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Eficiência do gasto público - o governo focado na solução das “falhas de mercado”

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Eficiência do gasto público: o governo focado na solução das “falhas de 
mercado”
Marcos Mendes1
Introdução
A maior eficiência do gasto público é uma condição necessária para que o Brasil 
possa obter mais crescimento econômico, menor desigualdade, mais oportunidades de 
trabalho, menos violência e uma vida mais longa e recompensadora para sua população.
O objetivo desse artigo é refletir sobre como nós, gestores e servidores públicos, 
podemos atuar para buscar essa maior eficiência. Para tanto, mostra-se, inicialmente, que o 
Estado brasileiro gasta muito e gasta mal. Em seguida são analisados os efeitos negativos 
sobre a sociedade de um estado grande e pouco eficiente. Fica, então, estabelecida a 
necessidade de racionalizar e controlar o gasto público no País. 
Para fazer essa racionalização do gasto de forma adequada, é preciso responder às 
seguintes questões: para que servem os governos? Que funções devem ser exercidas por um 
governo? Como decidir se um determinado objetivo deve ser perseguido por meio da 
criação de uma política pública ou se é melhor deixar que a sociedade privada – o mercado 
– resolva o problema por si só? Quais as limitações e fraquezas dos governos: em que 
funções o governo tem melhores condições para ajudar o progresso social? 
A teoria econômica procura responder a essas questões utilizando os conceitos de 
“falha de mercado” e “falha de governo”. Sempre que o funcionamento normal de uma 
economia capitalista não consegue, por si só, resolver um problema, então surge uma 
oportunidade para que o governo atue, com o objetivo de corrigir essa “falha de mercado”. 
Contudo, ao fazê-lo, o governo também pode incorrer em “falhas de governo”.
O artigo apresenta as principais falhas de mercado e de governo analisadas na 
literatura, argumentando que governo eficiente é aquele que: (a) é capaz de solucionar as 
“falhas de mercado” e (b) ao fazê-lo gera poucas “falhas de governo” . Ou seja, um governo 
eficiente seria como um remédio capaz de curar a doença sem gerar grandes efeitos 
colaterais. 
1 Consultor Legislativo do Senado Federal. Doutor em Economia pela USP.
Cabe aos gestores e servidores públicos se perguntarem, sempre que analisarem um 
novo projeto ou política governamental: qual é a “falha de mercado” que se pretende 
corrigir com essa nova política pública que estamos criando? Será que essa nova política 
pública é mesmo necessária? Em caso positivo, como fazer para implementá-la gerando o 
mínimo possível de “falhas de governo”?
É essencial que os gestores e servidores públicos saibam, com clareza, qual é a 
missão de um governo (quais as “falhas de mercado” que devem ser objeto de ação do 
governo) e quais são as limitações desse governo (qual é o custo, a perda de eficiência, 
gerado pelas “falhas de governo”); para que as políticas públicas sejam corretamente 
planejadas e implementadas.
2. Indicadores de baixa eficiência do setor público brasileiro
Comecemos pelas evidências de que o Brasil gasta muito e mal. Ribeiro (2008) 
apresenta um ranking de eficiência de dezessete países da América Latina. Seu trabalho 
utiliza o método de “envoltória de dados” (DEA, na sigla em inglês), que procura medir 
quanto o setor público de cada país utiliza de insumos (recursos públicos) e quanto oferece 
de serviços (medidos por índices de qualidade em educação, saúde, administração, 
equidade e desepenho econômico). 
Se plotarmos o resultado desse ranking em relação ao nível de gasto, chegaremos ao 
Gráfico 1, abaixo:
Gráfico 1 – Ranking de Eficiência do Setor Público na América Latina e 
Gasto em Percentual do PIB
6
8
10
12
14
16
18
20
22
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17
Ranking Eficiência
G
as
to
 %
 P
IB BRA
COL
GUAR. DOM
Fonte: Ribeiro (2008).
No eixo vertical temos o gasto em consumo dos governos em porcentagem do PIB e 
no eixo horizontal o ranking de eficiência. O Brasil aparece com o segundo maior nível de 
gasto público, perdendo apenas para a Colômbia2, e é apenas o décimo colocado no ranking 
de eficiência3: trata-se, pois, de uma evidência de que nosso setor público gasta muito e 
gasta mal.
