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2008 ME-100 Fundamentos de Matemática Mauro S. de F. Marques – p. 1/30 CAPÍTULO 3 Induçªo matemÆtica msdfm – p. 2/30 3.1 Introdução O Princípio da Indução matemática é uma importante ferramenta para demonstarção da validade de argumentos envolvendo “números naturais”. O entendimento do Princípio da Indução matemática é equivalente ao entedimento da definição do conjunto dos “números naturais”. Os números naturais fornecem uma estrutura matemática, uma escala, que nos permite contar , ato natural ao raciocínio humano. Essa estrutura também torna precisa a noção de quantidade. Formalmente, define-se os números naturais de forma simples e elegante através dos Axiomas de Peano. msdfm – p. 3/30 Axioma: Premissa considerada necessariamente evidente e verdadeira, fundamento de uma demonstraçªo, porØm ela mesma indemonstrÆvel, originada, segundo a tradiçªo racionalista, de princípios inatos da consciŒncia ou, segundo os empiristas, de generalizaçıes da observaçªo empírica [O princípio aristotØlico da contradiçªo ("nada pode ser e nªo ser simultaneamente") foi considerado desde a Antiguidade um axioma fundamental da �loso�a.] msdfm – p. 4/30 Um axioma é considerado algo óbvio ou um consenso inicial necessário para a construção de uma teoria. Na matemática, um axioma é uma hipótese inicial de qual outros enunciados são logicamente derivados. Em contraste aos teoremas, axiomas não podem ser derivados por princípios de dedução e demonstráveis por derivações formais, eles são hipóteses iniciais. Em muitos contextos, "axioma", "postulado"e "hipótese"são usados como sinônimos. Um axioma não é necessariamente uma verdade, mas apenas uma premissa usada em uma dedução, visando obter resultados.” msdfm – p. 5/30 3.2 Números naturais: Axioma de Peano No livro, "Arithmetices Principia Nova Methodo Exposita”, Giussepe Peano (1858-1932) elabora a teoria completa dos números naturais a partir de quatro premissas básicas, conhecidas como Axiomas de Peano. Em palavras, os Axiomas de Peano se resumem a: A1. Todo natural possui um único relativo, que também é um natural. A2. Naturais que têm o mesmo relativo são iguais, ou equivalentemente, naturais diferentes possuem relativos diferentes A3. Existe um único natural ♠ que não é relativo de nenhum outro. A4. Se um conjunto X tem como elementos ♠ e o relativo de cada um de seus elementos, então esse conjunto contém todos os naturais. O natural ♠ é usualmente denotado por 1! msdfm – p. 6/30 Matemáticamente os Axiomas de Peano se resumem a: Considere um conjunto N tal que, A1. ∃ s : N 7→ N,3 ∀n ∈ N ∃s(n) ∈ N. A2. A função s : N 7→ N é injetiva. A3. ∃ 1 ∈ N,3 1 6= s(n)∀n ∈ N. A4. ( ∀X ⊂ N 3 (1 ∈ N) ∧ (n ∈ X⇒ s(n) ∈ X ) ⇒ ( X = N ) . O conjunto N é chamado conjunto dos nu´meros naturais, e um elemento n de N de nu´mero natural. s(n) chamado o relativo de n. msdfm – p. 7/30 Podemos então