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hISTORIA DE MOCAMBIQUE VOLUME 3

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História de Moçambique, Vol. 3, Moçambique no
auge do colonialismo, 1930 - 1961
http://www.aluka.org/action/showMetadata?doi=10.5555/AL.SFF.DOCUMENT.crp2b20002
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http://www.aluka.org/page/about/termsConditions.jsp. By using Aluka, you agree that you have read and
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Aluka is a not-for-profit initiative dedicated to creating and preserving a digital archive of materials about
and from the developing world. For more information about Aluka, please see http://www.aluka.org
História de Moçambique, Vol. 3, Moçambique no auge do
colonialismo, 1930 - 1961
Author/Creator Hedges, David; Rocha, Aurélio; Medeiros, Eduardo;
Liesegang, Gerhard; Chilundo, Arlindo
Publisher Universidade Eduardo Mondlane, Departamento da História
Date 1993
Resource type Books
Language Portuguese
Subject
Coverage (spatial) Mozambique
Coverage (temporal) 1930-1961
Source Northwestern University Libraries, Melville J. Herskovits
Library of African Studies, 967.9 H673 1988 v. 3
Rights By kind permission of the Departamento de História da
Universidade Eduardo Mondlane.
Description This book produced by the Department of History at
Universidade Eduardo Mondlane focuses on the period
1930 to 1961, but also includes an introductory chapter
covering the period 1885-1930. It provides both analysis
and narrative coverage, divided into the following periods:
1930-1937 (reinforcement of colonialism), 1938-1944
(restructuring of Mozambican society), and 1945-1961 (in
two chapter, one on the apogee of Portuguese colonialism,
and the other on resistance to colonialism. The back matter
includes extensive notes and references.
Format extent
(length/size)
316 pages
http://www.aluka.org/action/showMetadata?doi=10.5555/AL.SFF.DOCUMENT.crp2b20002
http://www.aluka.org
HISTORIA DE MOÇAMBIQUE
HISTORIA DE MOÇAMBIQUE
VOL.
MOÇAMBIQUE NO AUGE DO COLONIALISMO, 1930- 1961
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA UNIVERSIDADE EDUARDO
MONDLANE
História de Moçambique Volume 3
Moçambique no Auge do Colonialismo, 1930-1961
Universidade Eduardo MondIane
Departamento de História - Faculdade de Letras
Maputo
473
Copyrigth
Coordenação deste volume:
ScLcção de fotografias: Mapas:
Capa:
Revisão do Texto:
Arranjo Gráfico: Montagem, Fotolito e Impressão: Editor:
N* de Registo:
Departamento de História - Faculdade de Letras, Universidade Eduardo
MondIane David Hedges
Amélia Souto , António Sopa, Paula Voss e Arlindo Chiluw Gerhard Liesegang
Quadro de Malangatana "Trabalho forçado" Fernanda Durão, Arlindo Chilundo e
Gilberto Matusse João Paulo Borges Coelho Imprensa da UEM Departamento de
História - Faculdade de Letras, Universidade Eduardo Mondlane 098 1IFBM/92
Maputo - 1993
SUMÁRIO
Lista de Quadros viii
Lista de Mapas viii
Lista de Fotografias ix
Abreviaturas utilizadas xi
Nota de Apresentação xii
Capítulo 1:
A História de Moçambique, 1885-1930 1
Por Aurélio Rocha, David Hedges, Eduardo Medeiros e Gerhard Liesegang Com
revisões e novas matérias por David Hedges e Arlindo Chilundo
1 A conquista e a nova organização político-administrativa 1
2 A emergência da economia colonial 3
2.1 Produção agrícola 3
2.2 A reestruturação capitalista da economia camponesa 5
2.3 Portos, caminhos de ferro e trabalho migratório 6
2.4 Indústrias de transformação 6
2.5 Balanço geral da economia 7
2.6 Relações económicas entre Moçambique, Portugal e outros países 7
3 As mudanças demográficas entre 1885 e 1930 8
3.1 População total 8
3.2 Distribuição da população e função das cidades 8
4 A estrutura social, o racismo e o proto-nacionalismo 9
4.1 Discriminação racial na estrutura colonial 10
4.2 A luta dos trabalhadores brancos e o reforço das barreiras raciais 12 4.3 A
pequena burguesia moçambicana, assimilação e educação 13
4.4 Últimos focos da resistência militar e o início do proto-nacionalismo 17
As igrejas 'separatistas' 18
O movimento associativo e literário 21
5 Os conflitos do período 1915-1930 23
