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TÍTULO 
AINFLUÊNCIA DA ESTÉTICA ROMÂNTICA NA FORMAÇÃO DO IMAGINÁRIO IDEOLÓGICO DO 
NAZISMO E SUAS OPOSIÇÕES À ARTE MODERNA NA ALEMANHA SO SÉCULO XX 
Sávio Ezequiel Lizardo Rodrigues Tavares 
 
RESUMO 
O estudo investiga como a estética do Romantismo alemão contribuiu para a formação 
do imaginário ideológico do nacional-socialismo, examinando de que modo símbolos 
românticos — como a exaltação da pátria, o ideal heroico, o culto ao corpo masculino e 
a figura da mulher-mãe — foram apropriados para legitimar políticas culturais e a 
perseguição à arte moderna. A pesquisa adota o método de análise bibliográfica, 
fundamentando-se em autores clássicos e contemporâneos para compreender os 
vínculos entre produção artística, pensamento político e construção de identidade 
nacional. O estudo demonstra que o Romantismo não apenas forneceu temas estéticos, 
mas também estruturou formas específicas de sentir e interpretar o mundo, 
posteriormente distorcidas pelo nazismo para compor uma visão racializada e totalitária 
de nação. Os resultados indicam que essa herança simbólica foi essencial para 
fortalecer o apelo emocional do regime e justificar práticas de exclusão cultural, como o 
ataque à Bauhaus e às vanguardas. Conclui-se que a manipulação do legado romântico 
pelo nacional-socialismo evidencia a força política da arte e reforça a necessidade de 
compreender criticamente a circulação histórica de imaginários estéticos. 
 
 
Palavras-chave: Romantismo alemão. Nazismo. Estética. Ideologia. Cultura 
política. 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
 
Ao discutir o papel das disciplinas escolares, é comum que professores se 
vejam obrigados a justificar sua relevância prática perante alunos, famílias e a 
sociedade. Entre essas disciplinas, a arte frequentemente é reduzida a um 
simples repertório cultural ou a uma forma de expressão individual, sendo muitas 
vezes tratada como acessória dentro do currículo. Contudo, a produção artística, 
em diferentes períodos históricos, não apenas reflete sensibilidades estéticas, 
mas também participa ativamente da construção de ideologias, valores e formas 
de perceber o mundo (CABELLO, 2024). 
No contexto europeu dos séculos XIX e XX, a arte romântica adquiriu papel 
central na formação de identidades coletivas, mobilizando símbolos de pátria, 
heroísmo, espiritualidade e nostalgia. Na Alemanha, em particular, o 
Romantismo ultrapassou os limites da expressão estética, tornando-se elemento 
 
estruturador da visão de mundo de gerações inteiras. Quando avançamos para 
o período do nacional-socialismo, é possível identificar nesse movimento político 
a apropriação e reinterpretação desses ideais românticos, transformando-os em 
instrumento de propaganda, coesão identitária e manipulação simbólica 
(DUARTE, 2011). 
Diante desse cenário, pensando de acordo com o estudo de Bortullucce 
(2008), este trabalho delimita-se a investigar como a arte romântica alemã 
contribuiu para moldar o imaginário estético e ideológico que fundamentou parte 
do pensamento nazista na primeira metade do século XX. Assim, a questão-
problema que orienta a pesquisa é: de que modo a estética romântica — marcada 
pela exaltação da pátria, pela valorização do sublime, do corpo masculino e da 
figura feminina idealizada — influenciou a formação do ideário nacional-socialista 
e justificou a perseguição às vertentes artísticas modernas? 
Trabalhamos com a hipótese de que o nazismo, ao rejeitar as 
transformações culturais modernas, resgatou seletivamente elementos do 
Romantismo para construir uma visão de mundo nostálgica e idealizada. Supõe-
se que essa estética romântica reforçou um modelo de pureza étnica, disciplina 
corporal e exaltação nacional, funcionando como base simbólica para legitimar 
perseguições a artistas modernistas, rotulados como “degenerados”. Outra 
hipótese é que a arte moderna, por romper com o passado mítico-romântico, 
tenha sido vista como ameaça à narrativa identitária que o regime buscava impor. 
O objetivo geral deste trabalho é analisar de que forma a arte romântica 
alemã moldou o pensamento estético e ideológico do nazismo. Para alcançá-lo, 
estabelecem-se como objetivos específicos: (a) examinar os fundamentos 
filosóficos e culturais do Romantismo alemão; (b) identificar elementos 
românticos apropriados pelo nacional-socialismo; (c) compreender como tais 
elementos foram utilizados para justificar políticas culturais e repressivas; (d) 
analisar a perseguição à arte moderna, especialmente à Bauhaus, como reação 
ao rompimento com valores românticos tradicionais. 
A relevância desta pesquisa reside no fato de que compreender o diálogo 
entre estética e ideologia permite interpretar com maior profundidade os 
mecanismos de construção simbólica utilizados por regimes totalitários. Em um 
contexto contemporâneo de crescente polarização política e de reinterpretações 
 
