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Psicopatologia da impulsividade (1)

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c a p í t u l o 1
Psicopatologia da
impulsividade
Hermano Tavares
Gustavo Alarcão
A impulsividade é descrita como uma característica do com-
portamento marcada por reações rápidas e não planejadas, em
que a avaliação das conseqüências não é realizada, ou o é apenas
de forma parcial, focando-se preferencialmente em aspectos ime-
diatos em detrimento das conseqüências a longo prazo.
A impulsividade também pode ser compreendida como um
fenômeno dinâmico, um desequilíbrio entre as funções propelentes
e inibitórias do comportamento. Por vezes, impulsos e desejos não
apresentam alterações mórbidas, nem de intensidade, mas as ini-
bições são pobremente estruturadas, ocasionando perda de con-
trole periódica. Outras vezes se dá o contrário, os freios estão pre-
sentes, porém os impulsos são vividos de forma intensa e, de for-
ma recorrente, superam a inibição.
A impulsividade é classicamente descrita como um compo-
nente ou traço do temperamento, um componente hereditário e
temporalmente estável da personalidade, mas também pode ser
um fenômeno adquirido por lesão do sistema nervoso central. Na
clínica dos transtornos mentais, a impulsividade é o fenômeno cen-
tral dos transtornos do grupamento B do Eixo II da classificação
norte-americana (transtornos da personalidade e do desenvolvi-
20 Abreu, Tavares, Cordás & cols.
mento), composto pelos transtornos da personalidade anti-social,
borderline, histriônica e narcisista. Porém, como sintoma, verifica-
se também em transtornos psiquiátricos do Eixo I – transtornos
psiquiátricos primários, adquiridos ou não, como o transtorno ex-
plosivo intermitente, as dependências e o transtorno afetivo bipolar
(TAB). Sintomaticamente, os portadores desses diagnósticos apre-
sentam impulsividade elevada em medidas de auto-relato e em
avaliações objetivas a partir de testes e baterias neuropsicológicas
desenvolvidas para este fim. Em outras palavras, a impulsividade
ignora a divisão didática, porém artificial, entre os Eixos I e II,
atravessa diferentes categorias classificatórias e se estabelece como
um desafio real para o cuidado da saúde mental.
Os estudos sobre impulsividade cresceram geometricamente
na última década. Uma avaliação panorâmica dos mesmos mostra
que se trata de um fenômeno multifacetado e contínuo. Isto é, não
se pode falar de um tipo universal de impulsividade, mas de tipos
de impulsividade e de comportamentos impulsivos que se distri-
buem na população normal, variando em intensidade de indiví-
duo para indivíduo.
Perversões e parafilias talvez constituam uma exceção à re-
gra e representem uma alteração qualitativa dos impulsos pela elei-
ção de um objeto fixo e particular de desejo ou pela forma rígida e
estereotipada com que certos atos fora da norma social são condu-
zidos pelos indivíduos acometidos. Mas esses são quadros menos
freqüentes e que fogem ao escopo da presente obra. Neste e nos
próximos capítulos, trataremos de comportamentos corriqueiros
da vida cotidiana que, em alguns dos nossos pacientes, pelo de-
sequilíbrio dinâmico mencionado, escapam ao controle. A clínica
da impulsividade também é a clínica do excesso. Mesmo os com-
portamentos aparentemente estranhos, como a tricotilomania (ar-
rancar cabelos e pêlos sem controle), a dermatotilexomania (es-
carificação neurótica da pele) e outros comportamentos au-
tomutilatórios, são encontrados em formas mais brandas no nos-
so cotidiano, como nos rituais matinais em que examinamos a pró-
pria face na frente do espelho em busca de fios brancos para ar-
rancar ou cravos para espremer, ou nas formas ritualizadas e so-
cialmente aceitas de infligir lesões ao corpo, que vão do simples
brinco nas orelhas até o piercing.
Manual Clínico dos Transtornos do Controle dos Impulsos 21
NOMENCLATURA: IMPULSO,
INSTINTO E ATO VOLUNTÁRIO
Em 1913, examinando os fenômenos volitivos, Karl Jaspers
traça os seguintes limites entre impulso, instinto e ato voluntário:
“... o impulso primário, sem conteúdo e sem direção, o instinto
natural que tende inconscientemente a um fim e o ato de vontade
que produz representações conscientes de finalidade, com conhe-
cimento dos meios e das conseqüências”.
