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Definição, Epidemiologia, Fatores de Risco e Patogênese Pontos principais: A DPOC é uma doença frequente, prevenível e tratável, heterogênea em sua apresentação clínica e evolução, caracterizada por obstrução ao fluxo de ar, persistente e geralmente progressiva. A espirometria é essencial para confirmar o diagnóstico. O estudo epidemiológico PLATINO forneceu dados sobre a prevalência da DPOC no Brasil. É grande a prevalência de subdiagnóstico (64%) e também de erros de diagnóstico (64%) relacionados a vários fatores, principalmente à baixa utilização de espirometria (20%). Definição A DPOC é uma doença frequente, prevenível e tratável, heterogênea em sua apresentação clínica e evolução.É caracterizada pela limitação crônica e persistente ao fluxo de ar e geralmente progressiva, associada a uma reação inflamatória pulmonar causada principalmente pela exposição à fumaça de tabaco, exposição ocupacional e combustão de biomassa. O conceito da DPOC como doença inexoravelmente progressiva está mudando, pois o declínio da função pulmonar não acontece em todos os pacientes(7-9). Para o diagnóstico da doença é essencial a realização da espirometria que permitirá confirmar a obstrução ao fluxo de ar através do resultado da relação entreo volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) e a capacidadevitalforçada (CVF)inferior a 0,70após o uso de broncodilatador inalatório(VEF1/CVF<0,70 pós- BD). É uma doença heterogêneaem sua apresentaçãoe evolução, e pode ou nãoser acompanhada de sintomascomo dispneia, tosse e expectoração,exacerbações, manifestações extra-pulmonares e comorbidades (1,2,10). Epidemiologia A DPOC é uma das principais causas de morbidade e mortalidade, com impacto sócio-econômico significativo e constitui um problema prioritário de saúde pública,sendoreconhecida como a terceira principal causa de morte no mundo (11,12). Tem sido postulado que dentre as doenças crônicas não transmissíveis, a DPOC é a única cuja morbi-mortalidade mantém aumento constante (13,14). No entanto, estudos recentes indicam que as taxas de mortalidade têm aumentado a um ritmo mais lento ou até mesmo diminuindo, especialmente entre homens (15-18). Dados de estudos epidemiológicos de diferentes regiões permitirem estimar a prevalência global da DPOC em 10% (19-23). As estimativas mostram considerável variabilidade entre as regiões, sugerindo que fatores de risco podem afetar as populações de forma distinta. O estudo epidemiológico, Projeto Latinoamericano de Pesquisa em Obstrução Pulmonar (PLATINO), forneceu informações sobre a prevalência da DPOC na América Latina e no Brasil (Figura 1) (24). OPLATINOavaliou a prevalência da DPOC em indivíduos ≥40 anos, tendo sido realizado em cinco cidades da América Latina: Cidade do México (México), São Paulo (Brasil), Montevidéu (Uruguai), Santiago (Chile) e Caracas (Venezuela). Usando o critério de diagnóstico do VEF1/CVF<0,70 pós-BD, aprevalência da DPOC no Brasil foi de 15,8% (variando de 7,8% na Cidade do México até 19,7% em Montevidéu) (24) .Usando o critério do limite inferior da normalidade (LIN) da razão VEF1 /CVF pós-BD,a prevalência da DPOC no Projeto PLATINOfoi de 11,7%.(26).Na Região Metropolitana de São Paulo o subdiagnóstico foi de 87,5% (Nascimento OA, Camelier A, Rosa FW, Menezes AM, Pérez-Padilla R, Jardim JR; Latin American Project for the Investigation of Obstructive Lung Disease (PLATINO) Group. Chronic obstructive pulmonary disease is underdiagnosed and undertreated in São Paulo (Brazil): results of the PLATINO study.Braz J Med Biol Res. 2007 Jul;40(7):887-95.). Apenas 20% dos indivíduos pesquisados no PLATINO haviam sido submetidos a espirometria em algum momento de suas vidas (27). Em outro estudo realizado com pessoas que procuravam unidades de saúde da região metropolitana de Goiânia (GO), entre aqueles com exposição ao tabagismo e/ou combustão de biomassa foi identificado DPOC em 31,5%; adicionalmente, 71,4% não sabiam do diagnóstico. (Queiroz MC, Moreira MA, Rabahi MF. Underdiagnosis of COPD at primary health care clinics in the city of Aparecida de Goiânia, Brazil.J Bras Pneumol. 