5.1 A I Guerra Mundial e a crise económica e social da década de 20 23 5.2 0
conflito sobre as bases da política colonial em Moçambique 26
5.3 0 golpe militar de 1926 em Portugal e a sua repercussão em Moçambique
28
NOTAS
Capítulo 2:
O Reforço do Colonialismo, 1930-1937 35
Por David Hedges e Aurélio Rocha
Com revisões e novas matérias por David Hedges e Arlindo Chilundo
1 Introdução 35
2 A crise económica e a produção em Moçambique 36
2.1 Origens e alcance da crise económica mundial 36
2.2 Produção em Moçambique na nova situação económica 36
2.3 0 trabalho migratório, trânsito e a situação financeira 39
3 0 reforço da dominação portuguesa 41
3.1 A ascensão do regime Salazarista em Portugal 41
3.2 0 proteccionismo e o novo regime político-administrativo 41
3.3 Novas relações de dominação económica 42
3.4 Educação e religião 46
4 A intensificação da exploração nas zonas rurais 49
5 Os conflitos sociais e a resistência anti-colonial, 1930-1937 53
5.1 0 conflito sobre as terras no Mossuril - Nampula 53
5.2 As greves de 1932-1933 na Beira e Lourenço Marques 55
A manifestação dos assalariados negros da Beira, 1932 56
A greve da 'Quinhenta' no porto de Lourenço Marques de 1933 59
5.3 0 movimento associativo e político 61
A divisão do movimento associativo 66
A repressão do jornalismo político 71
Ambiguidade da posição da elite 73
Agudização da tensão política e repressão fascista, 1935-1937 75
NOTAS
Capítulo 3:
A Reestruturação da Sociedade Mocambicana,1938-1944 83
Por David Hedges e Aurélio Rocha
1 Introdução: Características gerais do período 1938-1944 83
1.1 A procura renovada de matérias-primas 83
1.2 Capital português e reorganização da administração colonial 85 1.3 0 poder
reforçado do Governador-Geral 86
2 As culturas forçadas 88
2.1 Generalização do cultivo do algodão 88
2.2 Generalização da cultura obrigatória 91
2.3 0 cultivo forçado de arroz 93
3 A intensificação da exploração do trabalho 93
3.1 A crise de mão-de-obra rural 93
3.2 Actuação do governo colonial face à crise de mão-de-obra 95
3.3 A reorganização dos impostos 97
3.4 Reforço dos auxiliares administrativos: régulos e sipaios 98
3.5 Reforço do controle sobre trabalho em Lourenço Marques e Beira 99 3.6 0
novo sistema de sindicatos fascistas 100
4 A estrutura de produção e as suas consequências 101
4.1 Produção e rendimento nas zonas rurais 101
4.2 Diferenciação regional 102
4.3 Controle permanente da administração sobre a produção agricola 104 4.4
Crescente exploração do campesinato 104
4.5 Diferenciação social no seio do campesinato 106
4.6 Indústria, transportes e trabalho migratório 108
5 A resistência ao colonialismo 111
5.1 A resistência generalizada às culturas forçadas 111
5.2 A revolta Muta-hanu no Mossuril - Nampula, 1939 112
5.3 0 movimento associativo 114
6 0 Estado colonial, a Igreja Católica e o ensino rudimentar 117
NOTAS
Capítulo 4:
Moçambique durante o Apogeu do Colonialismo Português, 1945-1961: a
Economia e a Estrutura Social 129
Por David Hedges e Aurélio Rocha
1 Caracteristicas gerais do período 129
2 A intensificação da produção rural 130
2.1 A cultura forçada de algodão 130
Concentrações algodoeiras, blocos e picadas 132
Diferenças de produtividade 137
2.2 0 reforço do controlesobre a mão-de-obra rural 138
2.3 Produção global das mercadorias agrícolas de exportação 145
2.4 A estrutura da exploração rural colonial e as suas consequências 147
Violência e produção 148
O comércio rural 151
A degradação dos solos, subnutrição e fomes 153
3 Mão-de-obra migrat6ria 157
4 Os planos do fomento e industrialização 161
4.1 Acumulação portuguesa e a economia moçambicana 161
4.2 Os planos de fomento 161
4.3 Crescimento da população colona 164
4.4 Fomento industrial 168
4.5 A consolidação do capital português 171
5 0 desenvolvimento da estrutura social 172
5.1 A força de trabalho assalariado e a sua estratificação racial 172 5.2 A
educação, as missões e seu papel na estrutura social colonial 176
Ensino primário rudimentar e 'comum' 179
Ensino secundário 181
5.3 As formas de enquadramento colonial 182
O privilegiamento dos régulos e sipaios 183
As associações profissionais para negros 187
Os agricultores prósperos e as cooperativas 188
NOTAS
Capítulo 5:
A Contestação da Situação Colonial, 1945-1961 197
Por David Hedges e Arlindo Chilundo
1 Introdução 197
2 0 reforço do colonialismo na Africa após a II Guerra Mundial 198
O âmbito regional na África Austral 200
3 As associações e o movimento juvenil, 1945-1955 202
4 A luta dos camponeses e trabalhadores 209
4.10 contexto da luta 209
4.2 A resistência contra as culturas forçadas 210
4.3 Resistência contra o trabalho forçado 213
A greve na açucareira de Xinavane, 1954 214
4.4 Greves no caminho de ferro e porto de Lourenço Marques 215
4.5 0 motim da pedreira de Goba 217
4.6 Considerações finais sobre a luta dos camponeses e trabalhadores 219
5 A contestação cultural 221
5.1 Canção, música e dança populares 222
5.2 A literatura como arma da luta 225
5.3 Artes plásticas 230
5.4 A contestação cultural resumida 231
6 A Sociedade Algodoeira Africana Voluntária de Moçambique 232
7 A luta anti-colonial, 1955-1961 238
7.1 A criação de organizações políticas internas e externas 238
7.2 0 massacre de Mueda e a repressão de 1960-1961 241
7.3 0 âmbito político em Lourenço Marques e a revitalização do NESAM 243 7.4
A evolução das organizações moçambicanas nos territ6rios vizinhos 245 7.5 As
organizações unitárias contra o colonialismo português 246
8. Resumo e conclusão 248
NOTAS 250
PRINCIPAIS FONTES CONSULTADAS 259
INDICE
Lista de Quadros
1 Principais exportações de Moçambique, 1928-1935 38
2 A crise económica, 1928-1937: Valor e Volume das exportações 39 3
Expansão das missões católicas, 1930-1937 47
4 Aumento do número de escolas rudimentares, 1930-1937 48
5 O volume das principais exportações de Moçambique, 1939-1944 102 6 O
valor das principais exportações de Moçambique, 1939-1944 103 7 Aumento
de missões católicas, 1938-1944 120
8 Número de escolas rudimentares, 1938-1944 120
9 Ensino rudimentar católico, 1940-1944 121
10 Produção de Algodão, 1945-1960 136
11 O volume das principais exportações de Moçambique, 1945-1960 146 12 O
valor das principais exportações de Moçambique, 1945-1960 146
13 Percentagem das principais exportações de Moçambique, 1945-1960 147 14
Evolução da população total e da população colona de Moçambique 165 15
Crescimento da indústria de transformação, 1947-1961 169
16 Expansão do investimento fixo na indústria transformadora, 1956-1961 170
17 Proporção do valor de produção industrial, por sector, 1942-1960 171 18
Estimativa provisória do número de assalariados nos principais
sectores e actividades, 1950-1960 173
19 Aumento de missões religiosas, 1945-1961 178
20 Aproveitamento nas escolas rudimentares das missões católicas
e outras (missões protestantes e escolas oficiais), 1945-1960 180 21 Matrículas
nas escolas primárias 'comuns', 1945 e 1960 181
22 Matrículas nos Liceus, 1945 e 1960 182
Lista de Mapas
1 Produção de algodão, 1941: diferenciação regional 134
2 Produção de algodão, 1960: diferenciação regional 135
3 A expansão da rede ferroviária 160
4 Greves, contestações e protestos, 1930-1960 196
Lista de Fotografias
1. Construção da Ponte do Zambeze, 1933 44
2. Ponte do Zambeze, 1935 45
3. Trabalhadores no depósito do crómio no Porto da Beira 57
4. Retrato de Estácio Dias 62
5. Retrato de Karel Pott 62
6. Sede do Centro Associativo dos Negros (Instituto Negrófilo), 1939 63 7.
Kamba Simango 69
8. Tomada de posse do Governador-Geral J. T. Bettencourt 87
9. Parada militar em Lourenço Marques, 1942 87
10. Colheita de algodão 88
11. Mercado de algodão, Nampula 89
12. Processamento de algodão, Sofala 90
13. Paisagem da cultura de chá, Zambézia 94
14. Trabalhadores do chá, Zambézia 94
