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1 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Material de Apoio FARMACOLOGIA 2 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo SUMÁRIO CONCEITOS GERAIS ................................................................................................................ 3 FORMAS FARMACÊUTICAS ................................................................................................... 10 VIAS DE ADMINISTRAÇÃO DE FÁRMACOS .......................................................................... 16 FARMACOCINÉTICA ............................................................................................................... 24 ABSORÇÃO ............................................................................................................................. 30 DISTRIBUIÇÃO ........................................................................................................................ 36 ELIMINAÇÃO DE FÁRMACOS ................................................................................................ 41 BIOTRANSFORMAÇÃO OU METABOLIZAÇÃO ..................................................................... 41 EXCREÇÃO ............................................................................................................................. 48 FARMACODINÂMICA .............................................................................................................. 54 INTRODUÇÃO AO SISTEMA NERVOSO AUTONOMO .......................................................... 67 ANTAGONISTAS COLINÉRGICOS ......................................................................................... 75 AGONISTAS ADRENÉRGICOS ............................................................................................... 78 ANTAGONISTAS ADRENÉRGICOS ........................................................................................ 85 ANTI-HIPERTENSIVOS ........................................................................................................... 87 ANTIANGINOSOS .................................................................................................................... 98 DIGITÁLICOS ......................................................................................................................... 101 INFLAMAÇÃO ........................................................................................................................ 103 ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDAIS ........................................................................ 107 ANTI-INFLAMATÓRIOS ESTEROIDAIS ................................................................................ 109 ANTIBIÓTICOS ...................................................................................................................... 118 ANSIOLÍTICOS ...................................................................................................................... 144 ANTICONVULSIVANTES ....................................................................................................... 148 ANALGÉSICOS OPIÓDES ..................................................................................................... 157 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO ................................................................................................... 161 3 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo “As origens da farmacoterapêutica remontam a tempos imemoriais, pois a luta contras as doenças é uma constante de qualquer sociedade humana”.1 Nesta aula acompanharemos os conceitos gerais necessários para o entendimento da disciplina de Farmacologia. Por fim, abordaremos as subdivisões da disciplina. AULA 01 CONCEITOS GERAIS (em ordem alfabética) Biodisponibilidade- é definida pela quantidade inalterada de fármaco que alcança a corrente sanguínea após a sua administração por qualquer via e, que está disponível para fazer o seu efeito. Bioequivalência- é o estudo comparativo entre as biodisponibilidades do medicamento de referência (geralmente a especialidade farmacêutica) e, do genérico correspondente, sob a mesma forma farmacêutica e, contendo idêntica composição qualitativa e quantitativa de fármacos. Droga (do holandês, droog)- este termo, atualmente, vem sendo substituído por fármaco. Efeito adverso ou Reação adversa ao medicamento (RAM)- segundo a ANVISA: “é qualquer resposta a um medicamento que seja prejudicial, não intencional, e que ocorra nas doses normalmente utilizadas em seres humanos para profilaxia, diagnóstico e tratamento de doenças, ou para a modificação de uma função fisiológica." RDC nº 140, de 29 de maio de 2003. Efeito de primeira passagem hepático ou Metabolismo pré-sistêmico- também chamado de metabolismo de primeira passagem, é um fenômeno do transformação enzimática do fármaco, no qual a concentração da droga é significantemente reduzida pelo fígado antes de atingir a circulação sistêmica. Efeito terapêutico- efeito desejado 1 DeLucia, R. et al. Farmacologia Integrada. Rio de Janeiro: Revinter, 2007. 4 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Efeito tóxico- efeito gerado pela grande concentração de um fármaco no organismo. Estes efeitos não aparecem se ingerida a dose terapêutica ou se o individuo não apresentar problema algum no funcionamento do organismo Fármaco- substância química que é capaz de interagir com o organismo através de ligações químicas e, esta interação é capaz de modificar o funcionamento orgânico. As finalidades para o uso de um fármaco são: curativa, preventiva, paliativa ou diagnóstica. Farmacopéia- corresponde ao conjunto de drogas-medicamentos oficializadas e de uso corrente consagradas pela experiência como eficazes e úteis, sendo publicações oficiais de cada país, e, sujeitas a atualização e revisão por comissões especiais de cientistas. Interação medicamentosa- é à interferência de um fármaco na ação de outro ou de um alimento ou nutriente na ação de medicamentos. Existem interações medicamentosas benéficas ou desejáveis (como a interação aditiva) e, interações medicamentosas indesejáveis que determinam a redução do efeito terapêutico ou resultado contrário ao esperado, aumento da incidência de efeitos adversos e/ou no custo da terapia sem benefício terapêutico, portanto, podendo levar ao fracasso da terapia e/ou progressão da doença. Didaticamente, costuma-se classificar as interações medicamentosas em dois grandes grupos: a) Interações farmacocinéticas- são as que ocorrem na absorção, distribuição, biotransformação ou excreção dos fármacos. - Interações na absorção- quando fármacos interagem no organismo, um ou mais deles podem ficar insolúveis no estômago, impossibilitando a absorção. Também podem ocorrer alterações na motilidade intestinal ou um fármaco alterar o pH gástrico ou entérico, comprometendo a absorção do outro fármaco. - Interações na distribuição- alguns fármacos são distribuídos no organismo pela ligação a proteínas plasmáticas. Muitas vezes um fármaco pode comprometer a ligação de outro a essas proteínas, prejudicando a sua distribuição. - Interações na Biotransformação- a biotransformação dos fármacos no interior do organismo ocorre principalmente no fígado, através de reações bioquímicas catalisadas por enzimas. Determinados fármacos têm a capacidade de estimular a ação dessas enzimas (indutores enzimáticos) e outros de inibi-las (inibidores enzimáticos). Portanto, sua 5 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo administração em conjuntocom outros agentes pode provocar a indução ou inibição enzimática, levando à perda ou redução de ação do segundo fármaco ou, em alguns casos, acelerando sua excreção. - Interações na excreção- os fármacos são eliminados do organismo principalmente por via renal, através de mecanismos específicos. Quando ocorrem interações medicamentosas, alterações nesses mecanismos podem levar ao retardo ou aceleração da excreção dos fármacos, ocasionando modificações nas suas concentrações e possibilitando o prolongamento ou redução de sua ação. b) Interações farmacodinâmicas- são as que interferem na ação dos fármacos envolvidos, o que pode resultar na potencialização dos efeitos (sinergismo) ou na exacerbação de um ou mais efeitos colaterais. Algumas interações podem gerar efeitos antagônicos (resultados opostos). Assim, quando dois fármacos atuam em um mesmo receptor no organismo e são administrados simultaneamente, pode ocorrer competição pelo receptor, comprometendo a ação terapêutica. Mecanismo de ação- a maneira e o local de ação de um determinado fármaco. Medicamento- segundo a Farmacopéia Brasileira: "produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico. É uma forma farmacêutica terminada que contém o fármaco, geralmente em associação com adjuvantes farmacotécnicos." (Resolução RDC, nº84/02). Medicamento Genérico- Pela definição da Lei nº 9.787/99, Genérico é aquele medicamento que fez todas as análises comparativas a um outro de marca, que foi pesquisado e desenvolvido por um laboratório farmacêutico. O genérico, além de possuir o mesmo princípio ativo, tem a mesma composição de substâncias, modo e tempo de ação no organismo e absorção pela corrente sanguínea apresentados pelos produtos de marca. Também tem a mesma forma de apresentação (comprimidos, xarope, solução injetável entre outros) e de dosagem. É uma cópia 100% fiel do produto de marca. Para ser registrado como Genérico na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o medicamento deverá passar pelos testes de biodisponibilidade e de bioequivalência, o que garantirá que ele possui a mesma eficácia terapêutica do produto de marca. 