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63 Avaliação do Programa de Controle de Esquistossomose no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, sob a Perspectiva Farmacêutica Carla Virginia Vieira Rollemberg* Jullyana de Souza Siqueira Quintans** Roseli La Corte dos Santos*** A Esquistossomose é freqüente no estado de Sergipe, nos inqué-ritos realizados de 1999 à 2006 pela Secretaria Municipal deSaúde (SMS), o Bairro Santa Maria (Aracaju-SE) foi conside- rado de alta endemicidade. Assim, realizou-se estudo para avaliar as informações epidemiológicas do Programa de Controle da Es- quistossomose e a efetividade da estratégia de planejamento, diag- nóstico e tratamento precoce neste bairro sob a perspectiva do far- macêutico. Foi realizada análise dos resultados do último inquérito coproscópico da SMS (2006) e busca dos casos confirmados com execução de exames pelos métodos Ritchie e Kato-Katz. Pacientes positivos foram tratados com praziquantel. Após 25 dias de trata- mento, realizaram três exames controles mensais. A maior freqüên- cia da doença ocorre no sexo masculino (70,6%); crianças abaixo de 10 anos responderam por 10% dos casos. Na fase de campo, dos 57 pacientes tratados, 28 realizaram exame controle. A resposta terapêutica foi adequada em 26 dos 28 pacientes. Apesar da eficá- cia terapêutica ser adequada, a efetividade do Programa de Contro- le encontra-se abaixo do necessário, visto que, embora o diagnósti- co seja realizado, muitos não recebem o resultado e os que são tratados não realizam controle da cura. A transmissão local da do- ença aliada às falhas no processo são as principais causas da manu- tenção da endemicidade no bairro. PALAVRAS-CHAVE: Esquistossomose; praziquantel; análise epide- miológica; resposta terapêutica. * Estudante de Farmácia da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: caca_virginia@yahoo.com.br ** Farmacêutica, mestranda em Ciências Farmacêuticas, Professora DMO/UFS. E-mail: jullyanas@yahoo.com.br *** Bióloga, Doutora em Saúde Pública, Professora do DMO/UFS. E-mail: rlacorte@ufs.br R e s u m o Revista da Fapese, v.4, n. 2, p. 63-82, jul./dez. 2008 6464 Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Carla Virginia Vieira Rollemberg; Jullyana de Souza Siqueira Quintans; Roseli La Corte dos Santos 1. Introdução 1.1. A doença Conhecida pelos brasileiros como barriga d’água, xistosa ou doença do caramujo, a esquistossomose mansoni ou mansônica é infecção produzida por pa- rasita da classe Trematoda, espécie Schistosoma mansoni, cuja transmissão se dá pelo contato com água infectada pelas cercárias, estágio de vida do parasito infectante para o homem. A doença vitimiza principalmente pessoas de baixa renda as quais são submetidas a condições de vida pre- cárias sem tratamento de água ou saneamento básico, pois é na água que residem os hospedeiros intermediá- rios do S. mansoni, caramujos do gênero Biomphalaria. Atualmente a Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que a esquistossomose afeta 200 milhões de pes- soas e que representa ameaça para mais de 600 milhões de indivíduos que vivem em áreas de risco nos 74 paí- ses endêmicos. A doença é endemia parasitária típica das Américas, Ásia e África. Mas, de todas as espécies de Schistosoma que parasitam o homem, somente S. mansoni existe na América (PASSOS et al., 1998). Em muitos países endêmicos para esquistossomo- se os recursos são limitados para programas de con- trole. Entretanto, a tônica atual é no enfoque à preven- ção e controle da morbidade e não sobre a eliminação da transmissão (KING et al., 2003). A introdução da esquistossomose mansônica no país, provavelmente ocorreu no período colonial com a vinda de escravos negros africanos principalmente na região Nordeste. O primeiro registro da infecção humana pelo S. mansoni no Brasil foi realizado no estado da Bahia por Pirajá da Silva em 1908, ou seja, está completando centenário em 2008, o qual batizou a espécie como S. mansoni em homenagem aos achados semelhantes de Manson em portadores da infecção na África (CARMO e BARRETO, 1994; COURA e AMARAL, 2004). Assim, imagina-se que a esquistossomose penetrou no Brasil em meados do século XVI, disseminando-se a partir de 1920, com o início das migrações internas (NOVAES et al., 1999). Atualmente, o Brasil é consi- derado uma das principais áreas de distribuição da doença no mundo, não somente devido à vastidão de sua zona endêmica e à existência de grande número de pacientes portadores de formas graves da doença, mas também pela expansão desta endemia para outras áreas do país, até então indenes como a Região Sul (CALDEIRA et al., 2005). A transmissão da esquistossomose no Brasil em 2006 foi ativa em sete dos nove estados nordestinos e em Minas Gerais. No nordeste não ocorre no Ceará e Piauí, atingindo principalmente a região compreendi- da entre Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia (BRA- SIL, 2007). 1.2. Controle O controle da transmissão vai além da capacidade dos profissionais de saúde e deve ser feito com ações governamentais, como o saneamento básico, instala- ção de água e esgoto nas casas, mudanças no meio ambiente, educação sanitária, combate aos caramujos, além do diagnóstico e tratamento das pessoas infectadas (KATZ e ALMEIDA, 2003). Em 1975, foi criado no Brasil um programa com o objetivo de controlar a esquistossomose: o Programa Especial de Controle da Esquistossomose (PECE). A partir daquela data, mais de 12 milhões de tratamen- tos foram realizados em todo o país, principalmente na região Nordeste. Esse programa, lançado com mui- tos erros conceituais e de objetivos, foi criticado por cientistas brasileiros com conhecimento na área, em uma época onde as críticas às ações do governo, en- tão controlado por militares, não eram bem recebi- das. Todavia, o Programa trouxe bons resultados como a diminuição drástica do número de casos da esquis- tossomose hepatoesplênica, que não raramente pode levar o paciente à morte (KATZ e ALMEIDA, 2003). Em Sergipe, área coberta pelo PECE, foi observada inicialmente a esquistossomose em 40 dos 74 municí- pios do Estado. Nos indivíduos entre sete e 14 anos 65Avaliação do Programa de Controle de Esquistossomose no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, sob a Perspectiva Farmacêutica Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 foi encontrada prevalência inicial de 40,6% (variando entre 10,9 e 100,0%). Em 1985, era de 8,4% (variando entre 4,2 e 35,3%). Entre 1965 e 1985, as cirurgias gerais nos hospitais da região subiram de 3,2 para 13,9. Inicialmente, as esplenectomias representavam 2,5% destas cirurgias, e em 1985 haviam reduzido para 0,3%. Embora estes resultados apontem para melhora da condição clínica dos residentes cobertos pelo PECE, considerou-se que as muitas realidades ecológicas onde ocorre a esquistossomose levaram este programa à ine- ficiência e ao desperdício de recursos, com os quais seria possível adquirir resultados duradouros, se fos- sem mais usados em saneamento básico em detrimen- to da supervalorização do tratamento quimioterápico (COURA FILHO, 1997). Na China, um Projeto do