15. Carregamento da cana de açucar, Inkomati 96
16. Régulos com os seus bastiões de comando, Quelimane, 1939 98
17. Construção do Caminho de Ferro de Tete, 1944 109
18. Escola de Artes e Oficios, Moamba 122
19. Aula de sapataria, Escola de Artes e Oficios, Moamba 122
20. Caminho de Ferro do norte: abertura de uma trincheira 141
21. No parque de maquinaria, linha férrea de Tete,1949 162
22. Carros no caminho das Rodésias, Lourenço Marques, 1955 163
23. Colonos a chegar, Limpopo, 1954 166
24. Vista do colonato, Limpopo, 1960 166
25. Retrato de D. Soares de Resende, Bispo da Beira 177
26. A escola rudimentar da Missão católica de Murrupula, Nampula, 1960 179
27. Banja em Maniamba, Niassa, fim da década de 1950 184
28. Chefe Mataka, Niassa, fim da década de 1950 185
29. Os engraxadores de Lourenço Marques, 1946 187
30. Encontro dos Governadores-Gerais da Federação e de Moçambique, 1954 201
31. Eduardo Mondiane em 1949 204
32. M.M. Sicobele, fundador da Igreja Luz Episcopal 207
33. Figuras da contestação cultural, década de 1950 223
34. Retrato de Daniel Marivate 227
35. Retrato de João Dias, 1949 228
36. Manifestação em Lourenço Marques contra Resoluções da ONU, 1957 239
37. Notícias do julgamento da liderança da Convenção do Povo de
Moçambique, 1962 242
38. Nacionalistas da África Austral na altura da formação de CONCP 247
Abreviaturas Utilizadas
AA Associação Africana de Lourenço Marques (o Grémio Africano)
AHM Arquivo Histórico de Moçambique
ANC African National Congress of South Afica
BA O Brado Africano
BO Boletim Oficial de Moçambique, I série
BSEM Boletim da Sociedade de Estudos de Moçambique
CAN Centro Associativo dos Negros (o antigo Instituto Negrófilo)
CAM Companhia dos Algodões de Moçambique
CEA Centro de Estudos Africanos, Universidade Eduardo Mondlan
CPC/SS Corpo da Polícia Civil, Serviços de Segurança Cx. Caixa
DH Departamento de História, Universidade Eduardo Mondiane
FA Fundo do Algodão [Arquivo Histórico de Moçambique)
FAC Fundo da Administração Civil [Arquivo Histórico de Moçambique]
FGG Fundo do Governo Geral [Arquivo Histórico de Moçambique)
FNI Fundo dos Negócios Indígenas [Arquivo Histórico de Moçambique]
FTO Fundo de Testemunhas Orais [Arquivo Histórico de Moçambique
HM II DH, História de Moçambique, vol.II, Maputo:Cadernos Tempo, 1983
INLD Instituto Nacional do Livro e do Disco
ISANI Inspecção Superior de Administração e Negócios Indígenas JEAC
Junta de Exportação de Algodao
MAC Movimento Anti-Colonialista
MANU Mozambique African National Union
MJDM Movimento da Juventude Democrática de Moçambique
MPLA Movimento Popular para a Libertação de Angola
MUD Movimento da Unidade Democrática
NESAM Núcleo de Estudantes Secundários de Moçambique PAIGC Partido
Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde PIDE Policia Internacional
de Defesa do Estado
SAGAL Sociedade Agrícola Algodoeira S.d. Sem data
SE Secção Especial [Arquivo Histórico de Moçambique)
S.n. Sem número
SR [A.I.Ferraz de Freitas],'Seitas religiosas gentílicas', 4 vols.,
Lourenço Marques,n.p., 1956-1957 TANU Tanganyika African National Union
UEM Universidade Eduardo Mondlane, Maputo
UDENAMO União Democrática Nacional de Moçambique UNAMI União
Nacional de Moçambique Independente
Nota de Apresentação
Este terceiro volume da História de Moçambique segue as linhas gerais da
periodizaçãoestabelecida para a colecção, em 1981, sob a direcção do então chefe
do Departamento de História, Carlos Serra. Coube, porém, ao Departamento de
História, como um todo, a responsabilidade da elaboração deste volume.