 
 
 
distorcidas do passado, investigar como a arte contribuiu para sustentar práticas 
autoritárias torna-se fundamental tanto para o campo da História da Arte quanto 
para a sociedade em geral. Ao analisar criticamente essa relação, contribuímos 
para desnaturalizar discursos que ainda hoje se apropriam de símbolos 
românticos e nacionalistas com fins políticos. 
A metodologia adotada nesta pesquisa é de natureza bibliográfica, baseada 
na análise de obras de referência sobre Romantismo, estética alemã, ideologia 
nazista e políticas culturais do Terceiro Reich. Foram consultados livros, artigos 
científicos e documentos históricos que permitiram identificar convergências e 
divergências entre diferentes autores. O procedimento consistiu em revisão, 
seleção, comparação e interpretação crítica das fontes, a fim de construir uma 
análise consistente sobre como a estética romântica atuou como instrumento 
ideológico no nazismo. 
 
2. DESENVOLVIMENTO 
 
2.1 FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DO ROMANTISMO ALEMÃO 
O Romantismo alemão surgiu no final do século XVIII como uma reação 
estética e intelectual ao Iluminismo e ao racionalismo excessivamente 
mecanicista que dominava o pensamento europeu. Enquanto o Iluminismo 
valorizava a razão universal, os românticos defendiam a subjetividade, a emoção 
e a particularidade cultural como caminhos legítimos para compreender o mundo. 
Nesse contexto, a experiência individual, o sentimento e a imaginação foram 
elevados à condição de fontes essenciais de conhecimento, substituindo a 
rigidez racional por uma visão mais intuitiva e espiritual da realidade. 
Entre os principais fundamentos filosóficos está a noção de Volksgeist, 
elaborada por Johann Gottfried Herder, de acordo com Oliveira (2022), que 
propunha que cada povo possui um “espírito” próprio manifestado na língua, nos 
costumes e na arte. Essa ideia valorizava a identidade nacional e reforçava a 
percepção de que a cultura alemã deveria ser compreendida a partir de suas 
raízes históricas e simbólicas, não pela mera imitação de padrões clássicos ou 
estrangeiros. Esse princípio abriu caminho para a busca romântica por um 
passado germânico idealizado, alimentando um sentimento nacional profundo. 
 