Alguns autores reservam o termo instinto para a descrição de
impulsos primários que visam a sobrevivência do indivíduo (fome,
sede, sono, etc.). Mas Jaspers não estabelece relação entre impul-
so, instinto e ato voluntário. Para ele, os três são forças indepen-
dentes que interagem por meio dos processos de ponderação ou
hesitação, desembocando em uma decisão – “quero” ou “não que-
ro”. Se um determinado comportamento não puder ser inibido,
ocasionando uma resolução enviesada, quase sempre em seu fa-
vor, ele será chamado de ato impulsivo.
Nobre de Melo (1979) divide esse processo decisório em qua-
tro fases:
• A fase de intenção ou propósito, quando tendências bási-
cas, impulsos, desejos e temores inconscientes exercem
sua influência inicial.
• A fase de deliberação, quando o sujeito faz a apreciação
das implicações de cada alternativa.
• A fase da decisão propriamente dita, que marca o início da
ação.
• A fase de execução, representada pelo processo dinâmico
de um conjunto de atos que são combinados para atingir
o objetivo escolhido.
Outros autores tratam os termos instinto e impulso como si-
nônimos, ou, como Freud, acreditam que os instintos são impulsos
primários e os outros impulsos são elaborações dos primeiros or-
ganizadas ao longo do desenvolvimento psíquico. Em 1915, Freud
destacou os seguintes componentes da resposta instintiva:
• A pressão: a essência do instinto é representada por sua energia.
22 Abreu, Tavares, Cordás & cols.
• A finalidade: segundo Freud, “a finalidade do instinto é
sempre a satisfação, que somente pode ser alcançada pela
supressão do estado de estimulação da fonte do instinto”,
em outras palavras, este sempre busca uma satisfação.
• O objeto: por meio do qual o instinto atinge satisfação.
• A fonte: o processo somático do qual se origina o instinto.
Posteriormente, Freud divide os impulsos em duas catego-
rias: instinto de vida (Eros) e instinto de morte (Tanatos). Ainda
hoje, essa classificação se mostra útil, porque verificamos que a
literatura moderna sobre o assunto ocupa-se principalmente de
dois fenômenos de impulsividade primária: a perda de controle
sobre apetites e desejos, de um lado, e a perda de controle sobre a
agressão e comportamentos destrutivos, de outro.
Completam o quadro dos comportamentos impulsivos estu-
dados aqueles que são determinados por falha de diferentes fun-
ções inibitórias, a saber a inibição mais primitiva determinada pe-
las emoções negativas básicas como medo, tristeza e nojo; a inibi-
ção ensejada por processos cognitivos como planejamento, ponde-
ração e deliberação; e a inibição mais elaborada e complexa dos
sentimentos afiliativos, que se assenta sobre os componentes ante-
riores (afeto e cognição), acrescida da função da empatia, que re-
dunda na aquisição de um código de valores para a condução do
convívio em sociedade.
A CLASSIFICAÇÃO DOS TRANSTORNOS DO IMPULSO
Em contraste com a crescente atenção que recebem, a im-
pulsividade e os transtornos do impulso estão entre os temas mais
mal tratados na atual classificação psiquiátrica. Alguns diagnósti-
cos, como a bulimia nervosa, o transtorno de déficit de atenção/
hiperatividade (TDAH), o TAB e o transtorno da personalidade
borderline (TPB), estão classificados separadamente em supra-
categorias distintas (transtornos da alimentação, transtornos do
humor, etc.), nas quais as questões pertinentes ao impulso são abor-
dadas na formulação diagnóstica, muitas vezes de forma margi-
nal. Simultaneamente, o DSM-IV contempla uma seção de trans-
Manual Clínico dos Transtornos do Controle dos Impulsos 23
tornos do controle dos impulsos não classificados em outro lugar.
A designaçãoé clara, é uma seção residual que agrega diagnósti-
cos que não puderam ser reunidos sob outra rubrica, portanto,
não estão agregados por uma semelhança psicopatológica, exceto
pela questão da impulsividade. Porém, se considerarmos a nature-
za multidimensional desta, é inevitável certa inquietação diante
da vizinhança forçada entre quadros tão díspares como a piromania
e o jogo patológico. Resumidamente, os diagnósticos que compõem
essa seção são:
• Transtorno explosivo intermitente: é caracterizado por epi-
sódios distintos de fracasso em resistir a impulsos agressi-
vos, resultando em sérias agressões ou destruição de pro-
priedades.
• Cleptomania: caracteriza-se por falha recorrente em resis-
tir a impulsos de roubar objetos desnecessários para o uso
pessoal ou insignificantes em termos de valor monetário.
• Piromania: é caracterizada por um padrão de comportamen-
to incendiário por prazer, gratificação ou alívio da tensão.