2012 Nov-Dec;38(6):692-9.) Fatores de risco Pontos principais: Os principais fatores de risco são o tabagismo, a exposição ocupacional e a combustão de biomassa. Tabagismo O principal fator de risco para a DPOC é o consumo de tabaco. De acordo com levantamento doVigitel em 2013 (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), inquérito promovido pelo Ministério da Saúde do Brasil anualmente, a parcela da população brasileira fumante acima de 18 anos caiu 28 % nos últimos oito anos. A prevalência em 2015 foi de 10,5% de fumantes, enquanto em 2006 o índice era de 15,7%. A frequência permanece maior entre os homens (14,4%) do que em mulheres (8,6%). O percentual de fumantes passivos no domicílio passou de 12,7% em 2009 para 10,2% em 2015, e no local de trabalho passou de 12,1% para 9,8%%. (portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/.../Lancamento-Vigitel-28-04-ok.pdf) Sabe- se que o risco para a DPOC é dependente da carga tabagística. Pergunta: Há outros fatores de risco inalados que sejam diferentes ao da fumaça do cigarro relacionada com o desenvolvimento da DPOC? Resposta: Embora o consumo de tabaco seja o principal fator de risco para a DPOC, há um número significativo de casos que não podem ser atribuídos a essa exposição. Outros fatores de risco como a exposição à combustão de biomassa, poeiras ocupacionais, gases e poluição do ar têm sido associados à patogênese da doença. No entanto, o debate sobre a influência e importância desses fatores persiste. Seleção da busca bibliográfica: Foram analisadas 158 referências (MeSh: 114; Tripdatabase: 44) sendo 18 delas selecionadas (2 revisões sistemáticas, 3 estudos diagnósticos, 3 estudos de caso-controle e 13 estudos de coorte) Resumo da evidência: Em cerca de 50% dos lares em todo o mundo e em 90% das áreas rurais,a combustão de biomassaé utilizada como a principal fonte de energia doméstica. Os resultados de uma meta-análise indicam que, em geral, as pessoas expostas à fumaça de biomassa tem 2,44 vezes mais chance (IC 95%: 1,9-3,33) de desenvolver DPOC em comparação com não expostos (30). Esta exposição foi identificada como fator de risco para homens e mulheres (30). Estudos latino- americanos confirmam esta relação, indicando que os sintomas respiratórios ocorrem a partir de exposição à fumaça de biomassa a partir de 100 horas/ano e limitaçãoao fluxo de ar a partir de 200 horas/ano, ou> 10 anos de exposição (31). Estudo realizado em Goiânia demonstrou que mulheres com DPOC, não fumantes e que apresentavam história de exposição àfumaça de fogão a lenha apresentavam alterações na tomografia de tórax como espessamento das paredes brônquicas, bronquiectasias, perfusão em mosaico, bandas parenquimatosas, padrão de árvore em brotamento e atelectasias laminares; a extensão das alterações apresentavam associação positiva com tempo de exposição à fumaça. (Moreira MA, Barbosa MA, Queiroz MC, Teixeira KI, Torres PP, Santana Júnior PJ, Montadon Júnior ME, Jardim JR. Pulmonary changes on HRCT scans in nonsmoking females with COPD due to wood smoke exposure. J BrasPneumol. 2013 Mar-Apr;39(2):155-63.) Existem informações limitadas sobre a relação entre poluição do ar e o desenvolvimento da DPOC. Estudos existentes sugerem a associação entre a poluição ambiental e a perda da função pulmonar (32,33), a redução dos sintomas com a diminuição da exposição às partículas ambientais(34) e entre o aumento de internações hospitalares com o aumento dos níveis de poluição (35-38). Não existem dados suficientes para inferir uma relação causal entre a exposição ocupacional e o desenvolvimento da DPOC. Este risco tem sido demonstrado em mineradores de carvão,trabalhadores em escavações em rocha, produtores de concreto, trabalhadores do agronegócio e expostos a agentes químicos (39-41).No entanto, não está claro o percentual de indivíduos expostos que desenvolvem a doença. Tem sido sugerido que a exposição passiva ao tabaco esteja associada com risco aumentado da DPOC. Os resultados de um estudo transversal indicam que a exposição durante mais de 20 horas por semana aumentou em 1,18 vezes a possibilidade de risco da DPOC (IC 95%: 1,0-1,4) (42). Conclusões e recomendações Existem outros fatores de riscode substâncias inaladas para desenvolver DPOC diferentes da fumaça do tabaco, com várias evidências para sugerir a associação da DPOC com a exposiçãoocupacional e biomassa, com FORTE recomendação para explorar clínica e epidemiologicamente os fatores de risco diferentes ao tabaco. Histórico de tuberculose Dados dos estudos PLATINO mostram maior prevalência da DPOC em indivíduos com história de tuberculose em comparação com aqueles sem história anterior (25,43). É desconhecido se a perda da função pulmonar relacionada à tuberculose é clinicamente semelhante à DPOC