3. Os problemas de um estado pesado e ineficiente
Por vários motivos governos grandes entravam o desenvolvimento de um país. A 
princípio, a ação do governo tende a estimular o crescimento econômico e a igualdade 
social. Por exemplo, a construção de uma estrada ligando indústrias a um porto de 
exportações pode ser importante para o desenvolvimento do país, mas o retorno financeiro 
da empreitada, em si, não ser compensador para que um investidor privado se decida a 
construí-la. Nesse caso, a ação do governo, retirando dinheiro compulsoriamente da 
sociedade e investindo-o na estrada, permitirá que a sociedade atinja um nível mais elevado 
de renda. 
2 Lembrando que, por uma questão de conflito com a guerrilha das FARC, o governo colombiano é levado a 
aplicar aproximadamente 4,5% do PIB em gastos militares, conforme dados da Stockholm International Peace 
Research Institute - http://www.sipri.org.
3 O Brasil supera apenas: Argentina, Nicarágua, Honduras, Guatemala, Paraguai, Venezuela e Bolívia.
Todavia, quando o governo cresce excessivamente, os custos de suas ações passam 
a superar os benefícios, e surgem diversos motivos pelos quais ele passa a prejudicar o 
desenvolvimento econômico e social. 
Para sustentar uma máquina pública grande e em expansão, é preciso impor 
crescente tributação à sociedade. Como as fontes tradicionais de tributação (renda, 
patrimônio e consumo) são limitadas, o governo acaba criando impostos de baixa 
qualidade, que incidem sobre o faturamento das empresas, a folha de pagamentos, os 
depósitos bancários. Além disso, são criados mecanismos de poupança forçada (PIS, 
PASEP, FGTS) que obrigam empresas e empregados a depositar em fundos públicos, em 
troca de baixa remuneração, um dinheiro que poderia ser usado de forma mais produtiva no 
consumo ou poupança privados, sem que critérios políticos afetassem a sua alocação. 
Esse sistema tributário pesado e distorcido onera a criação de novos negócios, a 
ampliação das empresas e as exportações, que são algumas das molas mestras do 
crescimento econômico. Um novo equipamento, que poderia duplicar a produção de uma 
empresas, fica muito mais caro devido ao aumento dos impostos. A contratação de novos 
empregados é dificultada pelos inúmeros encargos sociais. Não se consegue exportar parte 
da produção porque as empresas dos países concorrentes têm custos tributários menores e, 
por isso, oferecem preços menores.
Outra importante fonte de crescimento – o aumento da produtividade – também é 
afetada pela tributação excessiva. Em um contexto de tributação elevada, pagar ou não 
todas as obrigações tributárias passa a ser, muitas vezes, uma decisão determinante sobre a 
possibilidade de sobrevivência das empresas. Muitas optam por não pagar impostos e, para 
não aparecer aos olhos do fisco, não podem crescer, mantendo-se pequenas e pouco 
produtivas, não podendo aproveitar os ganhos decorrentes do aumento da escala de 
produção e do acesso a técnicas mais eficientes. Um mestre de obras e seus operários, por 
exemplo, terão dificuldade para crescer a ponto de se tornarem uma pequena empreiteira, 
formalmente registrada, com acesso a crédito na rede bancária e junto a fornecedores, com 
uma sede em endereço publicamente divulgado, onde poderão organizar a administração, 
receber clientes, etc. 
Ao se tornar visível para o fisco, o empreendimentocorre o risco de ser 
inviabilizado pelo peso da carga tributária. Com isso se multiplicam no país as feiras e 
camelôs, onde deveria haver lojas bem organizadas; os quebra-galhos e biscateiros, em 
lugar das pequenas empresas de serviços; as fabriquetas de fundo de quintal, os quiosques 
de comida sem higiene. Todos empreendimentos de baixa qualidade impedidos, pela 
asfixiante carga fiscal, de crescer e de se tornarem mais produtivos.
A concorrência, que estimula a eficiência e a produtividade, também é afetada. Se a 
opção para a pequena empresa é manter-se na informalidade, não é melhor a sorte das 
empresas médias, que são excluídas do mercado devido ao peso da carga tributária. Isso 
significa que é baixa a probabilidade de que empresas médias tenham capacidade para 
crescer e desafiar a fatia de mercado das grandes empresas. Estas, por falta de concorrência, 
não precisam se esforçar (aumentar qualidade e produtividade) para manterem suas fatias 
de mercado. O resultado é uma economia pouco dinâmica, pouco inovadora.