• Jogo patológico: caracteriza-se por um comportamento
mal-adaptativo, recorrente e persistente, relacionado a
jogos de azar e apostas.
• Tricotilomania: caracteriza-se pelo ato de puxar de forma
recorrente os próprios cabelos por prazer, gratificação ou
alívio da tensão, acarretando uma perda capilar percep-
tível.
• Transtorno do controle dos impulsos sem outra especificação:
trata-se de uma categoria residual, à qual são atualmente
relegadas síndromes que ainda aguardam validação –
oniomania (compras compulsivas), impulso sexual exces-
sivo, dermatotilexomania, automutilação recorrente e as
chamadas dependências de tecnologia, como dependên-
cia de internet e videogame.
A classificação que apresentaremos a seguir deve ser vista
como uma proposta integradora dos diferentes fenômenos impul-
sivos que observamos na clínica cotidiana. Começamos pelos fenô-
menos ocasionados por perda de inibição:
24 Abreu, Tavares, Cordás & cols.
1. por afetividade negativa reduzida, ou instabilidade
afetiva,
2. por déficits de atenção, planejamento e por disfunção
executiva e, finalmente,
3. por deficiência de empatia e por conduta anti-social.
Em seguida, passamos aos fenômenos em que a exacerbação
dos impulsos é primária:
4. a perda de controle sobre a agressividade e
5. a perda de controle sobre apetites e desejos.
Destemor, comportamento
aventureiro e instabilidade afetiva
O primeiro “freio” comportamental caracteriza-se por emo-
ções básicas de medo/ansiedade, tristeza e nojo. Isto é, o receio
ou a memória de uma conseqüência negativa suscitada por um
afeto negativo interrompe ou muda o curso original da ação. Al-
guns indivíduos apresentam afetos negativos reduzidos. São, por
natureza, relativamente refratários a ameaças, não se sentem
desconfortáveis na presença de um risco maior, como a maioria
das pessoas, e, por isso mesmo, são aptos a usufruírem melhor o
prazer propiciado por atividades perigosas. É o caso típico do
praticante de esportes radicais (automobilismo, montanhismo,
etc.). Contudo, essas não são apresentações patológicas de de-
sinibição comportamental. Em geral, nesses casos, a pouca ansie-
dade é compensada por um espírito crítico e habilidades cogni-
tivas compensatórias. Com efeito, a prática desses esportes requer
planejamento e articulação executiva. Porém, se tal capacidade de
planejamento e antecipação de conseqüências não está devida-
mente desenvolvida, ou não é suficiente para contrabalançar o
espírito aventureiro, pode-se observar dificuldade de adaptação
em graus variáveis. Em seguida, apresentamos dois casos ilus-
trativos.
Manual Clínico dos Transtornos do Controle dos Impulsos 25
� CASO CLÍNICO �
Júlio tem 47 anos e sempre gostou de praticar esportes. Na juventude,
apreciava o esqui aquático. Aos 22 anos, descobriu as corridas de kart.
Com o desenvolvimento profissional, pôde se dedicar a um novo hobby, o
motociclismo. Aos 30 anos, passou a participar de corridas em caráter
semiprofissional, correndo em algumas etapas do circuito nacional. Nas
corridas, sempre se destacou pelo arrojo, interpretado por alguns de seus
próprios colegas como franca imprudência. Ele sofreu alguns acidentes,
teve três fraturas, mas que não deixaram seqüelas motoras e nem arra-
nharam sua disposição de continuar correndo. Quando questionado pe-
los amigos, sempre respondia que todos morreriam um dia; portanto, se-
ria preferível partir fazendo o que se gosta. Então, houve um acidente
grave seguido de trauma crânio-encefálico. A recuperação de Júlio durou
um ano. Ele voltou às pistas contra todas as recomendações, pois as
lesões sofridas poderiam afetar suas habilidades visuo-espaciais. Ele,
contudo, negou-se a realizar exames mais acurados nesse sentido. O fim
da história, infelizmente, é trágico, Júlio teve um novo acidente e ficou
tetraplégico.