do fumante (44). Fatores genéticos Deficiência da α-1-antitripsina: A deficiência de α-1-antitripsina (AAT) é uma doença hereditária associada com baixos níveis da proteína AAT, o que leva a um desequilíbrio de protease-antiprotease e maior risco de desenvolver DPOC. A prevalência dos genótipos de AAT anormais associados com deficiência grave de AAT é maior entre as populações de risco, tais como pessoas com DPOC, que é estimado em cerca de 1-2% (45,46).No Brasil, estudo recente que avaliou a prevalência de deficiência de alfa 1 antitripsina (AAT) em pacientes com diagnóstico de DPOC mostrou deficiência intermediária a grave em 2,8% dos pacientes e deficiência grave (com fenótipo ZZ) em 0,8%. (Russo R e col. J Bras Pneumol. 2014;40:R1-R450 PE248) ... Outros fatores genéticos Outros fatores genéticos diferentes da deficiência da proteína AAT provavelmente influenciam na variação da função pulmonar especialmenteem pessoas não fumantes. Entretanto, os estudos atuais ainda não identificaram os fatores genéticos que aumentam o risco de desenvolver DPOC (47). Pergunta:A DPOC em mulheres tem características clínicas e epidemiológicas diferentes? Resposta:A prevalência da DPOC em mulheres está aumentando. Isto poderia ser explicado pelo aumento no consumo de tabaco e dificuldade em conseguir a abstinência entre as mulheres. Existem controvérsias sobre possíveis diferenças na expressão clínica da DPOC em mulheres referente ao impacto, características clínicas, progressão e mortalidade. Seleção da busca bibliográficas:Foram selecionadas 26 referências (MeSh: 4;Tripdatabase:22), sendo que 9 foram analisadas (6 estudos de coorte, 3 estudos de caso- controle) Resumo da evidência: Perante a mesma exposição à fumaça do tabaco, as mulheres são mais propensas a desenvolver DPOC em idade mais precoce, com maior comprometimento da função pulmonar (48,49). Estudos na população geral e selecionada, mostram que as mulheres com gravidade de obstrução semelhante aos homens apresentam maior grau de dispneia, ansiedade e depressão, menos enfisema na radiologia, pior qualidade de vida e menor sobrevida (50-56). Conclusões e recomendações As evidências indicam que existem diferenças na epidemiologia e expressão clínica da DPOC em mulheres. É importante considerar e identificar estas manifestações e desenvolver estratégias adequadas para seu controle, especialmente em casos de ansiedade e depressão. Patogenia Pontos principais: • A DPOC é uma doença inflamatória que afeta as vias aéreas, os alvéolos e acirculação pulmonar. • A inflamação crônica provoca espessamento da parede brônquica com redução do tamanho e destruição alveolar com aumento dos espaços aéreos e perda da arquitetura brônquica. • As consequências funcionais são a obstrução do fluxo de ar, colapso expiratório da árvore brônquica e perda da elasticidade pulmonar. • A obstrução da via aérea possuicomponentes irreversíveis e reversíveis, nos quais é possível a ação farmacológica. • A DPOC é provavelmente o resultado da interação de múltiplos genes, alguns dos quais podem interagir com os fatores de risco ambientais, principalmente o tabagismo. A DPOC é uma doença inflamatória que afeta as vias aéreas em todas as suas dimensões, alvéolos e circulação pulmonar. O principal local de comprometimento são os brônquiosde diâmetro inferior a 2 mm e o componente elástico dos pulmões (57). O danonestas estruturas é precocena evolução da doença e leva a todas as manifestações fisiológicas e clínicas no sistema respiratório.Ao mesmo tempo, e por diferentes mecanismos, que causam manifestações sistêmicas, efeitos extrapulmonares (58,59) são ativados. A Figura 2 mostra as inter-relações entre a inflamação e DPOC. Os mecanismos patogênicos mais bem estudados são causados pela fumaça do tabaco. As substâncias inaladas desencadeiam um processo inflamatório crônico persistente no tempo (60). A obstrução das vias aéreas possui componentes reversíveis e irreversíveis. A inflamação danifica o epitélio respiratório, estimulando as fibras nervosas expostas (fibras sensoriais C, receptores de adaptação rápida) liberando neurocininas. Este mecanismo aumenta o estímulo do nervo aferente vagal e,como consequência,ocorre a resposta do nervo eferente com broncoconstrição pelo aumento do tônus broncomotor (61). Este é o principal componente reversível da obstrução ao fluxo de ar e pode ser tratado farmacologicamente. Mecanismos dos reflexos vagais também aumentam a secreção de muco que