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Resumos Perry Anderson e Henri Pirenne / Modo de produção escravista-feudal / História Econ. e Social da Idade Média / O renascimento do comércio / Influencia das cidades na civilização europeia

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1 
 
Resumos 
Texto: O modo de produção escravo – Perry Anderson 
 A gênese do feudalismo na Europa derivou de um colapso “catastrófico” e 
convergente de dois modos de produção distintos e anteriores, e a recombinação de 
seus elementos desintegrados liberou a adequada síntese feudal, que, portanto sempre 
manteve caráter hibrido. Os predecessores do modo feudal foram naturalmente o modo 
de produção escravo em decomposição, e os primitivos modos de produção 
distendidos e deformados dos invasores germânicos, que sobreviveram em suas novas 
pátrias, depois das conquistas bárbaras. 
 A agricultura representou através de sua historia o setor inteiramente dominante de 
produção, fornecendo invariavelmente as principais fortunas das próprias cidades. As 
cidades romanas nunca foram predominantemente comunidades de artífices, 
mercadores ou negociantes: elas eram em sua origem e princípios, conglomerados 
urbanos de proprietários de terras. As manufaturas permaneciam poucas e 
rudimentares: o gênero das mercadorias urbanas normais nunca ia além dos têxteis, 
cerâmica, mobília e utensílios de vidro. 
 A antiguidade Greco-romana era essencialmente mediterrânea em sua mais profunda 
estrutura. O comercio interlocal que a reunia só podia se fazer por água: o transporte 
marítimo era o único meio viável para a troca de mercadorias a medias ou longas 
distancias. A colossal importância do mar para o comércio pode ser avaliada pelo 
simples fato de que na época de Diocleciano era mais barato transportar o trigo da 
Síria para a Espanha – de um extremo do mediterrâneo ao outro – por embarcações do 
que levar por 120 quilômetros por via terrestre. A água era meio insubstituível da 
comunicação e do comércio que tornava possível o crescimento urbano de uma 
sofisticação e uma concentração bem distantes do interior rural que havia por trás. O 
mediterrâneo era é o único grande mar interior em toda a superfície da Terra: só ele 
oferecia a velocidade do transporte marítimo com a proteção terrestre contra os fortes 
ventos ou ondas em zona geográfica ampla. O mediterrâneo proporcionou o adequado 
cenário geográfico para a civilização antiga. Seu conteúdo histórico e sua novidade, no 
entanto, estão na fundamentação social do relacionamento entre cidade e campo dentro 
dela. 
 A escravidão em si tinha existido sob várias formas através da Antiguidade no Oriente 
Próximo; mas ela sempre fora uma condição jurídica impura, entre outros tipos mistos 
de servidão, formando simplesmente uma categoria muito baixa num continuum 
amorfo de dependência e falta de liberdade que se estendia bem acima na escala 
social. Foram as cidades-Estado gregas que primeiro tornaram a escravidão absoluta 
na forma dominante na extensão, transformando-a assim de sistema auxiliar em um 
modo sistemático de produção. 
 Na Grécia clássica, os escravos foram, assim, empregados pela primeira vez na 
manufatura, na industria e na agricultura, além da escala domestica. Ao mesmo tempo, 
enquanto o uso da escravidão se tornava generalizado, sua natureza, de maneira 
correspondente, se tornava absoluta: ela já não era mais uma forma de servidão 
relativa entre muitas, no decorrer de uma continuidade gradual, e sim uma condição 
polarizada da perda completa da liberdade, justaposa a uma nova liberdade sem 
impedimentos. 
 O trabalho escravo na Antiguidade clássica, portanto, incorporava dois atributos 
contraditórios em cuja unidade esta o segredo da paradoxal precocidade urbana do 
mundo Greco-romano. Por um lado a escravidão representava a mais radical 
degradação rural imaginável do trabalho – a conversão de seres humanos em meios 
inertes de produção, por sua privação de todo direito social e sua legal assimilação às 
bestas de cargas: o escravo da agricultura era considerado um grau acima do gado 
2 
 