� CASO CLÍNICO �
Alzira tem 52 anos, é viúva e mãe de dois filhos que não moram mais
com ela. Alzira ficou triste quando perdeu o marido, há dois anos. Ela
não aparenta a idade que tem, é muito assediada e benquista em sua
vizinhança por ser afetiva e participar de todas as iniciativas beneficen-
tes da comunidade. No último ano ela teve muitos pretendentes, mas
decidiu que não se casará de novo. Relata que sempre teve comporta-
mento sexual desinibido para os padrões de sua geração, mas que se
continha por respeito ao marido. Atualmente, tem participado de ses-
sões de sexo grupal. Fez novos amigos com quem sai e, às vezes,
bebe em excesso. Já se viu em situações difíceis, como ter de dirigir
embriagada e ser vítima de assalto por se encontrar sozinha na rua de
madrugada. Porém, nada disso a desestimula, ela aprecia muito sua
nova vida e se preocupa apenas em preservar sua privacidade. Por
insistência do filho, aceitou procurar um médico, porque seu colesterol
subiu desde que passou a beber e a se alimentar mais fora de casa.
Não se incomodou em relatar ao médico sua vida privada, mas se mos-
tra completamente refratária a qualquer ponderação sobre os riscos de
suas opções. Ela alega que, até o momento, não teve conseqüências
negativas, e que prefere abreviar um pouco a vida, mas aproveitá-la
melhor, agora que pode.
26 Abreu, Tavares, Cordás & cols.
Há casos em que ambas as categorias de afetos estão presen-
tes, negativos e positivos, mas não há estabilidade. Nesses casos,
os afetos alternam-se rapidamente e, muitas vezes, são vividos de
forma intensa. Os afetos desempenham um papel estratégico na
organização do comportamento, pois reforçam ou inibem um im-
pulso, evocam memórias específicas de contextos anteriores simi-
lares ao presente e orientam o comportamento para algumas for-
mas de respostas preferenciais. Por exemplo, a visão de um pai
abusando emocionalmente de uma criança pode provocar raiva e
angústia em um observador. Ele se recorda de situações da própria
infância em que fora humilhado por outro adulto e logo reage,
repreendendo de modo veemente o pai. Certos indivíduos são ro-
tineiramente tomados por suas emoções, envolvendo-se em situa-
ções constrangedoras como a descrita e exibindo comportamento
errático em função da instabilidade e da alternância rápida de emo-
ções. O paradigma clínico desses casos é o TPB. Em seguida, des-
crevemos um caso.
� CASO CLÍNICO �
Lúcia tem 25 anos. Desde pequena, é descrita como expressiva, porém
caprichosa. Ela estabelece relacionamentos facilmente e os perde da
mesma forma. Por isso, quase não tem amizades de longa data. Ela so-
fre muito com essa condição e reage de forma intempestiva aos rompi-
mentos, tendo tentado suicídio duas vezes, uma aos 15 anos e outra aos
17 anos de idade, ambas causadas por términos de namoro. É admirada
por sua sensibilidade poética e, às vezes, discriminada por sua forma de
se vestir e de expressar opiniões originais. Lúcia tem dificuldades de re-
lacionamento com a mãe. Às vezes, no auge de sua angústia, após bri-
gas e discussões,ela se corta para aliviar a tensão. Já iniciou graduação
em Letras, que abandonou porque brigou com um professor. Fez dois
anos de Administração, namorou um colega de turma e abandonou o
curso quando o relacionamento acabou. Atualmente estuda Jornalismo.
Está em busca de ajuda profissional porque, em suas palavras: “dessa
vez quero acabar alguma coisa que comecei”.
Manual Clínico dos Transtornos do Controle dos Impulsos 27
Cognição e disfunção executiva
As funções cognitivas, em especial a atenção, a memória e o
planejamento, seguem aos afetos na função moduladora do com-
portamento. Elas estão envolvidas na identificação de estímulos,
no estabelecimento de hierarquia entre eles, na eleição e, final-
mente, na execução da ação. As ações planejadas são preferíveis
quando o contexto requer mais precisão do que velocidade de res-
posta. Elas se opõem às reações instintivas, que são súbitas e geral-
mente provocadas por estímulos específicos, por exemplo, a visão
de um animal feroz.
Nenhuma outra espécie impõe mudanças ao meio ambiente
de forma tão radical como o ser humano. Essas mudanças, em
geral, incorrem em redução do risco imediato de agressões do meio
e em uma crescente complexidade de estímulos e contextos. As-
sim, ao longo da história da civilização humana, tem-se mostrado
cada vez mais interessante inibir as reações instintivas, substituin-
do-as por ações planejadas, que se baseiam na memória de expe-
riências anteriores para escolha da resposta comportamental mais
desejável. Enquanto a ação é executada, seu curso e suas conse-
qüências imediatas e futuras são analisados em um processo de
retroalimentação que define a rota e garante o objetivo final.