Todos os capítulos foram previamente publicados na revista do Departamento,
Cadernos de História 2,4,5,6,7 (1985-1988), ao que se seguiu um processo de
revisão e reelaboração.
A grande parte deste volume cobre o período de 1930-1961, sendo objecto
principal Moçambique no apogeu do colonialismo. Neste volume procura-se
mostrar como é que Portugal, guiado pela estratégia do 'nacionalismo económico',
tentou, mais do que vinha acontecendo até então, tirar de Moçambique mais
vantagens em seu próprio benefício. Procura-se também avaliar a experiência
moçambicana deste intensivo, violento e muitas vezes sufocante processo.
Tentamos fazer um balanço sistemático do material novo e informações relativa e
largamente conhecidas. Porém, fica-nos a consciência de que este livro é uma
mera tentativa de uma síntese geral deste período. Longe de ser um manual
adequado de ensino e muito menos uma história oficial, esperamos não obstante
que o livro seja de fácil leitura. Com diferentes graus de sucesso procuramos
incluir a máxima informação possível sobre os temas sócio-políticos, tais como
religião, educação e associações políticas. Aspectos sócio-económicos também
mereceram um tratamento especial. Mesmo assim, muitos temas e formas mais
frutíferas de interpretação foram, sem dúvidas, insuficientemente desenvolvidos.
Muito fica ainda por fazer e esperamos que este trabalho provisório contribua
substancialmente para a delimitação de novos temas de investigação sobre a
história de Moçambique.
No princípio, os autores decidiram que os capítulos seriam, de preferência,
divididos conforme uma periodização, incorporando desta
forma as divisões temáticas e diferenças regionais. Este procedimento nos pareceu
o meio apropriado para a sintetização de materiais que se encontram ainda mais
dispersos e não trabalhados do que aqueles que formaram a base do volume
anterior.
Os autores também decidiram que tal estrutura requeria um capítulo introdutório
resumindo o período de 1885 a 1930 e que inclui novas informações que, à data
da elaboração do II volume, não estavam disponíveis.
A conclusão deste livro foi possível graças ao apoio sempre concedido, muitas
vezes em difíceis circunstâncias, do Dr. Fernando Ganhão, Reitor da
Universidade Eduardo MondIane, e os seus sucessores, Dr. Rui Baltazar e Dr.
Narciso Matos. Os autores gostariam de expressar a sua profunda gratidão ao
Arquivo Histórico de Moçambique cuja directora, Dra Inês Nogueira da Costa, e
restantes trabalhadores generosamente os apoiaram na localização de fontes e na
fase final da edição. O Índice beneficiou do generoso apoio profissional de
António Sopa e de Fernanda Mendes. A publicação do livro deve muito ao
entusiasmo e às capacidades técnicas de João Paulo Borges Coelho.
Os autores agradecem particularmente a Colin Darch, pela sua indispensável
ajuda na localização da grande parte das fontes utilizadas no Capítulo 5. Pelos
valiosos comentários e informações fornecidas no decurso do trabalho, agradecem
também a Carlos Serra (caps. 1 e 2), Luís Covane e Gerhard Liesegang, do
Departamento de História, e a Yussuf Adam, Teresa Cruz e Silva e Alexandrino
José, do Centro de Estudos Africanos da UEM (cap. 5), Eduardo Medeiros, do
Instituto Superior Pedagógico (caps. 3 e 4) e a Paulo Soares, do Ministério da
Cultura (caps. 2 e 3).