Banco Mundial finan- ciou o estudo do impacto da esquistossomose nos úl- timos 10 anos naquele país. A estratégia de controle focou-se na utilização em grande escala de quimioterapia principalmente com vista a reforçar o controle da morbidade e, ao mesmo tempo, agindo com o objetivo de exterminar a transmissão. A quimioterapia foi complementada com a educação sa- nitária, o controle químico de caramujos e meio ambi- ente se necessário. A avaliação final em 2002 demons- trou que as taxas de infecção em seres humanos e ani- mais tinham diminuído em 55% e 50%, respectiva- mente. Um novo projeto para controle sustentável foi formulado para incluir além da quimioterapia, educa- ção em saúde e controle da transmissão. O novo pro- jeto necessita de reforma sanitária aliada ao controle do caramujoreduzindo as áreas de habitat que os caramujos vêm utilizando durante décadas (XIANYI et al., 2005). Além da educação, do saneamento, tratamento de doentes e de reservas de plarnobídeos, faz-se necessá- ria a busca ativa de casos sob as bases da epidemiologia. Segundo KATZ e PEIXOTO (2000), a ausência de da- dos precisos indica a necessidade de adequado levan- tamento nacional da prevalência da esquistossomose que continua a ser importante endemia parasitária, justificando esforços maiores para o seu controle no Brasil. Para a estimativa segura da prevalência da es- quistossomose, necessita-se de levantamentos parasi- tológicos feitos com amostragem adequada, em nível nacional, levando em consideração que a prevalência da parasitose não apresenta distribuição regular. O Programa de Controle da Esquistossomose em Aracaju é executado pelo Centro de Controle de Zoonozes (CCZ). A escolha dos bairros onde serão realizados os inquéritos é baseada em relatórios do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). Os bairros endêmicos devem ser trabalha- dos anualmente em um período de quatro a seis me- ses. Realiza-se busca ativa de casos na faixa etária de um a setenta anos em todas as casas do bairro entre- gando coletores em um dia para serem recolhidos com as amostras de fezes no dia subsequente. As amostras são submetidas a exames à fresco pelos métodos de Kato-Katz no Laboratório da Zoonose. Os resultados são entregues nas casas e os casos positivos são enca- minhados pra as Unidades Básicas de Saúde (UBSs) Exames posteriores ao tratamento, apesar de preco- nizados pelo Ministério da Saúde (MS), não foram in- corporados à rotina do programa, provavelmente devi- do à grande demanda de casos. Assim, na falta do con- trole de cura, caso a pessoa não seja curada, existe a possibilidade de cronificação da doença, permanecen- do seu portador como potencial infectante. Além dis- so, casos em que as pessoas venham a ser tratadas su- cessivamente com o mesmo medicamento podem, com o passar dos anos, influenciar na eficácia do mesmo pela seleção de populações de parasitos resistentes à droga. Segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Aracaju os últimos inquéritos coproscópicos obtidos por meio do CCZ no bairro Santa Maria nos anos de 1999, 2000, 2002, 2003, 2004, 2006, indicou que 6,03% da população positivou para S. mansoni, apesar de apenas 47,02% destes casos terem sido efe- tivamente tratados. 6666 Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Carla Virginia Vieira Rollemberg; Jullyana de Souza Siqueira Quintans; Roseli La Corte dos Santos 1.3. Terapêutica Desde 1918, diversas drogas foram indicadas para o tratamento clínico das esquistossomoses, contu- do, muitas não devem mais ser utilizadas devido sua alta toxicidade, são eles: tártaro emético, com- postos antimoniais trivalentes, lucantone, niridazol e hicantone. Hoje, o tratamento pode ser feito com medicamentos disponíveis no mercado brasileiro: oxamniquine (OXA) ou praziquantel (PZQ). Basta uma única dose, via oral, de um dos medicamentos. Ambos são bem tolerados e de baixa toxicidade e a eficácia do tratamento gira em torno de 80% dos casos, em adultos, e 70% em crianças de até 15 anos. Atualmente, prefere-se o praziquantel por apresen- tar o menor custo, já que o medicamento vem sendo fabricado no Brasil por Farmanguinhos (KATZ e ALMEIDA, 2003). Durante anos OXA e PZQ têm sido medicamentos de primeira escolha no tratamento de esquistossomo- se. Mas, há no uso do PZQ uma vantagem peculiar: as infecções por trematodos em geral são tratadas por PZQ, todas as formas de esquistossomose e outras infecções por cestódios, enquanto que o OXA só é eficaz para S. mansoni, preferencialmente machos (REZENDE, 1985). Outra vantagem do uso de PZQ frente a outros fár- macos de ação anti-helmíntica é sua curta meia-vida que garante menor toxicidade. Embora o PZQ possa causar desconforto e diarréia, as tonturas são mais fre- qüentes com OXA. Além disto, o PZQ já demonstrou ser 100% ativo contra linhagens de S. mansoni resis- tentes ao OXA. Apesar de serem substâncias com es- truturas químicas diversas (figuras 1 e 2) e de possuí- rem propriedades farmacológicas e toxicológicas dis- tintas, ambas as drogas apresentam tolerabilidade e eficácia terapêutica similares. Assim, o PZQ obteve respaldo na maioria dos casos, sendo preferencialmente utilizado em detrimento do já consolidado OXA (REZENDE, 1985). Contrações tetânicas do S. mansoni ocorrem in vitro por interferência de Ca, Mg e K após 10 segundos de contato com PZQ. Em estudos experimentais foi de- monstrado que a partir de algumas horas os vermes apresentam vacuolizações no tegumento com parada na postura de ovos, sendo carreados para o fígado onde serão fagocitados. Vê-se aí um grande diferencial entre PZQ e OXA, visto que este último afeta principal- mente vermes machos segundo estudos realizados em camundongos, enquanto que o outro impede a prolife- ração de ovos (CIMERMAN e CIMERMAN, 2005). Desde 1976, OXA tem sido utilizado em larga esca- la nos programas de controle. Entretanto, foi relatado cepas de S. mansoni em humanos que alteraram a sua susceptibilidade, resistência ou tolerância (SABADINI e DIAS, 2002). A tolerância ao OXA foi relatada no Senegal, no Egito, e até mesmo no Brasil em áreas onde é raramente utilizado (PARISE e SILVEIRA, 2001). Estes achados tiveram base em estudo que supunha que S. mansoni tem grande capacidade de desenvolver resis- tência a doses terapêuticas de determinada droga, es- pecialmente quando a população do parasita está sob pressão contínua a partir de esquistossomicidas. Vari- ações na susceptibilidadede S. mansonmi para OXA Figura 1 - Estrutura química do oxaminiquine. Fonte: Farmacopéia Britânica. Figura 2 - Estrutura química do praziquantel. Fonte: Farmacopéia Britânica. 