Novamente, os indivíduos variam em relação ao grau de es-
pontaneidade, velocidade e elaboração de suas respostas e na pro-
porção em que expressam ações instintivas versus ações planeja-
das. Algumas pessoas se notabilizam por ser inteligentes, mas re-
correntemente fracassam em responder de forma adequada aos
desafios da vida por não conseguirem se organizar. O paradigma
clínico por excelência nesses casos é o do TDAH. Os sintomas de
TDAH manifestam-se na infância ou na adolescência. Com o pas-
sar dos anos, a hiperatividade e os sinais de inquietação motora
sofrem redução espontânea, mas a inabilidade para concentrar-se
no essencial e manter um curso estável de vida, assentado em es-
colhas coerentes, persiste e tem grande impacto negativo na vida
28 Abreu, Tavares, Cordás & cols.
� CASO CLÍNICO �
Nivaldo tem 35 anos. Ele abandonou a escola aos 15 anos porque “não
tinha paciência para ficar sentado escutando o professor falar”. Seu pai,
que era vendedor, levou-o para trabalhar com ele. Em pouco tempo, com
seu jeito espontâneo e divertido, Nivaldo cativou uma clientela própria
maior que a do pai. Aos 20 anos, foi trabalhar no Japão. Retornou um ano
depois e, com o dinheiro que ganhou, abriu uma padaria em sociedade
com o irmão. Aos 22 anos, sentindo-se angustiado com a rotina rigorosa
do seu negócio, vendeu sua parte para o irmão e foi trabalhar para um
amigo em uma empresa de pesquisa de opinião. A rotina dinâmica e o
trabalho externo o encantaram. Mais uma vez, Nivaldo cresceu rapida-
mente, sendo que, dessa vez, com o auxílio de uma nova parceira que
organizava sua agenda e seus compromissos, ele logrou grande suces-
so. Abriu um negócio próprio no ramo e casou-se com sua sócia. Hoje,
chefia uma equipe de cerca de 120 funcionários. Há um ano, teve um
filho com a esposa, e esta decidiu permanecer mais em casa. Os negóci-
os de Nivaldo se desorganizaram. Ele fechou contratos desvantajosos,
perdeu prazos e colocou a empresa em risco. Seus amigos e funcionári-
os se exasperam ao vê-lo ocupar-se de detalhes irrelevantes e negligen-
ciar por semanas as solicitações de clientes importantes. Ele já perdeu
repetidas vezes o celular e a agenda eletrônica, esquece os compromis-
sos e está sempre atrasado. Recentemente aceitou buscar ajuda, porque
está sendo pressionado por credores de dívidas que contraiu para man-
ter a empresa aberta.
dessas pessoas, as quais também apresentam, entre as caracterís-
ticas exteriores mais óbvias, o comportamento errático. Em segui-
da, relataremos um quadro típico.
As semelhanças fenomenológicas entre o caso de Lúcia (TPB)
e o de Nivaldo (TDAH do adulto) são marcantes. Ambos são
erráticos por excelência, necessitando de outros e de seu apoio
para sanar deficiências pessoais. Os relacionamentos ficam sobre-
carregados e algumas pessoas afastam-se. Por serem ambos de
natureza afetiva, sofrem com essa condição. A prática do diagnós-
tico diferencial do comportamento errático (se por instabilidade
do afeto ou da cognição) não é mero exercício teórico. Tal resolu-
ção redunda na eleição de práticas terapêuticas particulares para
cada caso e, na verdade, representa um dos maiores desafios da
clínica moderna dos transtornos mentais.
Manual Clínico dos Transtornos do Controle dos Impulsos 29
Frieza afetiva e conduta anti-social
O desejo de ser estimado e o medo da reprovação são, certa-
mente, moduladores importantes do comportamento com vistas a
uma melhor adaptação. Para isso, é importante ser capaz de reco-
nhecer os códigos de conduta social explícitos e implícitos, ou seja,
é preciso recorrer à empatia. Trata-se de um complexo de opera-
ções mentais que começam pela suposição do outro como seme-
lhante e passam por buscar entender, pela perspectiva alheia, quais
seriam as sensações, as emoções, o raciocínio e as respostas mais
prováveis. Em outras palavras, a empatia é composta pelas fun-
ções afetivas e cognitivas, acrescidas da função da projeção dessas
habilidades em outra pessoa. Sujeitos com deficiência empática
são providos de pouca emoção, logo, não conseguem supô-la nos
outros, ou não conseguem “ler” adequadamente sentimentos alheios
e ponderar sobre os efeitos de suas atitudes.