6 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Medicamento Referência- É um produto de marca pesquisado e desenvolvido por um laboratório, que fez todos os estudos e que tem todos os dados necessários do fármaco de referência ao seu registro. Esses dados referem-se á eficácia terapêutica e qualidade do medicamento. Medicamento Similar- Segundo a Lei 9.787/99, Similar é aquele que contém o mesmo ou os mesmos princípios ativos, apresentam mesma concentração, forma farmacêutica, via de administração, posologia e indicação terapêutica do medicamento de referência registrado na ANVISA. Porém, pode apresentar características diferentes relativas ao tamanho, forma do produto, prazo de validade e embalagem. Meia-vida- representada pelo símbolo t1/2, representa o tempo necessário para que a concentração do fármaco na corrente sanguinea diminua 50%. Placebo (placeo = agradar)- tudo o que é feito com intenção benéfica para aliviar o sofrimento: fármaco/medicamento/droga/remédio (em concentração pequena ou mesmo na sua ausência). O efeito placebo pode ser definido como “o efeito psicológico, fisiológico ou psicofisiológico de qualquer medicação que não é devido à sua atividade farmacológica e cuja explicação pode ser dada como fenômeno induzido por mecanismo de sugestão”. Princípio ativo- sinônimo de fármaco. A substancia de um medicamento, planta ou alimento que faz a ação no organismo. Um medicamento pode ter muitas substâncias em sua composição, mas somente algumas tem a capacidade de interagir com o organismo. Receptor- são estruturas moleculares altamente especializadas, que tem no organismo afinidade de interar-se com substâncias endógenas, e que podem também reagir com substâncias exógenas, que tenham características químicas e estruturais comparáveis às substâncias endógenas. Remédio (re = novamente; medior = curar)- qualquer agente que provoque a cura ou o bem- estar. Estes agentes podem ser substância animal, vegetal, mineral ou sintética; procedimento (ginástica, massagem, acupuntura,banhos); fé ou crença ou influência. Veículo ou excipiente- corresponde a substância mais ou menos inerte de uma formula medicamentosa, que tem o objetivo de conferir consistência ou forma farmacêutica adequada. Atualmente, alguns autores diferenciam o veículo do excipiente, referindo ao veículo como a 7 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo parte líquida da fórmula onde estão dissolvidos ou emulsionados os princípios ativos, tendo a utilidade de facilitar a ingestão ou a aplicação direta no paciente; e, conceituam o excipiente como o ingrediente inerte que facilita o trabalho na dosagem ou na confecção do fármaco, quando misturado aos princípios ativos servindo também para dar volume e peso à fórmula. Introdução à Farmacologia Porque um determinado fármaco afeta o sistema nervoso central, enquanto outro fármaco limita-se a agir somente na periferia? Porque alguns fármacos provocam vários efeitos adversos, enquanto outros provocam menos prejuízos ao organismo? Essas perguntas podem ser respondidas se conhecermos a interação entre determinado fármaco e o seu alvo molecular (receptor) específico, além de considerarmos o papel dessa ação dentro de um contexto fisiológico amplo. Embora os fármacos possam ligar-se a muitos receptores, a maioria produz os seus efeitos terapeuticos através de uma interação seletiva com as moléculas-alvo, as quais desempenham papéis importantes tanto na fisiologia quanto na patologia. Entretanto, esta interação com os receptores não provoca somente os efeitos desejáveis, mas tambem os indesejáveis. Os efeitos produzidos por um fármaco, bem como a maneira com que ele os produz são estudados em uma subdivisão da farmacologia chamada farmacodinâmica. Ainda neste sentido, o sucesso do tratamento de doenças em humanos depende de conhecimentos farmacológicos que permitam a escolha do medicamento correto. Além de conhecer o medicamento certo para cada tipo de patologia, para prescrever um fármaco corretamente, o clínico deve levar em consideração as características fisiopatológicas, sexo, idade, peso corpóreo e raça do paciente. A dose deve ser escolhida levando-se em consideração que ela deve chegar e manter-se em uma concentração ideal no seu local de ação, pois a intensidade dos efeitos, terapêuticos (desejados) ou tóxicos, depende diretamente da concentração que o fármaco chega neste local de ação. Se o fármaco chegar em uma concentração abaixo da necessária no local de ação, o efeito será ineficaz, dando uma falsa impressão de que o fármaco não seria o correto. Ao contrário, se chegar em concentrações excessivas, o fármaco poderá provocar toxicidade. Os esquemas posológicos padrões e seus ajustes na presença de situações fisiológicas (idade, sexo, peso, gestação), hábitos do paciente (tabagismo, ingestão de alcool) e algumas doenças (insuficiência renal e hepática) é feito sob informações de outra subdivisão da farmacologia, a farmacocinética. 8 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Conceituação geral da disciplina Classicamente, define-se farmacologia como a ciência que estuda os fármacos e, ela surgiu da necessidade de comprovação da eficácia dos medicamentos. Esta ciência tem como objetivos: - a relação entre a dose e o efeito biológico - a localização do receptor do fármaco - o mecanismo de ação do fármaco - a relação entreestrutura química e atividade biológica - absorção, distribuição, biotransformação (metabolização) e excreção de um fármaco. A farmacologia é denominada de disciplina ponte, a qual combina várias ciências básicas e aplicadas, dentre elas podemos citar a matemática, estatística, química orgânica, biologia molecular, bioquímica e fisiologia, dentre outras. Essa disciplina apresenta muitas divisões (Fig. 1), dentre as quais devemos conhecer: - Farmacocinética: é a análise quantitativa dos processos de absorção, distribuição, biotransformação e excreção dos fármacos através dos modelos matemáticos. Na prática terapêutica um fármaco deve ser capaz de chegar ao local onde produzirá a sua ação após a sua administração por uma via adequada. O primeiro processo farmacocinético, após a administração do fármaco, é a absorção. A partir do momento que ele encontra-se na corrente sanguinea, este fármaco é distribuído, biotransformado e excretado e, estes processos acontecem simultaneamente. - Farmacodinâmica: é o estudo dos efeitos bioquímicos e fisiológicos dos fármacos e de seu mecanismo de ação. 9 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Fig. 1- representação dos componentes farmacocinéticos e farmacodinâmicos, compondo as divisões da farmacologia. Extraído de: KATZUNG, B.G. Farmacologia Básica e Clínica. 9 ed. 2006. Farmacocinética Farmacodinâmica 10 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo “Nesta aula abordaremos as diversas formas farmacêuticas pelas quais os fármacos são preparados e comercializados, bem como a suas respectivas definições e constituições.” AULA 02 FORMAS FARMACÊUTICAS Forma farmacêutica é a forma final como um medicamento é apresentado para a sua administração. Um fármaco não é administrado na sua forma natural ou pura. O(s) fármaco(s) faz(em) parte de uma fórmula onde constam várias substâncias sem função terapeutica, entretanto elas tem a finalidade de solubilizar, suspender, espessar, diluir, estabilizar, preservar, colorir, além de deixar o fármaco agradável ao paladar, bem como dar segurança e confiabilidade para a administração da dose correta de um fármaco. A partir da forma farmacêutica tem-se a via de administração adequada. As formas farmacêuticas podem ser divididas quanto ao estado físico: sólidos, líquidos, semi-sólidos e gasosos. Nas formas líquidas a substância ativa começa a ser absorvida no estômago. Enquanto que as formas sólidas exigem a degradação do comprimido ou abertura da cápsula (desintegração) antes da dissolução do fármaco para que possa ocorrer passagem pela mucosa gastrointestinal e a absorção na corrente sanguínea. A degradação e dissolução dos comprimidos revestidos ocorre no duodeno. Sólidos Pó- é uma mistura de fármacos e ou substâncias químicas finamente divididas e na forma seca. Os pós podem ser administrados sob a forma simples ou serem ponto de partida para outras formas farmacêuticas como as cápsulas. 