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O Comunicador Popular - Kaplun (Cap.1)

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“O COMUNICADOR POPULAR” 
Mario Kaplun 
 
 
 
 
PARTE 1. 
MODELOS DE EDUCAÇÃO E MODELOS DE COMUNICAÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Tradução coletiva realizada pelo Coletivo de Comunicadores Populares 
http://www.camaracom.com.br/coletivo 
 
Agradecimentos especiais aos tradutores(as): Cristina Beskow, Cecília Reigada, Flávio Vieira, Jefferson Vasques 
Apoio de tradução: Ofélia 
 
 
 
 
 
 
 
Por que começar falando de educação e não de comunicação? Não é alongar o caminho com um rodeio 
desnecessário? 
 
Em primeiro lugar, quando estamos fazendo comunicação popular estamos sempre buscando, de uma 
maneira ou de outra, um resultado educativo. Dizemos que produzimos nossas mensagens “para que o povo tome 
consciência de sua realidade”, ou “para suscitar uma reflexão”, ou “para gerar uma discussão”. Consideramos, 
pois, os meios de comunicação que realizamos como instrumentos para uma educação popular, como alimentadores 
de um processo educativo transformador. 
 
È bom, então, que comecemos clareando e idéia que temos da educação; que concepção de educação está 
por trás das nossas práticas de comunicação. 
 
No entanto, há outra razão ainda mais importante para começar por este tema. E é que, como veremos: 
 
 A CADA TIPO DE EDUCAÇÃO CORRESPONDE UMA DETERMINADA 
CONCEPÇÃO E UM A DETERMINADA PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO. 
 
Por isso é tão útil e esclarecedor começar analisando os diferentes tipos de educação. Pela experiência de 
nossas oficinas, temos comprovado que, depois de refletir sobre este tema, o entendimento do conceito de 
comunicação se torna mais fácil; e que ele constitui um bom ponto de partida. 
 
 
OS TRÊS MODELOS DE EDUCAÇÃO 
 
Ainda que na realidade existam muitas concepções pedagógicas, Díaz Bordenave1 assinalou que se pode 
agrupá-las em três modelos fundamentais. 
 
 Estes três modelos não se encontram em sua forma pura e isolada na realidade, e sim mesclados entre si e 
presentes em distintas proporções nas diversas ações educativas concretas. Entretanto, é possível distinguir estes 
três modelos básicos: 
 
 
 
 
 MODELOS EXÓGENOS 
 
 (educando = objeto) 
 
 MODELOS ENDÓGENOS
 
 (educando = sujeito) 
 Æ 1. Educação que enfatiza os conteúdos; Æ 3. Educação que enfatiza o processo. 
 Æ 2. Educação que enfatiza os efeitos. 
 
 Chamamos os dois primeiros de modelos exógenos porque foram concebidos desconsiderando o 
destinatário, como se fossem externos a ele: o educando é visto como objeto da educação. Já o modelo endógeno 
parte do destinatário: o educando é o sujeito da educação. 
 
Cada modelo dá ênfase a um objetivo distinto; isto é, que acentua, dá prioridade a este aspecto. Não que 
prescinda radicalmente dos outros dois, mas se centra e privilegia o que lhe é próprio. Por exemplo, a educação que 
enfatiza o processo, não por isso se desprende dos conteúdos e dos efeitos, mas sua prioridade básica nunca estará 
neles e sim no processo individual do educando. 
 
1 JUAN DÍAZ BORDENAVE: Las Nuevas Pedagogías y Tecnologías de Comunicacíon. Conferência apresentada 
na Reunião de Consulta sobre a Pesquisa para o Desenvolvimento Rural na América Latina. Cali, 1976. 
Comecemos definindo os tipos de educação sumariamente para logo analisá-los: 
 
1. EDUCAÇÃO QUE DÁ ÊNFASE AOS CONTEÚDOS: 
Corresponde à educação tradicional, baseada na transmissão de conhecimentos e 
valores de uma geração a outra, do professor ao aluno, da elite “instruída” às massas 
ignorantes; 
 
2. EDUCAÇÃO QUE DÁ ÊNFASE AOS EFEITOS: 
Corresponde à chamada “engenharia do comportamento” e consiste essencialmente em 
“moldar” a conduta das pessoas com objetivos previamente estabelecidos; 
 
3. EDUCAÇÃO QUE DÁ ÊNFASE AO PROCESSO: 
Destaca a importância do processo de transformação da pessoa e das comunidades. 
Não se preocupa tanto com os conteúdos a serem comunicados nem com os efeitos em 
termos de comportamento, quanto com a interação dialética entre as pessoas e sua 
realidade; com o desenvolvimento de suas capacidades intelectuais e de sua 
consciência social. 
 
Trataremos de descrever e caracterizar cada uma destas três pedagogias a fim de ver que modelo de 
comunicação se relaciona com cada uma delas: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1. ÊNFASE NOS CONTEÚDOS 
 
 
 
 
 
 
Esse modelo de educação é, como já foi 
dito, o tipo de educação tradicional, baseado na 
transmissão de conhecimentos. Ao professor (ou 
comunicador), o instruído, “o que sabe”; cabe 
ensinar ao ignorante, o que não sabe. 
 
Como o leitor seguramente já deve ter 
reconhecido, é o tipo de educação que um de seus 
mais agudos críticos, Paulo Freire, qualificou de 
bancária: o educador deposita conhecimentos na 
mente do educando. Trata-se de “inculcar” noções, 
de introduzi-las na memória do aluno, que é visto 
como receptáculo e depositário de informações. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Díaz Bordenave propõe esta adequada caricatura para caracterizar este modelo educativo: 
 
Todos conhecemos este tipo de educação vertical e autoritária: o 
paternalista (o paternalismo é tão somente uma forma mais amenizada do 
autoritarismo). Todos o sentimos. É ele que predomina no sistema educativo 
formal: no ginásio, no colegial, na Universidade. Repetidamente se censura a 
escola tradicional por sua tendência a confundir a autêntica educação com o 
que é mera instrução: ela INFORMA, mas não FORMA. 
 
Paulo Freire, ao analisá-la, diz que esta educação bancária serve para a 
domestificação do homem. Nela, aponta o autor de “Pedagogia do Oprimido”: 
 
 
O EDUCADOR O EDUCANDO 
- é sempre quem educa - é sempre o que é educado 
- é quem fala - é quem escuta 
- prescreve, põe as regras - obedece, segue a prescrição 
- escolhe o conteúdo dos programas - recebe o conteúdo em forma de depósito 
- é sempre quem sabe - é aquele que não sabe 
- é o sujeito do processo - é o objeto do processo. 
O MODELO EM SUA APLICAÇÃO: 
 
* Os eixos do método são o professor e o texto. 
* Os programas de estudo são frondosos e baseados nos conceitos que a fonte emissora (o professor) 
considera importantes. 
* Se dá muita pouca importância ao diálogo e à participação. 
* Valoriza-se muito a data e muito pouco o conceito. 
* Se preza a boa retenção dos conteúdos (ou seja, sua memorização) e se castiga a reprodução pouco fiel. A 
elaboração pessoal do educando também é reprimida como erro. 
* Há uma única verdade: a do professor. As experiências de vida dos educandos não são valorizadas. 
 
 
OS RESULTADOS 
 
* O aluno (ou o ouvinte, o leitor, o público) se habitua à passividade e não desenvolve sua própria 
capacidade de raciocinar e de desenvolver sua consciência crítica. 
* Se estabelece uma diferença de “status” entre o professor e o aluno (ou entre o comunicador e o leitor ou 
ouvinte). 
* Se fomenta uma estrutura mental de acatamento ao autoritarismo: o aluno internaliza a superioridade e 
autoridade do professor, atitude que logo passará paro o plano social e político. 
* Se favorece a manutenção do “status quo” no qual uma minoria pensante domina a uma massa apática. 
* Em virtude do regime de notas (prêmios e castigos) se fomenta o individualismo e a competência em 
prejuízo à solidariedade e aos valores comunitários. 
* Os educandos adquirem uma mente “fechada” ou dogmática, incapaz de julgar as mensagens recebidas 
por seus próprios méritos, independentemente da autoridade de suas fontes; 
* No estudante da classe popular se acentua o sentimento de inferioridade: o educando se sente inseguro, 
perde sua auto-estima, sente que não sabe. 
 