Ao descrever tais comportamentos, Hare (Harpur; Hart; Hare,
1994) enfatiza a necessidade de diferenciar a conduta anti-social
primária da secundária. Esta última seria o resultado de uma impul-
sividade extrema, calcada em casos de instabilidade como os já
descritos, acrescida de uma agressividade particularmente mar-
cante. O comportamento anti-social primário distingue-se pela
quase ausência de emoções positivas ou negativas. Esses indivíduos
foram descritos por Schneider (1948) como frios de alma, causando
estranheza no contato pessoal pelo distanciamento afetivo em rela-
ção ao interlocutor e, às vezes, ao próprio relato. São capazes de
descrever situações em que perpetraram atrocidades ou em que fo-
ram vítimas delas sem envolvimento emocional. Sua afetividade
pouco elaborada costuma lhes conferir uma expressividade um pouco
pueril, e seu traço biográfico mais importante é a ausência de laços
afetivos e de amizades significativas. O aprendizado pode ser preju-
dicado se o embotamento afetivo for extremo, pois a ausência de
emoções negativas inviabiliza o condicionamento pela punição, en-
quanto a ausência de afetos positivos reduz a suscetibilidade de
modulação do comportamento por reforço social ou por outra grati-
ficação. Contudo, se a afetividade não for inteiramente reduzida e
a deficiência empática for compensada por uma inteligência aci-
ma da média, trata-se de um indivíduo singular. Caso ele consiga
30 Abreu, Tavares, Cordás & cols.
coadunar seus objetivos com o de um grupo maior, será visto como
um líder destemido e um estrategista louvado pela resistência em
situações desesperadoras. Se seus interesses forem em direção con-
trária aos da sociedade, será um ardiloso contraventor. Para facili-
tar o exercício da diferenciação descrevemos a seguir dois casos,
respectivamente, de conduta anti-social secundária e primária.
� CASO CLÍNICO �
Fernando tem 32 anos. Desde pequeno, notabilizou-se pela independên-
cia em relaçãoaos seus tutores. Abandonou a escola aos 15 anos e
passava a maior parte do tempo com pessoas mais velhas e con-
traventores do bairro em que morava, em particular com o dono de uma
banca de jogo de bicho e o proprietário de um prostíbulo. Hoje, possui
seu próprio estabelecimento, onde explora drogas e prostituição. Preso
por porte de drogas, alegou ser dependente e buscou tratamento para
conseguir um atestado de que está sob seguimento terapêutico. Nunca
teve relacionamentos amorosos significativos, seus contatos são pessoas
com quem mantém relações primordialmente comerciais. Já teve dois
sócios e é suspeito de ter ordenado a execução de um deles.
� CASO CLÍNICO �
João tem 27 anos. Teve uma infância normal, mas, na adolescência, pas-
sou a apresentar problemas disciplinares crescentes, que culminaram em
expulsões sucessivas de três escolas. Aos 17 anos, abandonou os estu-
dos para tocar bateria em um grupo musical. Excursionou pelo interior e
envolveu-se com o tráfico de drogas em uma tentativa mal planejada de
financiar sua carreira musical. Foi preso e solto dois anos depois. Hoje
trabalha para uma firma de cobrança, mas sonha com a possibilidade de
voltar a tocar. Nos fins de semana, ele se embriaga, ocasiões em que se
envolve em brigas e, às vezes, em luta corporal. Apesar das dificuldades,
preserva algumas amizades dos tempos da carreira musical e sempre
surpreende pelo carinho e consideração com os animais. Há alguns me-
ses, surrou um policial civil que estava maltratando um gato vira-lata. Um
amigo o trouxe para tratamento, pois seu temperamento explosivo o colo-
ca em dificuldade recorrente. Devido à briga com o policial, João não
pode retornar à cidade natal.
A diferenciação entre a conduta anti-social secundária e a
primária é facilitada quando recorremos aos enredos de filmes que
retratam organizações criminosas. Tipicamente, os roteiros mos-
Manual Clínico dos Transtornos do Controle dos Impulsos 31
tram um ou mais sujeitos como João, irritadiços, de natureza pou-
co previsível, que comprometem a si ou a seus parceiros por rea-
ções impensadas e conduta agressiva fora de contexto mesmo para
o meio em que vivem. A personalidade de Fernando, em geral, é
representada pela figura do chefe do bando, igualmente violento,
porém mais contido. Este, em geral, usa sua agressividade visando
seu benefício, seu domínio social e para assegurar a hierarquia.
Irritabilidade e agressividade
As seções anteriores ocuparam-se dos casos em que a libera-
ção comportamental se deu pela debilidade de um mecanismo ini-
bitório. Esta e a próxima se ocuparão dos quadros em que o meca-
nismo envolvido é um impulso primariamente intenso. Para fins
didáticos e para facilitar a fluidez do texto, vamos inverter a or-
dem nessas seções, começando pelo caso, seguido de uma análise
descritiva da fenomenologia implicada.