(instrumentum semi vocale). Por outro lado, a escravidão era simultaneamente a mais 
drástica comercialização urbana concebível do trabalho: a total redução da 
individualizade do trabalhador a um objeto padronizado de compra e venda, nos 
mercadores metropolitanos de comércio de mercadorias. Assim, a escravidão era o 
vínculo que unia cidade e campo, para o desmedido beneficio da polis. A riqueza e o 
conforto da classe urbana proprietária da Antiguidade clássica repousavam sobre o 
amplo excedente que rendia a difusa presença desse sistema de trabalho, que não 
deixava nenhum outro intacto. 
 As relações escravagistas de produção determinavam alguns limites insuperáveis para 
as antigas forças de produção na época clássica. Acima de tudo, eles tenderam a 
paralisar a produtividade na agricultura e indústria. O modo de produção escravo em 
seus primórdios registrou alguns importantes avanços no aparelhamento econômico 
desenvolvido no arcabouço de sua nova divisão social do trabalho. Entre eles podem 
contar-se a disseminação de mais lucrativas culturas de vinho e azeite, a introdução de 
moinhos rotativos para cereais e a melhoria na qualidade do pão. Ao mesmo tempo, 
não ocorreu um enxame de invenções que impulsionasse a economia antiga para 
forças de produção qualitativamente novas. Nada é mais impressionante, em qualquer 
comparação retrospectiva, do que a estagnação técnica global da Antiguidade. 
 O retraimento estrutural da escravidão na tecnologia, assim, não assentava tanto numa 
causalidade intra-econômica direta, embora isto fosse importante em si, quanto na 
ideologia social mediata que envolvia a totalidade do trabalho manual no mundo 
clássico, contaminando o trabalho contratado e mesmo o independente com o estigma 
do aviltamento. O trabalho escravo em geral não era menos produtivo que o livre, mas 
estabeleceu o ritmo de ambos, de forma que nenhuma divergência jamais se 
desenvolveu entre os dois num espaço econômico que excluía a aplicação da cultura à 
técnica para invenções. 
 
Texto: O modo de produção feudal – Perry Anderson 
 
 Foi um modo de produção regido pela terra e por uma economia natural, na qual nem 
o trabalho nem os produtos do trabalho eram bens. O produtor imediato – o 
camponês – estava unido ao meio de produção – o solo – por uma especifica relação 
social. Os camponeses que ocupavam e cultivavam a terra não eram seus 
proprietários. A propriedade agrícola era controlada privadamente por uma classe de 
senhores feudais, que extraíam um excedente de produção dos camponeses através 
de uma relação político-legal de coação. 
 Seu efeito foi necessariamente uma amálgama de exploração econômica e autoridade 
política. O camponês estava sujeito à jurisdição de seu senhor. Ao mesmo tempo, os 
direitos de propriedade do senhor sobre sua terra geralmente eram apenas de grau: o 
senhor era investido neles por um nobre superior, a quem passaria a dever serviços 
de cavaleiros. Em outras palavras, suas propriedades eram mantidas como um feudo. 
O senhor feudal, por seu lado, muitas vezes seria vassalo de um outro senhor feudal 
superior. A consequência deste sistema era que a soberania política nunca estava 
enfocada num único centro. As funções do Estado desagregavam-se em concessões 
verticais sucessivas, e a casa nível estavam integradas as relações econômicas e 
políticas. Esta parcelarização da soberania seria constitutiva de todo o modo de 
produção feudal. 
 Acima deste complicado labirinto jurídico, caracteristicamente estava a haute justice 
dos senhorios territoriais, cuja competência não era senhorial, mas geográfica. A 
classe camponesa de quem era extraído o excedente neste sistema habitava então um 
mundo social de direitos e poderes superpostos, e a própria pluralidade de cujas 
3 
 