contribui para a obstrução brônquica (62). Tanto a resposta constritora do músculo liso, como a hipersecreção brônquica são reguladas pelo receptor muscarínico M3. A estimulação dos receptores muscarínicos atua sinergicamente com o fator de crescimento epitelial (EGF) na ativação de células muco secretoras. O mecanismo de secreção aumentado de acetilcolina pode intervir na hipertrofia e hiperplasia de células caliciformes e glândulas submucosas contribuindo para o remodelamento das paredes brônquicas (63). Estas mudanças estruturais são permanentes e difícilmente reversíveis. O resultado final da inflamação crônica é o espessamento da parede brônquica com a diminuição do calibre, destruição alveolar com aumento dos espaços aéreos e perda da arquitetura pulmonar. As consequências funcionais são a obstrução ao fluxo de ar, colapso expiratório da árvore brônquica e perda da elasticidade pulmonar. A inflamação é um mecanismo ativo e progressivo, com picos de aumento durante as exacerbações. A desativação deste mecanismo é mais difícil à medida que a doença progride e os danos estruturais (64) estejam estabelecidos. O efeito da cessação do tabagismo é mais eficaz nas fases iniciais da doença (65- 67). Pacientes com DPOC apresentam evidências de inflamação sistêmica, com aumento de citocinas no sangue (IL-8, IL-6, fator de necrose tumoral alfa, IL- 1β), quimiocinas (CXCL8), proteínas de fase aguda (proteína C-reactiva ), neutrófilos, monócitos e linfócitos (59,68,69). Não está bem estabelecida a relação entre essasalterações com os efeitos extra-pulmonares. Embora haja clara evidência da contribuição genética para a patogênese da DPOC, poucos genes relacionados à doença foram identificados até recentemente. A maior parte dos estudos realizados até há poucos anos teve uma amostra muito pequena para detectar, com precisão adequada, genes que pudessem ser implicados de maneira significativa com a doença. A DPOC é provavelmente o resultado da interação de múltiplos genes, alguns dos quais podem interagir com os fatores de risco ambientais, principalmente o tabagismo. Na DPOC, o estudo mais importante dedicado a desvendar os aspectos genéticos relacionados à patogenia da doença é o COPDGene Study que encontra-se em andamento desde 2010. O estudo foi delineado para identificar os fatores genéticos na DPOC, para definir e caracterizar os fenótipos relacionados à doença e para acessar a associação existente entre estes dois componentes. (Reagan AR.Genetic Epidemiology of COPD (COPDGene) Study Design.COPD: J COPD 2010; 7:32-43 ) Do ponto de vista prático, oCOPDGene está em andamento, com os seguintes objetivos: 1-Definir associações genéticas com os fenótipos da DPOC 2-Caracterizar os fenótipos da doença através da definição dos: a-Aspectos fisiopatológicos b-Fatores que controlam a expressão da doença c-Fatores que influenciam a progressão da doença d-Fatores que influenciam as respostas à terapia O risco atribuível à população com história familiar para DPOC foi de 18,6%. O estudo concluiu que história familiar da DPOC é um forte fator de risco para o surgimento da DPOC, independentemente de história familiar de tabagismo, história pessoal de tabagismo ou exposição à fumaça do cigarro durante a infância. (Hersch CH.Family history is a risk factor for COPD. Chest 2012; 2:343350) O COPDGene, com sua grande população e foco nos aspectos clínicos, funcionais, radiológicos e genéticos propõe definir os subtipos da DPOC que podem refletir os efeitos de variantes genéticas específicas e, assim, esclarecer muitas dúvidas que ainda persistem com relação à patogenia da doença. Uma cuidadosa fenotipagem radiológica pode gerar biomarcadores de imagem e permitir a identificação precoce de grupos de alto risco. O diagnóstico precoce da doença, ainda assintomática, pode proporcionar estratégias de prevenção e tratamento para limitar a progressão da doença. As associações genéticas esperadas a partir dos estudos de varredura genética ampla na grande coorte do COPDGeneStudy podem revelar novas direções para definir a patogenia e os mecanismos da doença com o objetivo de prover oportunidades para a prevenção e o tratamento. (www.copdgene.org) Definição, Epidemiologia, Fatores de Risco e Patogênese Definição Epidemiologia Fatores de risco Tabagismo Conclusões e recomendações Histórico de tuberculose Fatores genéticos Outros fatores genéticos Conclusões e recomendações Patogenia
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