� CASO CLÍNICO �
Marcelo tem 28 anos. Mora com a noiva, que lhe deu um ultimato, amea-
çando romper a relação se ele não se tratasse. Há uma semana, ele foi
comprar bananas na feira a pedido dela e envolveu-se em uma discussão
com o feirante, perdeu o controle e quebrou a banca de frutas. Teve de ser
retirado da delegacia pela noiva e não permaneceu preso porque a vítima
retirou a queixa. O evento que motivou a agressão foi irrisório se compara-
do à exuberância da reação. Ele solicitou banana nanica ao feirante, que
insistiu que ele levasse outro tipo de banana. Marcelo então respondeu de
forma ríspida e iniciou-se a discussão que teve o desfecho relatado. O
paciente conta que, para sua infelicidade, esses episódios são comuns em
seu cotidiano. Há pouco tempo, ao ser ofendido verbalmente por um moto-
rista no trânsito, perseguiu-o e, no sinal vermelho, desceu do carro. Arran-
cou o motorista pela janela, quando foi detido por pedestres que passavam
pelo local. Marcelo é faixa preta em caratê e tem força e habilidades sur-
preendentes para uma pessoa de baixa estatura e físico comum como o
dele. Seu mestre não quer mais treiná-lo porque ele não tem demonstrado
a disciplina necessária, envolvendo-se em brigas de rua quando isso deve-
ria ser evitado ao máximo. Ele próprio sente muita vergonha de seu des-
controle e está motivado para tratar-se, porque quer recuperar o respeito
da noiva e de seu mestre. Além disso, seus episódios de explosão são
seguidos de dias de remorso genuíno que o torturam.
32 Abreu, Tavares, Cordás & cols.
O diagnóstico de Marcelo é transtorno explosivo intermiten-
te (TEI). O TEI é caracterizado pela desproporção entre a reação
agressiva e o que a suscitou. Esta não tem nenhum objetivo, ser-
vindo apenas à catarse emocional. Normalmente, ocasiona dano
grave a pessoas ou a propriedades e grande remorso ao agressor,
que, afora esses episódios, não é reconhecido como pessoa parti-
cularmente violenta. Em geral, esses indivíduos são descritos por
quem os conhece como espontâneos, sinceros e irritáveis. Seu tra-
tamento, além de técnicas de manejo da raiva, classicamente in-
clui treino de assertividade. De forma paradoxal, eles apresentam
dificuldades em estabelecer limites nas relações interpessoais. Mui-
tos dos episódios de perda de controle são precedidos por eventos
em que o portador de TEI sentiu-se ofendido e não reagiu. No caso
das bananas, Marcelo vinha de um dia anterior típico, em que ha-
via trabalhado excessivamente, tolerado piadas desagradáveis do
chefe sobre sua estatura e dormido pouco à noite porque a noiva o
tinha chamado para uma longa conversa sobre o relacionamento.
De forma mais ou menos característica, esses indivíduos “toleram”
situações abusivas porque não sabem como se esquivar ou detê-
las, recorrendo à resposta automática da agressão quando sa-
turados. Some-se a essa deficiência o pavio curto inerente a essa
personalidade e entende-se que não é por acaso que o adjetivo
“explosivo” faz parte da sigla TEI.
Em formas subclínicas, podem ocorrer outras manifestações,
como gritar, proferir ofensas, lançar objetos à parede ou bater por-
tas. O TEI provavelmente representa o extremo de um contínuo de
irritabilidade e respostas agressivas sem finalidade de dominação
ou subversão da ordem social. Ele é mais descrito nos homens,
mas pode ser subdiagnosticado em mulheres, já que nelas a auto-
agressão é mais comum e, por isso, menos perceptível. Muitas ve-
zes, a auto-agressão (bater a cabeça, cortar-se, etc.) é praticada
como forma de autopunição e tentativa frustrada e paradoxal de
conter a própria agressividade.