 
Outro conceito fundamental foi a visão idealista de Friedrich Schiller e 
Friedrich Schelling, que associavam arte, liberdade e natureza. Para eles, a 
criação artística era uma expressão da união entre razão e sensibilidade, 
permitindo ao ser humano alcançar uma forma superior de harmonia espiritual. 
Schelling, especialmente, via a natureza como um organismo vivo carregado de 
força criadora, o que contribuiu para a estética romântica de paisagens sublimes, 
ruínas medievais e ambientes carregados de simbolismo. Essa integração entre 
natureza e espírito fundamentou boa parte da sensibilidade artística do período 
(HERDER, 1995). 
Por fim, o Romantismo alemão também recebeu influência das ideias de 
Fichte, especialmente da noção de que a consciência humana cria e transforma 
a realidade. Para ele, o“Eu” é uma força ativa, capaz de produzir e modificar o 
mundo por meio da imaginação e da arte. Essa visão reforçou o valor romântico 
da subjetividade, isto é, da experiência interior e da expressão pessoal. Assim, 
elementos como espiritualidade, identidade cultural e idealismo formaram a base 
que orientou a literatura, a música, a pintura e toda a sensibilidade romântica na 
Alemanha, deixando um impacto duradouro na cultura europeia (WENG, 1994). 
2.1.1 Contexto histórico do Romantismo na Europa 
A consolidação do Romantismo alemão deve ser compreendida a partir das 
profundas transformações sociais e políticas que marcaram o final do século 
XVIII. A Revolução Francesa e o avanço da industrialização reconfiguraram a 
estrutura das sociedades europeias, gerando, simultaneamente, novas 
possibilidades e novas formas de insegurança cultural. Enquanto o Iluminismo 
defendia um modelo de racionalidade universal, capaz de ordenar moral e 
politicamente o mundo, muitos intelectuais alemães perceberam que tal 
racionalidade não dava conta das rupturas emocionais e espirituais vividas pelo 
indivíduo moderno. Nesse contexto, o Romantismo surge como resposta ao 
sentimento de fragmentação provocado pela modernidade nascente (ZAKARIA, 
2024). 
A crítica romântica ao racionalismo iluminista, especialmente entre os 
pensadores do círculo de Jena, propunha uma revalorização da sensibilidade, da 
imaginação e da experiência subjetiva. Para esses autores, a razão sozinha não 
poderia sustentar um projeto humano integral. A estética torna-se, então, um 
 
 
 
 
caminho de reconciliação entre natureza e espírito, entre sujeito e mundo. 
Schiller, uma das referências centrais desse movimento, formula uma teoria 
estética que busca restaurar o equilíbrio perdido pelas tensões políticas e sociais 
do período. Em sua interpretação, a racionalidade abstrata rompeu a unidade 
orgânica do ser humano, e somente a educação estética poderia reconstituí-la. 
Como afirma: 
O Estado, fundado apenas na razão, jamais poderá satisfazer a totalidade da 
natureza humana, pois este exige não apenas leis, mas também beleza; não 
apenas ordem, mas também liberdade interior. A formação estética é, 
portanto, o caminho pelo qual o homem pode reconciliar em si a razão e o 
sentimento. (SCHILLER, 2006, p. 89). 
Essa crítica estética desempenhou papel decisivo na formação do pensamento 
político-cultural alemão. A Alemanha, ainda fragmentada em pequenos Estados 
e principados autônomos, não possuía uma unidade política comparável à 
França ou à Inglaterra. Assim, o Romantismo passou a investir na ideia de uma 
unidade espiritual e cultural anterior à unidade territorial — no conceito de 
Kulturnation, amplamente desenvolvido por Herder. Nesse processo, a cultura, a 
língua e a memória comum tornaram-se elementos centrais de identificação 
coletiva, oferecendo uma alternativa simbólica à falta de unificação política 
efetiva. 
Dessa forma, as transformações sociais e econômicas do período, somadas à 
crítica ao racionalismo e à busca de um princípio unificador para a nação alemã, 
consolidaram um ambiente fértil para o desenvolvimento do Romantismo. O 
movimento não apenas reagiu às tensões de seu tempo, mas também ofereceu 
um modelo de compreensão do mundo em que arte, política e identidade 
nacional se entrelaçam profundamente. A teoria estética de Schiller, articulada 
às contribuições de Herder, Fichte e Hölderlin, tornou-se, assim, um dos alicerces 
intelectuais da construção cultural que posteriormente influenciaria diversas 
formas de nacionalismo alemão — inclusive aquelas que seriam 
instrumentalizadas no século XX. 
 