67Avaliação do Programa de Controle de Esquistossomose no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, sob a Perspectiva Farmacêutica Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 também foram demonstradas no Brasil e no Quênia. Em Minas Gerais, Bahia e Paraíba utilizou-se cultura de vermes isolados provenientes de cinco pacientes com S. mansoni que não responderam ao tratamento com OXA (CONCEIÇÃO, 2000). Devido ao fenômeno de tolerância versus resistên- cia, pensou-se na associação de medicamentos como uma solução viável. A associação OXA/PZQ estudada por OLIVEIRA (2005) no tratamento da esquistosso- mose mansoni, por meio de experimentos “in vivo” e “in vitro” mostrou causar danos mais intensos na membrana tegumentar dos parasitos em relação àque- les provocados pelo uso das drogas usadas separada- mente. Os resultados obtidos com esse trabalho apon- tam para vantagem do uso da combinação dessas dro- gas na eliminação total da carga parasitária, na dose de 100 mg/Kg de OXA e 200 mg/Kg de PZQ. Assim, esse esquema pode prevenir o aparecimento de cepas resis- tentes, principalmente em áreas endêmicas, onde su- cessivos tratamentos são realizados. Segundo Programa Especial de Pesquisa e Treina- mento em Doenças Tropicais (TDR) - programa das Nações Unidas que visa ajudar a coordenar, apoiar e influenciar os esforços globais para lutar contra doen- ças dos países pobres e desfavorecidos – protocolo para teste de combinação de OXA e PZQ foi prepara- do, e, se aprovado, será a base para a Fase I de ensaios clínicos (WHO, 2005). Segundo SABADINI e DIAS (2002), a quimioterapia usada para tratar a esquistossomose intestinal, deve- ria ser baseada em dois medicamentos, OXA e PZQ. Nos programas de controle parasitários a cura com estas drogas é geralmente satisfatória. Ensaios clínicos estão sendo realizados pelo TDR na Ásia, África e América do Sul. Combinações de drogas podem também contribuir para melhorar o su- cesso do tratamento e evitar o desenvolvimento de re-sistência (WHO, 2005). Em estudo realizado em Minas Gerais comparando as efetividades de PZQ e OXA, a taxa de cura avaliada por exames de fezes foi de 90,3% e 100%, respectiva- mente. No entanto, quando o oograma foi utilizado como um indicador de sensibilidade identificando número de ovos nos tecidos do camundongo, a taxa de cura do OXA caiu para 42,4%, enquanto a taxa para o PZQ permaneceu alta, em 96,1%. Assim, o PZQ foi significativamente mais eficaz do que OXA no tratamento da infecção pelo S. mansoni (FERRARI et al., 2003). Entretanto, há relatos de baixa eficácia do PZQ no tratamento da esquistossomose humana em foco de S. mansoni no norte do Senegal. Caramujos Biomphalaria pfeifferi infectados foram coletados da área do foco e transportados para o Reino Unido. Grupos de camundongos foram infectados com cercárias de isolados senegalês, queniano ou porto riquenho. Em dois experimentos, o PZQ foi menos eficaz contra os parasitas do Senegal do que contra os outros dois isolados geográficos. A susceptibili- dade reduzida de S. mansoni para PZQ em popula- ções humanas tem implicações importantes para os programas atuais do controle de esquistossomose (FALLON et al, 1995). Outra combinação de artemisinina e PZQ é testada em ensaios clínicos na China e no Egito. No entanto, a utilização desta associação não é recomendável em áreas endêmicas de malária devido ao risco que poderia ocor- rer de induzir a resistência aos parasitas da malária por artemisinina (WHO, 2005). Esse não seria o caso do Brasil, uma vez que as áreas endêmicas de malária e esquistossomose não se sobrepõem. Na maioria dos países, a dose padrão de PZQ é de 40 mg/kg por tratamento. Entretanto, falhas têm sido observadas e, em alguns casos, há necessidade de doses mais elevadas da droga ou associações para matar o parasita. A segurança e a eficácia de dose mais elevada de PZQ têm sido pesquisadas pelo TDR. Entretanto, como PZQ tem sido uma droga eficaz, tem havido pouca investigação dirigida a encontrar novos tratamentos para a doença, dando origem ao risco de que a resistência torne-se generalizada, en- quanto outras opções de tratamento permanecem muito limitadas (WHO, 2005). 6868 Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Carla Virginia Vieira Rollemberg; Jullyana de Souza Siqueira Quintans; Roseli La Corte dos Santos 1.3.1. PRAZIQUANTEL PZQ é a droga de primeira escolha em esquistosso- mose causada por todas as espécies de Schistosoma. Em cisticercose, constitui alternativa para albendazol que previne formação de novos cistos hidáticos, após ressecção cirúrgica. Não apresenta toxicidade grave (BRASIL, 2008) e é derivado do pyrazinoisoquinolina esquistossomicida com baixa toxicidade. Afeta princi- palmente o S. mansoni fêmea provocando mudanças no tegumento e redução na concentração de glutationa (FERRARI et al., 2003). Segundo a Farmacopéia Britânica (1999), o PZQ não deve conter menos que 98,0% e não mais que o equivalente a 103,0% de (RS)-2-ciclohexil- 1,2,3,6,7,11b-hexahidro-4 H-pirozino[2,1-a] isoquinoli- 4-ona calculados através do seu pó seco. A droga con- siste de mistura racêmica dos seus isômeros ópticos levo-dextro-PZQ. Em infecção com cobaias por S. mansoni, levo-PZQ não mostrou nenhum efeito signi- ficativo esquistossomicida comparado com PZQ e dextro-PZQ, embora houvesse redução na contagem de ovos. (TANAKA et al., 1989). Entretanto, Levo-PZQ produziu menos efeitos ad- versos do que PZQ. Esses resultados sugerem que levo- PZQ é o componente da mistura isomérica que é anti- helmintica. Levo-PZQ poderia ser utilizado terapeuticamente com metade da dose atual da droga na mistura isomérica (WU et al., 1991). 1.3.2. ASPECTOS FARMACÊUTICOS QUE DIZEM RESPEITO AO PRAZIQUANTEL PZQ é apresentado na forma de comprimidos de 150 mg e 600 mg e pode ser administrado para adul- tos e crianças acima de quatro anos. No caso do trata- mento de esquistossomose (S. mansoni) deve-se usar 40 mg/kg, por via oral, em dose única, ou 20 mg/kg, por via oral, dividido em três tomadas durante um dia com intervalos de oito horas. Entretanto, além de ser indicado para infecções por trematódios como o S. mansoni é utilizado para tratamento de cestódios como Taenia saginata, Taenia solium e Hymenolepis nana, sendo contra-indicado para pessoas com hipersensi- bilidade ao fármaco e cisticercose ocular. Deve-se hos- pitalizar paciente que esteja sendo tratado para S. mansoni associado com neurocisticercose; com disfunção hepática e monitorar pacientes com irregu- laridades cardíacas (BRASIL, 2008). O uso de PZQ na gravidez é recomendado para infecções por T. solium que devem ser tratadas ime- diatamente. O tratamento no caso de infecção por S.mansoni pode ser benéfico apesar do risco. Entre- tanto, é necessário evitar a amamentação durante o tratamento e após 72 horas da última dose. Pacien- tes com dano hepático podem apresentar concentra- ções plasmáticas duas a quatro vezes maiores que pacientes com função hepática normal, por isso deve- se ajustar o esquema posológico (BRASIL, 2008) e pacientes alcoolistas devem ser monitorados com cuidado. Com relação aos aspectos farmacocinéticos clinica- mente relevantes, a absorção oral é rápida (BRASIL, 2008), entretanto, por ser medicamento praticamente insolúvel em água, parcialmente solúvel em álcool e solúvel em solventes orgânicos como clorofórmio (FARMACOPÉIA BRITÂNICA, 1999) recomenda-se administrá-lo com dieta ricamente lipídica. O pico de concentração sérica é atingido em uma a duas horas; a meia-vida é de 0,8 horas a três horas. Entre os efeitos adversos citam-se os comuns: descon- forto abdominal, náusea, vômitos, diarréia, anorexia e os raros: febre, urticária, prurido, eosinofilia, erup- ções cutâneas; artralgia, mialgia; dor de cabeça, cansa- ço, tontura, sonolência, convulsões; astenia. Em trata- mento de neurocisticercose podem ocorrer meningis- mo, convulsões, alterações mentais e pleiocitose no líquor (BRASIL, 2008). É importante orientar os pacientes a ingerir o com- primido sem mastigar, com 250 mL de água, para evi- tar gosto amargo que pode causar náusea e vômito. Orientar também a evitar atividades que exijam aten- ção, como dirigir e operar máquinas, até um dia após o término do tratamento (BRASIL, 2008). 