Manual Clínico dos Transtornos do Controle dos Impulsos 33
Apetite, desejo e dependência
Mara é dependente de cocaína. Isso significa que o uso da
droga ao longo do tempo ganhou precedência sobre qualquer ou-
tro objetivo e prioridade em sua vida. Essa subversão de valores
resultou em condutas anti-sociais que, no entanto, nunca ocorre-
ram antes de seu envolvimento com drogas. O artifício para escon-
der a cocaína sugere premeditação e revela que sua capacidade de
planejamento está presente quando necessária. De fato, Mara rea-
girá de forma intempestiva se for agraciada com acesso direto e
irrestrito à cocaína. Porém, se o contexto lhe impõe barreiras, ela
se mostra uma hábil estrategista. Tal capacidade preservada de
planejamento muitas vezes é erroneamente tomada como demons-
tração da ausência de impulsividade. Com efeito, todos os mode-
los de impulsividade discutidos até este ponto se notabilizam pela
falta de um objetivo específico e pela incapacidade de se planejar
a resposta comportamental. Mara tem objetivo definido (conse-
� CASO CLÍNICO �
Mara tem 34 anos e é publicitária. Após uma carreira meteórica, ela per-
deu todo o seu patrimônio e credibilidade. Nos últimos cinco anos ela tem
usado cocaína inalada e crack, comprometeu suas amizades e deixou a
filha com seus pais. Ela própria solicitou internação após um episódio de
overdose em queteve uma convulsão e acordou seminua no sofá de uma
casa desconhecida. Os amigos, condoídos de sua situação e saudosos
da amiga fiel que ela fora, organizaram-se e pagaram seu tratamento.
Com uma semana de internação, ela precisou ser revistada, pois dava
sinais nítidos de intoxicação por cocaína. Os enfermeiros da clínica en-
contraram pequenas “pedras” de crack meticulosamente costuradas den-
tro da bainha de suas calças. Os amigos e muitos membros do corpo
profissional da clínica interpretaram o fato como demonstração da falta
de compromisso de Mara com o tratamento e como sinal de um transtor-
no da personalidade anti-social.
34 Abreu, Tavares, Cordás & cols.
guir cocaína) e os meios cognitivos para alcançá-lo. O que se en-
contra alterado no impulso não é sua elaboração, mas a força
inescapável do desejo que fixa um objeto e não admite alternati-
vas. Além disso, sua ambigüidade (solicitar a internação e ao mes-
mo tempo preparar-se para dispor da droga enquanto estiver re-
clusa) é um elemento típico desse quadro, em que o indivíduo se
vê preso pelo conflito de desejar tanto algo que lhe faz tão mal.
Muitos dos sintomas da síndrome derivam desta oposição: tentati-
vas vãs de estabelecer controle sobre o abuso e artifícios para re-
duzir as conseqüências negativas. Essa dinâmica é observada não
só na dependência de substâncias psicoativas como também nas
chamadas dependências comportamentais, ou prática excessiva de
comportamentos formadores de hábito, como os jogos de azar, as
compras, o sexo e a comida.
Após um período de tratamento adequado, Mara não usou
mais cocaína. Todas as suas condutas socialmente dissonantes (pe-
dir dinheiro emprestado e não pagar, mentir, negligenciar a filha e
os amigos) desapareceram. Ela está cursando faculdade de Fisio-
terapia e dedica parte de seu tempo a uma ONG de alfabetização
de idosos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Estudar a impulsividade e suas variadas apresentações signifi-
ca estudar as motivações do comportamento humano e suas instân-
cias controladoras. Essas instâncias de controle podem ser genéri-
cas, as principais foram consideradas anteriormente, e também es-
pecíficas para cada tipo de comportamento em questão. A multi-
plicidade desses mecanismos confere plasticidade ao comportamen-
to, além de garantias contra a falência eventual de um sistema, pois
outro pode apresentar desenvolvimento compensatório para a ma-
nutenção do equilíbrio e a adaptabilidade do comportamento. É
importante, então, ter em mente que, quando um paciente se apre-
senta com uma síndrome impulsiva, ele provavelmente tem uma
forma de impulsividade predominante, mas para que a perda de
Manual Clínico dos Transtornos do Controle dos Impulsos 35
controle se manifeste é preciso que outras formas de impulsividade
coadjuvantes se apresentem também, ou uma perda muito focal de
controle ou um impulso específico poderiam ser naturalmente aba-
fados pelo crescimento vicariante de outra função. Assim sendo, no
caso de um dependente, o mecanismo central envolvido é o desejo
patológico, mas, para que a síndrome se manifeste plenamente, é
provável que haja a contribuição de certa dificuldade de planeja-
mento ou instabilidade afetiva, ou ambas.
A boa prática da clínica dos transtornos do impulso implica a
localização do tipo dominante de impulsividade, o estabelecimen-
to do tratamento específico, a avaliação de outras formas concor-
rentes de impulso e perda de controle e o estabelecimento de uma
hierarquia de objetivos e procedimentos para otimização do tra-
tamento.
REFERÊNCIAS
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36 Abreu, Tavares, Cordás & cols.
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