 
 
 
 
2.1.2 Transformações sociais e políticas (Revolução Francesa, 
Industrialização); Reação ao racionalismo iluminista e a formação do 
sistema alemão. 
O Romantismo alemão desenvolveu-se em meio a profundas 
transformações sociais e políticas que marcaram o fim do século XVIII e o início 
do XIX. A Revolução Francesa rompeu com a ordem tradicional europeia e 
introduziu novos paradigmas políticos — liberdade, cidadania e soberania 
popular — que reverberaram intensamente nos territórios germânicos. Somado 
a isso, o início da industrialização alterou padrões produtivos, urbanos e sociais, 
reforçando sensações de desenraizamento e crise cultural. Pensadores 
românticos perceberam que a nova sociedade moderna, centrada no progresso 
material e na racionalização da vida, precisava de um contraponto cultural que 
defendesse espiritualidade, história e comunidade. Nessa atmosfera, a filosofia 
romântica ganhou força como resposta crítica à mecanização da existência e à 
padronização social emergente. 
A reação ao racionalismo iluminista foi um dos pilares centrais do 
Romantismo. Autores como Johann Gottfried Herder — amplamente traduzido para 
o português — rejeitavam a ideia iluminista de que a razão abstrata poderia 
explicar todo comportamento humano. Em sua obra, Herder defendia que cada 
povo possui sua própria “alma nacional” (Volksgeist), formada por língua, 
costumes, memória e tradição, elementos que não poderiam ser reduzidos a um 
modelo racional universal. Essa crítica se estendia também à filosofia cartesiana 
e ao ideal de neutralidade científica defendido por parte dos iluministas, 
considerados incapazes de explicar dimensões subjetivas como sentimento, 
criatividade e pertencimento cultural. Desse modo, o Romantismo propôs uma 
síntese entre sensibilidades individuais e valores comunitários, contrapondo 
emoção à frieza racional (HERDER, 1995). 
 
 
 
 
 
 
 
 
No contexto alemão, fragmentado em dezenas de Estados autônomos, o 
Romantismo teve papel essencial na consolidação do sentimento nacional. 
Enquanto a Alemanha não existia como Estado unificado, autores como Friedrich 
Schiller enfatizavam a formação ética e estética do indivíduo como caminho para 
a autonomia dos povos germânicos. A ideia de que cada cultura possui 
originalidade e profundidade próprias — defendida por Herder — fortaleceu o 
discurso de unidade cultural antes de qualquer unificação política. Assim, o 
movimento romântico ajudou a produzir uma consciência coletiva de 
germanidade, que ultrapassava fronteiras dinásticas e territoriais. Esse processo 
foi intensificado pelas guerras napoleônicas, que estimularam a valorização do 
passado germânico e reforçaram a identidade nacional (HERDER, 1995). 
O Romantismo alemão, portanto, emergiu como um movimento filosófico 
que respondia a tensões modernas, articulando crítica social, busca por 
identidade e valorização da subjetividade. A combinação entre rejeição ao 
racionalismo iluminista, reação às transformações modernas e exaltação do 
espírito nacional germânico produziu uma síntese poderosa. Essa visão 
romântica — com seus ideais de nação orgânica, memória histórica e unidade 
espiritual — influenciaria não apenas o pensamento filosófico, mas, 
posteriormente, discursos político-ideológicos presentes na Alemanha do século 
XIX e XX. Assim, compreender esses fundamentos é essencial para analisar 
como elementos estéticos e filosóficos do Romantismo puderam ser apropriados, 
reinterpretados ou distorcidos por movimentos posteriores, incluindo o nacional-
socialismo (SCHILLER, 2006). 
2.1.3 Características estéticas do Romantismo alemão 
A estética do Romantismo alemão caracteriza-se pela compreensão da 
natureza como realidade espiritual e não como simples cenário externo. Para os 
autores desse movimento, o mundo natural funciona como um organismo vivo 
que expressa significados ocultos e estabelece diálogo profundo com a 
interioridade humana. A paisagem, portanto, não é apenas objeto de 
contemplação, mas via de revelação metafísica e de aproximação do mistério, 
ampliando sua função estética, existencial e simbólica (DE SOUZA, 2014). 
 