Uma característica dos governos grandes é que, mesmo com uma tributação 
elevada, eles dificilmente conseguem equilibrar suas contas. Para cada nova receita que 
entra, a burocracia, os políticos e sua clientela ou as demandas da população já criaram uma 
despesa nova. A tendência, então, é que governos grandes acumulem dívidas igualmente 
grandes. 
Um governo que deve muito representa risco para os emprestadores, que dele 
cobrarão altas taxas de juros. Pagando juros elevados e absorvendo parcela significativa dos 
recursos disponíveis na sociedade, o governo reduz o crédito disponível para o setor 
privado e eleva o seu custo. Muitos empreendimentos se tornam inviáveis em função do 
alto custo de financiamento. A taxa de investimento do país cai, prejudicando o 
crescimento.
Os governos têm, em geral, menos incentivos para agir com eficiência do que o 
setor privado. Afinal, a firma que não dá lucro vai a falência, já os governos não correm 
esse risco. Quando um percentual elevado da renda do país passa pelas mãos do governo, 
isso significa que um setor com baixo incentivos para ser produtivo tem prioridade na 
decisão de alocação dos recursos escassos da sociedade. O resultado é a baixa eficiência e 
produtividade e, mais uma vez, menos crescimento.
 Já que é o governo quem decide a alocação de quase quarenta por cento da renda 
nacional, torna-se interessante para cada indivíduo ter acesso a essa parcela da renda. Isso 
significa que muitas pessoas vão investir tempo e dinheiro para se especializar em obter 
recursos públicos. Vão, por exemplo, buscar relacionamentos pessoais que dêem acesso a 
instâncias de decisão no governo. Ou, ainda, buscarão uma militância partidária ou em 
grupos de interesse que abram as portas para um cargo público comissionado ou para um 
patrocínio de uma empresa estatal. 
Essa é a chamada atividade de “caçador de renda”, que não cria riqueza nova para a 
sociedade, mas apenas busca capturar recursos já existentes, produzidos por outros. É fácil 
perceber que será baixo o crescimento e a produtividade de longo prazo em um país onde 
valha mais fazer bons relacionamentos do que gastar horas estudando para se tornar um 
profissional produtivo; onde é mais lucrativo explorar brechas da lei para processar o 
estado do que desenvolver um novo produto. 
Já que o governo está entre os maiores compradores de bens e serviços do país, o 
nível de lucro de muitas empresas depende de decisões tomadas pelo governo. Por outro 
lado, as decisões de governo tendem a ser fortemente influenciadas pelos objetivos dos 
governantes que, em geral, buscam, em primeiro lugar, a sobrevivência política e a vitória 
nas próximas eleições. Nesse contexto, muitas vezes será mais interessante para uma 
empresa investir no financiamento de campanhas eleitorais, que garantam a eleição de um 
governante amigo, a investir na busca de produtos mais eficientes e de menor custo.
Reverter essa realidade, reduzindo o peso do estado sobre a sociedade (na verdade, 
tornando o setor público um fator de aumento do bem-estar coletivo) requer que as 
organizações públicas focalizem suas ações naquelas atividades que são essenciais 
(somente o setor público pode fazer), prioritárias (buscam os principais objetivos da 
sociedade) e que não gerem significativos “efeitos colaterais”, ou seja, falhas de governo. A 
próxima seção analisa esses pontos.
4. Falhas de mercado 
Para que serve o governo? Pode-se dizer que o governo é uma organização cuja 
função é corrigir “falhas de mercado”. Ou seja, quando o livre funcionamento da economia 
de mercado não é capaz de resolver um problema, ou gera algum problema, então o 
governo entra aplicando alguma medida saneadora. Como no exemplo dado acima: se o 
setor privado não tem motivação (perspectiva de lucro) para construir e operar uma 
determinada estrada (cobrando pedágio), o governo o faz, o que permite que os usuários 
privados da estrada (empresas e famílias) sejam beneficiados pela obra. O governo, 
portanto, é uma entidade complementar ao mercado privado. Porém, o governo, ao agir, 
também está sujeito às “falhas de governo”, que podem gerar problemas tão graves quanto 
aqueles que ele se propõe a resolver.