11 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Comprimido- forma farmacêutica sólida de forma variável, cilíndrica ou discóide, obtida por compressão de fármacos juntamente com os excipientes (qualquer material além dos fármacos que faze parte de uma formulação). Drágea- forma farmacêutica obtida pelo revestimento dos comprimidos. Para este fim se utiliza diversas substâncias, como: queratina, ácido esteárico, gelatina endurecida. O revestimento tem a finalidade de mascarar odor ou proteger o fármaco presente, o qual pode ser sensível ao suco gástrico. Cápsula- forma farmacêutica sólida na qual um ou mais fármacos e/ou excipientes são acondicionadas em um invólucro à base de gelatina. As cápsulas gelatinosas podem ser duras ou moles e, possuem a propriedade de desintegrarem-se e dissolverem-se no trato gastrointestinal. O fármaco encontrado dentro da cápsula pode estar na forma de pó, granulado ou solução. Supositório - são preparações à base de substância fundível pelo calor (37ºC) natural do corpo, destinado a ser introduzido no reto, gerando a dissolução do fármaco. O excipiente mais usado é a manteiga de cacau (lipossolúvel) junto com a glicerina gelatinada (hidrossolúvel). Pode ser para uso de efeito local ou sistêmico. 12 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Óvulo - são formas obtidas por compressão ou moldagem para aplicação vaginal, onde devem se dissolver para exercerem um efeito local. Geralmente, o excipiente é a glicerina. Grânulos - são preparações farmacêuticas compostas de um pó ou uma mistura de pós umedecidos e submetidos a secagem, para produzir grânulos de tamanho desejado. Pastilhas - são formas farmacêuticas destinadas a dissolverem-se lentamente na boca, constituída por grande quantidade de açúcar e mucilagens associadas a fármacos. Líquidos Solução- são preparados líquidos obtidos por dissolução de substâncias químicas em água. envasadas em frascos especiais que permitem a dosificação exata. Permite ajuste de doses individuais. Suspensão- forma farmaceutica que contêm partículas sólidas finas do fármaco em dispersão relativamente uniforme. Este tipo de formulação deve ser agitado antes do uso. 13 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Emulsão- forma farmacêutica líquida de aspecto cremoso feito com a mistura de dois líquidos imiscíveis: óleo e água, contendo o fármaco em uma delas Utiliza-se agentes emulsionantes como: goma arábica e gelatina. Xarope- São preparações aquosas caracterizadas pela alta viscosidade, que apresentam não menos que 45% de sacarose ou outros açúcares na sua composição. Elixir- forma farmacêutica que contém 20% de alcool e 20% de açucar. Loção- líquidos e semilíquidos com princípios ativos ou não, em solução ou suspensão. Semi-sólidos Creme- são emulsões líquidas viscosas do tipo óleo e água ou água e óleo. O agente emulsionante geralmente é um sabão. Difere das pomadas por possuir grande quantidade de água em sua formulação, e por isso apresenta absorção mais rápida. Ideal para lesões úmidas. 14 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Pomada- preparação farmacêutica de consistência pastosa contendo uma ou mais substâncias terapeuticamente ativas incorporadas a excipientes adequados, destinado ao uso tópico. Devido a sua oleosidade, a absorção do princípio ativo pode ser mais lenta, porém de efeito local mais prolongado. Possui poder hidratante e é ideal para lesões secas. Os excipientes podem ser de 4 classes: oleosos (vaselina), absorventes (lanolina), emulsivos (cremes) ou hidrossolúveis (polietilenoglicóis). Podem ser adicionados a agentes conservantes, estabilizantes, corantes e aromatizantes inócuos. Pasta- forma farmacêutica semi-sólida de consistência macia, contendo de 20% a 60% de pó. Ação superficial na pele, sem penetração. Gel- sistema semi-sólido que consiste de suspensão de pequenas partículas inorgânicas, ou de grandes moléculas orgânicas interpenetradas por um líquido. Pouca penetração na pele. 15 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Gasosos (utilizados para a administração de substância voláteis) Gases- não tem forma e volume definidos, e consiste em uma coleção de partículas (moléculas, átomos, íons, elétrons) cujos movimentossão aproximadamente aleatórios. Aerossol- conjunto de partículas suspensas num gás, com alta mobilidade intercontinental. O termo refere-se tanto as partículas como ao gás na qual as partículas estão suspensas. 16 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo “Na Aula 03 discutiremos as diversas vias de administração dos fármacos, incluindo as suas vantagens e desvantagens. As vias são importantes no efeito do fármaco devido a velocidade e concentração que o fármaco irá chegar na corrente sanguinea e, poder fazer o seu efeito. A escolha de cada via dependeá da finalidade do tratamento.” AULA 03 VIAS DE ADMINISTRAÇÃO DE FÁRMACOS Classificação das vias de administração: Enterais e Parenterais - Enterais: quando o fármaco entra em contato com qualquer segmento do trato gastrointestinal Ex: Vias oral, bucal, sublingual e retal - Parenterais: São aquelas que não utilizam o tubo digestivo. Ex: Vias intravenosa, intramuscular, subcutânea, intradérmica, intraarterial, intracardíaca, intraarticular, respiratória, conjuntival, geniturinária. Via Oral As formas farmacêuticas utilizadas para administração oral são comprimidos, cápsulas, drágeas, pó, xarope, solução, suspensão, elixir, emulsão e grânulos. Devido às necessidades terapêuticas, as formas farmacêuticas são formuladas normalmente de modo a produzir as características de absorção desejadas. Neste sentido, as cápsulas podem ser elaboradas de modo a permanecerem intactas por algumas horas após a ingestão, para retardar sua absorção ou os comprimidos podem ter um revestimento resistente com a mesma finalidade. Pode-se ter incluído numa cápsula uma mistura de partículas de liberação lenta e rápida, para produzir absorção prolongada. Essas preparações podem reduzir a frequência de administração necessária, e diminuir os efeitos adversos relacionados com elevadas concentrações plasmáticas logo após a administração. 17 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Após um fármaco ser ingerido pela via oral, ele é absorvido no sistema digestório e, entra no sistema porta hepático, isto é, antes de atingir a circulação sistêmica, ele é carregado através da veia porta-hepática para o fígado. O fígado metaboliza muitas drogas, às vezes de tal maneira que somente uma pequena quantidade de droga ativa é lançada a partir do fígado em direção ao sistema circulatório sistêmico. Essa primeira passagem pelo fígado diminui significativamente a biodisponibilidade da droga e é o, citado anteriormente, efeito de primeira passagem hepático (ver Conceitos). Vias de administração alternativas podem ser usadas, como endovenosa, intramuscular, sublingual e via retal. Estas vias evitam o efeito de primeira passagem, pois permitem que a droga alcance diretamente na circulação sistêmica. A via oral apresenta vantagens e desvantagens em comparação às outras vias de administração, das quais cabe citar: Vantagens Maior segurança e comodidade; Estabelecimento de esquemas terapêuticos fáceis de serem cumpridos pelo paciente; Absorção intestinal favorecida pela grande superfície de vilosidades intestinais; Não sendo uma via invasiva, apresenta boa aceitação por parte do paciente; Em casos de ingestão de dose excessiva, ainda há a possibilidade de reversão de absorção utilizando, por exemplo, indução de vômitos ou carvão ativado. Desvantagens Aparecimento de efeitos adversos pela irritação da mucosa; Variação do grau de absorção; Necessidade de cooperação do paciente, a fim de diminuir erros na administração. Revisando os processos digestivos Sabemos que os processos digestivos são fundamentais para a reposição energética. Esses processos envolvem em geral mecanismos secretores, de transporte por membranas e motores, de modo a propiciar os processos de digestão, absorção e excreção. A reabsorção de água ocorre principalmente no intestino grosso. O peristaltismo depende das propriedades da musculatura lisa em cada nível e de seu controle neural. A secreção de ácido pelo estômago é muito importante no processo digestivo, e, a maior parte da absorção de nutrientes ocorre no intestino delgado. Via mucosa Neste tipo de via de administração encontramos as vias sublingual, pulmonar e retal. 18 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Sublingual Esta via é utilizada em casos em que é necessária uma resposta rápida, uma vez que a região sublingual é extremamente irrigada e conectada aos vasos de bom calibre, especialmente se o fármaco é instável ao pH gástrico ou é metabolizado rapidamente pelo fígado. A drenagem venosa da cavidade oral é para a veia cava superior, portanto esta via é muito utilizada em casos de problemas cardíacos e pressão arterial. Vantagens Absorção rápida de substâncias lipossolúveis; Não há perda de fármaco pelo efeito de primeira passagem hepático; Via utilizada para tratamento de problemas cardíacos e de pressão arterial, devido a absorção acontecer em vasos que desembocam diretamente na veia cava. Desvantagens Imprópria para substâncias irritantes ou de sabores desagradáveis. Pulmonar A pulmonar é a via usada para anestésicos voláteis e gasosos. Para esses agentes o pulmão serve como via de administração e eliminação, e as trocas rápidas que são possíveis em conseqüência da grande área de superfície e do grande fluxo sangüíneo permitem a obtenção de ajustes rápidos na concentração plasmática. 