OBJETIVO: QUE O EDUCANDO APRENDA 
 
O indicador que o educador utilizará nestemodelo para avaliar seu produto será sempre: o aluno sabe (a 
lição, a matéria)? Ele aprendeu? 
 
Na verdade, o resultado é que geralmente o aluno não aprende, e sim memoriza, repete e logo esquece. Não 
assimila, porque não há assimilação sem participação, sem elaboração pessoal. 
 
A educação bancária dita idéias, não há intercâmbio de idéias. Não debate ou discute 
temas. Trabalha sobre o educando. Impõe-lhe uma ordem da qual ele não compartilha, e 
sim que o incomoda. Não lhe oferece meios para pensar autenticamente, porque ao 
receber as fórmulas dadas, simplesmente as guarda. Não as incorpora, porque a 
incorporação é o resultado da busca, de algo que exige da parte de quem a tenta, um 
esforço de re-criação, de invenção. 
 PAULO FREIRE2 
 
Convém reter estas últimas palavras, pois nos dão uma chave importante para nosso trabalho como 
comunicadores populares. Nossa comunicação popular deve procurar suscitar, estimular nos destinatários de nossas 
mensagens uma re-criação, uma invenção. 
 
 
2 PAULO FREIRE: La Educacíon como Práctica de la Libertad. Tierra Nueva, Montevideo, 1969. 
 
A COMUNICAÇÃO NESTE MODELO 
 
 Assim como existe uma educação bancária, existe uma comunicação bancária. 
 Que conceito da comunicação tem o tipo de educação que acabamos de caracterizar? 
 
 
 
Como transmissão de informação. Um emissor (E) que envia sua mensagem (m) a um receptor (R). 
O emissor é o educador que fala frente a um educando que deve escutá-lo passivamente. Ou é o 
comunicador que “sabe”, emitindo sua mensagem (seu artigo jornalístico, seu programa de rádio, etc.) a partir de 
sua própria visão, com seus próprios conteúdos, a um leitor (ou ouvinte ou espectador) que “não sabe” e que não 
reconhece para si outro papel que o de receptor da informação. Seu modo de comunicação é, pois, o 
MONÓLOGO. 
 
O COMUNICADOR 
 
O RECEPTOR 
 
- emite - recebe 
- fala - escuta 
- escolhe o conteúdo das mensagens - recebe o conteúdo como informação 
- é sempre o que sabe - é o que não sabe 
 
 
 
Na realidade, quando este modelo se propõe a si mesmo um traçado horizontal, já 
está trapaceando. Seria mais exato representá-lo como no desenho abaixo, posto que é 
uma comunicação essencialmente autoritária e, por tanto, vertical. O emissor domina, é o 
dono, o PROTAGONISTA de comunicação. Qualifica-se esta comunicação de 
unidirecional porque flui apenas em uma direção, em uma única via: do emissor ao 
receptor. 
 
 Pareceria que, em nossa comunicação popular, este modelo autoritário não tem 
lugar; que nos é totalmente alheio. Apresentado assim, ele merece apenas nossa 
rejeição/repúdio. Todavia, a concepção comunicacional emissor/mensagem/receptor está 
tão incorporada à sociedade, aparece como tão corriqueira e natural, que acaso, sem que 
sejamos conscientes disso, segue ainda influindo com força em nós e em nossa produção 
popular. 
 
* No nosso jornal, quem é que escolhe os conteúdos; quem os determina e seleciona? 
Fazemos o periódico consultando com a comunidade, recolhendo suas necessidades e suas 
aspirações, ou o fazemos desde nossa própria perspectiva? 
 
*Quando criamos nossa obra de teatro ou roteiro de nossa montagem de slides? Ou de 
nosso programa de rádio, tratamos de ir suscitando nos destinatários um processo pessoal, ou lhes disparamos 
verticalmente a informação que eles têm que aprender? 
 
À medida que seguimos assumindo o clássico papel de emissores, de possuidores da verdade que ditamos aos 
que “não sabem”; à medida que seguimos depositando informações e idéias já “digeridas” na mente de nossos 
destinatários, por libertadores e progressistas que sejam os conteúdos de nossas mensagens, continuamos tributários 
de uma comunicação autoritária, vertical, unidirecional. 
 
 
EXEMPLOS QUE NOS INTERPELAM 
 
Valeria a pena refletir sobre o caso da chamada “educação radiofônica” (instrução por rádio) na qual, por 
própria limitação do meio, o aluno se faz ausente, ouvindo a lição da sua casa e reduzido, portanto ao silêncio e à 
passividade. Somente lhe resta escutar, repetir o que lhe indica o professor e “aprender”. 
 
Muitas das tão meritórias “escolas radiofônicas” da América Latina, destinadas à educação de adultos 
reagiram saudavelmente contra essa concepção e a rechaçam, em muitos casos com indubitável sinceridade; em 
seus postulados hoje sustentam os princípios de uma educação libertadora e personalizante/pessoal; mas suas 
emissões, no entanto, continuam sujeitas ao esquema mecanicista tradicional – mestre que “ensina”, aluno que 
“aprende” – porque não souberam encontrar e criar outras maneiras de educar através do rádio. 
 
Seria interessante assim mesmo analisar e avaliar o caso de alguns grupos que produzem audiovisuais. Hoje, 
existe a moda de tais meios. A educação bancária tradicional sentiu a necessidade de “modernizar-se” e introduziu 
os chamados “apoio audiovisuais”: dispositivos, películas, vídeos... Inclusive se fala de uma “pedagogia 
audiovisual”. Mas com isso a educação em si, na realidade, não mudou nada. Ao contrário: fez-se ainda mais rígida 
e autoritária. Frente a um audiovisual, o educando nem sequer tem com quem falar. Já se dá tudo feito, todo o 
ensinamento digerido. Os meios audiovisuais na educação tradicional se usam somente como reforços para a 
transmissão dos conteúdos. É educação “envasada”. 
 
Pois bem, atualmente, na comunicação popular vemos utilizar cada vez mais e com maior entusiasmo as 
montagens de slides, as películas, os vídeos, etc. O que, em si mesmo, pode ser positivo: não estamos questionando 
o valor inegável desses recursos quando se sabe como utilizá-los bem. Mas talvez muitos desses comunicadores 
populares tão entusiasmados por eles, não estejam fazendo outra coisa que imitar irrefletidamente uma moda e 
valer-se de uma linguagem visual mais atrativa e penetrante para impor suas próprias idéias, seus próprios 
conteúdos (por mais “progressistas” que estes sejam). Realizam audiovisuais de tal maneira que não deixam um 
espaço, um respiro sequer ao espectador para que possa por sua conta recriar com sua própria elaboração. O 
bombardeiam com imagens, efeitos sonoros e musicais, com frases altissonantes e lhe dão, já digerida e mastigada, 
sua própria conclusão. 
 
Em síntese, todos que tratamos de fazer autêntica comunicação popular deveríamos nos perguntar: 
• Lançamos afirmações ou criamos as condições para uma reflexão pessoal? 
• Nossos meios monologam ou dialogam? 
 
 
SUGESTÕES PARA O FACILITADOR 
 
 Naturalmente que o que aqui, no livro, não temos possibilidade de apresentar senão em forma de exposição 
já elaborada e desenvolvida, nas oficinas o vamos inferindo, descobrindo no diálogo com os participantes, a partir 
de suas experiências e suas observações. Distintas dinâmicas podem ajudar a essa descoberta. Por exemplo, no caso 
deste primeiro tema: 
• Reconstruir (em forma de improvisação teatral ou sócio-drama) uma classe tradicional ou um exame. 
Logo, analisar a atitude do professor e dos educando e inferir dali as características e conseqüências 
deste tipo de educação. 
• Analisar algumas mensagens de comunicação popular (inclusive produzidos pelos próprios 
participantes) e detectar em que medida estão influenciados pelo modelo autoritário emissor/receptor. 
• Discutir se este modelo é eficaz ou não para uma educação libertadora e por quê. 
2. ÊNFASE NOS EFEITOS 
 
 
Convém analisar este segundo modelo com especial 
cuidado, porque é este o que mais influenciou a 
concepção da comunicação: em quase todos os 
manuais de comunicação que se utilizam como 
textos de estúdio em nossos países, os estudantes 
encontram, explícitaou implicitamente, os 
princípios que regem este tipo de educação. 
 