denotar s(1) = 2, s(2) = s(s(1)) = 3, s(3) = s(s(2)) = s(s(s(1))) = 4, . . . Outros podem preferir a notacão, 1 = I, s(I) = II, s(II) = s(s(I)) = III, s(III) = s(s(II)) = s(s(s(I))) = IV, . . . ou 1 = { }, s(1) = s({ }) = {{ }}, s(s(1)) = s({{ }}) = s(s({ })) = {{{ }}}, . . . ou 1, s(1) = s, s(s(1)) = s ◦ s, s(s(s(1))) = s ◦ s ◦ s, . . . msdfm – p. 8/30 Adic¸a˜o de nu´meros naturais Considere a função S : N× N 7→ N, chamada somar, definida da forma: Para todom ∈ N, F1. S(m, 1) = s(m) F2. S(m, s(n)) = s(S(m,n)) Portanto,S(m, 1) é, por definição, o relativo dem. Se conhecermos S(m,n), saberemos o valor de S(m, s(n)). Isto nos permite conhecer S(m,n) para todo n em N e todom em N. S(m, 2) = S(m, s(1)) = s(S(m, 1)) = s(s(m)), S(m, 3) = S(m, s(2)) = s(S(m, 2)) = s(s(s(m))), . . . msdfm – p. 9/30 A partir deste ponto podemos usar a notação usual para S(m,n) “S(m,n) ≡ m+ n”. Assim,m+ 1 = S(m, 1) = s(m), m+ 2 = S(m, 2) = S(m, s(1)) = s(m+ 1), . . . . . . , (m+ n) + 1 = S(m+ n, 1) = s(m+ n) . . . Portanto, s(m) = m+ 1,∀k ∈ N. Por F2 sabemos que m+ (n+ 1) = (m+ n) + 1. Assim, (F1) e (F2) definem, por recorrência, a “soma”m+ n de dois números naturais quaisquer,m e n em N. Claramente + é uma relação binária em N. msdfm – p. 10/30 Multiplicac¸a˜o de nu´meros naturais A multiplicaçªo de nœmeros naturais se de�ne de modo anÆlogo à adiçªo. Considere a funçªo M : N× N 7→ N, chamadamultiplicar, de�nida da forma: Para todo m ∈ N, F1. M(m, 1) = m F2. M(m, (n+ 1)) =M(m,n) +m. msdfm – p. 11/30 O produto (multiplicac¸a˜o)M(m,n) é usualmente escrito nas formas: M(m,n) ≡ mn ≡ m · n ≡ m× n e lê-se “m vezes n”. A definição acima diz que: (i) 1 vezm é igualm. (ii) (m vezes n+ 1,) é igual am vezes n mais (uma vez)m, isto é, m · (n+ 1) = (m · n) +m. Assim, m · 2 = m+m,m · 3 = m+m+m, . . . . msdfm – p. 12/30 Exercicios: Usando a definição: 3.1 Demonstre que a função “somar” é associativa e comutativa. 3.2 Demonstre que a função “somar” satisfaz a Lei do Corte, isto é, m+ n = m+ k ⇒ n = k, ∀m,n, k ∈ N. 3.3 Demonstre que a função “multiplicar” é associativa e comutativa. 3.4 Demonstre que a função “somar” satisfaz a Lei do Corte, isto é, n ·m = n · k ⇒ m = k, ∀n,m, k ∈ N. 3.5 Demonstre que a função “multiplicar” é distributiva com relação a função “somar” isto é, n · (m+ k) = (n ·m) + (n · k), ∀n,m, k ∈ N. msdfm – p. 13/30 Ordem A soma (adição) de números naturais induz uma relação de ordem em N. Ou seja: Dados dois números naturaism e n dizemos que m ·e menor do que n , escreve-sem < n, ∃k ∈ N,3 n = m+ k. Neste caso diz-se também que n ·e maior do que m e escreve-se n > m. Dizemos que n maior ou igual am oum nemor ou igual a n se (m ≤ n)⇔ (m < n) ∨ (m = n). Analogamente podemos escrever (m ≥ n) Note que, pela definição m < m+ k, ∀ n,m, k ∈ N. Em particular, ∀n ∈ N, 1 ≤ n ∧ n < s(n) = n+ 1. s(n) o relativo de um número natural n pode agora ser chamado, sem risco de confusão, de sucessor de n msdfm– p. 14/30 Exercicios: 3.6 Mostre que < é uma relação em N que é transitiva. 