19 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Além de provocar um efeito sistêmico muito rápido, a via pulmonar permite a aplicação do fármaco no local de ação desejado como, por exemplo, em casos de asma brônquica. A absorção pulmonar é uma importante via de entrada de certas substâncias tóxicas ambientais e, podem ocorrer reações locais e/ou sistêmicas. Retal Os medicamentos administrados por esta via são introduzidos através do canal anal. As formas farmacêuticas para esta via podem ser os supositórios (sólidos) ou os enemas (líquidos). Supositório Enema A administração retal pode ser utilizada tanto para farmacos de ação local quanto sistêmica. A absorção por via retal muitas vezes não é confiável, devido a sua irregularidade, além de poder produzir irritação na mucosa retal. Entretanto, esta via pode ser útil em pacientes incapazes de tomar medicações pela boca (apresentando vômitos, crianças, idosos, portadores de transtornos psiquiátricos ou em estado de coma). Injetáveis 20 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Nesta via incluem-se as vias subcutânea, intramuscular e endovenosa. As diferenças entre estas vias e outras vias de administração de fármacos são evidenciadas observando a Fig. 1. Fig. 1- Principais vias de absorção e eliminação de fármacos. Extraído de: RANG, H.P. et al. Farmacologia. 5 ed. 2004. A via endovenosa é a via mais rápida e mais precisa para administração de um fármaco. A concentração máxima eficaz que chega aos tecidos depende fundamentalmente da rapidez da injeção. Na administração endovenosa não ocorre absorção. As vias subcutânea e intramuscular produzem, geralmente, um efeito mais rápido que a administração oral, entretanto a taxa de absorção depende muito do local de injeção e de fatores fisiológicos, especialmente do fluxo sangüíneolocal. Os fatores que limitam a velocidade na absorção a partir do local de injeção são: difusão através do tecido, remoção pelo fluxo sangüíneo local, formação de complexos entre fármacos ou injeções oleosas (para hormônios). 21 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo As drogas comumente utilizadas apresentam um tamanho molecular pequeno e, portanto essas drogas deixam facilmente a circulação por filtração capilar, embora isso possa ser modificado pela extensão de ligação da droga às proteínas plasmáticas como a albumina. Uma das diferenças entre estas vias de administração é o local onde elas são administradas. A Fig. 2 ilustra a diferenças entre estes locais onde um fármaco é administrado. Fig. 2- Locais de administração dos fármacos injetáveis (vias subcutânea, intramuscular e intravenosa). Subcutânea Feita no tecido subcutâneo, que fica entre a pele e o músculo, é usada para a aplicação de insulinas, anticoagulantes e outros medicamentos que devam ser absorvidos lentamente. É um tipo de aplicação geralmente indolor, feito com seringas específicas e agulhas curtas, chamadas agulhas de insulina. Volume máximo recomendado é de 1,5ml. Vantagens Absorção boa e constante para soluções; Absorção lenta para suspensões. Desvantagens Dor e necrose por substâncias irritantes. 22 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Intramuscular É feita no músculo, parte do corpo responsável pelos movimentos, rica em vaso sangüíneos que facilitam a absorção de grande número de medicamentos. Possui também grande número de nervos que comandam a atividade muscular, sendo, por isso, muito importante que se identifique com exatidão as áreas apropriadas para a aplicação, afim de evitar possíveis complicações. As injeções intramusculares devem ser sempre profundas, isto é, aplicadas com agulhas de tamanho apropriado e com ângulo reto (90°), salvo exceções, para favorecer a absorção e não haver retorno do medicamento para a camada subcutânea. Os medicamentos mais doloridos e irritantes são aplicados por esta via. Vantagens Absorção rápida; Administração em pacientes inconscientes; Adequada para volumes moderados, veículos aquosos, não aquosos e suspensões. Desvantagens Dor; Lesões aplicação de substâncias irritantes ou de pH distante da neutralidade; Inflamações locais pela injeção de substâncias irritantes ou mal absorvidas. Endovenosa É a administração diretamente na corrente sistêmica e, o efeito é imediato. Deve ser aplicada lentamente para se evitar mal estar, hipotensão, formigamento e ondas de calor, fenômenos de origem nervosa que acometem pessoas ansiosas. Com este cuidado, evita-se também a elevação do volume circulatório, prejudicial aos cardíacos. A injeção é geralmente indolor e deve ser aplicada somente por pessoa realmente habilitada, podendo causar sérios problemas se for mal aplicada. Vantagens Obtenção rápida de efeitos; Administração de grandes volumes em infusão lenta; Aplicação de substâncias irritantes, diluídas; Possibilidade de controle de doses, para prevenção de efeitos tóxicos. Desvantagens Intoxicação relativa em injeções rápidas; Riscos de embolia, irritação do endotélio vascular, infecções por contaminação e reações anafiláticas; Imprópria para solventes oleosos e substâncias insolúveis. 23 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Via Tópica Podemos definir a via tópica como sendo a via onde administra-se o fármaco no local onde se deseja o efeito, não necessitando da absorção para que ocorra o seu efeito desejado. É a aplicação de medicamentos através da pele ou mucosas, podendo ser pomadas, loções, pastas, cremes, pós, xampús, gel, colirio, gotas nasais, gotas otológicas ou adesivos tipo emplasto. Esta via é utilizada principalmente quando se quer um efeito local sobre a pele ou mucosas. A absorção é considerável, podendo levar aos efeitos sistêmicos. Muitas drogas são mal absorvidas pela pele devido à baixa solubilidade das mesmas. Embora a absorção do fármaco ocorra, ela não é necessária para o efeito do fármaco, já que este está sendo administrado no local onde se deseja a ação. Via Transdérmica E a via de aplicação de medicamentos sobre a pele ou mucosas, entretanto o efeito do fármaco é sistêmico. Portanto, nesta via, ao contrário da via tópica a absorção do fármaco é necessária para o efeito do mesmo. Nesta via utilizam-se formas farmacêuticas tipo adesivos (ex.: de nicotina, hormônios, fentanil, etc...) ou pomadas. Tem-se aumentado o uso de formas de administração transdérmica, em que o fármaco é incorporado a uma embalagem presa com fita adesiva a uma área de pele fina. Essas embalagens adesivas produzem um estado de equilíbrio estável e tem diversas vantagens, especialmente a facilidade de retirada no caso de efeitos indesejáveis. Contudo, o método só é adequado para certos fármacos relativamente lipossolúveis, e essas preparações são caras. 24 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo “Na presente aula abordaremos a Farmacocinética, uma das divisões da Farmacologia, bem como conceitos gerais necessários para o entendimento do movimento do fármaco pelo organismo. ” AULA 04 FARMACOCINÉTICA Esta área da farmacologia estuda o caminho percorrido pelo fármaco no organismo desde a sua administração até a sua eliminação. Neste sentido, pode ser definida como o estudo quantitativo dos processos farmacocinéticos de absorção, distribuição, biotransformação ou metabolização e excreção dos fármacos ou dos seus metabólitos. Para entendermos a importância desta área temos que saber que um fármaco atua aumentando ou diminuindo os metabolismos em determinada situação no organismo. Existem conceitos básicos na farmacocinética cuja compreensão é fundamental para a utilização dos fármacos. O primeiro destes conceitos refere-se ao que é chamado de biodisponibilidade, a qual é definida como a quantidade de uma substância que, introduzida no organismo, ganha a circulação e, portanto, torna-se disponível para exercer sua atuação terapêutica. Com a via intravenosa a biodisponibilidade é de 100%, pois toda substância alcança a corrente circulatória. Mas, no caso da via oral (ou outra via que não a intravenosa), a absorção nunca é total e, portanto, a substância não ficará 100% disponível, pois é certo que parte não conseguirá chegar à corrente sangüínea. Ainda neste sentido, a concentração máxima (Cmax) que a substância atinge no plasma e o tempo máximo (Tmax) para aquela concentração ser atingida, são aspectos do comportamento das drogas dentro do organismo utilizados como parâmetros que definem as doses terapêuticas, as reações adversas e as intoxicações com medicamentos . A atividade terapêutica, ou uma eventual toxicidade, de um fármaco depende da sua permanência no organismo. O estudo de seu trajeto no organismo constitui, portanto, uma etapa indispensável do conhecimento do perfil do fármaco e também para a eleição da melhor forma farmacêutica que se adapte à obtenção dos efeitos terapêuticos requeridos. Um fármaco só pode exercer seu efeito farmacológico nos tecidos, depois de ter sido transportado para o sangue. A circulação sistêmica é responsável pela trajetória do fármaco no organismo. A absorção assegura sua chegada ao sangue, o qual o conduzirá aos diferentes 25 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo tecidos e órgãos, lugares estes de ação farmacológica, armazenamento,biotransformação e excreção. O fármaco, na sua absorção, distribuição ou eliminação atravessa membranas biológicas sob influência das características físico-químicas de ambos. Assim sendo, devemos relembrar as características destas barreiras biológicas, bem como os mecanismos que regem a passagem dos fármacos através delas. Membranas biológicas Os fármacos em geral passam através das células e não dos espaços intercelulares que são diminutos, permitindo apenas o trânsito de água, sais e compostos de baixo peso molecular. A membrana celular é uma estrutura dinâmica, mutável e adaptável à passagem de diferentes substâncias. Seu comportamento funcional é bastante variável no organismo, o que explica as diferenças observadas na velocidade, quantidade e tipo de substâncias transportadas pelas diversas membranas celulares. O mosaico fluido (Singer & Nicolson, 1972)2 é o modelo aceito atualmente para descrever o funcionamento e a estrutura da membrana celular. Todas as células humanas, segundo o modelo do mosaico fluido, são delimitadas por uma membrana com dupla camada lipídica. A membrana contém um cerne de lípídios hidrofóbico e possui uma superfície hidrofílica em contato com os ambientes intra e extracelular. Intercaladas dentro dos lipideos, há moléculas de colesterol e proteínas, algumas delas frouxamente adsorvidas à superfície, outras parcialmente imersas na matriz lipídica e, outras ainda se estendendo pela espessura total da membrana (Fig. 1). 