69Avaliação do Programa de Controle de Esquistossomose no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, sob a Perspectiva Farmacêutica Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Os comprimidos devem ser armazenados em local fechado, em temperatura abaixo de 30ºC, ao abrigo da umidade e da luz (BRASIL, 2008). Entre as várias ra- zões pelas quais o PZQ é desejável para programas de tratamento estão: sua baixa toxicidade, por ser bem tolerado por muitos indivíduos; a fácil estocagem e transporte, visto que é distribuído em forma de com- primidos e à diminuição do custo em relação ao ou- tros anti-esquistossomicidas. Seu preço tem caído des- de o início de sua fabricação no Brasil, com o corrente custo de um comprimido de 150 mg por aproximada- mente R$ 6,00 nas farmácias sergipanas. Além disso, o tratamento é simples porque pode ser completado com uma única dose o que o torna extremamente viá- vel para programas de tratamento em massa. 1.3.3. ACOMPANHAMENTO FARMACOTERAPÊUTICO O PZQ faz parte da Relação Nacional de Medica- mentos (RENAME) sendo, portanto, público e gratui- to. Entretanto, quando ocorre falta de medicamento na UBS, o paciente tem que comprá-lo. Apesar de ter valor não tão alto quanto alguns medicamentos para doenças crônicas, o PZQ é considerado caro para po- pulações carentes, até porque não é fracionável no Brasil e o paciente precisa comprar a caixa que custa em média R$30,00 (Consulta em Farmácias de Aracaju- SE). No que diz respeito à adesão ao tratamento, nes- tas situações o paciente muitas vezes não compra o medicamento e permanece doente tornando-sepoten- cial infectante. O Consenso de Granada de 1998 define Problemas Relacionados com Medicamentos (PRM) como elemen- to de resultado clínico negativo próprio da utilização de medicamentos (SANTOS et al., 2004). Um medicamento é necessário quando foi prescri- to ou indicado para um problema de saúde concreto que o doente apresenta, neste caso a infecção diagnosticada por meio de exame laboratorial. Entre- tanto, um medicamento é inefetivo quando não alcan- ça suficientemente os objetivos terapêuticos espera- dos o que engloba inclusive o bem estar e qualidade de vida do paciente (SANTOS et al., 2004). Quanto às interações entre drogas pode ocorrer re- dução da concentração plasmática do PZQ quando administrado junto a carbamazepina, cloroquina, dexametasona, fenitoína, fenobarbital. Pode ocorrer aumento da concentração plasmática do PZQ ao se utilizar simultanemanete cimetidina, eritromicina, itraconazol e cetoconazol. O PZQ pode aumentar a biodisponibilidade de albendazol e seu uso concomi- tante com rifampicina pode causar concentrações subterapêuticas do anti-helmíntico (BRASIL, 2008). O albendazol, passível de ser administrado em dose única e bem tolerado, tem sido considerado como pri- meira escolha para algumas helmintíases intestinais (BRASIL, 2008). A interação medicamentosa entre albendazol e PZQ é importante visto que muitas vezes seus parasitas alvos são encontrados numa mesma pessoa e o PZQ aumenta os níveis plasmáticos de albendazol. Investigação levada a cabo pelo TDR esta- beleceu a segurança da administração conjunta destes medicamentos e removeu obstáculo importante a tal interação. Sendo assim, sendo necessária a adminis- tração destes dois medicamentos em indivíduos biparasitados ou poliparasitados em que um dos pa- rasitas é o S. mansoni, albendazol e PZQ podem ser administrados ao mesmo tempo (WHO, 2005). 1.3.4. EPIDEMIOLOGIA, PLANEJAMENTO E GERENCIAMENTO DAASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA A Epidemiologia vem avançando no seu compro- misso com as transformações tão necessárias no nos- so sistema de saúde. No que diz respeito à Ciência Farmacêutica em especial, promove o bom funciona- mento das etapas do ciclo de assistência farmacêutica desde o planejamento ao gerenciamento e obtenção do medicamento pelo paciente mediante demanda pré- estabelecida por exames clínicos. Segundo a Lei Federal 8.080 de 19 de setembro de 1990, no seu artigo 6º: § 1º Entende-se por vigilância sanitária um conjunto de ações capaz de eliminar, dimi- nuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir 7070 Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Carla Virginia Vieira Rollemberg; Jullyana de Souza Siqueira Quintans; Roseli La Corte dos Santos nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde, abrangendo: I o controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente, se relacionem com a saú- de, compreendidas todas as etapas e proces- sos, da produção ao consumo; e II o controle da prestação de serviços que se relacionam direta ou indiretamente com a saúde. § 2º Entende-se por vigilância epidemioló- gica um conjunto de ações que proporcio- nam o conhecimento, a detecção ou preven- ção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde in- dividual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos. Um planejamento correto deve levar em conta a utilização da epidemiologia na seleção, na programa- ção e na avaliação do uso de medicamentos. Afinal, não podemos pensar em ações pertinentes à Assistên- cia Farmacêutica desvinculadas de dados epidemioló- gicos (MARIN et al., 2003). Segundo MARIN et al. (2003), é preciso sensibili- zar as autoridades para cuidar das reservas munici- pais de água e da rede de saneamento do município. É necessário ainda propor campanhas educativas com relação às medidas de higiene pessoal e doméstica, cuidados com alimentos e água potável. No Brasil, a epidemiologia tem sido construída com clara consciência de que seu papel histórico inclui o com- promisso com a transformação das condições de saúde da população. Isto implica a construção de sistema de saúde que compreende o processo saúde-doença-cuida- do como parte da organização social (CASTRO, 1999). Desde o inquérito epidemiológico ao estudo da implementação do planejamento da assistência farma- cêutica é sabido que o planejamento deve ser entendi- do como dinâmica de análise e cálculo que possibilita ajustar determinada ação, permitindo reorientá-la para obtenção de resultado de maior desempenho. A no- ção de continuidade é igualmente fundamental, pois acompanha a realidade que é mutável. Assim, torna- se necessário realizar o cálculo do plano em velocida- de maior que a mudança dos fatos na situação. O as- pecto central do planejamento é o acompanhamento permanente da realidade com avaliação das decisões tomadas. O objetivo é o de verificar se os resultados produzidos convergem na direção dos resultados es- perados (MARIN et al., 2003). A seleção dos medicamentos a serem padroniza- dos pelo serviço público é um dos processos mais importantes do ciclo da Assistência Farmacêutica, pois essa fase deve ser baseada em estudos epidemiológi- cos e farmacoeconômicos, evitando as pressões mer- cadológicas, além de considerar a eficácia terapêutica e a segurança do fármaco. Assim, padronização e sele- ção devem ser realizados pelo gestor municipal, em conjunto com a Comissão de Farmácia e Terapêutica, selecionando-se aquele medicamento seguro, eficaz, de qualidade comprovada, com preços acessíveis e que satisfaça as necessidades de saúde da maioria da po- pulação, atendendo ao conceito de medicamentos es- senciais da OMS (MARIN et al., 2003). Diagnosticar problemas relacionados à assistência farmacêutica ou falta dela na UBS no que diz respeito às enteroparasitoses, bem como sugerir soluções para este quadro tais como percentual de demanda não aten- dida na farmácia e reclamações do usuário em relação à falta de medicamentos é necessário. Entretanto, dizer o que fazer e como fazer não é suficiente para a elaboração de um plano. É necessá- rio responder ainda com que recursos, em que prazo, com que eficácia e eficiência e, principalmente, quem faz e com o auxílio de quem. Para completar o proces- so de gestão, além do planejamento e da execução pro- priamente dita do plano elaborado, torna-se necessá- rio estabelecer critérios de acompanhamento e avalia- ção do plano (MARIN et al., 2003). 71Avaliação do Programa de Controle de Esquistossomose no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, sob a Perspectiva Farmacêutica Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 2. Objetivo 2.1. Geral · Avaliar o Programa de Controle da Esquistossomo- se no Bairro Santa Maria. 2.2. Específicos · Avaliar situação epidemiológica da esquistos- somose no Bairro Santa Maria. · Avaliar o fluxo de informação entre a institui- ção que realiza os inquéritos coproscópicos e a responsável pelo tratamento. · Descrever o perfil da resposta terapêutica do PZQ para o tratamento da esquistossomose em área endêmica da doença · Identificar funções pertinentes à Assistência farmacêutica desde o inquérito epidemiológico até estudo da implementação do seu planeja- mento. 3. Material e métodos 3.1. Área de estudo A área selecionada para estudo foi o bairro Santa Maria que está situado na zona sul do município de Aracaju. Trata-se de uma área de expansão nos limites da cidade. O bairro cresce de forma não planejada, muitas vezes através de construções improvisadas erguidas a revelia das formalidades legais. Abriga pes- soas que migram para Aracaju em busca de moradias populares. Existe fornecimento de água para o bairro, contudo, irregular, além de não atingir todas as resi- dênciasdo bairro. Há abundancia no local de muitos lagos e poços, fontes naturais de água que são larga- mente utilizadas pelo moradores para os mais varia- dos fins: pesca, banho, lavagem de roupas. Carroceiros com freqüência utilizam os lagos para lavagem dos animais. A água também é utilizada para cultivo de hortaliças e, eventualmente, consumo humano. O que é preocupante visto que nas áreas alagadas, lagoas, e nas minas foram identificados criadouros naturais de planorbídeos da espécie B. glarata (CCZ, SE: comuni- cação pessoal, 2007). Assim como o abastecimento de água é insuficien- te, também os são as condições de saneamento, possí- vel veículo de contaminação não só para esquistosso- mose mais também para outras enteroparasitoses. Ademais, no bairro existe depósito de lixo que atrai catadores que residem nas proximidades apesar da proibição da prática. O bairro contava em 2006 com população de cer- ca de 19.400 habitantes. De acordo com o Programa de Saúde da Família (PSF), do Ministério da Saúde, essa população foi distribuída em três micro-áreas, conforme região da UBS que lhe presta serviço, ao todo três: UBS Elizabeth Pita; UBS Dr. Osvaldo Leite e UBS Celso Daniel, com cobertura do Programa de Saúde da Família (PSF) de Aracaju. Deve-se frisar que os principais cursos naturais de água tais como Prainha, Ponta Asa no Conjunto Santa Maria, Mor- ros em toda a extensão do bairro e Loteamento Re- creio estão sob a área de atuação da UBS Dr. Oswaldo Leite (figura 3). Obtidos os resultados e avaliados estatisticamente pode-se formular hipóteses através dos inquéritos com a população sobre possíveis fontes de contaminação para intervir sanitariamente seja através de educação, tratamento dos focos e das pessoas além de alerta ao órgão da vigilância sanitária municipal. 3.2. Avaliação epidemiológica da esquistossomoseno bairro Santa Maria A avaliação epidemiológica para esquistossomose foi realizada pela análise dos inquéritos coproscópicos fornecidos pela SMS. As informações disponíveis in- cluíram número de diagnósticos realizados, positividade, endereço do paciente, sexo, idade e to- mada de medicamento. 7272 Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Carla Virginia Vieira Rollemberg; Jullyana de Souza Siqueira Quintans; Roseli La Corte dos Santos Figura 3 - Vista aérea do Bairro Santa Maria. 1. Conjunto Santa Maria; 2. Loteamento Prainha; 3. Conjunto Valadares; 4. Loteamento Santa Maria; 5. Loteamento Novo Paraíso; 6. Conjunto Padre Pedro; 7. Conjunto Ponte do Caboclo; 8. Conjunto Marivan. Fonte: SEPLAN. Aracaju-SE 73Avaliação do Programa de Controle de Esquistossomose no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, sob a Perspectiva Farmacêutica Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 3.3 Resposta terapêutica ao PZQ 3.3.1. POPULAÇÃO ESTUDADA Inicialmente fizeram parte da população de estudo pacientes com resultado positivo para ovos de esquistossoma, diagnosticados pelo Centro de Controle de Zoonoses, de ambos os sexos, cuja idade estivesse entre 16 e 70 anos e que aceitassem participar do estu- do, assinando o termo de consentimento (Apêndice). Não seriam incluídos no estudo gestantes, diabéticos, cardíacos ou portadores de outras doenças crônicas. Entretanto, devido a falhas no processo de notifi- cação constatou-se grande número de casos não noti- ficados ou não tratados. Assim, o procedimento foi alterado, passando a inclusão dos pacientes que pos- suíam risco de contrair a doença ou que suspeitavam estar infectados. Dessa forma, o projeto abrangeu to- dos os pacientes com suspeita de estarem acometidos pela doença segundo indicação dos agentes de saúde. 3.3.2. DEFINIÇÃO DO TAMANHO DA AMOSTRA PARA O ESTUDO DE FALHA TERAPÊUTICA. A determinação do número de pacientes a ser in- cluído no estudo da resposta terapêutica do PZQ foi realizada pelo método clássico e considerou a pro- porção estimada de fracasso terapêutico parasitológi- co, para os esquemas utilizados no tratamento da es- quistossomose, com base em observações de estudos anteriores. Assim, para a proporção esperada de falha terapêu- tica de 25%, no nível de confiança de 95% e precisão de 10%, deveriam ser incluídos no mínimo 72 pacien- tes para a avaliação do PZQ no bairro Santa Maria. Con- siderando a possibilidade de perda de seguimento em 10%, 80 pacientes seriam necessários para o estudo. 