Outro motivo para examiná-lo com atenção é que, 
aparentemente, apresenta características que 
compartilhamos: 
 
• questiona o modelo tradicional; surgiu como 
uma reação contra ele, como uma resposta 
mais atual, mais “moderna”; 
• dá muita importância à motivação; 
• rechaça o modelo livresco, os programas 
frondosos; 
• busca uma comunicação com 
retroalimentação por parte do destinatário; 
• postula como objetivo a “mudança de 
atitudes”; 
• é um método ativo, propõe ações; 
• preocupa-se muito em avaliar o resultado 
das mesmas. 
 
No entanto, apesar dessas aparentes coincidências 
que podem fazê-lo atrativo a nossos olhos, sua 
diferença com a educação libertadora é radical; e é, 
como vamos ver, tão autoritário e impositivo como 
o modelo tradicional ou ainda mais. 
 
A ORIGEM DO MODELO 
 
 Se o primeiro modelo – o que põe a ênfase no conteúdo – é de origem europeu e acunhado pela velha 
educação escolástica e enciclopédica que recebemos do Velho Mundo desde a Colônia, este segundo modelo 
nasceu nos Estados Unidos em pleno século XX: durante a segunda Guerra Mundial (década de 40). Desenvolveu-
se precisamente para o treinamento militar; para o rápido e eficaz adestramento dos soldados. 
 
Seus planejadores – como apontamos antes – questionavam o tradicional método livresco por ser pouco 
prático; porque não conseguiam uma verdadeira aprendizagem em pouco tempo; porque é lento e caro. É ineficaz: o 
educador repete e depois esquece. Propunham, em seu lugar, um método mais rápido e eficiente, mais impactante, 
mais “feito em série”, para CONDICIONAR o educando para que adote as condutas e as idéias que o planejador 
havia determinado previamente (o qual explica porque este modelo teve tanta aceitação no exército, na guerra). 
 
O que determina o que o educando tem que fazer, como deve atuar, inclusive o que deve pensar, é o 
programador. Todos os passos do ensino vêm já programados. Tudo se converte em técnicas: em técnicas para o 
aprendizado. 
 
Chamaram-se ao primeiro tipo de “educação bancária” a este poderíamos chamá-lo de educação 
MANIPULADORA. 
 
 
O MODELO CHEGA À AMÉRICA LATINA 
 
Na década de 60, na chamada “década do desenvolvimento” ou de “desenvolvimentismo”, chega este 
modelo à América Latina, importado da Nação do Norte, como uma resposta da Aliança para o Progresso ao 
problema do “subdesenvolvimento”. 
 
Pensava-se que a solução para a pobreza em que estavam mergulhados nossos países “atrasados e 
ignorantes” era a modernização, isto é, a adoção das características e dos métodos de produção dos países 
capitalistas “desenvolvidos”. Era necessário multiplicar a produção e conquistar um rápido e forte aumento dos 
índices de produtividade; e, para isso, resultava imprescindível a introdução de novas e modernas tecnologias. As 
inovações tecnológicas eram vistas como a panacéia para todos nossos males; elas por si mesmas permitiriam obter 
progressos espetaculares. 
 
A educação e a comunicação deviam servir para alcançar essas metas. Por exemplo, deviam ser empregadas 
para PERSUADIR aos campesinos “atrasados” a abandonar seus métodos agrícolas primitivos e adotar rapidamente 
as novas técnicas. 
 
Repare no verbo persuadir. PERSUASÃO é um conceito chave neste modelo. Já não se trata, como no 
anterior, só de informar e dar conhecimentos; mas, sobretudo, de convencer, de manipular, de condicionar o 
indivíduo, para que adote a nova conduta proposta. Era fundamental buscar os meios e técnicas mais impactantes de 
penetração e de persuasão para - assim o dizem literalmente num escrito de 1960 – “mudar a mentalidade e o 
comportamento de milhares de seres humanos que vivem no campo”. 
 
Mudá-los – claro está – “para o bem deles mesmos e dos demais membros da coletividade”. Estes 
educadores trabalhavam de boa-fé, criam sinceramente que essa era a maneira de ajudarmos a sair da pobreza. Não 
é necessário imaginá-los como seres diabólicos. Todo manipulador legitima seu trabalho na convicção de que o faz 
pelo bem daqueles a quem tenta “conduzir para o bom caminho”. 
 
Assim se instrumentalizou a chamada ENGENHARIA DO COMPORTAMENTO. 
Em textos de comunicação escritos por esses anos, é possível encontrar definições tão significativas como a 
seguinte: 
 
O comunicador é uma espécie de arquiteto da conduta humana, um praticante da 
engenharia do comportamento, cuja função é induzir e persuadir a população a adotar 
determinadas formas de pensar, sentir e atuar, que lhes permitam aumentar sua 
produção e sua produtividade, e elevar seus níveis e hábitos de vida.3
 
 
AS BASES PSICOLÓGICAS 
 
Não seria de todo justo afirmar que este tipo de educação “não tem em conta o homem”. Pelo contrário, 
existe todo um vasto estudo da psicologia humana desenvolvido ao serviço desta corrente. 
Mas não é uma psicologia que procure o pleno desenvolvimento autônomo da personalidade do individuo, senão 
que investiga os mecanismos para poder “persuadi-lo” e “conduzi-lo” mais eficazmente; para modelar a conduta 
das pessoas de acordo com os objetivos previamente estabelecidos. 
 
3 JORGE RAMSAY e Outros: Extensão Agrícola - Dinâmica do Desenvolvimento rural. Instituto Interamericano de Ciências Agrícolas, 
Sari José, costa Rica. 1960 {4a. edição, 1975} 
Tal é o objetivo da psicologia CONDUTIVISTA (ou, em inglês, BEHAVIORISTA, de behavior, conduta), que se 
baseia no mecanismo de estímulos e recompensas e que originou este modelo educativo. 
 
 
O HÁBITO, A RECOMPENSA 
 
 
 O condutivismo assinala ao HÁBITO 
um papel centra na educação. Por hábito 
entende esta escola “a relação entre o estímulo e 
a resposta que a pessoa dá a esse estímulo, 
resposta pela qual recebe recompensa”. O 
hábito assim definido é, pois, uma conduta 
automática, mecânica, não-reflexiva, não-
consciente e, portanto, possível de ser 
condicionada, modelada, suscitada 
externamente pelo educador em poder do 
estímulo e das recompensas adequadas. Educar 
não é raciocinar, senão gerar hábitos. 
 
Como o leitor já terá percebido, se parte 
do mesmo princípio da teoria neurofisiológica 
dos “reflexos condicionados” de Pavlov, 
aplicados aqui à educação. É partindo disso que, 
para representar graficamente esse modelo educativo, Díaz Bordenave propõe o desenho presente na página 
anterior. 
 
 
A “MUDANÇA DE ATITUDES” 
 
A recompensa joga, pois, um papel fundamental nas técnicas educativas deste modelo. Ela é a que 
determina a criação de novos hábitos no indivíduo. É algo mais que o prêmio de obter uma boa nota em um exame; 
deve ser algo capaz de mover o indivíduo para que adote uma nova conduta; ou seja, de provocar um efeito e 
produzir um resultado. 
 
Um bom exemplo de recompensa encontramos na campanha de controle de natalidade realizada na Índia, 
onde o organismo norte-americano que financiou a campanha oferecia um presente um rádio a todo homem que se 
deixasse esterilizar. 
 
É também nesse sentido que este modelo de educação fala de “MUDANÇA DE ATITUDES”, entendida 
como a substituição de hábitos tradicionais por outros favoráveis a novas práticas; mas sempre hábitos, vale dizer, 
condutas automáticas, modeladas, condicionadas. 
 