 
Outra dimensão essencial é a valorização do passado mítico germânico 
comofundamento da identidade coletiva. Os românticos entendiam que a 
história, a língua, as tradições e os costumes populares constituíam expressões 
do espírito de um povo, funcionando como laços culturais que garantiam 
continuidade e pertencimento. Dessa perspectiva, o resgate de narrativas antigas 
não equivalia a nostalgia, mas consolidava uma visão de cultura como organismo 
vivo, cuja memória histórica sustentava o presente e projetava horizontes de 
unidade simbólica. 
Integra também esse repertório a figura do herói trágico, representado como 
indivíduo moralmente intenso, que encontra grandeza justamente na resistência 
às limitações impostas pelo destino. O heroísmo romântico não se define pela 
vitória, mas pela fidelidade ao ideal, mesmo diante do fracasso. Esse modelo 
ético dialoga com a busca interior por um “lar espiritual”, entendida como o 
processo formativo pelo qual o sujeito procura sua própria completude. A jornada 
humana, nessa perspectiva, é concebida como movimento de aproximação a um 
centro íntimo, onde se harmonizam sensibilidade, razão e identidade. 
Por fim, o Romantismo alemão estruturou um conjunto de símbolos que 
ultrapassou a esfera artística e se integrou a projetos culturais e políticos 
posteriores. A idealização do corpo masculino disciplinado, a imagem feminina 
associada à pátria afetiva, o herói melancólico, o povo concebido como unidade 
espiritual e a natureza sublime constituíram dispositivos estéticos capazes de 
modelar imaginários coletivos. A força desses símbolos explica sua reativação 
em contextos distintos ao longo dos séculos, demonstrando como o Romantismo 
não apenas produziu obras, mas instituiu formas duradouras de sentir, interpretar 
e organizar o mundo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2.2 A ARTE COMO CONSTRUÇÃO DE VISÃO DE MUNDO 
 
A arte funciona historicamente como um dos meios mais potentes de 
construção de visão de mundo, pois não apenas representa a realidade, mas cria 
modos de percebê-la. Como explica Hans Belting (2005), a arte não é apenas algo 
produzido por uma cultura; ela é também aquilo que produz cultura, porque organiza 
formas de olhar e de lembrar. Dessa forma, a produção artística — seja literária, 
pictórica ou musical — molda a sensibilidade coletiva, naturalizando certas 
interpretações do passado e do presente como se fossem verdades evidentes. 
Ao escolher símbolos, atmosferas e narrativas, a arte seleciona o que deve ser 
lembrado, o que deve ser esquecido e o que deve ser emocionalmente 
valorizado, contribuindo para formar visões coletivas de identidade, 
pertencimento e destino histórico. 
Além disso, a arte consolida imaginários que ultrapassam o campo estético, 
tornando-se um instrumento de legitimação de projetos políticos e identitários. 
Ernst Cassirer afirma que os seres humanos existem dentro de “um universo 
simbólico composto por mitos, religiões, artes e linguagens, que não apenas expressam a 
realidade, mas a constituem. Assim, a arte não é um simples reflexo da vida social: 
ela funciona como um sistema ativo de construção de sentido. Quando um 
movimento artístico — como o Romantismo alemão, por exemplo — se torna 
hegemônico, ele estabelece gramáticas simbólicas que orientam emoções, 
expectativas e formas de agir, podendo, inclusive, dar sustentação estética e 
emocional a projetos nacionais, ideológicos ou autoritários (GRAESER, 1994). 
2.3 O ROMANTISMO COMO BASE DO NACIONALISMO ALEMÃO 
 
O Romantismo alemão teve papel decisivo na formação de um imaginário 
nacional, algo amplamente analisado por Michael Löwy e Robert Sayre em 
Revolta e Melancolia: o Romantismo na contramão da modernidade. Para os 
autores, o Romantismo expressava tanto crítica quanto saudade de um passado 
idealizado, fornecendo símbolos que alimentavam a ideia de comunidade 
espiritual alemã (Volksgeist). Eles afirmam que o Romantismo “exprime uma 
crítica cultural global da modernidade capitalista”, criando um espaço imaginativo 
 