E, não em último lugar, o Departamento de História expressa a sua profunda
gratidão à Agência Sueca para Investigação e Cooperação Internacional
(SAREC), e à Agência Norueguesa para o Desenvolvimento (NORAD), pela
ajuda e encorajamento na área de investigação e pelo prestimoso apoio material,
sem os quais não seria possível a publicação deste livro.
Capítulo 1:
A História de Moçambique, 1885-1930
1. A conquista e a nova organização político-administrativa
Após a Conferência de Berlim, foram definidas novas formas de relacionamento
entre as potências europeias e os territórios colonizados, o que, em Moçambique,
se traduziu na delimitação de fronteiras e na ocupação militar, administrativa e
económica.
A implantação colonial no período imperialista efectivou-se, inicialmente,
aLravés da conquista militar do território moçambicano. Apesar da superioridade
em armas dos colonialistas, este processo durou mais de duas décadas (1886-
1918), devido a fortes resistências nas diversas partes do território [1].
Para diminuir os custos directos da ocupação militar e administrativa, Portugal
optou por ceder as actuais províncias do Niassa e de Cabo Delgado à Companhia
do Niassa, uma companhia majestática, que, para além da sua função económica,
tinha poderes militares e administrativos. Da mesma forma, as províncias de
Manica e de Sofala passaram a ser administradas pela Companhia de
Moçambique. As províncias de Tete e da Zambézia foram submetidas a uma
administração conjunta do estado português e de companhias que arrendaram os
antigos prazos. A província de Nampula e o território ao sul do Rio Save
(Maputo, Gaza
Capítulo 1
e Inhambane) ficaram sob administração directa do estado português.
Como a acumulação de capital, em Portugal estava baseada em grande medida no
comércio, e a economia estava pouco industrializada, não havia grandes
excedentes de capitais para investimento produtivo no exterior. Assim se explica a
penetração do capital não-português em todas as zonas de Moçambique, incluindo
nas Companhias Majestáticas.
A implantação do sistema administrativo colonial processou-se em diferentes
fases nas diversas partes do país. Por exemplo, nas áreas de resistência mais
prolongada, ou de acesso difícil, a primeira etapa efectivou-se através da
ocupação militar quase permanente (capitaniasmores na província de Nampula e
partes de Zambézia, comando militar em Gaza). Noutros lugares, como, por
exemplo, na província de Maputo em 1896, o governo colonial passou
directamente à divisão do território em circunscrições civis que, de um modo
geral, deram origem aos actuais distritos. Nestas divisões foram instalados os
administradores e chefes de posto portugueses, bem como régulos africanos,
escolhidos pelo regime colonial, em substituição dos antigos chefes. A partir de
1907, este sistema substituiu gradualmente a administração militar em Gaza,
Zambézia e Nampula.
O objectivo principal do colonialismo no período imperialista era aproveitar a
força de trabalho africana de uma maneira mais directa e permanente que no
período anterior. As formas em que este aproveitamento se podia realizar
variavam desde a aplicação do trabalho nas plantações até à comercialização dos
produtos do campesinato e à venda aos moçambicanos de vinhos, têxteis e outros
produtos portugueses (ver ponto 2).
Vários métodos concretizaram esse objectivo. O imposto de palhota servia para
forçar a população a ganhar dinheiro através da venda dos seus produtos ao
comércio rural ou da venda da sua força de trabalho. Metade do mussoco (o
imposto pagável na Zambézia) era cobrado em trabalho a partir de 1890. A
cobrança do imposto era uma das tarefas principais do administrador e dos seus
subordinados. O dinheiro cobrado contribuiu largamente para as despesas da nova
rede administrativa colonial (vencimentos, edifícios, estradas, etc.).
A diferença dos níveis de desenvolvimento entre as -potências europeias reflectiu-
se nas suas colónias, sobretudo na concorrência pela utilização da força de
trabalho. Não obstante as más condições de
Moçambique, 1885-1930
trabalho nas plantações, minas e obras públicas na África do Sul, nas Rodésias,
Niassalândia, Tanganhica e Zanzibar, verificou-se um grande fluxo de migrantes
moçambicanos para esses territórios. Para tal contribuiu o facto de os salários
serem relativamente superiores nesses territórios, como coroláriodo nível
relativamente superior de capitalização, gestão, aplicação de tecnologia e
produtividade. Por outro lado, as mercadorias (em especial, os têxteis) vendidas
nesses territórios eram de melhor qualidade e mais baratas.