 
O MANEJO DO CONFLITO; A RESISTÊNCIA À MUDANÇA 
 
É também significativa a estratégia que adota este modelo de educação em relação ao conflito. 
Os educadores e comunicadores formados neste modelo, ao utilizar as técnicas para impor a modernização e 
a “mudança de atitudes”, prevêem o que chamam de “resistência à mudança”: crenças, mitos, juízos, tradições, 
valores culturais ancestrais que conformam e condicionam o comportamento social das pessoas e que podem entrar 
em conflito com os novos hábitos propostos, gerando resistência e rechaço. 
Qual é a estratégiaque se aconselha nesse caso à comunicação persuasiva? Antes de tudo, desde logo, não fazer 
caso nem escutar os destinatários; considerar que o técnico sempre tem razão e que se a gente não quer aceitar as 
novas condutas é sempre por “prejuízos”, por “ignorância”, por “atraso”. E, em segundo lugar, tratar de introduzir a 
nova conduta evitando o conflito. 
 
“Para substituir algo – dizem – não é indispensável discutir os defeitos do anterior. É melhor ressaltar as 
vantagens do novo que se propõe e insistir na recompensa. Quando a mensagem não está de acordo com os valores 
do meio social que forma o destinatário, se deve omitir toda referência a esse desacordo”. 
 
Ou seja, INCULCAR AS NOVAS ATITUDES SEM PASSAR PELA REFLEXÃO, PELA ANÁLISE; 
SEM PASAR PELA CONSCIÊNCIA; SEM SUBMETÊ-LAS A UMA LIVRE ESCOLHA. 
 
 
 
A consciência, a liberdade, molestam, cansam. Fazem perder tempo. Temos que chegar a algum resultado: 
não que a pessoa pense, discuta a questão e tome uma decisão livre e autônoma (porque isso leva tempo e há sério 
perigo de que ao final termine negando a proposta), senão persuadi-la, condicioná-la, oferecer-lhe a isca de uma 
recompensa para que adote de uma vez a mudança que se deseja impor. 
 
 
ONDE ESTÁ PRESENTE ESTE MODELO? 
 
• Já demos um exemplo: nas técnicas difusoras da modernização agrícola. Muitos extensionistas o aplicam. 
• O encontramos também no treinamento técnico-profissional: adestramento de operários, ensino de ofícios. 
• O achamos assim em todo o conjunto de técnicas, métodos e aparatos da chamada “tecnologia educativa”; 
nas “máquinas de ensinar” que dão lugar à “instrução programada”. 
• Está muito presente também na maioria dos métodos planejados para a chamada “educação a distancia”, 
onde o estudante estuda só, mas não investigando ou pensando por sua conta, senão seguindo os passos 
rigidamente prefixados pelo programador do curso e instrumentados em uma bateria de cassetes, programas 
de televisão, vídeo-cassetes, etc, aonde já vem tudo definido. 
• Outra das aplicações da tecnologia educativa consiste nos exames escritos de múltiplas opções, com varias 
respostas já formuladas e um espaço onde o estudante deve marcar com um x a que resposta que crê correta. 
Este tipo de exame tecnifica o ensino, porque depois se pode processá-lo rapidamente por computadores 
sem necessidade de intervenção do professor para corrigi-lo. Mas suprime todo interesse pelo o que 
constitui o verdadeiro objeto da educação: o raciocínio pessoal pelo qual o estudante chegou à resposta (o 
aluno pode chegar à resposta por puro “chute”, adivinhando). E exclui, desde o início, toda a possibilidade 
de que o educando proponha uma resposta própria, pessoal, reelaborada por ele, que não coincida com 
nenhuma das opções formuladas. Tudo se reduz, não a raciocinar, não a relacionar, senão a respostas 
“corretas” e “incorretas”. 
 
O MODELO EM NOSSA VIDA COTIDIANA 
 
 Ainda que não tenhamos experiência pessoal de termos sido submetidos a este modelo de educação, o 
conhecemos por analogia, por fenômenos sociais que aplicam esses mesmos mecanismos, tais como: 
 
• Os meios massivos de comunicação (televisão, imprensa, radio, cinema comercial, revistas), os que se 
valem com freqüência destes mesmos recursos condicionadores para manipular a opinião do publico e 
modelar e uniformizar suas condutas. Não é de surpreender que este modelo de educação seja o que 
assinale mais importância aos meios massivos e os empregue amplamente em suas “campanha 
educativas”. 
• As técnicas publicitárias (propaganda comercial) que atuam por pressão, repetição e por motivações 
subliminares e onde o que interessa é que o público compre o produto anunciado (efeito) ainda que o 
faça por mero impulso, sem pensar, sem consciência dos motivos de seu ato e seduzido por um 
mecanismo ilusório de estímulo/recompensa que nada tem que ver com o conteúdo e com o uso do 
produto: “Camisa X: o segredo do êxito”... “Desodorante N para conquistar os homens... o desodorante 
da sedução”... 
• A propaganda política (particularmente a eleitoral), que, em geral, só se propõe criar uma pressão para 
que a massa vote no candidato (efeito) somente por sua presença e sua destreza oratória, sem reflexão 
nem analise nem conhecimento de seu programa de governo. O slogan é um grande recurso emocional 
desta concepção educativa. 
 
 
O MODELO EM SUA APLICAÇÃO 
 
 Voltemos ao modelo no aspecto estritamente educacional. Muitas de suas características foram assinaladas, 
incluímos aqui algumas poucas mais: 
 
 
• Assim como no modelo tradicional, o eixo 
residia no professor e o texto, aqui no centro 
é o PROGRAMADOR. O trabalho de 
ensinar se deixa para materiais escritos ou 
audiovisuais, máquinas de ensinar, 
computadores etc. 
• O planejamento da instrução e sua 
programação é encarada como uma 
engenharia do comportamento; 
• Dá-se uma aparência de participação dos 
educandos ou receptores. Mas, é somente 
uma aparência, uma pseudoparticipação: os 
conteúdos e os objetivos já estão definidos e 
programados de antemão. O educando só 
“participa” execuntando-os . (Por exemplo: 
quando se oferece um curso de cultivo de 
frutas, os camponeses participam das 
práticas; mas não têm nenhuma 
oportunidade de discutir sua realidade 
econômica e formas de libertação). 
 
 
 
 
 
ALGUMAS CONSEQUÊNCIAS 
 
- Aos serem estabelecidos os objetivos de maneira específica e rígida, pelo programador, o educando se 
acostuma a ser guiado por outros; 
- O ensino de maneira individual tende a isolar as pessoas, não propiciando uma atividade educativa e 
solidária; 
- Em troca, tende a desenvolver a competitividade; 
- Desde o ponto de vista dos valores sociais, pela vida da recompensa individual imediata, implantam-se ou 
reforçam-se valores de caráter mercantil ou utilitário, tais como o êxito material como critério de 
valorização, o consumismo, o individualismo e o lucro; 
- Ao rejeitarem seus valores culturais tradicionais, os educandos sofrem a perda de sua identidade cultural, o 
que lhes tira a segurança e referências, os deixando desenraizados. 
- Por outro lado, o método não favorece o desenvolvimento do raciocínio. Como só valoriza os resultados 
(efeito) em termos de ganho de objetivos operacionais pré-estabelecidos, este tipo de educação não contribui 
para o desenvolvimento da criatividade e da consciência crítica. 
- Tampouco favorece a inter-relação , a integração dos conhecimentos adquiridos, a capacidade de analisar 
a realidade de forma global, de tirar conseqüências. 
- Não se promove a participação, a auto-gestão, a tomada de decisões. 
- Por último, desde o ponto de vista sócio-político, é obvio que este modelo de educação tem um efeito 
domesticador, de adaptação ao status quo. 
 
 
 OBJETIVO: QUE O EDUCANDO FAÇA.
 
