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A responsabilidade civil do acionista controlador por dano ambiental.

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SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL 
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO 
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL 
Faculdade de Direito - FADIR 
GUILHERME BURZYNSKI DIENES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ACIONISTA CONTROLADOR 
POR DANO AMBIENTAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CAMPO GRANDE/MS 
JUNHO/2012
 
 
 
SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL 
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO 
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL 
Faculdade de Direito - FADIR 
GUILHERME BURZYNSKI DIENES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ACIONISTA CONTROLADOR 
POR DANO AMBIENTAL 
 
 
 
Trabalho final de graduação apresentado 
como requisito para colação de grau no 
Curso de Graduação em Direito da Faculdade 
de Direito da Universidade Federal de Mato 
Grosso do Sul, sob a orientação do Prof. Me. 
Alexandre Lima Raslan. 
 
 
 
 
 
 
CAMPO GRANDE/MS 
JUNHO/2012
3 
 
 
 
 
 
 
TERMO DE APROVAÇÃO 
 
 
A Monografia intitulada: “A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ACIONISTA 
CONTROLADOR POR DANO AMBIENTAL.”, apresentada por GUILHERME 
BURZYNSKI DIENES, RGA 2006.2002.086-8, como exigência parcial para a obtenção do 
título de Bacharel em Direito à Banca Examinadora da Universidade Federal de Mato Grosso 
do Sul, obteve nota _______ para aprovação. 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
 
 
Professor Me. Alexandre Lima Raslan 
Presidente 
 
 
 
Professor 
Examinador 
 
 
Professor 
Examinador 
 
 
Campo Grande/MS, ______de Julho de 2012. 
 
 
4 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico à minha mãe e à Marina Torrecilha 
pelo apoio incondicional e dedicação que 
tiveram comigo ao longo dos anos. 
 
 
 
5 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Agradeço inicialmente a minha mãe Maria Rosa Burzynski, que sempre me apoiou ao longo 
dessa extenuante e recompensadora jornada durante o curso do Direito e ao longo de todos os 
momentos, sejam eles alegres ou difíceis, sempre esteve ao meu lado me ajudando e guiando. 
Nas vezes em que tudo parecia perdido, ajudou-me incessantemente a levantar e continuar a 
caminhada, e me ensinou a não fugir dos problemas. 
 
Agradeço à Marina Torrecilha por todo o tempo que passamos juntos e por sempre me 
motivar a continuar me empenhando e estudando. O acaso fez com que nos conhecêssemos, 
mas a sua graça fez com que o encantamento inicial perdurasse até hoje. 
 
Agradeço a todos os professores que tive durante os tempos de escola, em especial a dois 
professores que tive em meu terceiro ano: Isali Dinaísa Lins de Oliveira, que com suas lições 
e aulas que se muito assemelhavam à poesia fez com que aprendesse a linguagem portuguesa 
escorreita em pouquíssimo tempo, mas de forma duradoura e muito significativa e Geraldo 
Fontana, que trazia alegria e conhecimento aos alunos lecionando sobre a história dos povos e 
a geografia, tornando fatos tão antigos em acontecimentos vivos na sala de aula. 
 
Agradeço especialmente ao meu orientador professor Me. Alexandre Lima Raslan pela 
disponibilidade e disposição em ajudar e aconselhar. Pela paciência para responder aos e-
mails e receber em reuniões e especialmente pela confiança em permitir a conclusão da 
monografia. Suas lições inspiradoras na seara do direito ambiental foram o grande incentivo 
para que eu enfrentasse o tema deste trabalho. 
 
Agradeço especialmente a todos os professores que tive no decorrer do curso de Direito da 
UFMS, em especial às aulas magistrais do prof. Jully Heyder quando nos lecionava processo 
civil sempre acompanhadas de sua risada marcante e acalentadora, do prof. Carlos Anzoategui 
6 
 
 
 
 
Neto que com raciocínio claro e coerente fez com que nos aprofundássemos no estudo do 
Direito Constitucional, e do prof. Fabrício Martins Rocha pelas suas valiosas lições na área de 
processo penal, que muito me auxiliaram para a maior compreensão dessa matéria. 
 
Agradeço por fim aos meus colegas de sala de aula, em particular ao meu amigo Sérgio da 
Silva Maciel, que me acompanhou durante todo o curso, que igualmente relutou em continuar, 
mas ainda assim mudou de ideia e continuou a se aplicar e que hoje luta por um futuro 
promissor. Os problemas durante o curso apareceram, mas conversando aprendemos a dar 
risada deles. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“É provavelmente muito cômodo 
esperar que um grande Zelador do 
Ecossistema venha à Terra e 
corrija os nossos abusos 
ambientais. Cabe a nós a tarefa. 
Não deve ser tão difícil assim. Os 
pássaros – cuja inteligência 
tendemos a denegrir – sabem o que 
fazer para não sujar o ninho. Os 
camarões, com cérebros do 
tamanho de partículas de fiapos, 
sabem o que fazer. As algas 
sabem. Os microorganismos 
unicelulares sabem. Já é hora de 
sabermos também”. 
(SAGAN, Carl. Bilhões e Bilhões: 
reflexões sobre a vida e a morte na 
virada do milênio. São Paulo: 
Schwarcz, 1998. P. 63). 
 
 
 
 
8 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
 
O presente trabalho tem como foco principal o estudo das esferas de poder da sociedade 
anônima contemporânea, analisando, em particular, se é possível a responsabilização do 
acionista controlador pelo ressarcimento do dano ambiental gerado por sua companhia. O 
estudo faz um histórico sistemático da evolução das sociedades anônimas, desde o seu 
surgimento até a sua disseminação como a principal forma societária para financiar grandes 
empreendimentos, e a respectiva evolução legislativa delas na legislação brasileira, 
ressaltando para as formas de responsabilização dos seus poderes gestores. Trata de analisar 
os deveres imputados ao controlador com fim de mitigar as possíveis distorções que o seu 
poder de supremacia na assembleia geral poderia causar na empresa, na economia e na 
sociedade, definindo o teor da regulação principiológica feita pelo art. 116, parágrafo único, 
da lei 6.404/76, principalmente quanto à composição do interesse social e a função social da 
empresa. Para definir esta, trata de fazer uma análise sistemática dos princípios que regem a 
ordem econômica, consubstanciados no art. 170 da Constituição Federal de 1988, em 
conjunto com a análise da função social dos bens de produção. Aborda com grande apreço o 
instituto da responsabilidade civil objetiva aplicado no direito do ambiente, delineando os 
seus princípios e requisitos para a caracterização, à luz da doutrina. Disserta por fim sobre a 
aplicação à figura do acionista controlador, questionando se ele poderia ser considerado como 
um poluidor indireto, caso contribua para a superveniência do desastre ambiental, na 
inteligência do art. art. 3º, inciso IV, da lei 6.938/81. 
 
PALAVRAS-CHAVE: sociedade anônima, acionista controlador, dano ambiental, 
responsabilidade civil, poluidor indireto. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
9 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 11 
CAPÍTULO 1 ........................................................................................................................... 13 
1 O CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS 13 
1.1 CONCEITO DE SOCIEDADE ANÔNIMA ..............................................................13 
1.2 A SOCIEDADE ANÔNIMA NA ANTIGUIDADE ATÉ A REVOLUÇÃO 
COMERCIAL ................................................................................................................... 13 
 1.2.1 A SOCIEDADE MARÍTIMA E O SURGIMENTO DAS 
COMPAGNIAS.................................................................................................................15 
 1.2.2 A DELIMITAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES E A CRIAÇÃO DA 
SOCIEDADE EM COMANDITA....................................................................................18 
 1.2.3 APARECIMETO DAS PRIMEIRAS SOCIEDADES POR AÇÕES E SEU 
DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO.............................................................................19 
1.3 O INÍCIO DA REGULAÇÃO DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS NO BRASIL...24 
 1.3.1 O DECRETO-LEI 2.627/1940..........................................................................27 
 1.3.2 A LEI 6.404/76..................................................................................................32 
CAPÍTULO 2 ........................................................................................................................... 35 
2 O PODER DE CONTROLE NA LEI DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS ...................... 35 
2.1 DEVERES DO ACIONISTA CONTROLADOR ...................................................... 37 
2.1.1 A DEFINIÇÃO DO INTERESSE SOCIAL ..................................................... 38 
 2.1.1.1 A TEORIA CONTRATUALISTA....................................................38 
 2.1.1.2 A TEORIA INSTITUCIONALISTA................................................41 
2.1.2 O RESPEITO AO INTERESSE DA COMUNIDADE COMO UM DEVER 
FIDUCIÁRIO DO CONTROLADOR ....................................................................... 46 
2.1.3 O PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA..................................48 
10 
 
 
 
 
CAPÍTULO 3 ........................................................................................................................... 56 
3 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ACIONISTA CONTROLADOR POR DANO 
AMBIENTAL ....................................................................................................................... 56 
3.1 PRINCÍPIOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL ........................... 56 
 3.1.1 PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO.......................................................................56 
 3.1.2 PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR......................................................60 
 3.1.3 PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL..................................................62 
3.2 CONSIDERAÇÕES SOBRE A RESPOSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL E 
PRESSUPOSTOS PARA A SUA OCORRÊNCIA ......................................................... 63 
 3.2.1 EVENTO DANOSO.........................................................................................67 
 3.2.2 NEXO DE CAUSALIDADE............................................................................68 
3.3 A APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL 
AMBIENTAL AO ACIONISTA CONTROLADOR ...................................................... 69 
CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 77 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 80 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 
 
 
 
 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
 
Analisaremos neste trabalho o motor da economia mundial: a importância da sociedade 
anônima ultrapassa a mera captação de recursos para os grandes empreendimentos. Podemos 
ver sua contribuição crucial, por exemplo, na geração de empregos que pode ser demonstrada 
pela pesquisa citada no Capítulo 2, item 2.1.3, que afirma que no ano de 2002 as micro e 
pequenas empresas correspondiam a 99,2% da totalidade das empresas formais do respectivo 
ano e empregavam 57,2% dos trabalhadores com carteira assinada, ao passo que as sociedades 
de médio e grande porte representavam 0,8% do total das empresas, mas possuíam 42,8% do 
total dos empregados. 
 