2 SINGER, S J. & NICOLSON, G. L. The fluid mosaic model of the structure of cell membranes. Science, v. 175, p. 720-31, 1972. 26 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Fig. 1- Organização da membrana biológica. Extraído de: http://www.drikabio.com/2009/04/21/ a-membrana-plasmatica-modelo-do-mosaico-fluido.html Essa estrutura da membrana biológica possui implicações importantes para a terapia farmacológica, pois para que um fármaco possa agir nos seus locais-alvo, ele deve atravessar, pelo menos uma, e em geral várias mebranas biológicas. O cerne hidrofóbico de uma membrana, por ser o mais abundante, representa uma importante barreira para o transporte dos fármacos. Segundo uma regra geral da química: “Semelhante dissolve semelhante”, significa que para uma substância misturar-se com outra, necessariamente terão que possuir a mesma característica, polar (hidrofílica, hidrossolúvel) ou apolar (hidrofóbica, lipossolúvel) Portanto, as pequenas moléculas apolares são capazes de difundir-se facilmente através das membranas pela camada lipídica, enquanto que a passagem das moléculas polares torna- se um processo mais complicado, pois estas moléculas atravessam a membrana através das proteínas inseridas, as quais podem ser canais iônicos ou transportadores de membrana. Para a passagem através destes transportadores pode haver ou não gasto de energia. Transporte através de membranas Os processos passivos, que independem de energia celular, compreendem a difusão simples, a difusão por poros e a filtração. 27 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo O caso mais comum é a penetração do fármaco por difusão simples seguindo um gradiente de concentração em virtude de sua solubilidade na camada lipídica. Esta transferência é diretamente proporcional ao gradiente de concentração através da membrana. A explicação física para o fenômeno da difusão é que cada partícula de soluto possui movimento aleatório próprio, dado pelo seu grau de agitação térmica molecular e que, além disso, sofre choques constantes de outras partículas adjacentes; assim, nas regiões onde a concentração de soluto é inicialmente maior, esses eventos de choque ocorrem em maior proporção que naquelas regiões onde a concentração de soluto é baixa ou nula. Desta forma, embora cada partícula se mova ao acaso, o movimento global médio do soluto se direciona para "invadir" áreas de menor concentração e o transporte do soluto é realizado na região de maior para a de menor concentração através da membrana, sem interferência e gasto de energia pela mesma. Também intervém no processo de difusão simples o coeficiente de difusão da molécula: esta se difundirá mais rapidamente através de uma membrana quanto menor for seu tamanho; porém o elemento mais importante para a permeabilidade de uma molécula através de uma determinada membrana é seu coeficiente de partição lipídeo/água: quanto maior a lipossolubilidade da molécula, maior é seu coeficiente de partição e mais rápida será sua difusão. A difusão por poros, também conhecida como difusão aquosa, ocorre para substâncias hidrossolúveis de pequeno tamanho (íons inorgânicos, uréia, metanol, água) e estas podem transpor a membrana através de poros virtuais, verdadeiros canais aquosos formados entre as proteínas; essa passagem envolve fluxo de água, resultante de diferenças de pressão hidrostática ou osmótica através da membrana, o qual arrasta pequenos solutos. O diâmetro dos canais é variável, permitindo somente a passagem de substâncias com peso molecular muito pequeno. Já, as células endoteliais dos capilares têm poros de diâmetro maior, o que permite a passagem de moléculas maiores, mas impede a passagem de moléculas grandes como a albumina. Por isso fármacos ligados às proteínas plasmáticas não passam, em condições fisiológicas, ao líquido intersticial. O processo de difusão por poros é muito importante nos tecidos renal e hepático. A filtração também é um processo passivo que implica na passagem através dos poros da membrana, no entanto, aqui soluto e solvente movem-se juntos através da membrana, a favor do gradiente de concentração, não havendo, portanto gasto energético pela célula. O solvente, normalmente água, leva consigo moléculas hidrossolúveis de pequeno tamanho, polares através dos poros da membrana; o tamanho e a carga elétrica do soluto e dos poros influem diretamente neste processo. Capilares e o glomérulo renal são os principais locais de 28 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo ocorrência deste processo de transporte por membranas; as forças responsáveis pela filtração são pressão osmótica e hidrostática. Transportes especializados são utilizados por fármacos hidrossolúveis de maior tamanho molecular, o que os impede de transpor a membrana pelos processos passivos. Neste sentido, estas moléculas deslocam-se mediante a complexação com carreadores, componentes da membrana celular (proteínas) que a atravessam segundo seu próprio gradiente de difusão, liberando o substrato no outro lado e retornando a posição original. Os carreadores tem especificidade pelo substrato e são saturáveis. Os transportes especializados requerem, ou não, gasto energético. Na difusão facilitada o carreador transporta o fármaco a favor do gradiente de concentração, com velocidade superior a da difusão simples. Na difusão por troca o carreador após transportar o fármaco, retorna ao lado original, ligado a outra molécula. Já no transporte ativo o movimento do fármaco se faz contra o gradiente de concentração, gradiente elétrico ou uma combinação de ambos, com gasto energético pela célula; esta energia é fornecida por hidrólise do ATP ou de outras ligações altamente energéticas. Estes sistemas de transporte especializados são passíveis de competição, ou seja, substâncias similares ao fármaco, endógenas ou exógenas, podem competir pelo mesmo carreador da membrana. A velocidade de transporte de substâncias através de uma membrana é influenciada pela espessurae área permeável da membrana, bem como por características do fármaco, como tamanho, forma molecular e coeficiente de partição lipídio/água. A constante de dissociação (pKa) da substância ativa e a concentração hidrogeniônica (pH) do meio onde se encontra (compartimentos corporais), também influenciam potencialmente sua velocidade de transporte por membranas biológicas. Para eletrólitos fracos, sais de ácidos ou bases fracas, como são a maioria de nossos fármacos, o pH do meio determina seu grau de dissociação em solução. Para estes fármacos, a passagem passiva através da membrana dependerá da lipossolubilidade e da quantidade da forma não ionizada. Influência do pH na passagem dos fármacos pela membrana A absorção, a distribuição, a biotransformação e a excreção de uma substância envolvem a sua passagem através das membranas celulares. Por conseguinte, é essencial conhecer os mecanismos pelos quais os fármacos atravessam as membranas e as propriedades físico- químicas das moléculas e das membranas que influenciam esta transferência. 29 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo A capacidade da droga em atravessar as paredes capilares, membranas celulares e outras barreiras, para circular livremente, depende em grande parte do tamanho e forma moleculares e da sua solubilidade em meios aquosos e lipídicos. A maioria dos fármacos consiste em ácidos ou bases fracas presentes nas soluções tanto sob a forma ionizada ou não-ionizada. As moléculas não-ionizadas, geralmente, são lipossolúveis e podem se difundir através da membrana celular. Em contraste, de modo geral as moléculas ionizadas são incapazes de penetrar a membrana lipídica devido a sua baixa lipossolubilidade, ou alta hidrossolubilidade. O pH de uma solução é o que determina se uma substância prevalecerá em sua forma lipossolúvel ou hidrossolúvel, dependendo da sua característica: ácida ou básica. A tabela 1 representa um resumo químico da forma que uma substância assume dependendo da sua característica e do pH onde ela está. Tabela 1- Influência do pH no grau de lipossolubilidade de um fármaco. Fármaco pH do meio Ácido Básico Ácido Lipossolúvel Hidrossolúvel Básico Hidrossolúvel Lipossolúvel Como podemos observar na tabela acima, se um fármaco ácido estiver em um pH ácido, predominará a sua forma lipossolúvel, facilitando, assim, a sua passagem pela membrana. Entretanto, se este fármaco passar para um pH básico, a sua forma hidrossolúvel irá predominar, o qual dificultará a passagem pela membrana. Em contrapartida, o fármaco básico em pH ácido torna-se hidrossolúvel, o que dificultará a sua passagem pela membrana e, em pH básico a sua forma predominante lipossolúvel favorecerá a sua passagem. 