3.7 A relação < em N é reflexiva? Simétrica? 3.8 A proposição abaixo é falsa ou verdadeira? Explique! ∀n,m ∈ N, (n < m) ∨ (n = m) ∨ (m < n). As proposições (n < m), (n = m) e (m < n) são exclusivas? 3.9 Mostre que: ∀n,m, k ∈ N,m < n ⇒ (m+ k < n+ k) ∧ (m · k < n · k). Use redução ao absurdo e a “Lei do Corte”. msdfm – p. 15/30 3.3 Princípio de indução O œltimo dos Axiomas de Peano possui uma natureza mais complexas e tambØm Ø conhecido como o axioma da induçªo. O Axioma da Induçªo Ø fundamental para a teoria dos nœmeros naturais e para a matemÆtica em geral. Ele fornece um mØtodo de demonstraçªo, chamado Me´todo de Induc¸a˜o Matema´tica, ou Princı´pio da Induc¸a˜o Finita, ou Princı´pio da Induc¸a˜o. msdfm – p. 16/30 O Princípio da Indução diz o seguinte: “ Seja p(·) uma func¸a˜o proposicional em N. Se p(1) e´ verdade e para todom em N, p(m) implica p(m+ 1), enta˜o p(n) e´ verdade para todo n em N, isto e´, ( p(1) ∧ ( ∀m ∈ N, p(m)⇒ p(m+ 1) )) ⇒ ( ∀n ∈ N, p(n) ) , Note que ( p(1) ∧ (∀m ∈ N, p(m)⇒ p(m+ 1) ) ⇒ p(1)⇒ p(2)⇒ p(3)⇒ · · · ⇒ p(n)⇒ · · · msdfm – p. 17/30 Em outros termos: “Seja S um subconjunto de N que satisfaz (i) 1 ∈ S. (ii) ∀n ∈ S⇒ (n+ 1) ∈ S. Enta˜o S = N”. msdfm – p. 18/30 Exemplos: 1. Para todo n ∈ N, 1 + 2 + · · ·+ n = n(n+ 1) 2 . De fato: 1 = 1(1 + 1) 2 = 1 · 2 2 = 2 2 = 1, logo a proposição é válida para n = 1. Vamos assumir que o resultado é válido param ∈ N (hipótese de indução), isto é, 1 + 2 + · · ·+m = m(m+ 1) 2 . Temos então que 1+2+· · ·+m+(m+1) = m(m+ 1) 2 +(m+1) = (m+1) (m 2 +1 )= (m+1) (m+ 2 2 ) = (m+ 1) ( (m+ 1) + 1 ) 2 . Logo, o resultado é válido para todo n ∈ N. msdfm– p. 19/30 2. Fixado x > 0, para todo n ∈ N, (1 + x)n ≥ 1 + xn. De fato: (1 + x)1 = 1 + x = 1 + x1 ≤ 1 + x1. logo a proposição é válida para n = 1. Vamos assumir que o resultado é válido param ∈ N (hipótese de indução), isto é, (1 + x)m ≥ 1 + xm. Temos então que (1 + x)m+1 = (1+ x)m(1 + x) ≥ (1 + xm)(1 + x) = 1+ xm + x+ xm+1 ≥ 1 + xm+1. Logo, o resultado é válido para todo n ∈ N. msdfm – p. 20/30 3. Para todo n ∈ N,n3 − n é divisível por 3. De fato: 13 − 1 = 1− 1 = 0 = 3× 0. logo a proposição é válida para n = 1. Vamos assumir que o resultado é válido param ∈ N (hipótese de indução), isto é, ∃k ∈ N 3 m3 −m = 3k. Temos então que (m+1)3−(m+1) = m3+3m2+3m+1−m−1 = (m3−m)+3(m2+m) = 3k+3(m2+m) = 3(k+m2+m) = 3l, l ∈ N. Logo, o resultado é válido para todo n ∈ N. msdfm – p. 21/30 Exercicios: Mostre usando a técnica de indução que para todo número natural n: 3.6. n2 ≥ n. 3.7. 12 + 22 + 32 + · · ·+ n2 = n(n+1)(2n+1) 6 . 3.8. 13 + 23 + 33 + · · ·+ n3 = ( n(n+1) 2 )2 . 3.9. 1 + 3 + 5 + 7 + · · · (2n− 1) = n2. msdfm – p. 22/30 3.10. ( 1− 1 2 )( 1− 1 3 ) · · · ( 1− 1 n+1 ) = 1 n+1 3.11. ∀x, y ∈ R, xn+1 − yn+1 = (x− y)(xn + xn−1y + · · ·+ xyn−1 + y). 3.12. 2−1 + 2−2 + 2−3 + · · ·+ 2−n ≤ 1. Interprete o resultado! 