Não somente lidando com a vida e o bem estar dos trabalhadores, a companhia envolve uma 
gama de interesses que abrange o interesse dos consumidores, dos próprios sócios e 
principalmente da comunidade, que vê seus recursos naturais muitas vezes vertidos para os 
grandes empreendimentos, o que gera uma série de benefícios tanto para a população quanto 
para as empresas que os utilizam, mas gera igualmente um risco para o meio ambiente que 
deve ser previamente avaliado pela empresa. 
 
No topo do poder econômico da sociedade anônima encontramos a figura do acionista 
controlador, criada pela lei 6.404/76, sobre a qual discorreremos no segundo capítulo. Ele 
possui a supremacia dentro da empresa, ditando os rumos e as estratégias que deverão ser 
tomadas por ela para ter sucesso em seus empreendimentos. 
 
Este poder soberano, legitimado pela legislação, possui uma série de deveres, que 
abordaremos no título 2.1 do segundo capítulo, dentre eles o de atender lealmente aos 
interesses da comunidade, consubstanciado no art. 116, parágrafo único, da lei das sociedades 
anônimas, bem como o de fazer cumprir a função social da empresa. 
12 
 
 
 
 
 
Dentre os interesses da comunidade a serem resguardados, podemos destacar o interesse 
difuso de se ter um meio ambiente equilibrado, disposto no caput do art. 225 da Constituição 
Federal de 1988. 
 
Ante a estes deveres inescusáveis, tentaremos observar o verdadeiro teor destes, e se de fato, 
ante a legislação ambiental, comercial e civil que abrange o tema, há ou não a possibilidade 
de se responsabilizar o acionista controlador por danos ao meio ambiente gerados pela 
companhia. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
13 
 
 
 
 
 
 
 
CAPÍTULO 1 
 
 
1 O CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DAS SOCIEDADES 
ANÔNIMAS 
 
1.1 CONCEITO DE SOCIEDADE ANÔNIMA 
 
Antes de nos debruçarmos sobre o tema deste capítulo e tentarmos identificar o surgimento 
das sociedades anônimas e contextualizá-las devemos ter uma plena noção do objeto a ser 
pesquisado. Para definí-la, utilizaremos o conceito de Fábio Ulhoa Coelho
1
, que leciona que: 
 
 a sociedade anônima, também referida pela expressão ‘companhia’, é a 
sociedade empresária com capital social dividido em ações, espécie de valor 
mobiliário, na qual os sócios, chamados acionistas, respondem pelas 
obrigações sociais até o limite do preço de emissão das ações que possuem. 
 
Valor mobiliário, por sua vez, trata-se de um instituto jurídico que por vezes se assemelha aos 
títulos de crédito, tendo em vista que quem possui uma ação de uma empresa é credor desta 
quanto aos seus dividendos, mas se diferencia por serem os direitos titularizados muito mais 
amplos, e por possuírem os seus titulares deveres também
2
. 
 
1.2 A SOCIEDADE ANÔNIMA NA ANTIGUIDADE ATÉ A REVOLUÇÃO 
COMERCIAL 
 
A história do comércio sempre foi permeada por sociedades mercantis. Em Roma havia 
 
1
 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. P. 67. Vol. 2. 
2
 Ibidem, P. 68. 
14 
 
 
 
 
sociedades comerciais cujas atividades se estendiam a todo Meditarrâneo
3
. Amador Paes de 
Almeida cita que certos autores consideram a Societates vectigalium ou Societates 
publicanorum como a origem das sociedades anônimas
4
.Estas sociedades eram dotadas de personalidade jurídica e “arrendatárias dos tributos devidos 
ao Estado, fornecedoras de gêneros ao povo e ao exército, encarregadas da construção de 
obras públicas”5. 
 
João Eunápio Borges afirma que elas se assemelham mais à sociedade de comandita por 
ações, mas, certamente, contribuíram para a formação do moderno conceito de sociedade por 
ações, tendo em vista que “era claramente distinta a qualidade de sócio da de participante e os 
títulos de participação (imitando as ações) eram transferíveis a terceiros”6. 
 
Para Fernand Braudel existem três gerações de sociedades que evoluíram expressivamente 
desde o período medieval, com a retomada do comércio, até a idade moderna, podendo ser 
classificadas entre as sociedades gerais, as sociedades em comandita e as sociedades por 
ações
7
. 
 
Tentaremos focar as discussões no período compreendido entre os séculos X e XIX, marcado 
pelo fim do feudalismo, onde havia uma economia de subsistência, a maioria dos produtos era 
manufaturada pelos servos dos senhores feudais e a terra representava a riqueza. Também será 
considerado o início do mercantilismo, onde podemos observar um comércio em expressiva 
evolução, uma contínua inovação dos arcabouços legais tanto para fomentar e viabilizar o 
comércio quanto para instituir monopólios e privilégios a poucas empresas e corporações. 
 
 
 
3
 BRAUDEL, Fernand. Civilização Material, Economia e Capitalismo Séculos XV-XVIII: Os Jogos das Trocas. 
São Paulo: Martins Fontes, 1998. P. 383. Vol. 2. 
4
 ALMEIDA, Amador Paes de. Manual das Sociedades Comerciais. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007. P. 165. 
5
 BORGES, João Eunápio. Curso de Direito Comercial Terrestre. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1967. P. 359. 
6
 Ibidem, P. 360. 
7
 BRAUDEL, Fernand, Op. Cit., 1998, P. 391. 
15 
 
 
 
 
A maior parte das trocas na Europa era realizada mediante o comércio marítimo, tendo em 
vista que a maioria das estradas estavam em péssimas condições e “eram frequentadas por 
duas espécies de salteadores - bandidos comuns e senhores feudais que faziam parar os 
mercadores e exigiam que pagassem direitos para trafegar em suas estradas abomináveis”8. 
 
As Cruzadas consistiam em um grande estímulo ao comércio, uma vez que os que viajavam a 
Europa para lutar precisavam de provisões e conforme progrediam no caminho para a terra 
santa os mercadores os acompanhavam
9
. Posteriormente, após as conquistas, os cruzados 
voltavam aos seus países com gostos pelas especiarias, roupas e produtos exóticos com que 
tiveram contato no Oriente, criando uma demanda crescente para estes tipos de mercadorias
10
. 
 
Com as conquistas das Cruzadas findou o controle muçulmano das rotas comerciais do 
Mediterrâneo e se instaurou o controle europeu, havendo um renascimento do comércio na 
região
11
. Nos séculos IX e X, as cidades de Amauri e Veneza, dentre outras, reiniciaram o 
comércio internacional intensivo. Veneza tinha em especial o comércio com Constantinopla, 
que por muitos anos foi a maior cidade do Mediterrâneo
12
. Este comércio exigia um maior 
domínio dos transportes e principalmente o levantamento de reservas financeiras vultosas para 
longas operações
13
. 
 
Outro fator que contribuiu para a expansão dos mercados foi justamente a reunificação da 
moeda, que aconteceu progressivamente com o curso dos séculos, tendo em vista a 
dificuldade de trocar produtos sem dinheiro
14
. Isto estimulou a criação das grandes feiras de 
comércio nas cidades realizadas nos séculos XII e XIII, em alguns casos com o salvo-conduto 
dos senhores das terras, protegendo os comerciantes de salteadores e ladrões nas estradas
15
. 
 
8
 HUBERMAN, Leo. História da Riqueza do Homem. 21ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. P. 17. 
9
 Ibidem, P. 17. 
10
 Ibidem, P. 17. 
11
 Ibidem, P. 21. 
12
 Ibidem, P. 20. 
13
 BRAUDEL, Fernand. Op. Cit., 1998, P. 383. 
14
 HUBERMAN, Leo. Op. Cit., 1986, P. 25. 
15
 Ibidem, P. 23. 
16 
 
 
 
 
 
1.2.1 A SOCIEDADE MARÍTIMA E O SURGIMENTO DAS 
COMPAGNIAS 
 
Para conseguir levantar o capital para as grandes viagens náuticas uma das primeiras 
alternativas econômicas que surgiram foi a societas maris, a sociedade marítima, também 
nomeada de societas vera, sociedade verdadeira, “o que leva a supor que tal forma de 
sociedade tenha sido, na origem, a única existente”16. 
 
Ela consistia em “uma associação entre um socius stans, um sócio que fica no local, e um 
socius tractator, que embarca no navio que vai partir”, sendo que ambos financiavam a 
sociedade
17
, e era feita para apenas uma viagem, funcionando a curto prazo, ressalvando que 
as viagens no Mediterrâneo levavam alguns meses
18
. Há registros desta sociedade “tanto no 
Notularium do notário genovês Giovanni Scriba (1155-1164), mais de 400 menções, como 
nas atas de um notário marselhês do século XIII, Almaric (360 menções)”19. Esta forma de 
sociedade se torna muito utilizada tendo em vista a sua simplicidade, podendo ser encontrada 
em Marselha e em Ragusa até no século XVI, inclusive em Portugal na mesma época
20
. 
 