30 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo “Nas aulas 05 à 08 serão abordados os processos farmacocinéticos absorção, distribuição, biotransformação ou metabolização e excreção. Será discutido cada processo separadamente, bem como os fatores que podem alterá-los. Na presente aula iniciaremos discutindo o processo de Absorção. ” AULA 05 ABSORÇÃO A absorção é conceituada como a passagem de um fármaco de seu local de administração para a corrente sanguínea. A absorção deve ser considerada para todas as vias de administrção exceto para a via endovenosa, pois, para a qual, o processo de entrada na corrente sanguínea é chamado de processo de Introdução. Este processo farmacocinético é importante na ação terapêutica de um fármaco devido ao fato de que para haver um efeito no organismo, o fármaco necessita chegar ao seu local de ação numa concentração ideal, através da corrente sanguínea. Entretanto, existem casos em que a absorção não é necessária para o efeito do fármaco, como por exemplo a inalação de um aerossol para o tratamento da asma, ou a aplicação tópica. A absorção do fármaco pode variar de modo significativo dependendo da formulação do medicamento utilizado e, da via de administração. Por exemplo, um fármaco injetado no músculo terá que se difundir a partir do local de injeção e atravessar o endotélio dos vasos sangüíneos mais próximos, para alcançar a circulação sistêmica e, portanto, ser absorvido. Vários são os fatores que podem influenciar este processo de absorção e devem, por isto, serem aqui apresentados e analisados. FATORES QUE ALTERAM A ABSORÇÃO DE UM FÁRMACO A- Ligados à via de administração do fármaco 1- Área da superfície absortiva Este é um dos determinantes mais importantes da velocidade de absorção. Em superfícies com grandes áreas, o fármaco é absorvido com maior rapidez; como exemplos temos o epitélio alveolar pulmonar e a mucosa intestinal. A superfície absortiva é determinada em grande parte pela via de administração. 31 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo 2- Circulação no local de administração A passagem dos fármacos para os líquidos de distribuição do organismo é intensamente afetada pela circulação. Quanto maior for a circulação no local da administração mais rápida será a absorção. Entretanto, quanto menor a circulação, mais lenta será a absorção. A absorção de fármacos pode ser aumentado por recursos que provoquem vasodilatação (massagens, aplicações locais quentes, fármacos vasodilatadores), ao passo que a diminuição da circulação local, com vasoconstritores (aplicações frias, fármacos vasoconstritores), retarda a absorção dos fármacos. Como exemplo, podemos citar o anestésico local associado com vasoconstritor, o qual irá diminuir a absorção do anestésico, fazendo com que este permaneça mais tempo no local, aumentado o seu tempo de efeito e diminuindo os efeitos sistemicos. B- Ligados ao Fármaco 1- Solubilidade do fármaco Como visto anteriormente, quanto maior o grau de lipossolubilidade de um fármaco, mais fácil é a sua passagem pelas membranas biológicas, portanto maior será a sua absorção. Entretanto, quanto maior a característica hidrossolúvel de um fármaco, menor será a sua absorção. Em alguns casos, a solubilidade pode ser alterada pela utilização de veículos como certos solventes orgânicos (álcoois), substâncias que diminuem a tensão superficial (detergentes) e pela mudança de pH no local de absorção por substâncias tamponantes. Independente do local de administração, em solução aquosa, os fármacos são absorvidos mais rapidamente do que aqueles administrados em solução oleosa, suspensão ou forma sólida, porque misturam-se mais prontamente à fase aquosa no local da absorção. A velocidade de dissolução pode ser um fator limitador da absorção dos fármacos administrados em formas farmacêuticas sólidas, pois a solubilização no meio de absorção é condição essencial para a ocorrência do processo. A molécula de um fármaco deve ter hidrossolubilidade suficiente para se dissolver nos líquidos do local de absorção do organismo e lipossolubilidade para atravessar a bicamada lipídica das membranas celulares pôr difusão passiva. Podemos dizer que quanto maior a lipossolubilidade de um fármaco melhor será seu processo de absorção, desde que ele esteja dissolvido no meio de absorção. Vários fatores podem alterar o grau de solubilidade de um fármaco em seu local de absorção e, indiretamente, podem afetar este processo: 32 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo - pH no local de absorção Trata-se de fator dos mais relevantes quando se consideram fármacos de característica ácida ou básica. Neste caso, um fármaco de característica ácida terá a sua absorção facilitada em um meio com pH ácido, devido a predominância da sua forma lipossolúvel,e a sua absorção será mais dificil em um pH básico pela predominância da sua forma hidrossolúvel. Um fármaco de característica básica em um meio de pH ácido terá sua absorção dificultada, devido a formação de formas hidrossolúveis deste fármaco, entretanto nem pH básico, onde predomina a sua forma lipossolúvel, terá a sua absorção facilitada. Como exemplo podemos citar o fármaco ácido acetilsalicílico (AAS) ingerido por um paciente pela via oral. A característica deste fármaco é ácida, o pH do estômago é de 1-3 e do duodeno 5-7. Este fármaco chegando no estômago prevalecerá na sua forma lipossolúvel (ácido em meio ácido), o que facilitaria a sua absorção. E no intestino prevalecerá na sua forma hidrossolúvel (ácido em meio básico), o que dificultaria a sua absorção, se considerarmos somente o pH. Se este paciente administrar este fármaco juntamente com um líquido ácido (suco de laranja, limão, refrigerantes, etc) observaremos um aumento na absorção deste fármaco devido ao líquido acidificar o trato gastrointestinal. Neste sentido, se adiministrar uma anfetamina (característica básica) pela via oral a sua forma lipossolúvel prevalecerá no intestino. E, se adiministrada juntamente com líquido ácido, a sua absorção ficará diminuída, devido a prevalência da sua forma hidrossolúvel. Baseando-se no exposto acima, podemos concluir que qualquer alteração que ocorra no pH do meio onde haverá a absorção de um fármaco, pode interferir no processo de absorção deste, para mais ou para menos, dependendo da característica do fármaco. - Tamanho das partículas do fármaco Fármacos administrados na forma de partículas de tamanho reduzido, em geral, dispersam-se mais rapidamente por toda a superfície de contato para absorção, o que favorece a velocidade de dissolução e consequentemente o processo de absorção do fármaco, especialmente se este é limitado pela dissolução. - Modificações na forma química Modificações na forma química dos fármacos podem influir em sua dissolução e, consequentemente, no processo de absorção. Formação de sais a partir de um fármaco, normalmente aumenta a solubilidade do mesmo. Sais sódicos e potássicos de ácidos orgânicos fracos e cloridratos de bases orgânicas fracas dissolvem-se muito mais facilmente que as respectivas bases e ácidos livres. Por 33 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo exemplo, o fenobarbital sódico possui velocidade de absorção aproximadamente 800 vezes maior que a do fenobarbital puro. A formação de éster, éteres e amidas com determinados fármacos pode modificar a solubilidade dos mesmos, sem interferir em suas propriedades farmacológicas, o que aumenta suas possibilidades de aplicação. Além de melhorar a solubilidade da substância, estas transformações podem também melhorar sua estabilidade, caracteres organolépticos e prolongar sua ação. - Forma Farmacêutica A presença de adjuvantes nas diferentes formas farmacêuticas que veiculam as substâncias ativas, podem interferir na dissolução da mesma consequentemente em sua absorção. Diluentes, desintegrantes, aglutinantes, estabilizantes, lubrificantes, são exemplos destes adjuvantes. Nas formas farmacêuticas de uso oral tem-se a seguinte ordem de liberação da substância ativa para absorção: Solução - Xarope - Suspensão - Pó - Cápsula - Comprimidos - Drágeas Ainda em relação às formas farmacêuticas de uso oral, as mais comumente usadas, devemos salientar também a diferença entre as sólidas (comprimidos, por exemplo) e as líquidas, no que se refere à etapa de desintegração, como visualizado no esquema abaixo: Comprimidos - Desintegração / Dissolução / Absorção Solução - Dissolução / Absorção 2- Concentração do fármaco A concentração do fármaco em seu local de absorção influencia diretamente sua velocidade de absorção. Fármacos administrados em soluções altamente concentradas são absorvidos mais rapidamente do que aqueles administrados em soluções de baixa concentração. 