 
 
COMO A COMUNICAÇÃO CONCEBE ESTE MODELO 
 
O esquema de comunicação persuasiva introduz uma diferença importante com respeito ao defendido pela 
educação tradicional. 
Faz-se necessário analisar com especial atenção, porque se trata do modelo clássico de comunicação, o mais 
difundido e consagrado 
 
 
Continua havendo um emissor (E) protagonista, um dono da comunicação, que envia uma mensagem (m) a 
um receptor (R), o qual, por conseguinte, continua reduzido a um papel secundário, subordinado, dependente; mas 
agora aparece uma resposta ou reação do receptor, denominada retroalimentação (r) ou, em inglês, feedback, o qual 
é recolhida pelo emissor. 
 
O modelo pode ser percebido, portanto, como algo mais equilibrado e participativo, já que, aparentemente, 
lhe reconhece um papel relativamente mais ativo ao receptor, a quem se lhe daria ao menos a oportunidade de 
reagir ante a mensagem recebida e ter, assim, alguma influência, algum peso na comunicação. Parece atenuar a 
unidirecionalidade do modelo e insinuauma certa bidirecionalidade. 
 
Contudo, não devemos esquecer que estamos diante de uma comunicação persuasiva cujo objetivo é 
conseguir efeitos. Indagando com mais rigor, se descobre que nesta o feedback tem um significado e uma função 
muito diferentes. Tomemos um texto de um comunicador desta corrente, que define o verdadeiro sentido do modelo 
de forma esclarecedora. 
 
 “Quando aprendemos a expressar nossa mensagem em termos de respostas específicas por parte 
de aqueles que a recebem, damos o primeiro passo para uma comunicação eficiente e eficaz (David 
Berlo). 
 Diante de uma proposta de troca – intenção de comunicação – a reação do sujeito pode ser 
positiva ou negativa. Por exemplo, quando através de nossa campanha educativa propusermos ao 
camponês adotar um novo produto químico para combater determinada praga, o camponês pode 
aceitar a proposta ou rejeitá-la. Se a aceita, se estabelece uma comunicação. Se não ocorre a troca 
desejada, se não se produz a resposta desejada diante do estímulo empregado, pode considerar que a 
comunicação falhou. Ou, mais radicalmente, ainda, pode afirmar-se tecnicamente que não houve 
comunicação.”4 
 
 O texto transcrito não deixa lugar para dúvidas. Comunicar é impor condutas, conseguir acatamento. Em tal 
contexto, a retroalimentação é somente a comprovação ou a confirmação do efeito previsto (é dizer, a “reação do 
sujeito” diante da “proposta” ou “intenção de comunicação”). Esta pode ser positiva se o indivíduo acata a proposta 
ou negativa se a rejeita. Neste último caso, lhe serve ao emissor como instrumento de verificação e controle: pode 
ajustar as próximas mensagens, regulá-las, fazer as trocas formais requeridas para, agora sim, obter o efeito 
determinado, a resposta desejada. 
 Em um excelente estudo crítico, um especialista tão qualificado como Beltrán confirma cabalmente este 
explicação do real significado do conceito: 
 
 A retroalimentação remete aos mecanismos de controle destinados a assegurar que 
os organismos se ajustem automaticamente às metas de comportamento. De fato, segundo 
Wiener, trata-se do “controle dos efeitos da mensagem”. 
 Ainda que o conceito tenha sido criado basicamente no campo da engenharia, foi 
aceito por muitos teóricos da comunicação humana por considerá-lo útil também para 
descrever o processo desta última. Falavam que, se as fontes emissoras queriam produzir 
certos efeitos nos receptores com suas mensagens, deviam receber de volta , por parte 
destes últimos, reações indicativas, enquanto em relação à eficácia do esforço persuasivo e, 
segundo este resultado, ajustar as mensagens aos seus objetivos. 
 Concluindo, na definição clássica de comunicação, o objeto principal desta é o 
propósito do comunicador de afetar o comportamento do receptor em uma certa direção. A 
retroalimentação é um instrumento para assegurar o ganho das metas do comunicador.5
 
 Não há nada aqui, portanto, de participação, nem de influência do receptor na comunicação. Há somente 
acatamento, adaptação, medição e controle de efeitos. A retroalimentação é o MECANISMO PARA 
COMPROVAR A OBTENÇÃO DA RESPOSTA BUSCADA E QUERIDA PELO COMUNICADOR. Como bem 
assinala Escarpit, “o feedback tem uma função de regulação destinada a manter uma situação em um estado 
estável, é uma forma de ‘robotização’ social”.6 
 
 Ainda que se tenha querida entender e apresentar como uma forma primária de participação do público, a 
retroalimentação ou “comunicação de retorno” não é, nesta concepção, mais que engrenagem do processo de 
 
4 RAMSAY e Outros, obra citada (ver nota 3). 
5 LUIS RAMIRO BELTRAN: Adeus a Aristóteles - Comunicação Horizontal. Revista Comunicação e Sociedade, No. 6, São Paulo, 
setembro 1981. 
6 ROBERT ESCARPIT: Teoria Geral da Informação e da Comunicação. Icaria, Barcelona, 1977. 
condicionamento dos receptores: primeiro os condiciona em sua conduta, suas atitudes e seus hábitos e logo se 
verifica se dão resposta para a qual foram condicionados. 
 
 Podemos citar dois bons exemplos práticos destes mecanismos: 
 
• Na publicidade comercial, cujo feedback consiste na comprovação posterior do aumento de vendas 
conseguido pela campanha publicitária; e 
• No índice de audiência dos canais de televisão, que logo permite afirmar que é o público que escolhe 
“livremente” e determina a programação. 
 
 
NÓS, COMUNICADORES POPULARES, DIANTE DO MODELO 
 
 Talvez mais de uma vez o leitor poderá ter observado que, em atos culturais e artísticos populares, o 
companheiro que fica com o papel de apresentador ou animador – sendo assim um militante de base com alto grau 
de compromisso – tende a imitar em sua atuação os recursos manipuladores do animador profissional dos shows da 
televisão. “Pantallea”. Força as pessoas a aplaudirem uma ou outra vez aos artistas populares que se apresentam, 
pede a gritos que os aplaudam com mais vigor, grita palavras de ordem e exige compulsivamente que o público 
repita. 
 Mencionamos este exemplo trivial (o acaso não tão trivial) para sugerir que, ainda que conscientemente lhe 
critiquemos e rejeitemos, o modelo de comunicação dirigista está tão presente na comunicação massiva e em tantas 
outras manifestações da sociedade, que mesmo os comunicadores populares não serão imunes a sua influência. A 
tentação de manipular reveste o atrativo de aparecer como o meio mais eficaz e mais rápido de conseguir um 
resultado; e sempre se pode justificar em função deste resultado. 
 Mais que denunciar indícios, cremos que este é um tema de reflexão para que cada leitor – ou melhor, cada 
grupo – medite e discuta. Em que medida nos vemos refletidos no modelo educativo que se acaba de descrever? Em 
que medida, consciente ou inconscientemente, reproduzimos em nossas produções de comunicação o tipo de 
pedagogia que coloca ênfase nos efeitos? A pergunta se mantém aberta para que todos analisemos, com honesto 
espírito autocrítico, nossa concepção e nosso estilo de trabalho. 
 Contribuímos somente com algumas pistas para esta reflexão, ainda que não apelemos a recompensas 
materiais nem fomentemos ao individualismo e a competência, podemos cair em parte nesta concepção dirigistas 
quando: 
 
• Damos mais importância aos EFEITOS imediatos de nossas realizações e ações que ao PROJETO dos 
participantes e assim forçamos resultado sem respeitar o ritmo de crescimento de nossos destinatários e sua 
liberdade de opção. 
• Confundimos COMUNICAÇÃO com PROPAGANDA e reduzimos nosso trabalho de comunicação a 
tarefas de “agitação”, a slogans, a campanhas, a palavras de ordem. 
• Assinalamos mais importância à QUANTIDADE do que à QUALIDADE; contabilizamos adeptos, adesões, 
leitores, espectadores, ouvintes por seu número e não analisamos se captaram ou compreenderam o 
significado de seu compromisso. 
• Não consideramos nossos destinatários como PESSOAS, mas sim como MASSAS, as quais nós, os 
“dirigentes lúcidos e esclarecidos, cabe conduzir. 
• Planejamos o conteúdo de nossos meios de comunicação, nossas campanhas etc, nós sozinhos, por nossa 
conta, sem dar participação à comunidade, e reduzimos a “participação” a assistir a nossos atos, leiam veja 
ou ouça nossas mensagens e execute as ações que nós programamos. 
• Em nossas mensagens, buscamos, sobretudo o “impacto”, apelamos aos EFEITOS EMOCIONAIS mais que 
aos CONTEÚDOS RACIONAIS; e esmagamos os espectadores com imagens e estímulos afetivos sem 
facilitar sua própria reflexão. 
 