Principalmente no interior da Itália, há o surgimento da compagnia, que pode ser 
caracterizada como uma sociedade em nome coletivo, geralmente de âmbito familiar, onde 
todos os seus sócios são solidariamente responsáveis de forma ilimitada, “não apenas no 
limite da sua quota-parte, mas com todos os seus bens“21. Com o passar dos anos, ela passou a 
admitir “sócios estrangeiros (que trazem capitais e trabalho) e dinheiro de depositantes (que, 
se pensarmos nos colossos de Florença, representa facilmente dez vezes o próprio capital - o 
corpo - da companhia), e assim se compreende que tais empresas sejam instrumentos 
 
16
 EVERITT, Alan. The Agrarian History of England and Wales. Apud BRAUDEL, Fernand. Op. Cit., 1998, P. 
383. 
17
 BRAUDEL, Fernand. Op. Cit., 1986, P. 383. 
18
 Ibidem, P. 383. 
19
 Ibidem, P. 383. 
20
 Ibidem, P. 383. 
17 
 
 
 
 
capitalistas de um peso anormal”22. 
 
Vale ressaltar que as companhias mais fortes com essa estrutura familiar conseguiam 
substituir seus membros no caso de morte e continuar em atividade
23
. Fernand Braudel 
ressalta a importância dessas sociedades do interior das cidades italianas, pois as sociedades 
marítimas, apesar de numerosas, eram pequenas e de curta duração
24
. 
 
Surgiram outros exemplos de sociedades mercantis com uma estrutura familiar, como a 
Magnas societas, a Grosse Ravensburger Gesselshaft, que consistia na reunião de três 
sociedades familiares
25
, que durou de 1380 a 1530, cujo capital chegava a 132 mil florins, um 
capital expressivo para a época. Seus membros e representantes frequentavam as crescentes 
feiras da Europa, principalmente a de Frankfürt-Am-Main e “seus pontos principais, além de 
Ravensburg, eram Memmingen, Constança, Nuremberg, Lindau, St. Gall; suas filiais 
situavam-se em Gênova, Milão, Berna, Genebra, Lyon, Bruges (depois Antuérpia), Barcelona 
Colônia, Viena e Paris”26. Fernand Braudel afirma que o traço característico desta sociedade 
era “não ter seguido as inovações que se impuseram com os grandes descobrimentos, não se 
ter instalado em Lisboa ou em Sevilha”27. 
 
Com o passar dos anos o número de sócios da Magnas societas diminuiu, os patrões 
compraram terras e se retiraram dos negócios
28
, mas ela continuou a existir até o século 
XVIII, pois a sua estrutura familiar assegurava a sua continuidade29
. Mas outro traço marcante 
dessas sociedades é justamente a mudança e reconstrução da empresa com o passar das 
 
21
 BRAUDEL, Fernand. Op. Cit., 1986, P. 384. 
22
 Ibidem, P. 384 
23
 Ibidem, P. 384. 
24
 Ibidem, P. 384. 
25
 Ibidem, P. 386. 
26
 Ibidem, P. 386. 
27
 Ibidem, P. 386. 
28
 Ibidem, P. 386. 
29
 Ibidem, P. 386 
18 
 
 
 
 
gerações
30
. Como exemplo desta mudança Fernand Braudel cita os Buonvisi, “mercadores 
luquenses instalados em Lyon”31, que entre 1575 e 1607 mudaram sua razão social cinco 
vezes
32
. 
 
 
1.2.2 A DELIMITAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES SOCIETÁRIAS E 
A CRIAÇÃO DA SOCIEDADE EM COMANDITA 
 
Estas sociedades começam a ser designadas pelo nome de sociedade geral, sociedade livre ou 
sociedade em nome coletivo e possuíam o grande problema da limitação das 
responsabilidades. Para saná-lo, eis que surge a sociedade em comandita
33
. Esta forma 
societária se distingue das demais pois define que a responsabilidade dos sócios é delimitada 
apenas pelo valor investido na empresa. A sua origem pode ser traçada aos séculos X e XI, 
conforme estudo de John Gilissen: 
 
“Este tipo de sociedade surgiu a partir dos séculos X-XI no quadro de comércio marítimo, no 
Mediterrâneo. Deriva do empréstimo marítimo (ou empréstimo de grande risco), no qual um 
financiador empresta dinheiro a um capitão de navio por uma ou várias viagens determinadas. 
Na commenda (de commendare = confiar, emprestar), o financiador (comanditário) associa-se 
ao capitão de navio (comandita do); partilha com ele os lucros, mas não suporta as perdas 
senão até ao limite do seu contributo em capital. Este tipo de contrato permitia escapar mais 
facilmente à proibição do juro que o empréstimo marítimo; a procura de meios para fazer 
frutificar os capitais, não obstante a proibição canônica, contribuiu para o nascer da idéia 
duma responsabilidade limitada ao capital investido”34. 
 
Fernand Braudel, citando Federigo Melis, afirma que “foi em Florença (mas não antes do 
 
30
 BRAUDEL, Fernand. Op. Cit., 1986, P. 386. 
31
 Ibidem, P. 386. 
32
 Ibidem, P. 386. 
33
 Ibidem, P. 387. 
34
 Ibidem, P. 387. 
19 
 
 
 
 
início do século XVI, datando o primeiro contrato conhecido de 8 de maio de 1532) que o 
sistema da comandita se desenvolveu claramente (accomandita), o que permitirá ao capital 
florentino, na tendência à sua grande expansão, participar de toda uma série de operações que 
se assemelham às holdings atuais” 35. 
 
Conforme se torna mais usual a associação a longa distância, e pelo fato dos sócios poderem 
ficar mais reservados e apenas cuidarem de seus investimentos e do comércio ao invés de ter 
de lidar também com a família dos associados, a sociedade em comandita começou a se 
alastrar por toda a Europa
36
. A sua adoção criou a possibilidade de “um mercador irlandês de 
Nantes de se associar (1732) a um mercador irlandês de Cork e de contornar as prescrições da 
legislação francesa vigentes até a Revolução e que proíbem o não-reinícola de participar das 
empresas nacionais de navegação”37. 
 
1.2.3 APARECIMENTO DAS PRIMEIRAS SOCIEDADES POR AÇÕES E 
SEU DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO 
 
Posteriormente houve o surgimento das sociedades por ações, uma sociedade apenas de 
capitais, onde cada sócio possui parte do capital social consubstanciada na ação, que pode ser 
livremente negociada no mercado. Segundo Fernand Braudel, esta prática de vender a 
possibilidade de se associar possui a sua origem na prática, datada antes do século XV, de se 
dividir a propriedade dos navios em ações - “chamadas partes em Veneza, luoghi em Gênova, 
caratti na maior parte das cidades italianas, quiratz ou carats em Marselha”38. 
 
Algumas minas na Europa central também eram partilhadas: “suas propriedades eram 
divididas em partes, as Kuxen, e estas Kuxen, transferíveis, eram objeto de especulações”39. 
Leo Huberman cita que até algumas expedições de corsários passaram a ser organizadas 
 
35
 BRAUDEL, Fernand, Op. Cit.,1998, P. 387. 
36
 Ibidem, P. 387. 
37
 Ibidem, 387. 
38
 Ibidem, P. 388. 
39
 Ibidem, P. 388. 
20 
 
 
 
 
mediante sociedade por ações, dentre elas, uma das expedições de Drake contra os espanhóis, 
que “a própria rainha Elisabete possuía ações, em troca do empréstimo de alguns navios. Os 
lucros, apenas nessa expedição, se elevaram a 4.700%, dos quais a boa rainha Bess recebeu 
cerca de 250 mil libras, como sua cota”40. 
 
Alguns autores consideram como primeira sociedade por ações a Banca di San Giorgio di 
Genova fundada em 1409, “quando os títulos de renda foram transformados em ações, 
ensejando a seus possuidores participação nos lucros ou dividendos”41. Mas Fernand Braudel 
observa que ela não passava de um “Estado dentro do Estado”, uma vez que exercia 
atividades que originariamente competiam ao governo de Gênova
42
. 
 
No comércio internacional, uma das rotas mais rentáveis era a rota às Índias, que era 
controlada por Veneza. Com a invenção da bússola e demais instrumentos de navegação 
como o astrolábio, os navios dos demais países passaram a se aventurar para achar rotas 
alternativas para as Índias. 
 
Leo Huberman afirma que “a viagem de Colombo rumo ao Ocidente foi apenas uma do sem-
número de viagens semelhantes que se empreenderam”. Até que em 1497 “Vasco da Gama, 
por essa rota do sul, circunavegou o continente africano, e em 1498 ancorou no porto de 
Calecute, Índia”43, descobrindo o caminho marítimo para as Índias. Somente na primeira 
viagem de Vasco da Gama, “os lucros atingiram a 6.000%”44. Em um único navio, ele 
transportou um carregamento de especiarias equivalente a metade do que Veneza comerciava 
por um ano
45
. Após esta descoberta, o oceano atlântico passou a ser a “rota mais importante e 
Portugal Espanha, Holanda, Inglaterra e França ascenderam à eminência comercial”46. 
 
 
40
 HUBERMAN, Leo, Op. Cit., 1986, P. 91. 
41
 ALMEIDA, Amador Paes de, Op. Cit, 2007, P. 165. 
42
 BRAUDEL, Fernand, Op. Cit., 1998, P. 389. 
43
 HUBERMAN, Leo, Op. Cit., 1986, P. 89. 
44
 Ibidem, P. 89. 
45
 Ibidem, P. 89. 
46
 Ibidem, P. 90. 
21 
 
 
 
 
Este período marcado por uma intensificação das transações comerciais internacionais foi 
denominado de Revolução Comercial. Diversas inovações jurídicas passaram a ser utilizadas 
para viabilizar o comércio entre as nações européias, como, por exemplo, as letras de câmbio, 
que serviam para evitar sofrer o risco desnecessário de ter de transportar moedas de ouro e 
prata para pagar suas mercadorias
47
. 
 