3- Estabilidade Química O fármaco deve ser estável no líquido do local de absorção para que esta ocorra sem problemas. Ex.: uma substância que não resista a pH ácido (1-2) não poderá ser administrada via oral, pois antes da absorção ela se desintegrará, exemplos: insulina e penicilina G. 4- Peso Molecular (PM) Peso molecular influi no tamanho e volume da molécula do fármaco, os quais devem ser compatíveis com a membrana a ser atravessada. 34 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Moléculas grandes e volumosas tem sempre dificuldade de atravessar membranas biológicas. 5- Grau de ionização do fármaco: Como já foi discutido, o grau de lipossolubilidade ou hidrossolubilidade do fármaco é um importante fator interferente no processo de transporte através de membranas e consequentemente no processo de absorção, principalmente ao considerar-se a via de administração oral. De uma forma geral podemos dizer que, uma vez lipossoluvel no local de absorção, o fármaco será melhor absorvido. Para qualquer eletrólito fraco a fração ionizada (hidrossolúvel) é responsável pela difusão através dos meios aquosos (plasma, líquido intersticial, meio intracelular). Já a fração não ionizada (lipossolúvel), é a responsável pela difusão nos meios lipídicos. De tudo isto desprende a importância da característica do fármaco, pois é o que orienta, aliado ao pH do meio em que o fármaco se encontra, seu grau de ionização, ou seja, quanto este se apresenta na forma ionizada ou molecular, consequentemente mais ou menos lipossolúvel. Através destas características é possível o reconhecimento de seu perfil farmacocinético, processos de absorção, distribuição, biotransformação e excreção. C. Ligados ao indivíduo (paciente) A variabilidade biológica é um fator interferente da absorção e, consequentemente no efeito terapêutico dos fármacos; "ela desafia a mais precisa previsão físico-química". Para os fármacos administrados por via oral, em formas farmacêuticas sólidas, como os comprimidos, podem ser citados fatores fisiológicos ligados ao trato gastrointestinal que influenciam no processo de absorção de fármacos. 1- Efeito de líquidos lumiais - pH: interfere no grau de ionização - Muco: A mucina, mucopolisacarídeo que protege o epitélio, pode atuar como barreira para absorção de certos fármacos, geralmente catiônicos, originando compostos de elevado peso molecular não absorvíveis. 35 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo - Presença de sais biliares: Com seus componentes tensoativos e solubilizantes, podem acelerar a dissolução de fármacos e, consequentemente, o processo de absorção. - Enzimas e proteínas: Podem interagir com fármacos diminuindo sua atividade - Viscosidade dos fluidos digestivos: Se elevada, influencia negativamente dificultando a dissolução e consequentemente a absorção. 2- Tempo de trânsito intestinal - Esvaziamento gástrico: O aumento da motilidade intestinal diminui o tempo disponível para absorção do fármaco. Apesar da teoria de partição, a maioria dos fármacos são absorvidos no intestino, devido ao maior tempo de permanência do fármaco neste órgão, em comparação ao estômago e, principalmente devido a ampla superfície de absorção deste órgão que é, aproximadamente, 200 vezes maior que a do estômago; ácidos fracos, são absorvidos na primeira porção do intestino onde o pH é de aproximadamente 4,5-5,0. O ritmo de esvaziamento gástrico pode ser alterado por: nervosismo, hiperacidez, tipo de alimento presente e presença de outros fármacos. - Alimentos: Podem formar complexos insolúveis com a substância ativa, o que diminuiriasua absorção. Normalmente a presença de alimentos dificulta a desintegração de formas farmacêuticas sólidas, diminuindo a velocidade de dissolução e influenciando o processo de absorção (diminuindo a velocidade). - Repouso no leito e exercício: Diminui e aumenta o tempo de trânsito intestinal, respectivamente. 36 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo “Nesta aula seguimos analisando os processos farmacocinéticos, abordando o processo da Distribuição do fármaco pelo organismo. ” AULA 06 DISTRIBUIÇÃO Depois de absorvido ou introduzido na corrente sangüínea o fármaco pode distribuir-se para os líquidos intersticial e celular. Os padrões de distribuição de um fármaco, refletem alguns fatores fisiológicos, como fluxo sangüíneo tecidual e características da membrana de transporte, bem como de suas propriedades físico-químicas. O termo distribuição se refere à transferência reversível do fármaco de um local a outro dentro do organismo. Informações precisas da distribuição de um fármaco requer seu doseamento em nível dos diferentes tecidos. Estes dados tem sido obtidos em animais, mas são difíceis de se obter em humanos. Desta forma, a maioria dos dados sobre velocidade e extensão da distribuição de fármacos em humanos, tem sido derivada de observações das variações da concentração destes no soro ou plasma. Quando as características do fármaco propiciam sua fácil passagem através da membrana endotelial, a velocidade de distribuição depende da taxa de perfusão. Assim os fármacos se distribuem mais rapidamente em tecidos altamente perfundidos, como o pulmão; o contrário ocorre nos de baixa perfusão, como o músculo em repouso. Se características do fármaco, como polaridade e grande peso molecular, dificultam seu transporte através da membrana celular, a velocidade de distribuição é limitada pela taxa de difusão. A distribuição também pode ser limitada pela ligação do fármaco às proteínas plasmáticas, em especial à albumina. Uma vez que as proteínas não passam através das paredes capilares, a ligação do fármaco às proteínas pode retê-lo no espaço vascular por um determinado tempo. A fração do fármaco não ligado é que atravessará as membranas tornando-se disponível para interações com receptores, ou seja, é ela que exercerá o efeito farmacológico, bem como ser biotransformada e excretada. Esta fração é chamada de fração farmacologicamente ativa. Já a fração ligada é considerada farmacologicamente inerte. Uma substância ativa extensa e fortemente ligada à estas proteínas tem pouco acesso a locais de ação intracelulares e pode ser lentamente biotransformada e excretada. 37 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Os fármacos podem acumular-se nos tecidos em concentrações maiores que as esperadas a partir do equilíbrio estável de difusão, como resultado dos gradientes de pH, da ligação a componentes intracelulares ou da distribuição nos lipídeos. O acumulo de um fármaco em determinado tecido, pode atuar como um reservatório que prolonga sua ação nesse mesmo tecido e em um local distante atingido pela circulação. Ligação à proteínas plasmáticas Fármacos ao alcançarem a circulação sangüínea podem se ligar, em diferentes proporções (frações) às proteínas plasmáticas (Fig. 1). Essa ligação é uma medida da afinidade do fármaco pelas proteínas do plasma, especialmente pela albumina. Legenda: = proteína plasmática = molécula de fármaco na corrente sanguinea Fig. 1– Ligação de fármacos às proteínas plasmáticas na corrente sanguinea. ABSORÇÃO Local de administração do fármaco tecidos ELIMINAÇÃO (Metabolização ou Excreção) Local de ação EFEITO NOS RECEPTORES DISTRIBUIÇÃO REABSORÇÃO 38 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo A fração (porcentagem) do fármaco que está ligada a proteína plasmática depende da afinidade química de cada um, podendo ser de 1% - 99%. Assim, podemos ter fármacos de 5% de ligação á proteína, enquanto outro fármaco poderá ligar-se 98%. A fração do fármaco não ligado (livre) é que atravessará as membranas tornando-se disponível para distribuição pelos tecidos, metabolização, excreção e interações com receptores, ou seja, é ela que exercerá o efeito farmacológico sendo, assim, chamada de fração farmacologicamente ativa. Já a fração ligada é considerada farmacologicamente inerte, já que esta porção do fármaco ligada a proteína plasmática fica impossibilitada de sair do vaso sanguineo e ligar-se a qualquer receptor ou enzimas para ser metabolizada ou excretada. Porém, a interação do fármaco com a proteína plasmática é um processo rapidamente reversível e, à medida que o fármaco livre difunde-se dos capilares para os tecidos, mais fármaco ligado desliga-se da proteína até que seja alcançado um equilíbrio, onde há concentrações relativamente constantes de forma ligada e não ligada. É uma interação dinâmica, em que complexos continuamente se formam e se desfazem. A fração ligada do fármaco age como um reservatório temporário na corrente sangüínea retardando a chegada de fármacos aos órgãos alvo e sítios de eliminação. Portanto, quanto maior a quantidade fármaco ligado a proteina plasmatica menor será a sua eliminação e, portanto, mais tempo ficará circulando na corrente sanguinea. FATORES QUE ALTERAM A DISTRIBUIÇÃO DE UM FÁRMACO 1- Competição pelas proteínas plasmáticas Fármacos podem competir entre si pelos sítios de ligação protéica, sendo deslocado o que tem menor afinidade pelos mesmos, ficando, consequentemente, com a fração livre aumentada no plasma. Estes mecanismos resultam num aumento da fração livre do fármaco deslocado. Assim, o deslocamento de 1% da ligação protéica de um fármaco que liga-se 99% à proteína, terá duplicada a percentagem da fração livre, farmacologicamente ativa, podendo por isso ocorrer um aumento de sua atividade farmacológica. Em geral, podemos dizer que a importância quantitativa e clínica do deslocamento das proteínas plasmáticas depende da quantidade total de fármaco ligado à proteína. Além disso, temos que analisar o grau de eliminação do fármaco para saber se este fármaco terá seu efeito aumentado, pois aumentando a fração livre aumentaremos também a eliminação deste na corrente sanguinea, ou seja, se a eliminação for a suficiente para eliminar o aumento da fração livre do fármaco, não ocorrerá aumento do efeito, entretanto, se aumentar a fração livre numa proporção em que a eliminação não for a suficiente, esta fração livre 39 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo aumentada permanecerá na corrente sanguinea e chegará ao seu local de ação, aumentando a intensidade do seu efeito. 