3.3.3. PROCEDIMENTO DE CAMPO Inicialmente foram realizadas visitas as UBSs para adequação das atividades do estudo à rotina dos enfer- meiros responsáveis pelo PSF em cada unidade e acesso às notificações dos casos confirmados de esquistosso- mose. Os pacientes foram procurados em suas casas em dois dias da semana, agendados também de acor- do com os horários livres dos agentes de saúde. Após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Escla- recido e preenchimento de cadastro recebiam coleto- res de amostra de fezes disponíveis também nas far- mácias das UBS. As amostras, por sua vez, deveriam ser entregues pelos pacientes nas UBSs em dia previ- amente estabelecido entre as sete e nove horas da ma- nhã. Os exames controle foram feitos em pacientes em que foram encontrados ovos de S. mansoni tratados por uma dose única de PZQ (40 mg/Kg). Outros parasi- tos intestinais foram tratados com a droga correspon- dente. Os resultados foram entregues nas visitas da sema- na seguinte. Caso fosse positivo o paciente era enca- minhado ao médico ou enfermeiro da sua área para que fosse prescrito o medicamento necessário. Nos casos positivos para esquistossomose o paciente foi acompanhado com exames controles, inicialmente pre- visto para seis meses, para verificação da eficácia tera- pêutica do medicamento PZQ. Os exames controle iniciais foram realizados após cerca de 25 dias da administração da dose única de PZQ. Os pacientes foram procurados e convidados a participar do estudo, informados da necessidade da coleta de fezes mensal durante seis meses, recebiam o coletor e eram instruídos de como proceder a coleta e entrega da amostra. 3.3.4. PROCEDIMENTO DE LABORATÓRIO As amostras de fezes foram processadas no mesmo dia da entrega, utilizando duas técnicas: qualitativa de Ritchie e quantitativa de Kato-Katz (KATZ e PELLEGRINO, 1972), de forma a aumentar a sensibili- dade do diagnóstico. Todo o material foi examinado ao microscópio e submetido a contagem dos ovos. Todas as lâminas foram revisadas por profissional bioquímico que assinava os resultados. 7474 Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Carla Virginia Vieira Rollemberg; Jullyana de Souza Siqueira Quintans; Roseli La Corte dos Santos O exame parasitológico de fezes pelo método de Kato- Katz é o mais adequado, rápido e de fácil execução além de possuir como vantagem ser quantitativo. Um único exame de fezes pelo método de Kato-Katz revela 85% dos casos positivos (CIMERMAN e CIMERMAN, 2005). Nas áreas de baixa prevalência ou após o tratamento, quando o número de ovos é pequeno, recomenda-se repetir o exame. Apesar da boa resposta do método de Kato-Katz é importante o uso associado de outro méto- do pra redução de falsos negativos. Segundo WHO (1985), existem três categorias para a intensidade da infecção intestinal (expressas em ovos por gramas de fezes) onde se considera: suave (1-100 ovos por grama de fezes), moderado (101-400) e severo (>400). Assim, o método quantitativo de Kato modificado por Katz e colaboradores apesar de não ser prerrogativa para dose medicamentosa é importante em estudos de eficácia te- rapêutica versus parasitemia. O paciente é considerado curado se todos os resul- tados forem negativos, pois, a presença de um único ovo de S. mansoni é indicação de falha terapêutica. 3.4. Avaliação de dados O banco de dados do projeto foi elaborado no software EPIDATA e analisado utilizando o software EPIINFO. Para as variáveis qualitativasfoi aplicado o teste do qui-quadrado e calculados os intervalos de confiança para comparações entre duas proporções. A probabilidade do erro tipo I <05% (p<0,05) foi con- siderado significante. 3.5. Considerações éticas O protocolo da pesquisa-objeto deste relato foi sub- metido ao Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade Federal de Sergipe (HU), obtendo sua aprovação em 06 de fevereiro de 2007 (Apêndice A). 4. Resultados e discussão 4.1. Avaliação do programa de controle de esquis-tossomose em um bairro de Aracaju, Sergipe 4.1.1. ANÁLISE EPIDEMIOLÓGICA DOS DADOS DO CENTRO DECONTROLE DE ZOONOSES DE ARACAJU A localização dos casos diagnosticados de esquis- tossomose permite confirmar suspeitas de possíveis focos tais como o Morro do Avião no Conjunto Marivan e o Loteamento Novo Paraíso, localidades onde não há água encanada nem saneamento, onde existem di- versas minas de água e muito lixo espalhado no terre- no que, por ser mais alto, possibilita contaminação de todo o bairro quando chove. É imprescindível ao Pro- grama conhecer os locais de agregação de casos para concentrar ações nessas áreas (Tabela 1). Tabela 1 - Distribuição de casos de esquistossomose identificados pelo inquérito do CCZ em 2006 no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, Brasil. Localidades N° de casos % População Média de idade Média de ovos Loteamento Santa Maria 104 15,1 3460 27,9 3,5 Loteamento Prainha 58 8,4 845 28,2 5,5 Conjunto Valadares 56 8,1 - 29,3 2,7 Conjunto Santa Maria 18 2,6 - 21,1 5,3 Loteamento Novo Paraíso 8 1,2 - 24,5 3,5 Conjunto Padre Pedro 354 51,4 10039 25,8 3,9 Conjunto Ponte do Caboclo 28 4,1 - 30,1 3,6 Conjunto Marivan 63 9,1 1644 27,4 4,8 Média 26,8 4,1 Fonte: CCZ, 2006 75Avaliação do Programa de Controle de Esquistossomose no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, sob a Perspectiva Farmacêutica Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Figura 5 - Prevalência de enteroparasitoses no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe de Junho de 2007 a Junho de 2008. De acordo com os dados da SMS, a maior freqüên- cia de eliminadores de ovos ocorre no sexo masculino (70,6%). Essa distribuição sugere a influência de vari- áveis comportamentais, provavelmente por exposição durante as atividades profissionais, como carroceiros e recicladores, ou de lazer como a pescaria. Crianças abaixo de 10 anos responderam por 10% dos casos (Figura 4). Esse fato aponta para a transmissão local da doença, principalmente relacionada com ativida- des de lazer. Esforços continuados de tratamento e educação em saúde, aliados a projetos de saneamento e oferta de alternativas de lazer poderão minimizar os riscos de contaminação. 4.1.2. Análise da resposta terapêutica do PZQ A avaliação da resposta terapêutica ocorreu entre 11 de junho de 2007 e 30 de junho de 2008. Com o fácil acesso ao diagnóstico, muitas pessoas que se sus- peitavam parasitadas solicitaram a realização de exa- me. Assim, por meio de busca ativa, foram contatadas 1.500 pessoas das quais 459 se submeteram aos exa- mes coproscópicos (Figura 6). Muitas delas nunca haviam feito exames parasitológicos outras só o fize- ram há muitos anos. Observou-se alto índice de parasitoses intestinais nas amostras analisadas (Figura 5). A alta freqüência destes parasitos, normalmente relacionando a causas ambientais, provavelmente está relacionada ao fato de o bairro tratar-se de área de ocupação recente e irregu- lar, com sanitários coletivos ou mesmo ausência deles como conseqüência da falta de rede de esgoto, trata- mento de água e calçamento das ruas. A prevalência considerável de casos de S. mansoni (10,9 %) decorre, possivelmente de pessoas que mi- gram de cidade endêmicas do interior do estado e de outros estados para esta área de expansão da capital de Sergipe. Figura 4 - Distribuição por faixa etária de 688 casos identificados de esquistossomose pelo inquérito do CCZ em 2006 no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, Brasil. 