A captação de recursos provenientes da venda de ações era o meio mais eficiente na época 
para levantar o capital suficiente para as expedições marítimas, e então começaram a ser 
criadas diversas companhias de mercadores com essa forma societária. Dentre elas, a 
companhia dos Aventureiros Mercadores, criada em 1552, sendo a primeira sociedade por 
ações inglesa, possuindo “240 acionistas que entravam, cada um com 25 libras - soma de certa 
importância na época”48. Posteriormente houve o surgimento na Holanda da Companhia das 
Índias Orientais, criada em 1602, e da Companhia das Índias Ocidentais, fundada em 1621
49
 e 
de outras companhias em diversos países da Europa. 
 
Vale ressaltar que essas companhias colonizadoras detinham geralmente vários privilégiosna 
exploração de suas atividades econômicas, dentre eles o monopólio sustentado pelo Estado, 
que também ajudava a compor o capital social das empresas, sendo elas consideradas como 
uma descentralização política, social e econômica das funções estatais
50
. Um exemplo dado 
por Rubens Requião é o da outorga à Companhia das Índias Ocidentais pelo soberano 
holandês do “poder de efetuar pactos e alianças com príncipes e naturais dos países, nos 
limites da outorga que receberam na carta real de construir fortalezas, de armar exércitos, de 
nomear governadores e funcionários da justiça e outros para todos os serviços necessários à 
conservação das praças, à manutenção da ordem e da polícia”51. 
 
A sociedade anônima, mais vantajosa para arrecadar recursos da época, não se difundiu 
rapidamente, segundo Fernand Braudel: “a própria palavra ação se aclimata tardiamente na 
 
47
 HUBERMAN, Leo, Op. Cit., 1986, P. 96 
48
 Ibidem, P. 91. 
49
 ALMEIDA, Amador Paes de, Op. Cit., 2007, P. 165. 
50
 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 25ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007. P. 4. Vol. 2. 
22 
 
 
 
 
França e, mesmo quando pode ser lida preto no branco, não se trata forçosamente de ações 
facilmente transferíveis. Muitas vezes aparece a palavra, mas não ainda a coisa”52. 
 
Com o passar do tempo, “as sociedades por ações que surgiam, uma por uma, de privilégio 
real, concedido por carta ou patente real, começaram a debater-se no círculo fechado do poder 
estatal, procurando a sua libertação”53. A discussão sobre a liberdade das sociedades 
anônimas teve progressos e retrocessos na França revolucionária do século XVIII
54
: não 
obstante a revolução garantir a liberdade dos indivíduos, o que pressupõe a liberdade do 
comércio, em junho de 1791 foi elaborada a Lei Le Chapelier, que “proibia a associação de 
qualquer espécie”55. Tendo em vista o prejuízo para economia francesa gerado por esta lei, 
pouco depois foram concedidas às empresas a plena liberdade
56
. 
 
Rubens Requião observa que esse regime de plena liberdade fez com que ocorressem muitos 
abusos, dentre eles “a fundação de companhias apenas para especular com ações”57 o que 
levou “a codificação napoleônica a sujeitar a constituição das sociedades por ações, como 
norma geral, ao controle do Estado, não mais pelo sistema do privilégio, mas pelo da 
autorização governamental”58, que foi estabelecida pelo art. 37 do Code de Comerce, que 
preconiza que “A sociedade anônima não pode existir sem a autorização do governo e com a 
aprovação do ato que a constitua”59. Foi este mesmo código que elevou as sociedades 
anônimas à categoria de mercantis, ao lado da sociedade em comandita por ações, e que fixou 
“a limitação da responsabilidade do acionista ao valor das ações subscritas, e a divisão do 
 
51
 REQUIÃO, Rubens, Op. Cit., 2007, P. 4. 
52
 BRAUDEL, Fernand, Op. Cit., 1998, P. 390. 
53
 REQUIÃO, Rubens, Op. Cit., 2007, P. 4. 
54
 Ibidem, P. 4. 
55
 Ibidem, P. 4. 
56
 Ibidem, P. 5. 
57
 BULGARELLI, Waldirio. Manual das sociedades anônimas. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 1999. P. 61. 
58
 REQUIÃO, Rubens, Op. Cit., 2007, P. 5. 
59
 Texto original: “La société anonyme ne peut exister qu’avec l’autorisation du governement et avec son 
approbation pour l’acte qui la constitue” 
23 
 
 
 
 
capital em ações”60. 
 
A partir de 1844, na Inglaterra, as sociedades anônimas poderiam se constituir livremente, 
apenas com o registro em repartição competente
61
. Anteriormente, houve um período datado a 
partir de 1720 onde em virtude da falência da Companhia dos Mares do Sul, criou-se o Bubble 
Act, que “condicionava a personalização jurídica das sociedades anônimas, bem como a 
captação de recursos da poupança popular, a prévia concessão estatal (por meio de Royal 
Charter ou de Act of Parliament“62. 
 
Em 1862 houve uma “convenção firmada entre a França e a Inglaterra que levou a primeira a 
permitir às sociedades inglesas funcionarem livremente em seu território”63, o que estimulou a 
criação de sociedades inglesas por franceses para atuar na França dada a ausência da 
necessidade de permissão do Estado
64
. Segundo Rubens Requião
65
, isso pressionou o governo 
francês a promulgar: 
 uma lei de transição, pela qual as sociedades anônimas, cujo capital não 
excedesse de vinte milhões de francos poderiam constituir-se sem 
autorização, e a essas sociedades se lhes atribuiu, impropriamente, a 
categoria de sociedades de responsabilidade limitada, por influência do 
sistema britânico
66
. 
 
Por fim, houve a elaboração da Lei francesa de 24 de julho de 1867 que estabeleceu “plena 
liberdade para as sociedades comerciais, inclusive para as sociedades anônimas, que passam, 
como as demais, a contar com lei normativa, cujos postulados, uma vez cumpridos e 
respeitados, permitem a livre constituição e funcionamento”67. 
 
Com a desnecessidade da autorização do governante para a sua criação, as sociedades 
 
60
 ALMEIDA, Amador Paes de, Op. Cit., 2007, P. 165. 
61
 BULGARELLI, Waldirio, Op. Cit., 1999, P. 62. 
62
 COELHO, Fábio Ulhoa, Op. Cit., 2010. P.65. 
63
 REQUIÃO, Rubens, Op. Cit., 2007, P. 5. 
64
 Ibidem, P. 5. 
65
 Ibidem, P. 5. 
66
 Ibidem, P. 5. 
67
 Ibidem, P. 5. 
24 
 
 
 
 
anônimas começaram a se multiplicar no período da Revolução Industrial, por ser o meio 
mais eficiente de captação de recursos imprescindíveis para o princípio da atividade industrial 
e fabril, podendo qualquer um com o capital suficiente comprar as ações e receber os 
dividendos. Ela passou de ser um instrumento jurídico excepcional e se tornou uma forma 
jurídica “normal” da empresa econômica “e a sua adoção se espalhou pari passu com a 
industrialização dos vários países”68. 
 
 
1.3 O INÍCIO DA REGULAÇÃO DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS NO 
BRASIL 
 
No período colonial brasileiro as sociedades anônimas só poderiam se constituir mediante 
outorga em carta real de Portugal
69
. Um dos exemplos desta outorga foi o Alvará de 10 de 
março de 1649 que instituiu a criação da Companhia Geral de Comércio do Brasil, instituída 
para explorar especialmente a região do nordeste brasileiro, sendo uma medida para garantir a 
conquista portuguesa da região, que então estava sendo tomada pelos holandeses
70
. Esta 
empresa “era administrada por uma Junta composta de nove deputados ou diretores, sendo 
oito eleitos pelos acionistas de mais de 5.000 cruzados e um designado pela municipalidade 
de Lisboa, mais oito conselheiros eleitos pelos comerciantes lisboetas”71. 
 
Dentre os privilégios concedidos a esta companhia Waldirio Bulgarelli destaca o de “estanco 
para o Brasil dos quatros gêneros de mantimentos, a saber: vinhos, farinhas, azeites e 
bacalhau”72. Esta companhia foi posteriormente sucedida em 1755 pela Companhia Geral do 
Grão-Pará e Maranhão, que detinha o privilégio do monopólio do tráfico de escravos negros
73
. 
 
68
 ASCARELLI, Tullio. Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Comparado. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 
1969. P. 318. 
69
 REQUIÃO, Rubens, Op. Cit., 2007, P. 9. 
70
 ALMEIDA, Amador Paes de, Op. Cit., 2007, P. 166. 
71
 COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade anônima. Rio 
de Janeiro: Forense, 2008. P. 37. 
72
 BULGARELLI, Waldirio, Op. Cit., 1999, P. 60. 
73
 ALMEIDA, AmadorPaes de, Op. Cit., 2007, P. 166. 
25 
 
 
 
 
Ela foi em seguida sucedida pela Companhia Geral das Capitanias de Pernambuco e Paraíba, 
datada de 1779
74
. 
 
