhares libidinosos, fazendo sinais 
convencionais e escrevendo cartas a um doente que via de longe, durante os passeios pelo jardim, o que lhe vale o rótulo de ninfomaníaca. 
Segundo o Dr. Cândido Andrade, M. J. apresenta alguns distúrbios uterinos, por isso a submeteu a uma cirurgia de curetagem, após a qual ela 
passou a ter uma menstruação normal. Mas, o mais curioso é que a cirurgia uterina teria produzido outros efeitos. M. J. se revelou em fins de 
agosto nervosa e excitada, pela falta da visita do marido que julga seu único amparo. Em 2 de setembro de 1896 ela recebeu alta, assim, para o 
Dr. Vicente Maia, o resultado da operação foi lisonjeiro sob o ponto de vista mental, já que M. J. saíra da Casa de Saúde Dr. Eiras curada. Algum 
tempo depois, contudo, tendo recrudescido as suas perturbações psíquicas, M. J. foi recolhida ao Hospital Nacional de Alienados, onde veio a 
falecer. (...) [ os dados sobre M. J. foram extraídos da ficha de observação da paciente, reproduzida pelo Dr. Urbano Garcia na tese que 
apresentou à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, em 16 de abril de 1901, “Da intervenção cirúrgico-ginecológica em alienação 
mental ] 
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(...) A mulher tem mais pureza que o homem. E tem também mais ternura, que é a máxima do altruísmo. Tem mais apego, mais veneração e mais 
bondade, isto é, mais amor. Instintos são estes de obediência, porque amar é obedecer, é preferir à vontade própria a vontade alheia; é gozar a 
felicidade de ver os outros felizes; é saborear o encanto de ver os outros satisfeitos. (...) para ter uma vida de obediência contínua, com alegria, é 
preciso possuir uma organização privilegiada. Quanta obediência, e quanta sublimidade não é mister para ser mãe! (...) servi-lo ( ao filho ) como 
uma escrava submissa. ( ... ) [ Raul Teixeira Mendes, Trechos de uma conferência, 1908 ] 
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“Amo a noite, o silêncio, a harmonia do mar, amo a hora do meio-dia, o crepúsculo mágico da tarde, a brisa aromatizada da manhã (...) amo o 
afeto de uma mãe querida, as amigas (...) e amo a Deus; e ainda assim não sou feliz, porque o insondável me segue, me acompanha, esse querer 
indefinível ... [ Anotações de um ‘caderno goiabada1’ de Maria Firmina dos Reis, Maçarico – Maranhão em 1847 ] 
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(...) A confecção de enxovais, iniciada aos doze anos de idade das meninas, com peças de linho mandadas bordar e guardar em papéis de seda em 
baús ... os conselhos amigáveis da mãe experiente para que a moça tivesse um comportamento moderado e repleto de solicitude, “para poder 
casar”, inculcavam na vida feminina a noção da valorização da vida matrimonial e, ao mesmo tempo, imprimiam-lhe uma profunda angústia, caso 
ela não viesse a contrair casamento antes dos 25 anos de idade (...) [ Miridan Knox Falci, Da necessidade de casar ] 
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(...) A maternidade era vista como a verdadeira essência da mulher, inscrita em sua própria natureza. Somente através da maternidade a mulher 
poderia curar-se e redimir-se dos desvios que, concebidos ao mesmo tempo como causa e efeito da doença, lançavam-na muitas vezes nos lodos 
 
1 “Caderno goiabada” era o nome dado ao livro de receitas das donas-de-casa dos séculos XVIII e XIX, que acabavam fazendo do livro seu diário. 
do pecado. Mas, para a mulher que não quisesse ou não pudesse realizá-la – aos olhos do médico, um ser físico, moral ou psiquicamente incapaz 
– não haveria salvação e ela acabaria, cedo ou tarde, afogada nas águas turvas da insanidade. (...) [ Magali Engel, Maternidade e Loucura ] 
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Dez mandamentos da mulher: 
1. Amai a vosso marido sobre todas as coisas. 6. Não o enganeis. 
2. Não lhes jureis falso. 7. Não lhe subtraias dinheiro, nem gasteis este com futilidades. 
3. Preparai-lhe dias de festa. 8. Não resmungueis, nem finjais ataques nervosos. 
4. Amai-o mais do que a vosso pai e a vossa mãe. 9. Não desejeis mais do que um próximo, e que este seja o teu marido. 
5. Não o atormenteis com exigências, caprichos e amuos. 10. Não exijais luxo e não vos detenhais diante das vitrines. 
 
Estes dez mandamentos devem ser lidos pelas mulheres doze vezes por dia, e depois ser bem guardados na caixinha de toillete. [ Jornal do 
Comércio, 1888 ]

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