2- Patologias A relação entre fração livre/ligada pode ser influenciada por situações onde ocorre variações nas concentrações das proteínas plasmáticas, podemos citar as situações de hipoalbuminemia por insuficiência hepática, síndrome nefrótica e desnutrição grave, onde, muitas vezes por menor capacidade de produção de proteínas ou pela sua eliminação intensa, a fração livre dos fármacos torna-se maior, consequentemente o efeito do fármaco será mais intenso tambem. 3- Gestação Nas gestantes ocorre um quadro chamado de hipoalbuminemia dilucional, o qual é causado pela retenção hídrica. Desta forma, a quantidade de proteínas está diminuída devido ao aumento de água na corrente sanguinea, provocando uma diluição na concentração das proteínas. Devido a este quadro, a fração livre dos fármacos encontra-seaumentada, o que pode aumentar o efeito dos fármacos administrados. 4- Barreira hematoencefálica O conceito de barreira hematoencefálica foi introduzido por Paul Ehrlich para explicar a sua observação de que um corante injetado por via endovenosa corava a maioria dos tecidos, enquanto o sistema nervoso central (SNC) permanecia sem cor. A barreira consiste numa camada contínua de células endoteliais unidas por zonas de oclusão. Além disso, essa camada de células não possui transportadores de membrana e nem canais iônicos. Consequentemente esta área é inacessível a muitas drogas de ação sistêmica cuja lipossolubilidade é insuficiente para permitir sua penetração na barreira hematoencefálica, ou seja, fármacos hidrossolúveis não conseguem atravessá-la.. Neste sentido, os fármacos destinados a atuar no SNC devem ser pequenos o suficiente e lipossolúveis para atravessar facilmente a barreira. Os fármacos hidrossolúveis são incapazes de penetrar no SNC. 5- Obesidade Os fármacos com característica lipossolúvel tem a capacidade de acumular-se no tecido adiposo fazendo com que este tecido torne-se um depósito de fármaco. Quanto maior a área de tecido adiposo o individuo possuir, maior será a distribuição deste fármaco. 40 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Assim, se o indivíduo é obeso e, administra um fármaco de característica lipossolúvel, este irá se distribuir mais intensamente neste tecido, diminuindo a sua concentração na corrente sanguinea. Neste sentido, individuos obesos devem receber dosagens de fármacos lipossolúveis maiores quando comparadas às dosagens administradas em indivíduos considerados de peso normal (70 kg), pois devemos levar em consideração a alta distribuição deste tipo de fármaco nos obesos, a qual fará com que uma quantidade menor permaneça circulante na corrente sanguinea e chegue ao seu local de ação. Além disso, o efeito dos fármacos lipossolúveis no obeso tende a apresentar um tempo maior. Isso acontece devido a reabsorção que acontece desta maior quantidade de fármaco armazenada no tecido adiposo, conforme vai acontecendo esta reabsorção, uma quantidade ainda suficiente de fármaco permanece circulante, podendo manter o efeito por mais tempo. Enquanto que, se este individuo emagrece rapidamente, a quantidade de fármaco que estava armazenado no tecido adiposo retorna para a corrente sanguinea, aumentando a sua concentração e podendo aumentar o efeito. 41 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo “Iniciaremos o estudo dos processos de eliminação de um fármaco no organismo. Estes processos podem ser a biotransformação e a excreção. Nesta aula veremos os fatores que alteram a biotransformação de um fármaco.” AULA 07 ELIMINAÇÃO DE FÁRMACOS Os fármacos são reconhecidos como substâncias estranhas ao organismo, portanto, ao mesmo tempo, que estão exercendo as suas ações, estes já estão sendo eliminados. Os principais processos que determinam o fim de efeito dos fármacos são biotransformação hepática, também chamada de metabolização, e a excreção renal. Excluindo-se o pulmão, os órgãos excretores eliminam os compostos hidrossolúveis mais eficientemente que as substâncias com alta lipossolubilidade, assim os fármacos lipossolúveis não são prontamente eliminados até serem biotransformados em compostos mais polarizados. A biotransformação contribui muito para eliminação final de fármacos do organismo, ou seja, eliminados pela excreção. Poucas substâncias ativas são eliminadas quase totalmente inalteradas pelos rins. Alguns fármacos são excretados via bile; outros particularmente substâncias voláteis, são excretados com a expiração. Contudo, para maioria dos fármacos a excreção é feita via renal. BIOTRANSFORMAÇÃO OU METABOLIZAÇÃO A biotransformação submete o fármaco a reações químicas, geralmente mediadas por enzimas, que o converte em um composto diferente do originalmente administrado (metabólito). Fármaco original Metabólito As reações mais comuns da biotransformação de fármacos são oxidação, redução, hidrólise, conjugação e acetilação. Freqüentemente, a mesma substância pode sofrer biotransformação por diversas vias competitivas; a fração de formação de cada um dos metabólitos é dependente da velocidade relativa de cada uma destas vias. Um metabólito pode, por sua vez, também sofrer Enzimas 42 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo biotransformação; por exemplo, oxidação, redução e hidrólise são freqüentemente seguidas de uma reação de conjugação. Estas reações ocorrem em série e são ditas seqüenciais; didaticamente, as reações de oxidação, redução e hidrólise, são classificadas como de fase I as de conjugação e acetilação, como de fase II do processo de biotransformação. Geralmente, o fígado é o maior, e algumas vezes o único, sítio de biotransformação de fármacos; ocasionalmente o fármaco é biotransformado em outros tecidos como os rins, pele, pulmões, sangue e trato gastrintestinal. Várias destas reações ocorrem no retículo endoplasmático do fígado e de alguns outros tecidos; após homogeneização destes tecidos, o retículo endoplasmático é rompido, formando- se pequenas vesículas denominadas microssomas. Por esta razão, enzimas biotransformadoras do retículo endoplasmático são chamadas enzimas microssomais; desta forma a biotransformação de fármacos pode ser classificada como microssomal e não microssomal. Dentre as enzimas não microssomais que participam da biotransformação de fármacos podemos citar a diaminoxidase (DAO) e monoaminoxidase (MAO), ambas de origem mitocondrial e ligadas às membranas, que desaminam oxidativamente aminas primárias, aldeídos ou cetonas; e estearases solúveis presentes no plasma, que catalisam reações hidrolíticas. As principais enzimas microssomais responsáveis por oxidação e redução de fármacos pertencem à superfamília de enzimas do citocromo P450 (CYP). As principais enzimas deste sistema, as quais são responsáveis pela biotransformação dos fármacos são a CYP2E1 e CYP3A4. Entretanto, além destas existem dezenas de outros tipos de enzimas deste sistema. São várias as conseqüências da biotransformação de fármacos; ela é um mecanismo através do qual o organismo se desfaz de compostos estranhos e fármacos (xenobióticos = são compostos químicos estranhos a um organismo ou sistema biológico); consiste em carregar eletricamente o fármaco para que, ao passar pelos túbulos renais, não seja reabsorvido, ou ainda torná-lo polar, hidrossolúvel, capaz de ser excretado. Esse processo, em geral, inativa o fármaco, pois, além de modificar pontos fundamentais de sua estrutura, diminui a possibilidade de que chegue aos tecidos susceptíveis. A biotransformação de fármacos e outros xenobióticos em metabólitos mais hidrofílicos são, portanto, essenciais para o término de sua atividade biológica, bem como para sua eliminação. A biotransformação também pode ser um meio de produção de compostos ativos. São conhecidos inúmeros exemplos onde o fármaco administrado (denominado "pró-fármaco") é um produto inativo, o qual é, in vivo, convertido na forma farmacologicamente ativa. Freqüentemente, a biotransformação pode também originar metabólitos ativos. A duração e a intensidade da resposta variam com o tempo de duração destas substâncias no organismo. 43 Profa. Ana Paula Natalini de Araujo Assim, para a terapêutica é de extrema importância tanto a farmacocinética dos compostos administrados, quanto a de seus metabólitos
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