Com a vinda da família real portuguesa ao Brasil foi criado, por iniciativa de Dom João VI, o 
Banco do Brasil, em 1808, “conceituado em seus estatutos como um corpo moral, limitada a 
responsabilidade do acionista a sua entrada, devendo o dividendo ser pago semanalmente”75. 
As sociedades criadas no Brasil até 1849 foram feitas no regime do privilégio concedido pelo 
governo, “emanando de lei especial (alvarás, cartas régias etc) a sua organização e os seus 
estatutos”76 
 
Em 10 de janeiro de 1849 foi instituído o regime de autorização governamental para a 
incorporação ou aprovação dos estatutos das Sociedades Anônimas no Brasil, através do 
Decreto nº 575. Ele foi posteriormente substituído pelo Código Comercial de 1850, cujo art. 
295 preconizava: 
 
 As companhias ou sociedades anônimas, designadas pelo objeto ou empresa 
a que se destinam, sem firma social e administradas por mandatários 
revogáveis, sócios ou não sócios, só podem estabelecer-se por tempo 
determinado e com autorização do governo, dependente da aprovação do 
corpo legislativo quando hajam de gozar de algum privilégio; e devem 
provar-se por escritura pública ou pelos seus estatutos e pelo ato do poder 
que as houver autorizado. 
 
Em 23 de agosto de 1860 a Lei nº 1.083 revogou o capítulo referente às sociedades anônimas 
do referido código e passou a subordinar a constituição das sociedades à prévia autorização 
governamental, “estabelecendo a necessidade de audiência do Conselho de Estado sobre os 
fins sociais da companhia, avaliação de bens e outros detalhes da organização”77. Esta lei 
vigeu até 1882 e foi substituída pela Lei nº 3.150, de 4 de novembro de 1882, que foi 
inspirada na lei francesa de 1867, e que ampliou a liberdade da iniciativa privada, “limitando 
a autorização governamental às sociedades religiosas, montepios, sociedades de seguro, 
 
74
 ALMEIDA, Amador Paes de, Op. Cit., 2007, P. 166. 
75
 Ibidem, P. 166. 
76
 BORGES, João Eunápio, Op. Cit., 1967, P. 364. 
77
 ALMEIDA, Amador Paes de, Op. Cit., 2007, P. 166. 
26 
 
 
 
 
caixas econômicas, gêneros alimentícios e sociedades estrangeiras, fixando, outrossim, a 
necessidade de autorização do Poder Legislativo para o funcionamento de sociedades 
anônimas constituídas em bancos de circulação”78. 
 
A Lei nº 3.150 delineou os órgãos de poder da sociedade anônima que eram estes, a saber: a 
administração, eleita pelos acionistas; a assembléia geral, exigindo que esta se realizasse a 
cada ano; e o conselho fiscal, composto por três ou mais fiscais nomeados pela assembléia 
geral, que era encarregado de dar pareceres sobre os negócios e operações do ano seguinte, 
tendo por base o balanço, inventário e contas da administração, nos termos do art. 14. 
Determinou especialmente a “responsabilidade pessoal e solidária dos incorporadores pela 
prática de atos em inobservância às leis; a responsabilidade do cedente de ações pelo valor 
integral destas; a obrigação de restituírem os administradores os dividendos indevidamente 
distribuídos, garantindo sobremaneira os interesses dos acionistas”79. 
 
Após a proclamação da República a Lei nº 3.150 foi substituída pelo Decreto nº 164 de 17 de 
janeiro de 1890 que, segundo Amador Paes de Almeida, “por uma série de circunstâncias, 
ensejou inúmeras irregularidades na então agitada vida financeira do país”80. Quanto à 
responsabilidade dos administradores, estes eram responsáveis perante a sociedade pela 
negligência, culpa ou dolo, com que se houverem no desempenho do mandato, perante a 
sociedade e os terceiros prejudicados, pelo excesso de mandato, por violação à legislação e ao 
estatuto da sociedade. 
 
Em 13 de outubro de 1890 surgiu o Decreto nº 850 que elevou de 10% para 30% o valor do 
depósito exigido para a constituição da sociedade anônima, proibindo a negociação de ações 
“antes de realizados 40% do capital subscrito”81. 
 
A legislação das sociedades anônimas só foi consolidada a partir do Decreto nº 434, de 4 
 
78
 ALMEIDA, Amador Paes de, Op. Cit., 2007, P. 166. 
79
 Ibidem, P. 166. 
80
 Ibidem, P. 166. 
81
 Ibidem, P. 166. 
27 
 
 
 
 
julho de 1891. Diversas outras leis e decretos se sucederam regrando as sociedades até a 
promulgação do Código Civil de 1916, que dentre outras determinações condicionou a 
atuação das sociedades estrangeiras por ações no Brasil à aprovação de seus respectivos 
estatutos pelo Governo Federal
82
. 
 
Posteriormente, houve o Decreto nº 21.828, de 15 de junho de 1932, que determinou que “as 
sociedades anônimas poderiam ter o seu capital social representado por ações preferenciais de 
uma ou mais classes”83. No mesmo ano houve o Decreto nº 21.828, de 14 de setembro, que 
“determinava a obrigatoriedade das sociedades de seguros revestirem-se a forma anônima e 
em março de 1940, o Decreto-lei nº 2.055 regulava a conversão de ações ordinárias em ações 
preferenciais emitidas por sociedades sujeitas à fiscalização do Governo Federal”84 
 
1.3.1 O DECRETO-LEI Nº 2.627/1940 
 
Inúmeras iniciativas para a mudança da legislação se sucederam até que com inspiração na 
reforma da legislação alemã referente às sociedades anônimas
85
, que ocorreu em 1937. 
Miranda Valverde elaborou um anteprojeto que foi transformado, com algumas alterações, no 
Decreto-lei nº 2.627/1940. João Eunapio Borges
86
. afirma que a única obrigação legal do 
acionista naquela época era a de “integralizar o valor de suas ações”. 
 
A sociedade anônima na época mantinha a estrutura delineada pelas legislações anteriores: 
havia “a assembléia geral dos acionistas, que detinha poder supremo da sociedade, a diretoria, 
que, nomeada pela assembléia e dela recebendo os seus poderes, constituía o seu poder 
executivo, e o conselho fiscal”87. 
 
O órgão máximo da sociedade anônima seria a assembléia geral, que possuía o poder “para 
 
82
 ALMEIDA, Amador Paes de, Op. Cit., 2007, P. 166. 
83
 Ibidem, P. 166. 
84
 Ibidem, P. 166. 
85
 BULGARELLI, Waldirio, Op. Cit., 1999, P. 25. 
86
 BORGES, João Eunápio, Op. Cit., 1967, P. 445. 
28 
 
 
 
 
resolver todos os negócios relativos ao objeto da sociedade e para tomar as decisões que 
julgar convenientes à defesa desta e ao desenvolvimento de suas operações”88, e que detinha o 
poder principal de indicar os membros da diretoria. 
 
Ainda assim, segundo Ana Frazão
89
 “não caberia à assembleia geral os poderes de gestão”, 
caso esclarecido pelo §5º do art. 116 do decreto-lei nº 2.627/40 que dizia que “as atribuições e 
poderes conferidos pela lei aos diretores não podem ser outorgados a outro órgão, criado pela 
lei ou pelos estatutos”. 
 
Ana Frazão
90
 conclui, com o raciocínio de Fábio Konder Comparato, que o decreto-lei 
“seguia a teoria dos poderes de direção, segundo a qual a assembleia geral de acionistas não 
teria competência para praticar atos de gestão”91. 
 
O ideal doutrinário era de que a sociedade anônima era o tipo “perfeito de democracia de 
governo popular”92, cuja soberania se manifestava nos atos deliberativos da assembléia geral 
que era composta por todos os acionistas. Era vigente o sistema majoritário, onde segundo 
Modesto Carvalhosa93 havia: 
 
uma correlação direta entre risco de capital empregado e mando social. O 
acionista ou grupo de acionistas que assumiam maior risco decapitais 
investidos na companhia é que deveriam comandá-la. Assim, aqueles que 
possuíam mais de 50% do capital votante eram considerados pela lei como 
os acionistas que teriam os poderes de decisão, de indicação dos 
administradores e da orientação política da companhia. 
 
A realidade é que em virtude do alto número de acionistas da maioria das companhias, que em 
 
87
 BORGES, João Eunápio, Op. Cit., 1967, P. 445. 
88
 Ibidem, P. 449. 
89
 FRAZÃO, Ana. Função social da empresa: repercussões sobre a responsabilidade civil de controladores e 
administradores de S/As. Rio de Janeiro: Renovar, 2011. P.163 
90
 Ibidem, P. 163. 
91
 Ibidem, P. 163. 
92
 BORGES, João Eunápio, Op. Cit., 1967, P. 449. 
93
 CARVALHOSA, Modesto. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998. Pág. 
420. Vol. 2 
29 
 
 
 
 
alguns casos poderiam ter suas residências em locais diversos, seria praticamente inviável 
reuní-los todos no mesmo local, e poucos tinham de fato o interesse em dirigir a companhia, 
sendo que a grande maioria apenas possuía interesse em especular, adquirindo ações por puro 
interesse de revendê-las e não com o intuito de fazerem parte de uma sociedade
94
. 
 
O que acontecia na prática era que a assembléia tinha o seu “quorum preenchido por meio de 
procurações outorgadas não aos diretores (porque a lei o proibia), mas a acionistas-
empregados, ou, de qualquer modo, estreitamente ligados aos diretores”95. Em virtude dessa 
abstenção em massa, a diretoria dispunha de um “poder autônomo e, praticamente, sem 
limites”96. Ruy Carneiro Guimarães corrobora este domínio do conselho de administração, 
que “conservando as aparências de um formalismo jurídico, governa, de fato, sob o regime de 
oligarquia”97. 
 