Colocado numa situação desvantajosa em relação aos outros poderes coloniais na
região, no que diz respeito ao recrutamento de trabalhadores, o estado colonial em
Moçambique recorreu, mais do que os estados coloniais vizinhos, ao sistema de
trabalho forçado, cuja supervisão era outra das tarefas principais do
administrador. Desta maneira, o colonialismo português pretendeu compensar o
baixo nível de investimento.
Foi através deste novo sistema político-administrativo, cuja actuação se fez sentir
a nível do uso da força de trabalho, que se estabeleceu a economia colonial no
período 1885-1930.
2. A emergência da economia colonial
2.1 Produção agrícola
A maior parte da população moçambicana pertencia ao sector agrícola. No novo
sistema, que emergiu entre 1885 e 1930, podemos distinguir vários tipos de
produção provenientes dos seguintes sectores:
a) As plantações de cana-de-açúcar, de coqueiros, de sisal e de chá, com as
respectivas fábricas de transformação anexas, constituíam a agro-indústria. A
produção de açúcar começou na última década do século XIX, com as principais
plantações situadas no vale do Zambeze, localizando-se outras unidades
importantes nos vales dos rios Buzi e Incomati. As plantações de sisal começaram
a ser feitas em 1904/6 na Zambézia, mas as da zona litoral de Nampula tornaram-
se as mais importantes por volta de 1930, havendo outras em Cabo Delgado e
Manica. A produção das plantações era quase totalmente exportada.
b) As machambas familiares dos camponeses produziam para exportação
quantidades sensqvelménte iguais às das plantações. Para além disso,
alimentavam não só a população rural, mas também os milhares
Capítulo 1
de trabalhadores na agro-indústria, que comprava os produtos aos camponeses na
sua rede de lojas montada para o efeito. A Sena Sugar Estates, por exemplo, criou
a Companhia de Comércio de Moçambique principalmente para este fim.
Os principais produtos comercializados, quer para exportação, quer para comércio
interno, eram o milho, o amendoim, o gergelim e a borracha, e provinham em
grande parte da província de Nampula, e em menor escala, das províncias da
Zambézia, de Cabo Delgado e de Inhambane.
Nas províncias de Gaza, Maputo e Inhambane, o campesinato ficou sem muitos
trabalhadores devido ao recrutamento para as minas sul-africanas. O imposto de
palhota nestas zonas (pagável em divisas) provinha geralmente dos salários dos
mineiros; reduziu-se, assim, a possibilidade e o estimulo da família camponesa
para produzir para a comercialização. Por estas razões, o campesinato nestas
províncias produzia poucos excedentes agrícolas. No entanto, na década de 20,
alguns migrantes regressavam da África do Sul já com charruas, o que tornou
possível a uma minoria de camponeses uma maior produtividade e até alguma
acumulação de bens e o aumento das áreas cultivadas, como no vale do Limpopo.
c) As pequenas e médias machambas de colonos individuais empregavam
trabalhadores africanos. Algumas estavam instaladas em zonas de colonização
antiga, perto de Quelimane e da Ilha de Moçambique, e produziam pequenas
quantidades de copra e cajú. Outras dedicavam-se à cultura do milho no Chimoio
a partir de 1907, e, no sul, à cultura do algodão a partir de 1920. Ainda neste
período, os agricultures colonos começaram a pro4u±ir citn'nos para o mercado
sul-africano e a criar gado para o mercado interno (principalmente para Lourenço
Marques).
As exportações por ýector, em termos de valor, eram as seguintes, em 1930 [2]:
Das plantações 40% Do campesinato 28% Dos agricultores 10%
Doutros sectores 22% vários: óleos, bagaços, sal, artesenato, minerais, etc.)
Moçambique, 1885-1930
Embora as exportações do campesinato, em quantidade, se igualassem às da agro-
indústria, os produtos desta última valiam mais no mercado internacional, até
porque iam já semi-transformados.
2.2 A reestruturação capitalista da economia camponesa Embora seja útil
distinguir, para efeitos de estudo, as formas de produção agrícola das formas de
produção indústrial que emergiram neste período, é, no entanto, importante
compreender que elas estavam perfeitamente interligadas na economia colonial.