 
onde a nação podia ser vista não como instituição jurídica, mas como totalidade 
orgânica, cultural e emocional (LÖWY, 2017). 
No entanto, essa mesma estrutura simbólica — a ideia de um povo unido 
por essência espiritual, ancestralidade e destino comum — seria mais tarde 
deturpada e instrumentalizada pelo nacional-socialismo. Löwy e Sayre (2015) 
insistem que o Romantismo não contém, em si, elementos fascistas, mas que 
certos aspectos, como o culto ao passado mítico, a exaltação da natureza e a 
busca por unidade espiritual, puderam ser reinterpretados de forma autoritária. 
Nesse sentido, eles observam que algumas tendências românticas puderam, em 
contextos específicos, ser desviadas para projetos de direita radical, ainda que isso 
represente uma ruptura violenta com o pensamento original dos românticos. 
Ao relacionar Romantismo e nazismo, o ponto central não é uma 
continuidade direta, mas a apropriação seletiva de temas românticos por 
ideólogos do Terceiro Reich. A estética nacional-socialista buscou legitimidade 
ao manipular imagens de passado heroico, pureza comunitária e identidade 
orgânica — temas que o Romantismo tratava de maneira poética, crítica ou 
espiritual, mas nunca racial ou genocida. Löwy e Sayre (2015) mostram que o 
nazismo realizou uma “perversão da nostalgia romântica”, convertendo-a em 
propaganda étnico-racial. Assim, elementos culturais originalmente ligados à 
crítica da modernidade foram transformados em ferramentas de exclusão e 
violência, demonstrando como símbolos literários e estéticos podem ser 
reconfigurados dentro de projetos políticos destrutivos. 
2.4 A ESTÉTICA ROMÂNTICA COMO FUNDAMENTO IDEOLÓGICO 
 
A estética romântica alemã, originalmente centrada na exaltação da 
natureza sublime, na valorização de um passado heroico e na ideia de povo como 
unidade espiritual, acabou convertendo-se em um repertório simbólico disponível 
para apropriações políticas posteriores. No contexto do nacional-socialismo, 
esses elementos foram reinterpretados como instrumentos de legitimação de um 
nacionalismo extremo. Mitos como a pureza originária, o heroísmo sacrificial e a 
ligação quase mística entre comunidade e natureza passaram a alimentar 
 
 
 
 
 
discursos que buscavam apresentar o regime como herdeiro direto de uma 
grande tradição espiritual germânica (SILVA, 2023). 
Nesse processo, a política da SS (Schutzstaffel) desempenhou papel 
central ao transformar motivos românticos em rituais políticos. Suas cerimônias 
faziam uso de cenários escuros, tochas, ruínas e ambientes naturais 
cuidadosamente construídos para produzir uma atmosfera de mistério e 
ancestralidade, reforçando a ideia de pertencimento a uma comunidade unida 
por destino, sangue e espiritualidade. Essa estética, embora apresentada como 
herança autêntica, era na verdade uma recriação artificial e ideológica de 
imaginários que o romantismo havia difundido no século XIX. 
A apropriação também moldou a política artística e arquitetônica do regime, 
que via a arte como meio de formação moral e espiritual da população. A 
monumentalidade, a pureza formal e a grandiosidade inspirada em modelos 
clássicos foram reinterpretadas como expressão da suposta grandeza eterna do 
povo alemão. Projetos arquitetônicos ambiciosos, concebidos como símbolos de 
força e unidade, utilizavam essa fusão entre tradição romantizada e estética 
monumental para consolidar uma narrativa de continuidade histórica destinada a 
justificar o poder totalitário. 
O projeto do grande museu planejado para Linz sintetizava essa visão ao 
ser idealizado como centro espiritual e cultural de um futuro império. Ele 
funcionaria como espaço de consagração de uma arte considerada pura, eterna 
e superior, reforçando a ideia de que a sensibilidadecoletiva deveria ser 
reorganizada segundo os valores estéticos definidos pelo regime. Assim, o 
romantismo, reinterpretado e distorcido, tornou-se alicerce de uma política de 
engenharia cultural voltada à construção de uma identidade nacional homogênea 
e subordinada ao projeto totalitário. 
2.5 OFENSIVA CONTRA A ARTE MODERNA 
A ascensão do nazismo representou uma ruptura violenta com toda a 
tradição artística moderna europeia. A estética do regime buscava “pureza”, 
ordem e monumentalidade, rejeitando qualquer forma de experimentação que 
evocasse subjetividade, distorção ou cosmopolitismo. Como observa Stephanie 
 