Para identificar as circunstâncias em que o governo pode suplementar as carências 
do setor privado, é preciso, inicialmente, identificar quais as principais características que 
distinguem o setor público do setor privado. São elas:
a) A legitimidade dos dirigentes das organizações governamentais provém, 
direta ou indiretamente, do processo eleitoral. Por exemplo, o presidente 
de uma empresa estatal estadual é escolhido por um secretário de governo, 
que foi escolhido pelo governador, que chegou ao posto por meio de 
eleição;
b) O governo tem poder de coerção: institui impostos de pagamento 
obrigatório, desapropria terras, tem (ou deveria ter) o monopólio da força 
policial e militar.
Isso significa que o governo tem motivações diferentes das organizações privadas (o 
governo procura atender aos eleitores enquanto as empresas procuram atender a seus donos 
e acionistas) e tem instrumentos diferentes (o uso da força permite fazer coisas que o setor 
privado não pode: uma empresa que deseja construir um prédio tem que comprar o terreno; 
se o dono não quiser vender, ela não pode desapropriar).
Mas como será mostrado adiante, o governo também tem fragilidades (por exemplo, 
os trabalhadores do setor público, com estabilidade no emprego, têm muito menos 
incentivos a se empenharem nas suas tarefas que os da iniciativa privada, que estão todo o 
tempo ameaçados pelo desemprego).
Entender quais são os pontos fracos e fortes do setor privado e do governo é o que 
nos ajuda a delimitar quais devem ser as funções de cada um em uma economia capitalista 
em regime democrático.
A primeira dificuldade em uma economia de mercado está em garantir a 
propriedade privada e cumprimento dos contratos de compra, venda, aluguel. É preciso que 
haja um governo, que estabeleça em lei as regras de direito civil e comercial; e que garanta 
o cumprimento dessa lei por meio do funcionamento do Poder Judiciário e do aparato de 
repressão (polícia) e de punição (sistema prisional) aos infratores.
Essa, portanto, é uma função essencial de governo. É um importante componente da 
eficiência de governo garantir que a justiça funcione com agilidade; que os contratos sejam 
cumpridos, que os desrespeitos à propriedade privada (invasões de terra, grilagem, furto, 
etc.) sejam punidos.Um governo que não seja capaz de garantir isso não permitirá o 
florescimento de uma economia privada dinâmica, capaz de gerar emprego e renda para a 
população. No âmbito dos governos estaduais, isso significa ter, por exemplo, polícias 
eficientes, adequada fiscalização das leis de uso do solo, sistemas carcerários bem 
estruturados, políticas de fiscalização tributária que evitem a sonegação. No âmbito 
municipal sobressaem o adequado uso do solo (zoneamento urbano), a imposição de 
posturas urbanas (lei do silêncio, alvarás de funcionamento comercial, etc.), a repressão ao 
comércio informal, a repressão a pequenos crimes por meio da guarda municipal.
Afinal, quem vai ter estímulo para juntar dinheiro e fazer economias, se existe o 
risco elevado de ladrões levarem tudo? Quem vai fazer uma compra se há risco elevado de 
não receber a mercadoria? Quem vai montar uma loja ou criar uma empresa se há o risco 
de, no dia seguinte, ter tudo roubado?
Outra importante falha de mercado ocorre quando não há livre concorrência entre 
empresas na produção e venda de algum produto ou serviço. A formação dos chamados 
oligopólios e monopólios é uma tendência natural do desenvolvimento econômico e tende a 
prejudicar os consumidores, pois as empresas que detêm poder de mercado tendem a 
produzir em menor quantidade e com preço mais elevado do que se estivessem em um 
sistema concorrencial. 
Para aumentar o bem-estar da sociedade, os governos estabelecem políticas para 
controlar o poder de mercado dos oligopólios e monopólios. Isso pode ser feito de várias 
formas: agências de defesa da concorrência, agências reguladoras (como no caso dos 
serviços de telecomunicações e energia), estatização da produção (por exemplo serviços de 
água e esgoto) ou criação de legislação que estimule a concorrência (por exemplo: permitir 
ao usuário de telefone celular mudar de companhia sem que se altere o número de seu 
telefone).
Embora a legislação de proteção da concorrência e de regulação de monopólios seja 
de âmbito federal, os governos estaduais e municipais têm importante escolha a fazer entre 
prestar serviços públicos de água e esgoto por meio de companhias estatais ou por meio de 
concessões a empresas privadas, definindo contratos em busca do maior benefício ao 
consumidor.