 
 
O RISCO DE ABSOLUTIZAR 
 
 Confiamos em não ser mal compreendidos. Se, por um lado, existem alguns comunicadores populares que, 
inadvertidamente se deixam levar facilmente pela tentação de manipular, há também quem, por reação, tem tanto 
em cair neste erro que tendem a ver manipulação em tudo. 
 É bom e são estar sempre alertas e ser crítico. 
Mas, levar esta atitudea extremos irreais pode resultar em paralisia. Por temos ao fantasma da manipulação, 
poderemos terminar bloqueados e não fazer nenhum trabalho concreto. 
 Esperamos que, ao longo do livro, o conceito vá se tornando mais claro. A comunicação popular, sempre 
colocando sua ênfase no processo, também tem que atender aos conteúdos e aos resultados. A propaganda, a 
palavra de ordem, o símbolo, a expressão coletiva e massiva, o elemento emocional, colocados dentro de seus 
justos limites, ocupam um espaço necessário e legítimo na prática comunicacional e organizativa do povo. Contanto 
que não substituam nem sufoquem o processo. 
 
 
O MODELO CONDUTIVISTA É EFICAZ? 
 
 A receita condutivista atrai por sua aparente eficácia. “Não será muito ética, mas, diabos!... dá resultado”. 
 Assim como assinalamos anteriormente o modelo bancário, além de ser impositivo, tampouco é 
pedagogicamente rentável, é bom agora destacar que se rejeitamos este modelo dirigista, não é somente por 
reservas éticas, mas também por sua muito baixa eficácia para o trabalho popular. 
 
Convêm em primeiro lugar anotar que, em suas aplicações educativas específicas, este método mecanicista 
apresenta mais fracassos que êxitos. Pos sorte, os seres humanos não somos “moldáveis” como supunham os 
“engenheiros do comportamento”. 
 Mas, em todo caso, há que se perguntar se o modelo resulta produtivo para nossa ação popular. Mesmo que 
a manipulação demonstre ser eficaz em certos casos quando a classe dominante a utiliza; disso não se pode inferir 
que também o seja na educação do povo. Impor, moldar condutas, tratar educação de suscitar hábitos automáticos, 
não geram – já vimos – criatividade nem participação nem consciência crítica. E sem estas não existe trabalho 
popular durável e eficaz. 
 
 Nossas mensagens libertadoras, conscientizadoras, problematizadoras, vão “contra a corrente” do sistema, 
da ideologia dominante. Os mecanismos que este emprega para reforçar seus valores são inoperantes quando se 
trata justamente de questionar e trocar estes valores. Não se “vende” criticidade, solidariedade, libertação, com os 
mesmos recursos com que se vende Coca-Cola. 
 
 
SUGESTÕES AO FACILITADOR 
 
• A DINÂMICA DOS “MUDOS”. Esta pequena cena é muito útil para problematizar a pseudocomunicação dos 
meios massivos. Pede-se a colaboração de três ou quatro voluntários, ao que lhes tapamos a boca com uma 
venda. Um dos facilitadores (ou algum colaborador previamente preparado) os chama, os convida a sentar-se ao 
seu redor e, em tom de voz normal, lhes diz: “Comunico que a Organização decidiu realizar um ato artístico 
para celebrar o Primeiro de Maio”. E logo lhes passa as instruções: um deles deverá encarregar-se de conseguir 
o local, outro os números artísticos, outro a propaganda, etc. Depois disso, lhes diz que podem se retirar e 
executar suas tarefas. Os voluntários lêem se levantam e se retiram. Em seguida criamos uma segunda situação: 
tira-se as vendas dos voluntários, o facilitador os chama novamente e lhes diz: “Cremos que deveríamos 
organizar algo para o Primeiro de Maio. Que vocês acham? Que deveríamos fazer?”. Os outros, certamente, 
começa a opinar, a propor, a dar seu parecer. Aí cortamos a cena: já cumpriu seu propósito. Logo, começamos a 
oficina: Em qual destas duas situações diríamos que houve comunicação? Logicamente, quase todos indicarão 
que somente a segunda, já que na primeira uma única pessoa dava o direcionamento, falava; os outros não 
podiam falar, estavam emudecidos pela venda. Então, levamos o grupo a confrontar a primeira situação com o 
modelo clássico de comunicação; e, com surpresa, os participantes descobrem que, apesar das mordaças, o 
modelo se cumpriu perfeitamente: o emissor transmitiu uma mensagem aos receptores e inclusive houve um 
feedback, “resposta”, posto que estes saíram para executar as instruções recebidas. A comprovação impressiona 
o grupo, já que os conduz a perceber como o consagrado modelo que legitima aos meios massivos de 
“comunicação” oculta a realidade que os receptores são mudos; estão impedidos de falar. Outras duas 
comprovações interessantes: O conteúdo da mensagem era bom, compatível: celebrar o 1º de Maio. E, no 
entanto, a situação era autoritária. Vemos, então, que o problema dos meios massivos não é somente de 
conteúdo, mas, também, de forma de comunicar; Ainda que o emissor tenha dado suas instruções em tom 
normal, sem prepotência, a relação era autoritária e impositiva, pelo fato de que os convocados não podiam 
replicar nem opinar. Destas comprovações se pode inferir que, sempre que alguém monopoliza a palavra e se 
coloca no papel de emissor exclusivo, incorre em uma comunicação impositiva, independentemente de suas 
intenções, do conteúdo de suas mensagens e do tom que emprega. Também será interessante analisar a 
expressão empregada pelo emissor: “Comunico que...” em que sentido está dita? Que entende esse emissor por 
comunicar? Por último, pode-se perguntar aos voluntários como se sentiram em uma e outra situação, e em qual 
delas estiveram mais motivados para colaborar. Seguramente na segunda, quando foi permitido que opinassem, 
dialogassem, propusessem, participassem das decisões. Disso pode-se perceber que a comunicação concebida 
como dialogo não é somente a mais humana e respeitosa, mas também a mais eficaz. 
 
• Analisar anúncios de publicidade comercial. Buscar onde está a imaginaria “recompensa” que oferecem (por 
exemplo, a camisa ou o cigarro que se valem de uma modelo “sexy” para vender o produto... os xampus e 
desodorantes que oferecem a mulher a promessa de que, usando-os, conseguiram romper sua solidão e cercar-se 
de pretendentes). 
 
• Analisar a propaganda da ultima campanha eleitoral do país, seus slogans, os efeitos de que se valeu cada 
candidato. 
 
• Reproduzir a atuação do animador e apresentador de um ato cultural popular. Analisar seus recursos e atitudes e 
confrontá-las com as de um profissional dos shows televisivos. 
 
• Analisar meios de comunicação popular – inclusive os produzidos pelos próprios participantes – e detectar 
possíveis influências do modelo dirigista. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3. Ênfase no Processo 
 
 Veremos, finalmente, o terceiro tipo de educação: o endógeno, o que centra na pessoa e enfatiza o 
processo. É o modelo pedagógico que Paulo Freie, seu principal inspirador, chama de “educação libertadora” ou 
“transformadora”. 
 
 
 
 
SUA ORIGEM 
 
De certo modo pode-se dizer que é um modelo nascido na América Latina. Que recebeu valiosos aportes de 
pedagogos e sociólogos europeus e norte-americanos, e em nossa região, onde Freire e outros educadores mostram 
sua clara orientação social, política e cultural e a elaboração como uma pedagogia do oprimido, como uma 
educação para a liberação das classes subalternas e um instrumento para a transformação da sociedade. 
 