7676 Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Carla Virginia Vieira Rollemberg; Jullyana de Souza Siqueira Quintans; Roseli La Corte dos Santos A freqüência simultânea de ovos de Schistosoma com outros parasitas foi de 41,9% com Ancylostomideo sp, 32,26% com Trichuris trichiura, 19,35% com Ascaris lumbricoides, 19,35% com E. coli, e apenas 3,22% com Giardia lamblia. Não houve eliminação simultâ- nea de ovos de Schistosoma e cistos de E. hystolitica e Iodameba bustchilii e ovos de Enterobius vermicularis. Foi marcante a freqüência (22,3%) de portadores de ovos de ancilostomídeos, especialmente em deter- minadas áreas do bairro como a Ponta da Asa no Lote- amento Santa Maria (Figura 3) onde nenhuma das ruas são pavimentadas e existem muitas casas sem sanitá- rio. Além disto, ao comparar à freqüência de casos eliminando ovos de Ancylostomideos e S. mansoni si- multaneamente (41,9%) apesar de diferentes formas de contaminação entre a epidemiologia desses dois helmintos um adquirido pelo contato com o solo e o outro pela água, os dois helmintos são contraídos quan- do se possui hábito de não andar calçado. Não se des- carta também hipótese de existir mecanismos de inte- ração entre estes helmintos tal como uma possível simbiose que possa elucidar esta relação que foi maior inclusive que a entre Ancylostomideos e Ascaris lumbricoides (30,4%) apesar da maior semelhança en- tre os ciclos destes dois geo-helmintos. Os resultados positivos de 31,6 % portadores monoparasitados, 14,8% biparasitados e 8,7 % poliparasitados comprovam a relação precária de saú- de e higiene no Bairro Santa Maria sendo necessária implementação de condições de saneamento básico e campanhas de educação em saúde uma vez que as parasitoses intestinais apresentam diferentes mecanis- mos de transmissão, os quais estão diretamente asso- ciados às condições inadequadas de saneamento bási- co e ao pouco investimento em educação sanitária. Foram encontradas 98 pessoas com diagnóstico positivo para esquistossomose das quais 57 realiza- ram exames pelo projeto. Os resultados dos exames iniciais realizados através do CCZ não chegaram efeti- vamente aos pacientes. Deste modo, a maioria dos diagnósticos iniciais dos pacientes foram obtidos no trabalho de busca ativa em campo e a menor parte por meio dos resultados do inquérito da SMS. Dos 57 pacientes, 28 (49,1 %) aderiram à terapêuti- ca com PZQ e realizaram ao menos o primeiro exame controle. O restante (50,9%) apenas aderiu ao trata- mento, mas não realizou o controle, alegando para tanto se sentir bem ou justificando sua recusa na inutilida- de da medida visto que inevitavelmente voltaria a se contaminar. A resposta terapêutica foi adequada em 27dos 28 pacientes que tomaram PZQ. Apenas oito realizaram o segundo exame controle, dos quais um positivou para ovos do helminto. O que demonstra a importância da execução do controle de cura. Os resultados indicaram falha terapêutica do PZQ em 7,14% (02/28) dos indivíduos tratados, valor que está abaixo dos 24,5% relatado por REZENDE (1985), mas, acima do padrões dos estudos de FERRARI et al. (2003) de 3,9%. Todavia esses resultados foram preju- dicados devido à baixa adesão dos pacientes ao núme- ro de controles de cura. Acontece que o número de controles preconizado é demasiadamente desgastante para os pacientes visto que muitos iniciam suas rotinas de trabalho e estudo antes das sete horas da manhã, ou seja, antes da abertura da UBS, ou residem longe da mesma. Assim, o controle de cura foi reduzido de seis para três meses, prática esta ademais compartilhada pelo Dr. Naftale Katz aperfeiçoador do método de Kato que conforme comunicação pessoal declarou enfrentar di- ficuldade semelhante com seus pacientes. A classificação dos casos por faixa etária permitiu identificar corrente contaminação na faixa de zero a dez anos (7,0% dos infectados porS. mansoni) e nas faixas de 11 a 20 e 21 a 30 anos (21,1% e 15,8% respectiva- mente). Além dos percentuais já esperados na faixa de 31 a 40 anos (15,8%) e acima de 40 anos (26,3%). 77Avaliação do Programa de Controle de Esquistossomose no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, sob a Perspectiva Farmacêutica Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 O conhecimento prévio de alguns pacientes sobre os efeitos colaterais do PZQ os inibe e faz com que não tomem o medicamento. A não adesão ao trata- mento também pode ocorrer devido a falhas estrutu- rais no Sistema de Saúde. No mês de dezembro de 2007, muitos dos pacientes que deveriam tomar o medicamento não o puderam fazer devido falta de va- gas para agendamento de consulta médica e até mes- mo falta de medicamento. Constatou-se nas visitas às UBSs, grande número de casos não notificados. A interação entre a equipe de saúde e o paciente é crucial para a cura da esquis- tossomose e impede sua reinfecção. Além disto, a in- teração entre a própria equipe de saúde é extremamente importante, afinal, caso o médico não comunique ao enfermeiro a ocorrência de diagnostico positivo, este não realizará devida notificação à Secretaria Munici- pal de Saúde. Na falta da notificação o Centro de Abas- tecimento Farmacêutico (CAF) não enviará à UBS o número necessário de medicamentos. Rompendo-se Alguns pacientes não aderiram ao tratamento, ou- tros de maneira análoga, muito embora tenham aderi- do ao uso do PZQ, não deram continuidade aos im- prescindíveis exames controle. Assim como alguns pa- cientes que não deram seguimento ao estudo, mesmo após saberem da gravidade da doença, sustentando as mesmas desculpas alegaram falta de tempo, distância entre sua casa e a UBS, reinfecção muito provável etc. Figura 7 - Distribuição por faixa etária de 57 casos identificados de Esquistossomose no Bairro Santa Maria de Junho de 2007 a Junho de 2008, Aracaju, Sergipe, Brasil. Figura 6 - Fluxograma da quantidade de exames e visitas realizadas pelo projeto. 