Uma terceira falha de mercado que exige a intervenção do governo refere-se aos 
chamados “bens públicos”. Bens públicos têm como característica o fato de que não podem 
ser vendidos em mercado, porque não é possível limitar o seu consumo às pessoas que 
paguem por esse bem. Por exemplo: quando a secretaria de meio-ambiente de um estado 
faz uma política que resulta em melhoria da qualidade do ar, esse ar mais puro beneficiará a 
todas as pessoas que estão no estado. Não é possível que uma empresa venda “ar puro” no 
mercado, entregando-o apenas a quem pagar por ele. Quando não se pode excluir os “não-
pagantes” do consumo de um bem ou serviço, o mercado privado, que funciona na base de 
compra e venda, deixa de funcionar. E aí o governo tem que entrar, para produzir esse bem 
de consumo coletivo, e usar o seu poder de coerção (que o setor privado não tem) para 
cobrar impostos de toda a população para financiar esses bens públicos. Vários bens e 
serviços têm algum grau de “consumo coletivo”, por exemplo: iluminação pública, parques 
e jardins, rodovias, segurança nacional, sinalização de ruas.
Outra importante falha de mercado é a geração de externalidades. Quando as ações 
de um indivíduo ou grupo geram conseqüências negativas para terceiros, dizemos que isso 
é uma externalidade negativa. Quando tais ações geram conseqüências positivas, temos 
uma externalidade positiva.
São exemplos de externalidades negativas:
1) o carro que eu uso gera poluição do ar que as demais pessoas da cidade 
respiram;
2) a produção que dá lucro para uma fábrica também gera dejetos industriais que 
são jogados nos rios;
3) os bares proporcionam diversão para seus freqüentadores mas geram barulho 
que perturbam os moradores da vizinhança;
4) o desleixo do meu vizinho com o seu jardim pode gerar um criadouro de 
mosquito da dengue que vai transmitir a doença para a minha família;
São exemplos de externalidades positivas:
1) se boa parte da população se vacinar contra sarampo, a probabilidade de uma 
pessoa não vacinada contrair a doença será menor;
2) se uma pessoa contratar seguranças privados para vigiar sua casa, os seus 
vizinhos vão se beneficiar disso, pois os ladrões vão explorar outras ruas;
3) o aumento da escolaridade de uma pessoa não só gera benefícios a ela, mas 
também a torna uma trabalhadora mais produtiva, que vai contribuir para o 
crescimento mais rápido do país e será menos dependente da assistência social;
4) o saneamento básico não só gera água e coleta de esgoto para as casas atendidas, 
mas também reduz a incidência de doenças na população, além de reduzir a 
agressão ao meio ambiente e os custos de tratamentos médicos.
Por que a existência de externalidade gera a necessidade de intervenção do 
governo? Porque o seu causador (pessoa, família, firma, etc.) não está preocupado com o 
custo gerado pela externalidade negativa ou com o benefício gerado pela externalidade 
positiva. Ele pensa, principalmente, nos seus próprios custos e benefícios. Por isso, há uma 
tendência à existência de ações geradoras de externalidade negativa acima do “ótimo 
social” e de externalidades positivas abaixo do “ótimo social”.
Se não houver a ação do governo, instituindo uma legislação restringindo a 
quantidade de madeira que pode ser extraída de uma floresta, os madereiros (que estão mais 
preocupados com o seu faturamento que com a preservação da natureza) vão extrair 
madeira em excesso. Da mesma forma, se não houver campanha pública de vacinação 
gratuita nos postos de saúde, muitas pessoas vão preferir não se vacinar e, com isso, 
aumenta o risco de uma epidemia. Se não houver uma legislação restringindo os horários e 
locais para funcionamento de bares, os notívagos vão acabar com o sossego de quem quer 
dormir. 
Também constitui uma falha de mercado a dificuldade do setor privado para, 
sozinho, realizar tarefas que exijam a coordenação da ação de varias pessoas e empresas. 
Por exemplo, o planejamento urbano de uma cidade envolve vários agentes: moradores, 
lojistas, empresas de transportes, pedestres, motoristas, etc. Na impossibilidade de reunir 
todos esses agentes para decidir sobre a organização do espaço urbano, o governo é 
chamado a assumir a tarefa. 