 
Barron, estudiosa da política cultural do Terceiro Reich, a arte moderna foi 
oficialmente condenada porque “encarnava tudo aquilo que o regime considerava 
degenerado: internacionalismo, intelectualismo e a recusa de padrões raciais idealizados” 
(BARRON, 1995). Ao promover uma campanha estatal contra artistas, museus e 
escolas, o nazismo transformou a arte em instrumento ideológico, reduzindo sua 
função a ilustrar a supremacia racial e o destino histórico imaginado para o povo 
alemão. 
Entre os principais alvos dessa perseguição esteve a Bauhaus, símbolo da 
vanguarda artística e arquitetônica do início do século XX. A escola representava 
exatamente o contrário do projeto hitlerista: integração das artes, inovação 
técnica, interdisciplinaridade e internacionalização cultural. Walter Gropius, seu 
fundador, já defendia desde 1919 que a Bauhaus deveria unir arte, artesanato e 
tecnologia em um novo espírito de criação, livre dos preconceitos nacionalistas e das 
amarras de tradição morta (GROPIUS, 2009). Não surpreende, portanto, que o 
regime a visse como ameaça. Como destaca Peter Gay, o modernismo — e 
especialmente a Bauhaus — era intolerável para o nazismo porque rompia com o 
culto à obediência, preferindo a autonomia criativa e o experimentalismo (GAY, 2009). 
A pressão política, a vigilância policial e a hostilidade oficial acabaram levando 
ao fechamento definitivo da instituição em 1933, marcando o fim de um dos 
movimentos artísticos mais inovadores do século XX. 
 
3. CONCLUSÃO 
 
A análise desenvolvida ao longo deste trabalho permite afirmar que as 
hipóteses iniciais foram confirmadas: a estética do Romantismo alemão forneceu 
ao nacional-socialismo um repertório simbólico, emocional e imagético capaz de 
sustentar parte de sua visão de mundo, especialmente no que diz respeito à 
exaltação da pátria, da natureza idealizada, da pureza coletiva e do heroísmo 
sacrificial. Embora o nazismo não possa ser entendido como simples 
continuidade do Romantismo, uma vez que o regime instrumentaliza a cultura e 
desvirtua muitos de seus princípios, é evidente que ele se apropria de certas 
matrizes românticas para legitimar seu projeto ideológico. A idealização do 
passado germânico, o culto ao corpo do guerreiro e a figura feminina como 
 
 
 
 
guardiã da comunidade são retomados de forma sistemática, convertidos em 
instrumento de propaganda política e de engenharia social. 
A investigação também demonstrou que essa herança estética se torna um 
instrumento ativo de exclusão, pois o nazismo utiliza os símbolos românticos 
como critério de distinção entre aquilo que seria considerado “verdadeiramente 
alemão” e o que deveria ser rejeitado como degenerado ou antinacional. Nesse 
sentido, o movimento identifica nas vanguardas modernistas um inimigo cultural, 
acusando-as de romper com os valores espirituais da nação. A perseguição à 
arte moderna, incluindo a Bauhaus, revela como o regime transforma a estética 
em arma política, reforçando uma visão homogênea de povo, raça e identidade. 
Assim, a estrutura simbólica romântica, esvaziada de seu caráter filosófico e 
sentimental originalmente plural, converte-se no discurso rígido de uma ideologia 
totalitária. 
Por fim, conclui-se que a articulação entre Romantismo e nazismo não é 
linear, mas construída por meio de seleções, supressões e manipulações. O 
Romantismo, enquanto movimento cultural complexo e multifacetado, abrigou 
tanto tendências libertárias quanto impulsos nacionalistas, e foi justamente essa 
ambiguidade que permitiu ao nazismo explorar seletivamente certos elementos 
estéticos e mitológicos. A pesquisa demonstra que o imaginário romântico, 
quando dissociado de seus fundamentos humanistas e colocado a serviço de 
uma política de exclusão, pode ser reinterpretado como justificativa para projetos 
autoritários. Assim, o estudo reforça a importância de compreender como formas 
artísticas e simbólicas são mobilizadas politicamente e como sua apropriação 
indevida pode gerar consequências históricas devastadoras. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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