SUAS BASES 
 
 Partiremos, para caracterizar, de uma frase do próprio Freire: “A educação é práxis, reflexão e ação do 
homem sobre o mundo para transformá-lo”. E não se trata, pois, de uma educação para informar (ainda menos para 
firmar comportamentos) e sim que busque FORMAR as pessoas e levá-las a TRANSFORMAR sua realidade. 
Dessa primeira definição, o pensador brasileiro extrai os postulados desta nova educação: 
- Não há um educador do aluno. 
- Não há um aluno do educador. 
- Mas sim, um educador-aluno com um aluno-educador. 
 
O que significa: 
- Nada educa nada. 
- Tão pouco nada se educa sozinho. 
- Os homens se educam entre si mediados pelo mundo. 
 
Esta dinâmica no transcorrer da qual os homens se vão educando entre si, é precisamente “o processo” 
educativo. 
 
 
O QUE É ENFATIZAR O PROCESSO? 
 
 É ver a educação como um processo permanente em que o sujeito vai descobrindo, elaborando, 
reinventando, fazendo seu o conhecimento.Um processo de ação-reflexão-ação que ele faz a partir de sua realidade, de sua experiência, de sua pratica 
social, junto com os demais. 
 
 E também aquele que está aí – o educador/aluno – No entanto não como aquele que ensina e dirige, mas sim 
para acompanhar a outro, para estimular esse processo de analise e reflexão, para facilitar; para aprender junto com 
ele através dele; para construir juntos. 
 
 
A TROCA NESTE MODELO 
 
 Como se vê, este modelo também apresenta uma “troca de atitudes”; mas que não está associado à adoção 
de novas tecnologias ou o estado mecânico de condutas. A troca fundamental aqui consiste em transformar um 
homem acrítico em um homem critico; no processo em que um homem passa desde seu estado passivo, 
conformista, fatalista, até a vontade de assumir seu destino humano; desde suas tendências mais individualistas e 
egoístas até fixação dos valores solidários e comunitários. 
 
 Não é necessário salientar que está transformação não poderá jamais ser alcançada por via de mecanismos 
manipuladores. Trata-se, necessariamente, por exigência dos objetivos, de um processo livre, no que o homem deve 
tomar suas opções cada vez com maior autonomia. 
 
 
UMA EDUCAÇÃO QUE PROBLEMATIZA 
 
Trata-se de uma educação problematizante, que busca ajudar a pessoa a desmistificar sua realidade, tanto 
física como social. 
 
O que importa aqui, mais que ensinar coisas e transmitir conteúdos, é que o sujeito aprenda a aprender; que 
seja capaz de resolver por si mesmo, de superar as constatações meramente empíricas e imediatas dos fatos que o 
rodeiam (consciência ingênua) e desenvolver sua própria capacidade de decidir, de relacionar, de elaborar sínteses 
(consciência critica). 
 
O que o adulto carente de educação não necessita de dados e informações tanto quanto de instrumentos para 
pensar, para inter-relacionar um fato com outro e perceber conseqüências e conclusões; para construir uma 
explicação global, uma cosmo-visão coerente. Sua maior carência não está nos dados e noções que ignora, mas nos 
condicionamentos de seu raciocínio nos exercícios que o reduzem somente a o que é capaz de perceber em seu 
redor imediato, em seu contingente. 
 
 
UM MODELO AUTOGESTIONÁRIO 
 
O modelo se baseia na participação ativa do sujeito no processo educativo; e forma para a participação na 
sociedade. 
 
Como foi visto, tem de ser assim, participativo, não somente por uma razão de coerência com a nova 
sociedade democrática que busca construir, mas também por uma razão de eficácia; por que somente participando, 
se envolvendo, investigando, fazendo perguntas e buscando respostas, problematizando e problematizando-se, se 
chega realmente ao conhecimento. 
 
Aprende-se de verdade o que se vive, o que se recria, o que se reinventa. E não o que simplesmente se lê ou 
escuta. Somente há verdadeiro aprendizado quando há processo; quando há autogestão dos alunos . 
 
 
PROCESSO, ERRO, CONFLITO 
 
* Ao contrario do modelo bancário, este não rechaça o erro, não o vê como falha nem o sanciona; pelo 
contrário, o assume como uma etapa necessária na busca, no processo de buscar a verdade. Nesta educação 
não há erros ou falhas, mas sim aprendizagem. 
 
* Também é distinta sua atitude diante do conflito. Em vez de contorná-lo , assume-o como força geradora, 
problematizante. Sabe que sem crise dificilmente há crescimento. 
 
 Não pretende, naturalmente, agredir o sujeito e encará-lo bruscamente e marcá-lo como acrítico, de 
alienante em sua cosmo-visão, de dominado; No entanto tampouco pretende ocultar-lhe as contradições entre essa 
cosmo visão e a nova perspectiva libertadora cuja qual ele participa da construção. Para que haja real processo 
transformador, é necessário que os estereótipos e os hábitos do homem dominado aflorem a sua consciência e 
pouco a pouco vão revisando-o criticamente. 
 
 
OUTRAS CARACTERÍSTICAS DO MODELO 
 
* Não é uma educação individual, ao contrário, sempre GRUPAL, comunitária: “nada se educa sozinho”, 
mas sim através da experiência compartilhada, da interação com os demais. “O grupo é a célula educativa 
básica” (Freire). 
*O olho aqui não é o professor, se não o grupo de alunos. O educador está ai para estimular, para facilitar o 
processo de busca, para problematizar, para fazer perguntas, para escutar,para ajudar o grupo a se expressar 
e aportar a eles a informação que necessita para que avance no processo. 
* Este tipo de educação exalta os valores comunitários, a solidariedade, a cooperação; exalta também a 
criatividade, o valor e a capacidade potencial de todo o individuo. 
* Se a educação é um processo, é um processo permanente. Não se limita a alguns momentos da vida, a 
algumas instancias educativas, a um curso escolar de alguns meses. A educação se faz na vida, na práxis do 
pensamento. 
* Não tem medo de ambigüidades diante a realidade, diante a pluralidade de opções. É uma educação não-
dogmática, aberta. 
* Esta pedagogia também pode usar – e de fato usa – recursos audiovisuais, porem não para reforçar 
conteúdos se não para problematizar e para estimular a discussão, o dialogo, a reflexão e a participação. 
* Na esfera psicossocial e cultural, suas meta são: 
 - Favorecer através educação a tomada de consciência de sua própria dignidade, de seu próprio valor 
como pessoa; 
 - Ajudar o sujeito de classes populares a superar seu “sentimento aprendido” de inferioridade, 
recompondo sua auto-estima e recuperando a confiança em sua própria capacidade criativa. 
* E é, claramente, uma educação com um compromisso social: uma educação comprometida com o 
oprimido e que se propõem a contribuir com sua libertação. 
 
Sua “mensagem” central é a liberdade essencial que todo homem tem para realizar-se plenamente 
como tal em sua entrega livre aos demais homens. 
 
 
Se é possível caracterizar ao primeiro tipo de educação como o que propõem que o aluno APRENDA e o 
segundo como o que busque que o receptor HAJA, poderíamos resumir a finalidade deste modelo na seguinte 
formulação: 
 
OBJETIVO: QUE O SUJEITO PENSE 
E que esse pensar o leve a transformar sua realidade. 
 
 
O PAPEL NECESSÁRIO DA INFORMAÇÃO 
 
 Pareceria que este modelo de educação não apresenta, como os anteriores, conseqüências questionáveis. 
 Contudo, é preciso salientar um risco que ela implica e uma conseqüência negativa que ela pode derivar; não 
da educação autogestora em si, mas do fato de mal entendê-la; de exagerá-la e encará-la de forma absoluta a tal 
extremo que termine por fazê-la inoperante. 
 
Existem críticos radicais que são “mais freiristas que Freire” e que tendem a condenar todo aporte do 
educador ou do comunicador como uma imposição e até como uma manipulação. 
 
Sim é certo que “nada educa nada”, também é que “nada se educa sozinho”. Colocar ênfase no dialogo, no 
intercambio, na interação dos participantes, não significa prescindir a informação. Não equivale a afirmar que tudo, 
absolutamente tudo, há de sair do autodescobrimento do grupo. 
 