A supremacia do conselho de administração refletia também no conselho fiscal, uma vez que 
tinham os seus membros eleitos pela a assembléia geral, o que fazia com que ele fosse um 
órgão meramente decorativo
98
, contrariando todos os dispositivos legais de então que 
tentavam evitar que o administrador interviesse em sua composição, tal como o disposto no 
artigo 126, que considerava inelegível para o conselho fiscal os empregados da sociedade e os 
parentes dos diretores até o terceiro grau. 
 
Então, quais seriam as limitações ao poder dos administradores se eles de fato poderiam 
possuir pleno domínio das decisões da assembléia? A respeito dispõe o artigo 119 do Decreto-
Lei nº 2.627: 
 
Os diretores não poderão praticar atos de liberalidade à custa da sociedade. 
Não lhes será, igualmente, lícito hipotecar, empenhar ou alienar bens sociais, 
sem expressa autorização dos estatutos ou da assembléia geral, salvo se esses 
 
94
 BORGES, João Eunápio, Op. Cit., 1967, P. 450. 
95
 Ibidem, P. 450. 
96
 Ibidem, P. 451. 
97
 GUIMARÃES, Ruy Carneiro. Sociedades por Ações (Notas de Doutrina e Jurisprudência). Rio de Janeiro: 
Forense, 1960. P. 171. Vol. 2. 
98
 BORGES, João Eunápio, Op. Cit., 1967, P. 447. 
30 
 
 
 
 
atos ou operações constituírem objeto da sociedade 
Parágrafo único. É também defeso os diretores tomar empréstimos à 
sociedade, sem prévia autorização da assembléia geral. 
 
Os referidos atos de liberalidade seriam os que “diminuem, de qualquer sorte, o patrimônio 
social, sem que tragam para a sociedade nenhum benefício ou vantagem econômica”99. 
 
Não poderiam os diretores igualmente agirem em conflito de interesses, segundo o art. 120 
que preconiza que: 
 é vedado ao diretor intervir em qualquer operação social, em que tenha 
interesse oposto ao da companhia, bem como na deliberação que a respeito 
tomarem os demais diretores, cumprindo-lhes cientificá-los do seu 
impedimento. Parágrafo único = a violação dessa proibição sujeitará o 
diretor à responsabilidade civil, pelos prejuízos causados à sociedade, e à 
responsabilidade penal que no caso couber. 
 
Sob a influência do institucionalismo, do qual trataremos no capítulo seguinte da monografia, 
havia igualmente uma exigência no art. 117, §7º de que “os diretores deverão empregar, no 
exercício de suas funções, tanto no interesse da empresa como do bem público, a diligência 
que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios 
negócios”. Apesar disso, as obrigações impostas aos administradores eram vistas como “de 
meio e não de fim, motivo pelo qual o critério aferidor seria a normalidade das operações e 
não os resultados das condutas”100. 
 
Ana Frazão destaca a previsão do art. 121, §1º do Decreto-lei que “continha cláusula geral 
responsabilizando os administradores pelos prejuízos que causarem dentro de suas 
atribuições, com culpa ou dolo (inciso I) e com violação da lei e dos estatutos (inciso II)”101 e 
afirma que tal disposição correspondeu à cláusula geral de responsabilidade civil dos 
administradores. 
 
 
99
 VALVERDE, Trajano de Miranda. Sociedades por ações. Apud GUIMARÃES, Ruy Carneiro. Op. Cit, 1960, 
P. 77. 
100
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 165. 
101
 Ibidem, P. 165. 
31 
 
 
 
 
A previsão no inciso II, segundo Miranda Valverde
102
: 
 
perderia valor se, como geralmente se admite, houvesse necessidade da 
prova da culpa do diretor nos casos de violação da lei ou dos estatutos. Dir-
se-á que a lei presume, nesses casos, a culpa do diretor pelo que a ele 
incumbirá provar que a violação da lei ou dos estatutos resultou de 
circunstâncias especialíssimas, por ele não provocadas ou relativamente às 
quais não podia ele ter nenhuma influência, ou, ainda, que os prejuízos 
verificados ocorreriam em qualquer hipótese. 
 
 
Por sua vez o art. 123 elencava as hipóteses que permitiam intentarem ação de 
responsabilidade civil contra os diretores, dentre elas a ação promovida pela sociedade para 
reparar os prejuízos causados diretamente ao seu patrimônio, sendo que se a empresa se 
mantivesse inerte por seis meses a contar da primeira assembleia geral ordinária, qualquer 
acionista poderá promovê-la em favor da companhia. Havia também a possibilidade do 
acionista que experimentasse prejuízo direto intentar com a ação de responsabilidade civil 
para reaver a quantia perdida. 
 
O decreto-lei de então não previa qualquer disposição expressa de que terceiros prejudicados 
poderiam se valer de ação de responsabilidade contra a diretoria, mas segundo Ana Frazão
103
 
a doutrina admitia tal possibilidade a partir das regras gerais de responsabilidade 
extracontratual. Tal raciocínio era corroborado por Miranda Valverde
104
 que afirmava: 
 
a ação de responsabilidade ou reparação civil dos terceiros obedece às regras 
do direito comum, menos no que se relaciona com a prova da culpa ou do 
dolo do diretor, na hipótese de atos violadores da lei ou dos estatutos. Aliás, 
em princípio, não têm os terceiros contra os diretores ação alguma baseada 
em atos ou operações praticados por estes, dentro de suas atribuições e 
poderes. Os prejudicados são a sociedade e seus acionistas. 
 
O Decreto-Lei nº 2.627 vigeu até a promulgação da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, 
que atualmente regula as Sociedades Anônimas no Brasil. 
 
 
102
 VALVERDE, Trajano de Miranda. Sociedade por ações. Apud FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 165 
103
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 167. 
104
 VALVERDE, Trajano de Miranda. Sociedade por ações.Apud FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 167. 
32 
 
 
 
 
1.3.2 A LEI 6.404/76 
 
Com o intuito de fortalecer o mercado de capitais e de se resguardar o direito dos acionistas 
minoritários, a lei 6.404/76 criou uma série de inovações quanto aos órgãos e aos cargos 
gestores da sociedade anônima, mantendo a maioria dos principais órgãos societários, tais 
como a assembleia geral e o conselho fiscal, e fazendo regulações incisivas nos órgãos 
gestores. 
 
Houve “o reconhecimento expresso dos administradores como órgãos, bem como a adoção do 
sistema dualístico – conselho de administração e diretoria – de forma obrigatória somente 
apenas para as companhias abertas e de capital autorizado (art. 138)”105. 
 
De acordo com Modesto Carvalhosa
106
 a fundamentação formal da existência do conselho era 
justamente para tentar “conciliar os interesses dos acionistas controladores e daqueles que 
compõem a comunidade minoritária de investidores do mercado” e por sua vez a razão real 
seria para se tornar o órgão facilitador da execução dos acordos de acionistas, posicionando 
“em termos de privilégios, ou paridade, ou de veto, determinados grupos influentes de 
acionistas minoritários”107. 
 
O conselho de administração trata-se de um órgão colegiado, que é formado por no mínimo 
três membros eleitos pela assembleia geral e cujas competências se encontram dispostas no 
art. 142 da lei societária. Por sua vez, de acordo com o art. 143, a diretoria é composta por 
duas ou mais pessoas escolhidas pelo conselho de administração ou pela assembleia geral, 
possuindo competência privativa de representação da companhia de acordo com o art. 138, 
§1º. De acordo com o art. 139, as atribuições conferidas por lei a ambos os órgãos não podem 
ser outorgadas a outro órgão, criado por lei ou pelo estatuto. 
 
 
105
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 168. 
106
 CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998. P. 5. 
Vol. 3. 
107
 Ibidem, P. 7 
33 
 
 
 
 
O diploma legal estabelece no seu art. 143 que até um terço dos membros do conselho de 
administração poderão ser eleitos para os cargos de diretores, e ainda afirma que o estatuto 
pode estabelecer que determinadas decisões, que sejam de competência dos diretores, sejam 
tomadas em reunião com a diretoria. 
 
De acordo com Ana Frazão
108, “apesar das diferenças entre os conselheiros e os diretores, o 
art. 145 da Lei das S/A esclarece que as normas relativas a deveres e responsabilidade dos 
administradores aplicam-se indistintamente aos dois grupos”. 
 
Já Modesto Carvalhosa
109
 aponta a relatividade do preceito legal dizendo que haveria 
diferentes momentos e diversas intensidades no tocante à responsabilidade dos dois grupos, e 
segundo sua lição: 
 
basta verificar o caráter colegial das deliberações do Conselho e o regime 
individual dos atos praticados pelos diretores. Os conselheiros somente serão 
responsáveis pelos atos, documentos e negócios jurídicos que chegarem ao 
conhecimento do órgão, seja em virtude do exercício do controle de 
legitimidade que lhes cabe, seja pelo exame das informações e relatórios que 
são trazidos às reuniões pelos diretores. Não podem os conselheiros ser 
responsabilizados pelos atos praticados pelos diretores (art. 158), que lhes 
sejam ocultados, inclusive pelos que não vierem a constar das contas da 
diretoria e das demonstrações financeiras. 
 