instancias de exploração criavam interstícios latentes e discrepâncias que seriam 
insuportáveis num sistema jurídicoe econômico mais unificado. 
 Contudo, o modo de produção feudal foi o primeiro a permitir a esta produção um 
desenvolvimento autônomo em uma economia agrária natural. O fato de as maiores 
cidades medievais jamais tenham rivalizado em dimensão com a Antiguidade ou com 
as dos impérios asiáticos, muitas vezes tem atenuado a verdade de que sua função na 
formação social era muito mais avançada. Assim, uma oposição dinâmica de cidade 
e campo só foi possível no modo de produção feudal: a oposição entre uma economia 
urbana de crescente comércio de bens, controlada pelos mercadores e organizada em 
associações e corporações, e uma economia rural de troca natural, controlada pelos 
nobres e organizada em terras senhoriais e pequenas propriedades, com enclaves 
camponeses individuais. 
 Dentro do feudalismo havia uma contradição não-definida, entre sua própria 
tendência rigorosa à das terras comunais, alódios e parcelas camponesas com o 
domínio senhorial era por si constitutiva do modo de produção feudal na Europa 
Ocidental e teve implicações críticas em seu desenvolvimento. 
 
Texto: História Econômica e Social da Idade Média – Henri Pirenne 
 
 Para os bárbaros estabelecidos na Itália, África, Espanha e Gália, o mediterrâneo era 
ainda a grande via de comunicação com o Império Bizantino, e as relações mantidas 
através dele permitiam que subsistisse uma vida econômica, que deve ser vista, sem a 
menor sombra de dúvida, como um prolongamento direto da Antiguidade. 
 Com o tempo, em vez de continuar sendo o vínculo milenar entre Oriente e Ocidente, 
que fora até então, o Mediterrâneo transformou-se em barreira. A partir do inicio do 
século VIII, o comércio europeu está condenado a desaparecer nesse extenso 
quadrilátero marítimo. O equilíbrio econômico da Antiguidade, que sobrevivera às 
invasões germânicas, rompe-se ante a invasão do Islão. O Império de Carlos Magno, 
por manifesto contraste com a Gália romana e merovíngia, será puramente terrestre 
ou se quiser continental. Desse fato fundamental, origina-se uma ordem econômica 
nova, que é, propriamente dita, a da alta Idade Média. 
 Do século IX ao XI, o Ocidente, em verdade, permaneceu bloqueado. O movimento 
comercial não lhe sobreviveu, pois a navegação constituía sua artéria vital. O fato de 
haver a expansão islamítica fechado este mar, no século VII, teve como resultado 
necessário a rapidíssima decadência daquela atividade. No decorrer do século VIII, s 
mercadores desapareceram em virtude da interrupção do comércio. 
 As cidades romanas, contudo, subsistiram, talvez porque, sendo centros de 
administração diocesana, os bispos nelas conservassem suas residências e reunissem 
em torno de si um clero numeroso; mas perderam todo significado econômico, ao 
mesmo tempo que sua administração municipal. Manifestou-se, então, um 
empobrecimento geral. O numerário de ouro desapareceu, para ser substituído pela 
moeda de prata que os carolíngios puseram no lugar. O novo sistema monetário, que 
instituíram em lugar do antigo soldo romano, é a prova evidente de seu rompimento 
com a economia antiga, ou melhor, com a economia mediterrânea. 
 Comparado com o período merovíngio, o carolíngio aparece, sob o ponto de vista 
comercial, como um período de decadência, ou se quiser, de retrocesso. 
 Tem-se como absolutamente certo que, a partir do fim do século VIII, a Europa 
Ocidental regredira ao estado de região exclusivamente agrícola. É a terra a única 
fonte de subsistência e a única condição de riqueza. Toda a existência social funda-se 
na propriedade ou na posse da terra. Daí a impossibilidade para o Estado de manter 
um sistema militar e uma administração que não se baseassem naquela. Em suma, o 
aparecimento do feudalismo, na Europa ocidental, no decorrer do século IX, nada 
4 
 