A educação popular rechaça tanto a idéia de diferenciação hierárquica entre 
educadores e alunos – os primeiros donos de uma verdade levada aos segundos – 
como a de “um educador passivo que por um mal entendido ‘respeito’ ao povo 
se desresponsabiliza da finalidade do processo educativo e se inibe de fazer seu 
aporte”.7
 
 
7 MARIA CRISTINA MATA: A investigação associada à educação popular, papel do trabalho. Lima, 1981. A citação entre aspas foi 
tomada de um trabalho de JUAN E. GARCIA HUIDOBRO e SERGIO MARTINIC. 
 
 O próprio Freire, máximo inspirador da educação autogestora, mostrou a necessidade de deixar claro em um 
de seus últimos livros que “conhecer não é adivinhar” e que “a informação é um momento fundamental do ato do 
conhecimento”. 
 
 Isso não significa retratar-se dos princípios da pedagogialibertadora. O decisivo, aquilo que é necessário 
perguntar a si mesmo é como e em que contexto se proporciona essa informação. Se ela se dá de forma negativa, 
como conhecimento dado “em pára-quedas”, somente por que “está no programa”, como uma mera transmissão do 
“emissor” aos “receptores”, ela entrará indubitavelmente em franca contradição com os princípios. 
 Porem aportar uma informação dentro do processo é outra coisa. Freire explica assim: 
 
 Na relação entre o educador e os alunos, mediados pelo objetivo que há 
de descobrir-se, o importante é o exercício da atitude critica frente ao objeto e 
não o discurso do educador em torno do objeto. 
 Quando os alunos necessitam alguma informação indispensável para 
prosseguir a analise – posto que conhecer não é adivinhar – nunca será 
esquecido que toda informação deve ir precedida de certa problematização. 
Sem esta, a informação deixa de ser um momento fundamental do ato de 
conhecimento e se converte em simples transferência entre o educador e os 
alunos.8 
 
 A informação, porem, é necessária. Uma data, um aspecto da realidade pode ser indispensável para que o 
grupo avance. E o educador (o comunicador) não deve deixar de aportar9. No entanto essa informação deve 
responder a uma previa problematização: a una dificuldade que o grupo sente, a uma pergunta que este formule, a 
uma busca, a uma inquietude. Se essa inquietude não nasce no grupo e o educador julga que essa informação é 
imprescindível para que os alunos possam avançar em seu processo, sua primeira tarefa será despertar essa 
inquietude, fazer que essas perguntas surjam; vale dizer, problematizar. Somente então aportará a informação. Por 
que somente assim o grupo se incorporará. 
 
 Como educadores populares, é importante que absorvamos essa recomendação. Ela nos da uma pauta chave 
para a formulação de nossas mensagens. Mas adiante vamos ver quando e como se aplicar a nosso trabalho. 
 
 
OS CONHECIMENTOS PRÁTICOS 
 
Da mesma forma muitas vezes surgiu o problema da instrução. Quando se necessita ensinar destrezas, 
técnicas, conhecimentos práticos – se argumenta – não é possível aplicar esta pedagogia no processo. 
 
Diaz Bordenave discute este tema e chega a uma resposta razoável e equilibrada. Ela pensa que estas duas 
metas não são incompatíveis; e que apresenta-las como tal é gerar uma falsa oposição. 
 
 
 
 
 
8 PAULO FREIRE: Cartas a Guiné-Bissau. Século XXI, México, 1977. 
9 -(Adendo a esta nova edição). Nos textos recentes, Freire, todavia foi mais claro e preciso, declarando “em oposição positiva tanto ao 
autoritarismo arrogante quanto ao espontaneísmo irresponsável” (prólogo à J. WERTHEIN, A. CASTILLI, P. LATAPI e M. KAPLUN – 
Educação de adultos na América latina, Edições da Flor, Buenos Aires, 1985) e rechaçando a posição de alguns educadores que o 
qualificam como espontaneísta: “É dizer, uma posição segundo a qual, o nome do respeito à capacidade de pensar e a capacidade critica 
dos alunos, se deixa a esses livres a si mesmos, se deixa às massas populares livres a elas mesmas. Obviamente, uma educação 
revolucionaria deve estimular a capacidade critica e autônoma de pensamento entre os alunos, porem jamais deixa-los entregues a eles 
mesmos” (Em: ROSA MARIA TORRES, Educação popular; um encontro com Paulo Freire, CECCA-CEDECO, quito 1986). 
Indicadores 
Modelo 
Ênfase no 
Conteúdo 
Ênfase no Resultado Ênfase no 
Processo 
Concepção Bancaria Manipuladora Libertadora – 
Transformadora 
Pedagogia Exógena Exógena Endógena 
Lugar do aluno Objeto Objeto Sujeito 
Olho Professor – Texto Programador Sujeito – grupo 
Relação Autoritária – 
Paternalista 
Autoritária – 
paternalista 
Autogestionaria 
Objetivo Ensinar/Aprender 
(Repetir) 
Alinhar/ Fazer Pensar – 
Transformar 
Função Educativa Transmissão de 
Conhecimento 
Técnicas – Condutas 
Engenharia do 
Comportamento 
Reflexão – Ação 
Tipo de 
Comunicação 
Transmissão de 
Informação 
Informação/Persuasão Comunicação 
(dialogo) 
Motivação Individual: 
prêmios/castigos 
Individual: 
estimulo/recompensa 
Social 
Função do 
Docente 
Ensinar Instrutor Facilitador – 
Animador 
Gral de 
Participação 
Mínimo Pseudo participação Máxima 
Formação Critica Bloqueada Evitada Altamente 
Estimulada 
Criatividade Bloqueada Bloqueada Altamente 
Estimulada 
Papel do Erro Falha Falha Troca Busca 
Manejo do 
Conflito 
Reprimido Iludido Assumido 
Recusa de Apoio Reforço 
transmissão 
Tecnologia Educativa Geradora 
Valor Obediência Lucro Utilitarismo Solidariedade 
Cooperação 
Função Política Acatamento Acatamento/Adaptação Libertação. 
 
 
 
 
 
 
 
Posto que em qualquer tipo de sociedade será necessário que as pessoas adquiram 
conhecimento e destrezas, nada impede que se utilizem procedimentos de índole transmissora, 
sempre que os mesmo sejam empregados dentro de uma orientação global problematizante e 
participativa, mediante a qual o educador aprenda conhecimentos e destrezas instrumentais ao 
mesmo tempo em que conhece a realidade que o rodeia. Desenvolve sua consciência critica e 
seu espírito solidário mediante o dialogo, o debate e a participação na ação transformadora.10
 
Cabe-nos, para completar esta analise, definir o conceito de comunicação que se desprende de este tipo de 
educação. Ele equivale a construir o novo modelo libertador, próprio da comunicação popular. Pela importância do 
tema, este será destinado ao capitulo seguinte. 
 
 
SUGESTÕES PARA O FACILITADOR 
 
• Representar, através de dois “sociodramas”, uma classe tradicional e uma atividade formativa dentro deste 
terceiro tipo de educação. Analisar as diferenças. Ver qual é a atitude do professor bancário e qual a do 
formador o facilitador no modelo que põem ênfase no processo. 
• Aplicar as conclusões a nossos meios de comunicação popular: como devem ser nossos meios e nossas 
mensagens para gerar e se inserir num processo educativo? 
• Analisar produções de comunicação popular (incluso as realizadas pelos próprios participantes) e ver em 
que medidas correspondem a este modelo educativo: 
- em seus objetivos 
- em seu conteúdo 
- em sua forma 
- no uso ao qual se destina 
Pergunta-se: 
- problematizam? 
- Geram um dialogo? 
- Geram participação? 
• Colocar uma informação que se considere importante difundir em um meio popular ( em um jornal, um 
programa de radio, etc.) e ver como apresenta-lo na forma que coloca FREIRE, “a partir de uma clara 
problematização” 
 
 
 
 
 
10 JUAN DIAZ BORDENAVE: América Latina necessita repensar a TECNOLOGIA EDUCATIVA. Mimeo, Caracas, 1982.

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