Outra importante falha de mercado a ser corrigida pela ação do governo é a 
desigualdade de renda e a pobreza. O mercado privado é um excelente sistema para se 
produzir bens e serviços de qualidade e ao menor custo possível. Mas esse sistema é 
incapaz de lidar com os problemas gerados pela desigualdade de renda e a pobreza. Cabe ao 
governo fazer políticas que dêem à população menos privilegiada condições de sair da 
pobreza. Assim, serviços públicos de educação, saúde e assistência social têm por 
finalidade última lidar com essa falha de mercado.
Muitas outras falhas de mercado, que justificam a intervenção do governo, 
poderiam ser aqui analisadas; tais como problemas relacionados à informação e ao mercado 
de seguros4. Mas as situações aqui descritas já são suficientes para estabelecer a principal 
mensagem dessa seção: todo gestor público, antes de dar início a um novo programa ou 
atividade, deve se perguntar qual é a falha de mercado que essa novaação se propõe a 
corrigir. 
Muitas vezes o impulso de começar uma nova ação pública decorre, pura e 
simplesmente, da pressão de um determinado grupo da sociedade que vai se beneficiar 
daquela ação, e não está voltada para a correção de uma falha de mercado. Por exemplo, 
constrói-se uma ponte ligando o “nada” a “lugar nenhum” porque a empreiteira contratada 
para construir a ponte tem influência dentro do governo; e não porque se pretende oferecer 
um bem público realmente demandado pela sociedade, e que o sistema privado de mercado 
não consegue prover. Criam-se novos cargos públicos, não porque o governo está 
precisando de mão-de-obra para atuar em um programa destinado a corrigir uma falha de 
mercado, mas porque há interesse em dar emprego a pessoas de um determinado grupo 
político.
Trata-se de um uso privado do governo, para gerar benefícios privados; e não de 
uma ação do governo no sentido de corrigir falhas de mercado que venham a gerar 
benefícios difusos para toda a população.
Há diversas situações em que há distorção nas ações do governo, que fazem com 
que ele cresça demais, gaste em excesso e não gere os resultados fundamentais necessários 
ao bom funcionamento da sociedade. Essas são situações em que as “falhas de governo” 
predominam.
5. Falhas de governo
Uma primeira dificuldade na ação de governo é que o processo de decisão 
governamental é feito de forma diferente do processo de decisão privado. As pessoas votam 
em representantes, que votam um orçamento, para que o dinheiro público seja gasto.
O político, ao votar por este ou aquele gasto público, terá dois problemas. Primeiro, 
ele não conhece inteiramente as preferências de seu eleitorado. No máximo ele tem uma 
4 Uma análise detalhada das falhas de mercado e falhas de governo pode ser obtida em Stiglitz (1999) ou em 
Arvate e Biderman (2006).
idéia de que os seus eleitores estão demandando, por exemplo, mais segurança pública e 
menos educação pública, ou que preferem menos impostos com menos serviços do que a 
expansão dos serviços financiada por mais impostos. 
Segundo, o seu eleitorado não tem preferência uniforme, cada um dos seus eleitores 
tem preferências diferentes, e ele terá que encontrar uma forma de atribuir pesos às diversas 
prioridades.
Mesmo que as pessoas sejam perguntadas, em pesquisa de opinião, sobre as suas 
preferências por serviços públicos, elas não terão incentivo para revelar suas verdadeiras 
preferências. Se elas tiverem que pagar pelos serviços públicos que elas elegerem como 
prioritários, então vão dizer que não querem serviço público nenhum (para não ter que 
pagar imposto) e ficam esperando que outras pessoas respondam que querem ter serviços 
públicos (pois essas outras pessoas pagariam pelo serviço), para poder se beneficiar dos 
serviços sem pagar.
 Se, por outro lado, houver uma pesquisa de opinião pública, perguntando às 
pessoas que serviços públicos elas querem ter, informando-se a elas que não terão que 
pagar pelos serviços que escolherem, então todos vão pedir uma grande quantidade e 
variedade de serviços. E o resultado é que o governo teria que estabelecer uma tributação 
muito alta para satisfazer essa demanda excessiva.