mais é do que a repercussão, na ordem política, do retorno da sociedade a uma 
civilização puramente rural. 
 Do ponto de vista econômico, o fenômeno mais notável e característico desta 
civilização é o latifúndio. A organização latifundiária não constituiu, sob nenhum 
aspecto, um fato novo. Mas o seu funcionamento, a partir do desaparecimento do 
comércio e das cidades, foi uma inovação. O latifúndio poderia beneficiar-se de um 
comércio regular com o exterior, participando da atividade econômica geral como 
produtor de gêneros alimentícios e consumidor de objetos manufaturados. Mas esta 
situação mudaria quando os mercadores e a população municipal deixassem de 
existir. Como cada um vivesse de sua própria terra, ninguém se preocupava com a 
intervenção alheia, e, forçosamente, faltando a demanda, o detentor da terra teria que 
consumir seus próprios produto. Desse modo, cada latifúndio se dedicou a essa 
espécie de economia que se designa com pouca exatidão como um estado de 
economia latifundiária fechada e que é, unicamente, a bem dizer, uma economia sem 
mercados externos. O latifúndio não se adaptou a esta situação por livre escolha, mas 
por necessidade. Deixou de vender, não tanto porque não quisesse vender, mas 
porque não passavam compradores ao seu alcance. 
 É obvio dizer-se que semelhante situação está iniludivelmente exposta às incertezas 
do clima. Se não houve colheita, as provisões armazenadas, prevendo uma época de 
escassez, esgotar-se-ão rapidamente e será necessário procurar em outra parte por 
cereais indispensáveis. Os senhores despacham, então, para todo país, os seus servos, 
a quem encarregam de adquiri-los nos celeiros de algum vizinho mais afortunado ou 
em alguma região em que haja abundancia de viveres. Acontece, também, que nos 
anos de prosperidade, procura-se, pelos mesmos meios, vender fora o excedente da 
vindima ou da colheita. A compra e venda não é ocupação normal de ninguém. É um 
recurso que se emprega quando a necessidade o impõe. 
 Os judeus, a partir da época carolíngia, exerciam com regularidade o comercio, a tal 
ponto que, no idioma daquele tempo, a palavra judaeus e a palavra mercator são 
quase sinônimas. Eram todos eles radanitas, perpétuos viajores, graças aos quais se 
manteve um contato superficial com as regiões orientais. 
 Século IX: a classe mercantil desapareceu nas referidas sociedades. Determina-se, 
agora, a condição dos homens, por suas relações com a terra. Quem possui terra, ao 
mesmo tempo, liberdade e poder; por isso, o proprietário é simultaneamente senhor; 
quem dela está privado, fica reduzido à servidão: assim, a palavra “vilão” designa, do 
mesmo modo, o camponês de um domínio e o servo. Como regra geral, a servidão é 
a condição normal da população agrícola, isto é, de todo o povo. 
 Nesse mundo rigorosamente hierárquico, o primeiro lugar, pertence à Igreja. Esta 
possui, ao mesmo tempo, ascendência economia e moral. Em uma sociedade que 
tornou a cair na ignorância, só ela possui ainda estes dois instrumentos 
indispensáveis a toda cultura: a leitura e a escrita. Sempre foi proibida ao clero 
(usura); a Igreja conseguiu, a partir do século IX, que se tornasse proibida também 
aos leigos, e reservou o castigo desse delito à jurisdição de seus tribunais. A 
reprovação da usura, do comércio, do lucro pelo lucro, é muito natural e, naqueles 
séculos em que cada latifúndio se bastava a si mesmo e constituía normalmente um 
pequeno mundo fechado, nada podia ser mais benéfico, se pensarmos que somente a 
fome obrigava a pedir emprestado e, portanto, tivesse tornado possível todos os 
abusos da especulação, da usura, do açambarcamento, em sua, da tentadora 
exploração da necessidade, se a religião não os tivesse explicitamente condenado. 
 