3.13 ∀M ∈ N, ∃n ∈ N 3 1 + 2−1 + 3−1 + · · ·+ n−1 > M. Interprete o resultado! msdfm – p. 23/30 3.4 Formas equivalentes de indução As duas proximas proposições são equivalentes ao Princípio de Indução e em algumas situações podem ser mais convenientes. A primeira delas é referida como Princı´pio da Boa Ordenac¸a˜o, segue do Princípio de Indução. Proposic¸a˜o 1. Todo subconjunto na˜o vazio de N tem um menor elemento. Em outras palavras ∀S ⊂ N, S 6= ∅, ∃m ∈ S 3, ∀n ∈ S,m ≤ n. Demonstrac¸a˜o: Se 1 é elemento de S, nada resta a ser provado. Vamos assumir então que 1 não pertence a S. msdfm – p. 24/30 Usaremos a técnica de redução ao absurdo. Suponhamos que S não tem um menor elemento, ou seja, ∀m ∈ S, ∃n ∈ S 3 n < m. Seja T = {m ∈ N : (∀n ∈ N, n ≤ m)⇒ n 6∈ S}. Claramente, 1 ∈ T e, pela definição de T , ∀k ∈ T ⇒ 1, 2, . . . k 6∈ S. ∀k ∈ T ⇒ k + 1 6∈ S pois pois caso contrário (k + 1) seria o menor elemento de S. Logo Pelo principio de indução, T = N ∧ S = ∅ o que é uma contradição. Logo,S tem um menor elemento. c.q.d msdfm – p. 25/30 A próxima proposição é conhecida como Princı´pio de Induc¸a˜o Completa, é consequência do Princípio da Boa Ordenação. Proposic¸a˜o 2. Seja S um subconjunto de N que satisfaz: (i) 1 ∈ S. (ii) ∀n ∈ N, {1, 2, . . . , n} ⊂ S → (n+ 1) ∈ S. Enta˜o S = N Demonstrac¸a˜o: Se Sc = ∅ a proposição está demonstrada. msdfm – p. 26/30 Suponhamos então Sc 6= ∅. Pela Proposição 2, existe um menor elemento de Sc, digamosm+ 1. De (i) 1 ∈ S → 1 6∈ Sc → (m+ 1) 6= 1. Claramente 2, 3, . . .m ∈ S pois caso contrariom+ 1 não seria o menor elemento de Sc. Mas (ii) ({1, 2, . . . ,m} ⊂ S → (m+ 1) ∈ S. Logo temos uma contradição. Segue que Sc = ∅ → S = N. c.q.d msdfm – p. 27/30 Para completar a equivalência proposta, resta mostar que o Princípio de Indução Completa implica no Princípio de Indução. Proposic‚ ao 3. Seja S um subconjunto de N que satisfaz: (i) 1 ∈ S. (ii) ( ∀n ∈ N, n ∈ S ) → (n+ 1) ∈ S. Ent ao S = N. Demonstrac‚ ao: A proposição ∀n ∈ N, {1, 2, . . . , n} ⊂ S → n ∈ S é trivialmente verdadeira. Logo temos ( (∀n ∈ N, {1, 2, . . . , n} ⊂ S → n ∈ S) ∧ (∀n ∈ N, n ∈ S → (n+ 1) ∈ S) ) . Consequentemente ( ∀n ∈ N, {1, 2, . . . , n} ⊂ S ) → (n+ 1) ∈ S. Ou seja S satisfaz as condições da Proposição 2, mostrando que S = N. c.q.d msdfm – p. 28/30 As Proposiçıes 1,2 e 3 mostram que (Princípio de Indução) ⇓ (Princípio da Boa Ordenação) ⇓ (Princípio de Indução Completa) ⇓ (Princípio de Indução). Em outras palavras, os três principios são equivalentes. msdfm – p. 29/30 Exercı´cios: 3.14 Mostre usando o Princípio da Boa Ordenaçªo 1 + 2 + · · ·+ n = n(n+ 1) 2 3.14 Mostre usando o Princípio da Boa Ordenaçªo os Exercícios 3.6 a 3.9. msdfm – p. 30/30 small 3.1 Introduc c~ao small 3.2 N'umeros naturais: Axioma de Peano small 3.3 Princ'{i }pio de induc c~ao small 3.4 Formas equivalentes de induc c~ao
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