Apesar disso, Modesto Carvalhosa
110
 destaca a situação dos “diretores de fato” dizendo que: 
as pessoas que exercitam irregularmente poderes e atribuições dos 
administradores, seja por delegação ilegal, seja por abuso ou excesso de 
mandato, são equiparados aos administradores no que respeita à 
responsabilidade (art. 158) 
 
A lei não estabelece hierarquia entre o conselho de administração e os diretores, “motivo pelo 
qual estes últimos não poderão se isentar da responsabilidade pela simples circunstância de 
estarem amparados por decisão do conselho de administração”111. De acordo com Ana 
 
108
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 169 
109
 CARVALHOSA, Modesto. Op. Cit., 1998, Vol. 3, P. 161. 
110
 Ibidem, P. 162. 
111
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 170 
34 
 
 
 
 
Frazão
112, “os membros do conselho não respondem pelos atos dos diretores, salvo se tiverem 
agido com culpa”. 
 
Quanto à assembleia geral, a lei escolheu por não definí-la, mas sim afirmar sua importância 
afirmando em seu art. 121 que ela é o órgão “primário, ou imediato, que investe os demais, 
elegendo os seus membros, elegendo os seus membros e podendo demití-los”113 (art. 122, II) 
e que, na dicção do art. 121, possui poderes para “decidir todos os negócios relativos ao 
objeto da sociedade e tomar resoluções que julgar convenientes à sua defesa e 
desenvolvimento”. 
 
Segundo Roberto Barcellos de Magalhães a assembleia geral “teoricamente, pode ser 
considerada o poder supremo das sociedades anônimas”114. O problema é que era notório que 
este poder supremo ficava, em certos casos, nas mãos de poucos, denominados de “acionistas 
majoritários” no Decreto-Lei 2.627/40, que o exerciam com poucas exigências legais, caso 
compararmos com a figura do diretor. Exigiu-se do legislador que fosse criada a figura do 
acionista controlador, que se encontra disposta no art. 116 da lei das S/As. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
112
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 170 
113
 COMPARATO, Fábio Konder, Op. Cit., 2008, P. 31. 
114
 MAGALHÃES, Roberto Barcellos. A nova Lei das Sociedades Anônimas. Apud SANTOS, Jurandir dos. 
Manual das Assembléias Gerais nas Sociedades Anônimas. São Paulo: Saraiva, 1994. P. 16 
35 
 
 
 
 
 
 
 
 
CAPÍTULO 2 
 
 
2 O PODER DE CONTROLE NA LEI DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS 
 
A palavra controle no português não significa apenas vigilância, verificação ou fiscalização. 
Atribuímos também à palavra “o ato ou poder de dominar, regular, guiar ou restringir”115. A 
disciplina estabelecida no art. 116 para a figura do acionista controlador é derivada 
especialmente desta segunda conotação ao apregoar que: 
 
Entende-se por acionista controlador a pessoa natural ou jurídica, ou o grupo 
de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que: 
a) É titular de direitos de sócio que lhe assegurem de modo permanente a 
maioria dos votos nas deliberações da assembleia geral e o poder de 
eleger a maioria dos administradores da companhia; e 
b) Usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o 
funcionamento dos órgãos da companhia. 
 
 
A solução legislativa foi uma resposta para o cenário brasileiro de extrema concentração 
acioniária comprovado pela pesquisa de Dante Mendes Aldrighi e Alessandro Vinícius 
Marques de Oliveira
116
 que afirma que 77,3% das companhias abertas pesquisadas possuem 
um acionista controlador. 
 
A intenção de regular tal poder fica clara na exposição justificativa dada ao art. 116 pelos 
 
115
 COMPARATO, Fábio Konder, Op Cit., 2008, P. 29. 
116
 ALDRIGHI, Dante Mendes; OLIVEIRA, Alessandro Vinícius Marques. The influence of ownership and 
control structures on the firm performance: evidence from Brazil. Social Science Research Network. 15 de março 
de 2007. Disponível em: http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=972615. Acesso em: 07 de maio de 
2012. 
36 
 
 
 
 
autores do projeto, AlfredoLamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira
117
, que afirmam: 
 
O art. 116 dá “status” próprio, no direito brasileiro, à figura do “acionista 
controlador”. Esta é a inovação em que a norma jurídica visa encontrar-se 
com a realidade econômica subjacente. Com efeito, é de todos sabido que as 
pessoas jurídicas têm o comportamento e a idoneidade de quem as controla, 
mas nem sempre o exercício desse poder é responsável, ou atingível pela lei, 
porque se oculta atrás do véu dos procuradores ou dos terceiros eleitos para 
administrar a sociedade. Ocorre que a empresa, sobretudo na escala que lhe 
impõe a economia moderna, tem poder e importância social de tal maneira 
relevantes na comunidade que os que a dirigem devem assumir a primeira 
cena na vida econômica, seja para fruir do justo reconhecimento pelos 
benefícios que geram, seja para responder pelos agravos a que dão causa. O 
tema cresce em importância quando se considera que o controlador, muitas 
vezes, é sociedade ou grupo estrangeiro, que fica, por força de sua origem, 
excluído até mesmo das sanções morais da comunidade. 
 
O poder de controle para Fábio Konder Comparato deve ser dividido entre o controle interno 
e o externo, sendo que naquele “o titular do controle atua no interior da sociedade (ab intus), 
lançando mão dos mecanismos de poder próprios da estrutura societária, notadamente a 
deliberação em assembleia”118, e neste “o controle pertence a uma ou mais pessoas, físicas ou 
jurídicas, que não compõem quaisquer órgão da sociedade, mas agem de fora (ab extra)”119. 
 
O controle interno trata-se exatamente da figura do acionista controlador como está disposta 
no art. 116. Já o controle externo poderia ocorrer, segundo exemplo dado pelo referido autor, 
na hipótese de uma grande companhia extremamente endividada perante um banco que passa 
a se sujeitar às decisões deste em tudo o que for necessário para a reorganização empresarial, 
sendo mais conveniente para a instituição financeira “agir de fora do que assumir o controle 
acionário, ou provocar a falência da devedora”120. 
 
Nesta hipótese de controle externo, na lição de Fábio Konder Comparato, a titularidade desses 
poderes poderia se tornar meramente formal, com as decisões em assembleia se submetendo a 
 
117
 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões Pedreira. A lei das S.A: Pressupostos, elaboração, 
aplicação. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. P. 229. 
118
 COMPARATO, Fábio Konder, Op. Cit., 2008, P. 48. 
119
 Ibidem, P. 48. 
120
 Ibidem, P. 39. 
37 
 
 
 
 
uma soberania externa
121
. Apesar disso, Modesto Carvalhosa
122
 afirma que a lei 6.404 não 
prevê “qualquer responsabilidade do controlador externo” e que consequentemente, caberia 
aos controladores internos essa responsabilidade (disposta no art. 117). 
 
Na opinião de Modesto Carvalhosa
123, os controladores externos seriam “irresponsáveis 
perante a companhia, seus acionistas e terceiros em geral pela condução, de fato, da 
sociedade”. 
 
Segundo Modesto Carvalhosa
124
, o poder oligárquico conferido ao acionista controlador foi 
contrabalançado pela outorga aos acionistas minoritários de: 
 
uma série de direitos específicos de informação, fiscalização e de ação em 
face dos administradores e dos próprios controladores (arts. 105, 123, 124, 
126, 133, 141, 157, 161). Esses direitos constituíam uma forma de 
compensar a retirada do direito de participação (art. 112) – ainda que 
minoritária – na discussão e deliberação da política da companhia, que se 
proporcionava na assembleia geral, através do voto, anteriormente à Lei n. 
8.021, de 1990, que aboliu as ações ao portador, derrogando o art. 112, por 
incompatibilidade com o ordenamento vigente. 
 
 
2.1 DEVERES DO ACIONISTA CONTROLADOR 
 
O legislador tratou de impor uma série de deveres ao acionista controlador para controlar o 
seu poder, consubstanciados no parágrafo único no art. 116, que preconiza que: 
 
O acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia 
realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e 
responsabilidades para os demais acionistas da empresa, os que nela 
trabalham e para a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve 
lealmente respeitar e atender. 
 
 
Esta disposição legislativa foi influenciada pela corrente institucionalista que definia o 
interesse social, que é entendido como parâmetro que orienta a conduta dos órgãos 
 
121
 COMPARATO, Fábio Konder, Op. Cit., 2008, P. 39. 
122
 CARVALHOSA, Modesto, Op. Cit., 1998, Vol. 2, P. 436. 
123
 Ibidem, P. 436. 
124
 Ibidem, P. 421. 
38 
 
 
 
 
societários, ou, nas palavras de Calixto Salomão Filho
125, “a razão de ser das sociedades 
comerciais”. Tal discussão foi utilizada amplamente em diversos países, dentre elas a França e 
a Alemanha, para o início de responsabilização dos órgãos gestores
126
. 
 
A lei das S/As faz diversas menções à figura do interesse social. Quanto ao acionista 
controlador, há especialmente a disposição do art. 115, que trata do abuso do direito de voto e 
do conflito de interesses, afirmando que “o acionista deve exercer o direito de voto no 
interesse da companhia”. 
 
Trataremos de analisar inicialmente as correntes que definem o interesse social para depois 
adentrarmos de fato no estudo aprofundado dos deveres do acionista controlador, posto que 
tal compreensão é de suma importância para a definição da função social da sociedade 
anônima. 
 
2.1.1 A DEFINIÇÃO DO INTERESSE SOCIAL 
 
Ao analisar a temática do interesse social, a doutrina expõe inicialmente a contraposição de 
duas correntes doutrinárias e suas ramificações: a teoria contratualista e a institucionalista. 
 
2.1.1.1 A TEORIA CONTRATUALISTA 
 
A teoria contratualista foi desenvolvida com maior expressão na doutrina e jurisprudência 
italiana
127
 e dispõe basicamente que o interesse social coincide com o interesse do grupo de 
sócios. Ana Frazão
128
 atribui o surgimento de tal teoria à formação do conceito de 
personalidade jurídica das sociedades comerciais no século XIX. 
 