 
 
 
5 
 
Texto: O renascimento do comércio – Henri Pirenne 
 
 Pode considerar-se o fim do século IX como o momento em que a curva descrita pelaevolução econômica da Europa Ocidental desde o encerramento do mediterrâneo 
chegou ao seu ponto mais baixo. É também o momento em que a desordem social 
provocada pelas pilhagens dos invasores e a anarquia política atingem o ponto 
culminante. O século X foi, se não uma época de restauração, pelo menos um 
período de estabilização e de relativa paz. Parece que se pode datar o século X um 
renovo no movimento ascensional da população. A grande necessidade desta época, 
saída a custo da anarquia, é a necessidade de paz, a mais primitiva e a mais essencial 
de todas as necessidades sociais. 
 A igreja, reanimada pela forma clunisiana, começa a purificar-se dos abusos que 
tinham introduzido na sua disciplina e a sacudir a submissão em que a tinham os 
imperadores. O místico entusiasmo que a anima a insufla aos seus fieis lança-os no 
heroico e grandioso feito na Cruzada que lança a cristiandade ocidental contra o 
Islão. 
 Na época romana ao século XI, não parece que a superfície do solo cultivado tenha 
aumentado sensivelmente. Mas tudo foi diferente no dia em que o aumento da 
população permitiu dar rendimento a esses terrenos improdutivos. A partir do ano 
1000, aproximadamente, começa um período de arroteamento que continuará sempre 
em aumento ate o fim do século XII. A Europa colonizou-se a si própria, graças ao 
aumento dos seus habitantes. Os príncipes e os grandes proprietários meteram-se a 
fundar novas cidades, onde afluíram os aventureiros em busca de terras para cultivar. 
 Como se vê, o aumento da população e o renovo da atividade, de que ela foi ao 
mesmo tempo a causa e o efeito, redundou em proveito da economia agrícola. Assim, 
entra, ainda antes do século XI, num período de renascimento. Este renascimento 
começou sob a ação de dois centros: Veneza e a Itália do Sul e por outro lado a costa 
da Flandres. Da mesma maneira que o comercio ocidental desaparecera aquando do 
encerramento das suas saídas para o exterior, assim se reanimou quando essas saídas 
se reabriram. 
 O comércio foi-lhes assim imposto pelas próprias condições da sua situação 
territorial. Tiveram a energia e o talento de tirar proveito das diversas possibilidades 
que ele oferece ao espírito empreendedor. A consequência foi que Veneza não 
deixou de gravitar na órbita de Constantinopla. Através dos mares, ela sofreu-lhe a 
atração e engrandeceu-se sob a nova influencia. Constantinopla, no decorrer do 
século XI, surge não somente como uma grande cidade, mas como a maior cidade de 
toda a bacia do Mediterrâneo. Era um grande porto e um centro manufatureiro de 
primeira ordem e, simultaneamente, uma capital política. As suas frotas de guerra 
garantiam-lhe o domínio do mar, sem o qual não teria podido viver. Durante o tempo 
em que permaneceu poderosa conseguiu manter, em face do Islão, o seu domínio 
sobre todas as águas do Mediterrâneo Oriental. 
 O mar só podia ser aberto à viva força. A partir de 1015-1016, foi dirigida uma 
expedição pelos Goneveses de comum acordo com Pisa contra a Sardenha. 
 Assim, perante o contra-ataque cristão, O Islão recua pouco a pouco. O desencadear 
da primeira Cruzada (1096) marca seu definitivo recuo. A partir de 1097, uma frota 
genovesa singra para Antioquia, levando aos cruzados reforços e víveres. O 
mediterrâneo reabre-se, à navegação ocidental. O domínio do Islão findou esse mar. 
Sem duvida que os resultados políticos e religiosos da Cruzada foram efêmeros. O 
reino de Jerusalém e os principados de Edessa e Antioquia foram reconquistados 
pelos muçulmanos no século XII, mas o mar continuou em poder dos cristãos. São 
eles que agora exercem o domínio econômico. 
6 
 