Devido a essa dificuldade, os governos podem acabar produzindo serviços em maior 
ou menor quantidade do que o ideal para a sociedade; além de haver grande chance de 
errarem o “alvo”; produzindo serviços que não são os mais desejados pela população. Tudo 
isso porque a produção de serviços públicos não pode contar com o mesmo conjunto de 
informações disponível para a produção de bens de consumo pelo setor privado. Quando há 
um aumento na procura por sapatos, o preço desses produtos aumenta. Os fabricantes 
percebem que, com esses preços mais altos podem ganhar mais e, por isso, aumentam a 
produção. Essa maior produção vai gerar maior oferta de sapatos nas lojas e o preço tenderá 
a cair. A oferta e a procura por sapatos tenderá a se equilibrar. No caso dos serviços 
públicos, que não são vendidos (e sim financiados por impostos) não há um mecanismos de 
preços similar, que orientem o governo a aumentar ou diminuir a produção de um dado 
serviço.
O resultado é um certo grau de ineficiência (produção em excesso ou menor que a 
necessária). Daí porque os governos não devem se aventurar a produzir aquilo que o 
mercado faz melhor do que eles; devendo restringir-se a tentar corrigir as falhas de 
mercado. 
Outra falha de governo surge do fato de que os eleitores não têm como monitorar 
plenamente os políticos eleitos. E os políticos eleitos não têm como monitorar os servidores 
que nomeiam. Por isso, servidores e políticos podem, no exercício da função, buscar os 
seus objetivos individuais (ampliar poder político, enriquecer, trabalhar pouco, etc.) em vez 
de buscar os objetivos da comunidade.
Por exemplo, empresas públicas monopolistas podem direcionar o excedente de 
renda obtido pelo exercício do poder de monopólio para os seus funcionários (via altos 
salários), em vez carrear os recursos para os cofres públicos. Classes sociais sobre-
representadas nas instâncias de poder enviesam o gasto público a seu favor: a título de gerar 
emprego para a população, criam programas de subsídios fiscais que favorecem suas 
próprias empresas. Durante anos os estados brasileiros tiveram bancos estaduais, cuja 
justificativa de existência era financiar o desenvolvimento estadual mas, na prática, esses 
bancos serviram para financiar campanhas eleitorais e direcionar crédito barato para grupos 
influentes.
Uma terceira, e muito importante falha de mercado, é a falta de incentivos à 
eficiência. O servidor público que toma decisões de gasto tem pouco incentivo para buscar 
o menor custo, pois a despesa não está sendo paga com o seu próprio dinheiro. Também 
não tem interesse em buscar a melhor qualidade pois ele está comprando algo não será da 
propriedade dele, e sim algo para “os outros”. Também há pouco incentivo a inovar ou 
buscar aumento de eficiência, pois os planos de carreira do setor público raramente 
premiam as inovações bem sucedidas. 
Ademais, do ponto de vista do servidor, a competição ocorre antes (no concurso) e 
não durante o exercício profissional (é comum o raciocínio do tipo: “já passei no concurso, 
agora não preciso mais fazer esforço até à aposentadoria”). A estabilidade no emprego 
também reduz o incentivo a se manter produtivo e aplicado no trabalho. Há que se 
considerar, ainda, que o setor público é monopolista na prestação de muitos serviços, logo 
não há o estímulo à eficiência gerado pela competição (infra-estrutura urbana, 
policiamento, controle de poluição, justiça, legislativo).
Uma quarta falha de governo está no “custo de transação” existente nas decisões 
públicas. Em geral os lobbies levam vantagem na decisão do orçamento pois têm menor 
custo de transação e maior retorno esperado para as suas reivindicações, enquanto que, para 
a maioria que paga a conta, não vale a pena o custo de se mobilizar para brecar a demanda 
do lobby (o custo é dividido por todos e o benefício é concentrado).
Por exemplo, se há no governo uma discussão acerca de um projeto que vai elevar 
em R$ 0,01 o custo da ligação telefônica, as empresas de telefonia enxergam um elevado 
ganho potencial na aprovação dessa medida (um centavo multiplicado por milhões de 
ligações). Por isso, se mobilizam para pressionar os governantes a aprová-la. Já para o 
usuário individual, o aumento de custo resultante da medida (digamos uns R$ 5,00 por mês)não é suficientemente alto para que ele incorra no custo de se mobilizar contra a medida 
(procurar o Procon, formar uma comissão para conversar com parlamentares, etc.).