 
125
 SALOMÃO FILHO, Calixto. O Novo Direito Societário. 4ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011. P. 27. 
126
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 60. 
127
 SALOMÃO FILHO, Calixto, Op. Cit., 2011, P. 28. 
128
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 62 
39 
 
 
 
 
Apesar do Código Napoleônico apenas mencionar a existência de pessoas naturais
129
, a 
jurisprudência francesa foi de suma importância para o surgimento da personalidade jurídica 
das sociedades comerciais e das demais pessoas de direito privado, ao reconhecê-las em 
1834
130
. Tal personalização fez com que houvesse a separação entre o patrimônio da empresa 
e dos sócios. 
 
De acordo com Ana Frazão
131
: 
A personalização ainda permitiu que as sociedades anônimas (i) 
delimitassem o seu campo de atuação a partir da noção de objeto social – o 
que os franceses chamam de “princípio da especialização” e (ii) recebessem, 
como sujeitos autônomos de direito, proteção semelhante à que o sistema 
jurídico conferia às pessoas naturais, inclusive para o fim de titularizarem 
diversos direitos para o exercício da atividade empresarial, dentre os quais o 
de propriedade. 
 
Não havia dúvidas da utilidade da personalização das sociedades comerciais, mas tal hipótese 
gerou várias dúvidas “quanto aos seus próprios pressupostos e finalidades”132. Ana Frazão133 
afirma que Savigny se propôs a solver tal problema dizendoque as pessoas jurídicas “seriam 
entes fictícios, que não existiriam senão para fins jurídicos”. Ana Frazão134 arremata dizendo 
que “sendo uma mera ficção, dificilmente se poderia sustentar que a pessoa jurídica tivesse 
um interesse próprio, que transcendesse aos dos seus componentes”. Por tal razão, o 
contratualismo adviria dessa concepção. 
 
Na concepção do contratualismo, “a liberdade iniciativa, os direitos e o patrimônio social da 
sociedade anônima poderiam e deveriam ser utilizados apenas para o proveito dos 
acionistas”135. 
 
Essa visão, aliada com o entendimento da época do Estado liberal de que direitos como a 
 
129
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 61. 
130
 Ibidem, P. 61. 
131
 Ibidem, P. 61 
132
 Ibidem, P. 62. 
133
 Ibidem, P. 62 
134
 Ibidem, P. 63. 
135
 Ibidem, P. 64. 
40 
 
 
 
 
propriedade eram considerados absolutos, fazia com que as sociedades empresárias “se 
dedicassem às suas finalidades econômicas em toda intensidade possível, sem que houvesse 
qualquer outro interesse que pudesse pautar suas condutas além da obtenção de lucros para os 
acionistas”136. 
 
De acordo com Calixto Salomão Filho
137
, há duas versões do contratualismo clássico: uma 
que apregoa que o interesse social se refere apenas ao grupo de sócios atuais, e outra que 
“inclui na categoria sócio não apenas os atuais como também os futuros”. Um dos partidários 
desta primeira corrente seria Pier Giusto Jaeger, que nas palavras de Calixto Salomão Filho
138
, 
considerava que o interesse social “não constitui um conceito abstrato, mas, sim, algo de 
concreto definível apenas quando comparado com o interesse do sócio para aplicação das 
regras sobre o conflito de interesses”. 
 
No pensamento de Calixto Salomão Filho, tal visão viria: 
 
a partir de sua concepção particular do contrato de sociedade: como o 
contrato social é de execução continuada e o interesse social é o interesse do 
grupo de sócios, aquele interesse social pode ser constantemente revisto e 
eventualmente desconsiderado de modo explícito quando se trata de decisão 
unânime dos sócios. 
 
A questão é que essa visão de Pier Giusto Jaeger foi inclusive revista por ele quarenta anos 
depois, onde ele identifica o interesse social como a busca para conseguir o shareholder 
value, ou seja, a maximização do valor de venda das ações do sócio
139
, consubstanciando o 
pensamento do chamado contratualismo moderno. 
 
Essa linha de raciocínio acarretaria apenas em um forte incentivo para a busca “desenfreada 
de aumento do valor de venda das ações por todos os agentes do mercado”140, em um 
 
136
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 66. 
137
 SALOMÃO FILHO, Calixto, Op. Cit., 2011, P. 29. 
138
 Ibidem, P. 29. 
139
 JAEGER, Pier Giusto. Interesse sociale revisitato (quarant’ anni dopo). Apud SALOMÃO FILHO, Calixto. 
Ob. Cit., 2011, P. 31. 
140
 SALOMÃO FILHO, Calixto, Ob. Cit., 2011, P. 32. 
41 
 
 
 
 
encorajamento ímpar para a especulação. Tal perspectiva é dominante na doutrina e na prática 
societária americana, e de acordo com Calixto Salomão Filho
141
: 
 
é responsável, hoje, pela forte tendência à interpretação permissiva de regras 
contábeis, à mudança de regras contábeis ou até mesmo à maquiagem de 
balanços, fenômenos endêmicos e conhecidos na realidade societária 
americana, da qual o caso Enron e os escândalos com empresas de auditoria 
são apenas pequena parte, até agora visível. 
 
 
A definição de que o interesse social seria a maximização do valor de venda das ações do 
sócio tratava principalmente de aumentar a remuneração dos administradores, que nas 
empresas americanas “consistia basicamente de compra de ações”142. Ou seja, haveria um 
estímulo para a criação artificial de valor acionário, decorrente, segundo Fábio Konder 
Comparato
143, “dessas características societárias e não de falhas na legislação de mercado de 
capitais”. 
 
2.1.1.2 A TEORIA INSTUTUCIONALISTA 
 
Por sua vez, a corrente institucionalista que se contrapôs ao contratualismo foi composta de 
várias vertentes, dentre elas, destaca-se o que foi denominado como institucionalismo 
publicista e o integracionista, ou organizativo. 
 
O institucionalismo publicista surgiu na Alemanha após a Primeira Guerra Mundial e teve 
como expoente a doutrina do “Unternehmen an sich” ou “empresa em si” de Walther 
Rathenau
144
. Segundo Calixto Salomão Filho
145
, o termo Unternehmen teria o sentido de 
identificar uma “instituição não redutível ao interesse dos sócios”. 
 
Diante do abalo econômico sofrido pelo povo alemão, Walther Rathenau “identificava em 
 
141
 SALOMÃO FILHO, Calixto, Op. Cit., 2011, P. 32. 
142
 COMPARATO, Fábio Konder, Ob. Cit., 2008, P. 378. 
143
 Ibidem, P. 378. 
144
 SALOMÃO FILHO, Calixto, Op. Cit., 2011, P. 32. 
145
 Ibidem, P. 33. 
42 
 
 
 
 
cada grande sociedade um instrumento para o renascimento econômico do país, que 
interessaria cada vez mais ao Estado, a quem caberia o dever de proteção da empresa”146. Essa 
teoria trata de definir o interesse social como o interesse da empresa, de forma a abranger 
também as necessidades sociais, não reduzindo apenas o foco aos interesses dos acionistas
147
. 
 
Luigi Mengoni
148
 esclarece que essa ruína financeira da Alemanha fez com que surgisse um 
grande interesse dos empresários para tentar barrar o crescimento exacerbado de capitais 
estrangeiros na indústria alemã e o consequente domínio estrangeiro da economia. A 
exaltação do poder dos controladores e dos administradores aliada com a “substituição dos 
fins genuinamente societários de maximização de lucros pelos fins imediatamente 
empresariais de produção a favor da recuperação da economia do país”149 foram uma forma 
de tentar atingir tal fim. 
 
A teoria de Walther Rathenau valorizou “papel do órgão de administração da sociedade por 
ações, visto como órgão neutro, apto à defesa do Unternehmensinteresse (interesse 
empresarial)”150, passando a ser “depositário e intérprete do interesse social”151 e diminuindo 
a importância da assembleia geral. 
 
A respeito desse aspecto da teoria de Walther Rathenau, Calixto Salomão Filho
152
 afirma que: 
 
os críticos dessa teoria argumentam ser ilógico considerar a administração 
(Verwaltung) um órgão neutro de defesa do interesse social. Dada a sua 
estreita ligação aos interesses dos sócios majoritários, a autonomia e 
tendencial irresponsabilidade decorrente do recurso constante ao interesse 
social acaba funcionando frequentemente contra os interesses do sócio 
minoritário e no interesse do sócio controlador. 
 
146
 FRAZÃO, Ana, Op. Cit., 2011, P. 122. 
147
 Ibidem, P. 122. 
148
 MENGONI, Luigi. Apunti per uma revisiane dela teoria sul conflito di interessi. Apud CARVALHOSA, 
Modesto, Op. Cit., 1998, Vol. 2, P. 424. 
149
 CARVALHOSA, Modesto, Op. Cit., 1998, Vol. 2, P. 424. 
150
 SALOMÃO FILHO, Calixto, Op. Cit., 2011, P. 33. 
151
 CARVALHOSA, Modesto, Op. Cit., 1998, Vol. 2, P. 392. 
152
 SALOMÃO FILHO, Calixto, Op. Cit., 2011, P. 33. 
43 
 
 
 
 
 
A doutrina de Walther Rathenau influenciou a legislação alemã de 1937 que afirmava que “a 
direção tem poderes para dirigir a sociedade para o bem do estabelecimento e do seu pessoal e 
o bem comum do povo e do Reich”153, e se a diretoria for composta por um diretor ele se 
tornaria “a alma da empresa, o Führer”154. 
 
A essa previsão é que

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