 A fertilidade do solo permite uma ilimitada expansão, ao mesmo tempo que a 
facilidade dos mercados favorece simultaneamente a importação das matérias primas 
e a exportação dos produtos fabricados. O comércio provoca a indústria e, na própria 
medida em que se desenvolve Bérgamo, Cremoda, Lodi, Verona, todas as antigas 
cidades retomam uma nova vida e muito mais exuberante que a que os animava na 
Antiguidade. 
 Quanto mais fácil era o acesso ao país, mais ele atraía os invasores e mais teve a 
sofrer com as suas devastações. A situação geográfica de Veneza salvaguardara a 
prosperidade comercial deveria, naturalmente, provocar aqui o seu aniquilamento. 
 Os escandinavos no decurso do século X, abandonam a guerra para se entregarem ao 
comércio. Os seus barcos singram todos os mares do Norte e nada tem a temer dos 
rivais, pois são os únicos, de entre os povos cujas costas este mar banha, que são 
navegadores. A situação geográfica da Flandres colocava-a, com efeito, numa 
situação maravilhosa para se tornar a via ocidental do comércio dos mares do Norte. 
 Flandres já contava com uma industria indígena desde a época romana, assim, o 
comercio e a indústria uniram-se para dar a região flamenga, a partir do século X, 
uma atividade econômica que não mais deveria deixar de se desenvolver. 
 Foi no século XII que esta penetração, progredindo gradualmente, transforma, em 
definitivo a Europa Ocidental. O comércio e a indústria não se limitam a tomar uma 
posição ao lado da agricultura, mas agem sobre ela. Os seus produtos não servem só 
para o consumo dos proprietários e trabalhadores do solo: são arrastados na 
circulação geral, como objetos de permuta ou matérias primas. Os quadros do 
sistema feudal, que tinham, até então encerrado a atividade econômica, quebram-se e 
toda a sociedade se impregna de um caráter mais maleável, mais ativo e mais 
variado. De novo, como na Antiguidade, o campo se orienta para as cidades. Sob a 
influência do comércio, as antigas cidades romanas reanimaram-se, repovoam-se, 
aglomerações de mercadores agrupam-se junto dos burgos, estabelecem-se ao longo 
das costas marítimas, nas margens dos rios, na confluência das ribeiras, nos pontos 
de encontro das vias naturais de comunicação. 
 Introduziram-se uma divisão de trabalho, doravante imprescindível. Entre estas e o 
campo estabeleceu-se uma recíproca troca de serviços. Uma solidariedade, cada vez 
mais estreita, liga-as, provendo o campo ao abastecimento das cidades, e fornecendo-
lhe as cidades, em contrapartida, produtos comerciais e objetos fabricados. A vida 
física do burguês depende do camponês, mas a vida social do camponês depende do 
burguês. Porque o burguês lhe revela um gênero de vida mais confortável, mais 
requintado e que, excitando os seus desejos, multiplica as suas necessidades e eleva o 
seu standart of life. 
 O desenvolvimento econômico da Europa medieval ultrapassou os limites que 
atingira na Europa Romana. Regiões que não eram percorridas no começo da era 
cristã senão por raros mercadores de âmbar e de peles, e que pareciam tão inóspitas 
como o centro da África o parecia a nossos pais, estão agora cobertas de uma 
floração de cidades. Há quase tantos portos nas margens de um como nas de outro. 
Dos dois lados, o comércio utiliza de recursos que a natureza colocou à sua 
disposição. Domina os dois mares interiores que encerram entre si as margens tão 
admiravelmente recortadas do continente europeu. 
 Deste modo, a expansão comercial que começou pelos dois pontos graças aos quais a 
Europa se encontrava em contato através de Veneza e da Flandres com o mundo 
oriental espalhou-se como uma epidemia benfazeja por todo o continente. 
 