A lição que se tira ao se constatar a existência das falhas de governo é a de que o 
setor público não deve se “aventurar” em atividades que não sejam essencialmente voltadas 
a corrigir falhas de mercado. Ao fazê-lo, certamente estará produzindo um bem ou serviço 
que poderia ser oferecido pelo setor privado, a um custo mais alto, com menor qualidade, 
com impactos negativos sobre a distribuição de renda e o crescimento econômico; e, ainda 
por cima, estará consumindo recursos fiscais escassos, que poderiam ser empregados, de 
forma mais produtiva, em atividades típicas de governo, voltadas à redução das falhas de 
governo.
6. Conclusões
Esse artigo procurou mostrar que o Estado brasileiro, aí compreendidos os três 
níveis de governo (União, estados e municípios) gasta muito e gasta mal. Para tanto, foram 
apresentadas estatísticas comparativas com países da América Latina, que evidenciaram o 
elevado gasto público brasileiro e uma posição retardatária em um ranking de eficiência.
Argumentou-se, em seguida, que esse peso do governo gera inúmeros efeitos 
negativos, como redução da taxa de crescimento econômico e concentração da renda. Em 
última instância, um estado pesado e ineficiente resulta em piora da qualidade de vida 
média das pessoas.
Para mudar essa realidade, é preciso que cada gestor público, ao planejar uma nova 
atividade de governo, se pergunte se aquela atividade está voltada a corrigir uma falha de 
mercado, ou seja, se a sociedade sozinha, sem o governo, não pode resolver o problema 
sem a necessidade de um programa público.
Raciocinando dessa forma, a atividade pública se concentraria naquelas tarefas mais 
importantes para o progresso econômico e social, tais como, a garantia da segurança 
pública, o respeito aos contratos, a redução da pobreza ou a repressão a atividades 
geradoras de externalidades negativas.
É fundamental evitar os falsos argumentos para a ação pública. É muito comum, por 
exemplo, criar empregos públicos desnecessários para abrigar aliados políticos, sob o 
pretexto de que cabe ao governo dar renda às pessoas. Mas é preciso lembrar que o governo 
não tira essa renda do limbo, e sim a extrai da sociedade, via impostos. Logo, ele estará 
tributando uma atividade produtiva, para financiar um emprego público que se mostrará 
improdutivo.
Muito mais eficaz seria usar esse dinheiro em políticas sociais abrangentes, de 
educação pública e assistência social e de saúde que, em vez de atender a alguns poucos 
aliados políticos, atenderia a um conjunto muito maior de pessoas. Isso sem considerar que 
os serviços públicos gerariam, efetivamente, um produto (educação, assistência médica, 
etc.) e não apenas renda ao empregado público ocupando cargo desnecessário.
Políticas essenciais, como segurança pública, limpeza urbana e planejamento 
urbanístico, se bem executadas, garantem a geração de muito mais empregos (no setor 
privado) do que uma política de inchaço da folha de pagamentos do governo; uma vez que 
viabilizam maior eficiência operacional para o setor privado, que crescerá criando 
empregos de qualidade. 
Também é muito comum que se expanda a atividade pública em nome de bandeiras 
“vistosas”, como a defesa da “indústria nacional”, o “desenvolvimento regional” ou o 
“ensino público e gratuito para todos”; criando-se programas que, muitas vezes (porém, 
nem sempre), funcionam para beneficiar grupos de interesse bem posicionados dentro do 
governo e não colocam, efetivamente, benefícios a disposição da maioria da população.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Arvate, P., Biderman, C. (2006) Vantagens e desvantagens da intervenção do governo na 
economia. In: Mendes, M. (Org.) Gasto público eficiente: 91 propostas para o 
desenvolvimento do Brasil. Instituto Fernand Braudel/Topbooks. São Paulo, p. 45-
70.
Andrade, E. (2004) Externalidades. In: Arvate, P., Biderman, C. (Orgs.) Economia do setor 
público no Brasil.FGV/Campus. São Paulo., p. 16-33
Mendes, M. (2006) Introdução. In: Mendes, M. (Org.) Gasto público eficiente: 91 
propostas para o desenvolvimento do Brasil. Instituto Fernand Braudel/Topbooks. 
São Paulo, p. 45-70.
Stiglitz, J. (1999) Economics of the public sector. W.W. Norton & Company, 3rd edition. 
Capítulos 1 e 4.

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