7878 Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Carla Virginia Vieira Rollemberg; Jullyana de Souza Siqueira Quintans; Roseli La Corte dos Santos assim o ciclo de assistência farmacêutica e impedindo o acesso ao medicamento pelo paciente. A falta de notificação é justamente um dos grandes problemas encontrados quanto ao programa de con- trole visto que encobre o número de casos e acarreta diretamente na falta de medicamentos. Os pedidos não são feitos por demanda epidemiológica ou qualquer estudo prévio ao CAF que na falta de notificação en- via à UBS cotas fixas do medicamento, porém, discre- pantes da demanda real, a UBS Dr. Osvaldo Leite, por exemplo, recebe mensalmente 60 comprimidos. Foi verificada a falta do medicamento pelo menos três ve- zes durante o projeto, possivelmente pelo aumento na procura devido a nossos exames controle, sem que o pedido de medicamento fosse alterado. Foram identificados nos relatos dos pacientes dife- rentes suspeitas de PRM baseados no Segundo Con- senso de Granada (SANTOS et al., 2004) relacionados ao uso do PZQ: PRM 1 – O doente não usa os medicamen- tos que necessita. PRM 4 – O doente usa uma dose, freqüên- cia e/ou duração inferior à que necessita. PRM 6 – O doente usa medicamento que lhe provoca reação adversa a medicamen- tos. Assim, as suspeitas de problema relacionado a medicamento foram identificadas seja por falta deste na UBS; seja por achar que não necessita de tratamen- to. Outras suspeitas por casos de recrudescência pro- vavelmente devido ao sobrepeso e ao fracionamento incorreto além de casos de vômito após administração da dose. E ainda o relato de alguns pacientes que so- freram efeitos colaterais. Dentre os pacientes com esquistossomose apenas 25,5% eram mulheres. Os dois únicos casos com a forma hepatosplênica da esquistossomose ocorreram na residência de pescadores. Nestes dois pacientes do sexo masculino ainda se identificaram ovos viáveis mesmo após o tratamento e foram então encaminha- dos ao Hospital Universitário e Hospital de Urgências de Sergipe. O primeiro apresentou suspeita de pro- blema relacionado ao medicamento (PRM 4), prova- velmente devido ao seu sobrepeso, podendo ser este fato a razão para a falha terapêutica. O segundo paci- ente faz uso freqüente de bebidas alcoólicas e foi enca- minhado para realização de exames complementares referentes ao estado mais grave da doença visto que o requerimento médico dos exames do paciente era jus- tificado pela presença de hepatoesplenomegalia e he- morragias. É importante ressaltar que ambos os paci- entes inicialmente relataram que não mais iriam pes- car sem botas na lagoa e com o decorrer dos meses ao adquirir relação de confiança com a pesquisadora con- fessaram não resistir à pratica da pesca e que não sen- tiam-se confortáveis com a bota de proteção. Como nesse bairro há um alto contingente migrató- rio e todos os elementos da cadeia epidemiológica do S. mansoni estão presentes, são fortes as evidências da transmissão urbana dessa infecção. A não resolu- ção destes PRMs podem ampliar os riscos de conta- minação no bairro. Assim, torna-se necessário orien- tar o paciente quanto ao uso correto do medicamento bem como a importância de aderir ao tratamento; o ajuste da dose; a farmacovigilância; o planejamento na aquisição de medicamentos. Funções desempenha- das pelo farmacêutico, profissional que não consta nas equipes de saúde de nenhuma das três UBSs. 5. Conclusões Os resultados positivos de 31,6 % portadores monoparasitados, 14,8% biparasitados e 8,7 % poliparasitados demonstram o estado precário de saú- de e higiene no Bairro Santa Maria sendo necessária implementação de condições de saneamento básico e campanhas de educação em saúde. Quanto à falha terapêutica do PZQ revelou-se em 7,14% (02/28) dos indivíduos tratados, entretanto, este dado pode ter sido prejudicado porque o número de indivíduos submetidos à análise está abaixo do esta- belecido para índice de confiança de 95%. 79Avaliação do Programa de Controle de Esquistossomose no Bairro Santa Maria, Aracaju, Sergipe, sob a Perspectiva Farmacêutica Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Foi verificada baixa adesão ao tratamento e ao pro- grama de controle por parte dos pacientes e dos pro- fissionais de saúde. A efetividade do programa en- contra-se abaixo do necessário para controlar a doen- ça. Embora o diagnóstico seja realizado, muitos não recebem o resultado e os que são tratados não são acom- panhados para verificação da cura. Com o não uso do medicamento e ausência de seguimento dos controles de cura, o tratamento fica prejudicado visto que os pacientes podem não estar curados, mas apenas dimi- nuírem a parasitemia. Isto é um dado alarmante quando se considera que o bairro possui precárias condições de saneamento e existe nas valas das ruas o hospedeiro intermediário caramujo Biomphalaria glabrata. A verificação da transmissão local da doença e ao mesmo tempo as falhas verificadas no processo são apontadas como principais causas da manutenção da endemicidade no Bairro Santa Maria e, possivelmente nos demais bairros endêmicos de Aracaju. Assim, se fazem necessárias medidas de planejamento e educa- ção em saúde. Comentários finais A esquistossomose mansônica completa em 2008 centenário do seu primeiro registro. Entretanto, ape- sar das condições para sua superação já estarem pos- tas desde o século XIX, mesmo nas capitais, como é o caso de Aracaju, algumas populações estão sujeitas a condições sanitárias que afrontam a dignidade huma- na e possibilitam a persistência da doença. O bairro Santa Maria é importante reserva ecoló- gica de hospedeiros intermediários de S. mansoni, a falta ou má administração de medidas de controle nessa localidade, especialmente aquelas voltadas ao saneamentobásico, poderão ampliar os casos de es- quistossomose. Sendo assim, faz-se necessário a cons- trução de medidas de saneamento sejam estruturais ou de comportamento. A efetiva execução do progra- ma de controle da esquistossomose no bairro se dará aliando os esforços dos profissionais de saúde aos da população, utilizando dados epidemiológicos como ponto de partida para planejamento, seleção e aquisição de medicamentos e criação de estratégias para ampliar e facilitar o acesso aos medicamentos e exames laboratoriais. A troca de informações e o bom convívio entre a equipe do projeto e os profissionais das UBS foram decisivos para o bom entendimento da realidade do bairro, seja no aspecto da saúde, como social, geográ- fico e estrutural, o que viabilizou a formulação de hi- póteses de aspectos ligados à contaminação e focos de esquistossomose. Sem a ajuda dos agentes não seria possível levar o projeto a áreas de difícil acesso por motivos estruturais, como falta de calçamento, morros e lugares inabitados ou por motivos de segurança de- vido ao alto registro de violência que acomete este bair- ro, reconhecidamente rotulado como à margem da so- ciedade e perigoso. Apesar de toda a sua parte estrutural, burocráti- ca e analítica, além dos inquéritos, gráficos e simu- lações estatísticas, o projeto é imbuído de humanismo e vontade de mudança objetivando construir um sistema de saúde de prevenção e não apenas de cura, de doação e não apenas de cobran- ça, integrando universidade, comunidade e profis- sionais da saúde de forma a estender-se favorecen- do a todos os aspectos. 8080 Revista da Fapese, v.4, n.2, p. 63-82, jul./dez. 2008 Carla Virginia Vieira Rollemberg; Jullyana de Souza Siqueira Quintans; Roseli La Corte dos Santos BRASIL. Lei 8.080 de 19 de setembro de 1990. Dispo- nível em: <http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/ pdf/Lei%208080.pdf>. Acesso em Mai., 2008. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilân- cia em saúde. Plano Nacional de Vigilância e Controle das Enteroparasitoses. Brasília, 2005. Disponível em: < http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ enteroparasitoses_pano_nacional.pdf >. Acesso em Fev. 2008. BRASIL. 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