 
 
 
7 
 
Texto: Influência das cidades na civilização europeia – Henri Pirenne 
 
 O nascimento das cidades assinala o começo de uma nova era na história interna da 
Europa Ocidental. A sociedade não tinha comportado até então senão duas ordens 
ativas: o clero e a nobreza. Tomando o lugar ao lado delas, a burguesia completa-as, 
ou, antes, aperfeiçoa-as.Como o clero e como a nobreza, a burguesia é uma ordem 
privilegiada. Forma uma classe jurídica distinta, e o direito especial de que goza 
isola-a da massa do povo rural, que continua a formar uma imensa maioria da 
população. Ainda mais, já o dissemos, esforça-se por conservar intacta a sua 
excepcional situação e reserva exclusivamente para si o beneficio. A liberdade tal 
como a concede é um monopólio. E não obstante, a esta burguesia tão exclusivista 
estava reservada a missão de espalhar à sua volta a liberdade de se tornar, sem o ter 
querido, o motivo da gradual libertação das classes rurais. 
 A formação dos aglomerados urbanos abalou imediatamente a organização 
econômica dos campos. A produção tal como ai era praticada não tinha servido até 
então senão para bastar à existência do camponês e aos impostos devidos ao seu 
senhor. Desde que o terminara o comercio, nada o solicitava a pedir ao solo um 
excedente de que seria impossível desfazer-se, pois já dispunha de mercados. 
Contentava-se em fazer face à sua vida quotidiana, certo do dia de amanha e não 
pensando em nenhuma melhoria da sua sorte, porque não podia conceber tal 
possibilidade. Os pequenos mercados das cidades de dos burgos eram demasiado 
insignificantes. 
 O crescimento da população fornecerá os braços necessários aos trabalhos de 
arroteamento e de secagem. A superfície do solo cultivada, que, a partir do fim do 
Império Romano, não aumentou, vai-se incessantemente alargando. Em vez de 
conservar para as suas terras a velha organização senhorial, adapta-se 
inteligentemente ao novo estado das coisas. 
 Entretanto, em todo o lado, senhores laicos ou eclesiásticos fundam “cidades novas”. 
Mas estas cidades novas, cujo numero não cessa de aumentar no decurso do século 
XII, são ao mesmo tempo “cidades livres”. Porque, para atrair os cultivadores, o 
senhor promete-lhes a isenção dos impostos que recaem sobre os servos. Só mantém 
sobre eles a jurisdição. Abole a seu favor os velhos direitos que ainda substistem na 
organização senhorial. 
 Assim, aparece um novo tipo de camponês, bem diferente do antigo. Este tinha por 
característica a servidão; aquele é dotado de liberdade. E esta liberdade, cuja a causa 
foi a agitação econômica comunicada pelas cidades à orgânica dos campos, é ela 
própria copiada das cidades. Os habitantes das cidades novas são, por assim dizer, 
burgueses rurais. Recebem uma constituição jurídica e uma autonomia local que são 
manifestamente reproduzidas das instituições urbanas, tanto que estas transbordam, 
por assim dizer, do recito das muralhas para se espalharem nos campos e 
comunicarem-lhes a liberdade. 
 Fosse pela libertação voluntaria, por prescrição ou usurpação, os senhores deixam-na 
substituir gradualmente à servidão que tanto tempo tinha sido a condição normal dos 
seus rendeiros. O comércio satisfaz agora a toda a gente as necessidades que os 
domínios se tinham por tanto tempo esforçado por prover por si próprios. Já não é 
indispensável que cada um deles produza todos os gêneros de que necessitam para 
seu uso. Basta irem à cidade vizinha para os procurarem. 
 A circulação, que se torna cada vez mais intensa, favorece necessariamente a 
produção agrícola, desloca os quadros que a tinham manietado até então, ao mesmo 
tempo, liberta-a. Desprende o homem do solo a que tinha estado por tanto tempo 
sujeito. Substitui cada vez mais amplamente o trabalho servil pelo trabalho livre. 
8 
 
 A libertação das classes rurais não é senão uma das consequências provocadas pelo 
renascimento econômico de que as cidades foram todas em conjunto o resultado e o 
instrumento. Coincide com a crescente importância do capital mobiliário. 
 A servidão das massas era a consequência de uma organização social onde não havia 
outra alternativa senão a de possuir o solo e ser senhor, ou a de o amanhar e ser 
servo. Ora, como a burguesia, aparece à luz do sol unia classe de homens cuja 
existência está em flagrante contradição com esta ordem das coisas. Porque ela é, na 
plena acepção do termo, uma classe de desenraizados e, portanto, uma classe de 
homens livres. Com a burguesia manifesta-se e afirma-se, com uma força crescente, 
a possibilidade de viver e de se enriquecer pelo único fato de vender ou produzir 
valores de troca. 
 Até então, o dinheiro amoedado tinha sido estéril. Os grandes proprietários laicos ou 
eclesiásticos, nas mãos de quem se monopolizava a muito fraca existência do 
numerário em circulação, proveniente do censo que recebiam dos seus rendeiros, ou 
das esmolas que os fiéis traziam às igrejas, não possuíam normalmente qualquer 
meio de o fazerem frutificar. Regra geral, o dinheiro era entesourado pelos detentores 
e a maior parte das vezes transformados em baixela ou em ornamentos de igreja. O 
comércio libertou esse dinheiro cativo e reconduziu-o ao seu destino. Graças a ele, 
tornou-se o instrumento das trocas e medida dos valores, e, visto que as cidades eram 
os centros de comércio, necessariamente aflui para eles. 
 E uma nova noção de riqueza apareceu: a da riqueza mercantil, consistindo não já em 
terras, mas em dinheiro ou artigos comerciais avaliados em dinheiro. No decorrer do 
século XI, verdadeiros capitalistas existiam já em grande número de cidades. 
Consagraram uma parte dos seus ganhos à compra de imóveis, a principio na própria 
cidade em que habitavam, mais tarde, no campo. A época contemporânea da 
formação das cidades foi um período de vida cara, tão favorável aos negociantes e 
aos artífices da burguesia quão penosa para os detentores do solo, que não chegaram 
a aumentar seus rendimentos. A partir do século XI, veem-se vários de entre eles 
obrigados, para se manterem, a recorrer aos capitais mercadores. 
 O poderio do capital mobiliário concentrado nas cidades não lhe deu só o ascendente 
econômico, contribuiu também para introduzir na vida política. Durante o tempo em 
que a sociedade não conhecera outro poder exceto o que deriva da posse da terra, só 
o clero e a nobreza participaram do governo. Toda a hierarquia feudal era constituída 
à base da propriedade rústica. Talvez o caráter mais impressionante do sistema feudal 
seja o aspecto rudimentar das suas finanças. O dinheiro não desempenha qualquer 
papel. Os rendimentos senhoriais do príncipe alimentam quase exclusivamente o seu 
cofre. 
 Mas no dia em que o renascimento comercial lhe permite aumentar os seus 
rendimentos e que o dinheiro amoedado começa, graças a ele, a afluir seus cofres, 
vemo-lo ao mesmo tempo tirar partido das circunstancias. A aparição dos bailios, no 
decurso do século XII, é o primeiro sintoma do progresso político que vai permitir ao 
poder principesco fundar uma verdadeira administração pública e transformar a 
pouco e pouco a suserania em soberania. Porque o bailio é, na plena acepção do 
termo, um funcionário. Com esta personagem amovível, remunerada não por uma 
concessão de terra, mas por uma gratificação em dinheiro, e obrigada a prestar 
anualmente contas de sua gestão, afirma-se um novo tipo de governo. 
 Causas econômicas idênticas transformaram ao mesmo tempo a organização 
imobiliária e a administração dos homens. Do mesmo modo que elas permitiram aos 
camponeses libertar-se e aos proprietários substituir a renda anual pelo mansus 
senhorial, permitiram aos príncipes apoderar-se, graças a agente pagos, do governo 
direto dos seus territórios. A inovação política, como as inovações sociais de que é 
contemporânea, supõe a difusão da riqueza mobiliaria e da circulação do dinheiro.

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