Note-se que em todos os tipos de produção o trabalho era efectuado pela
população moçambicana, com ou sem a supervisão dos colonos. Para além disso,
é importante realçar o papel da produção camponesa no fornecimento de
alimentação aos trabalhadores das plantações, indústrias e machambas privadas.
Lembramos que estes trabalhadores eram migrantes sazonas, cujas famílias, além
de manterem a casa, produziam para a sua subsistência e do próprio migrante
depois do seu regresso.
Podemos dizer que a família camponesa veio a constituir a base de repodução
social do trabalhador migrante e, assim, a base fundamental de todas as formas de
produção que dela dependiam. Com este sistema, nem plantações, nem indústrias,
nem machambas privadas tinham que pagar um salário que alimentasse a família
do trabalhador, o que era sempre justificativo da atribuição de salários muito
baixos. Por essa razão os empreendimentos na nova economia colonial preferiam
o trabalho migratório, procurando o estado colonial evitar, na medida do possível,
o crescimento de uma força de trabalho permanente e estável, o que teria exigido
salários mais elevados e melhores' condições sociais. Os migrantes, devido ao
carácter temporário do trabalho, tinham pouco poder para reclamar junto do
empregador, que os podia despedir em qualquer altura sem remuneração
nenhuma.
Devido ao rendimento muito baixo que se podia esperar dos contratos ou do
trabalho forçado em Moçambique, que em geral somente bastava para pagamento
do imposto e aquisição de alguma roupa de trabalho, o enquadramento social do
homem e da mulher, através do casamento, dependia muitas vezes de contratos
sucessivos do homem nas minas e plantações dos territórios vizinhos, onde
ganhava o dinheiro necessário para o casamento e os impostos.
O sistema de trabalho migratório (dentro e fora do país) atingiu quase
Capítulo 1
todas as actividades produtivas, levando à proletarização parcial do campesinato
e, assim, tornando a situação das massas cada vez mais uniforme. Se, por um
lado, o recrutamento dos homens em brigadas nas zonas de origem, com a
segregação nos acampamentos e o repatriamento no fim do contrato, fortaleceu a
discriminação étnica, e facilitou o controlo rigoroso dos trabalhadores, por outro,
contribuiu para o início de uma experiência comum de exploração [3]. Um outro
aspecto fundamental da nova economia colonial era o comércio rural, essencial
para o escoamento de produtos. Foi, de facto, a produção familiar dos camponeses
que alimentou o crescimento e os lucros da rede de lojas rurais, exclusivamente
nas mãos de comerciantes asiáticos e europeus [4].
Desta maneira, o sistema de produção familiar camponesa, herdado do período
antes de 1885, foi transformado na base principal para a acumulação do capital na
nova economia colonial [5].
2.3 Portos, caminhos de ferro e trabalho migratório Enquanto a maior parte da
população continuava a viver da agricultura, com o surgimento da nova economia
colonial, havia um número reduzido que exercia a sua actividade na construção
dos portos e caminhos de ferro de Lourenço Marques e Beira, e como estivadores
e carregadores no seu funcionamento [ponto 3.2]. Para o fornecimento de grande
parte desta mão-de-obra, desenvolveu-se o sistema de trabalho forçado.
. Como vimos, outros trabalhadores foram para as minas e plantações dos
territórios vizinhos. Estas actividades beneficiaram principalmente os
empreendimentos das colónias britânicas vizinhas. No entanto, a burguesia
portuguesa tinha o seu benefício através da canalizaçãodas divisas provenientes
do trabalho nesses territórios para a rede comercial de Moçambique. Para além de
vários impostos de recrutamento, pagáveis em divisas ao estado colonial, o Sul
importava grandes quantidades de vinho, principal exportação portuguesa da
altura, que era vendido nas lojas rurais.
2.4 Indústrias de transformação
A extracção de óleos, a destilação de alcool, as moagens, a produção de cigarros,
de gelos e de refigerantes foram as primeiras indústrias de transformação,
principalmente viradas para o consumo de Lourenço Marques, e construídas antes
de 1914. Nos anos seguintes,
Moçambique, 1885-1930
estabeleceram-se fábricas de sabões, de cerveja e de cimento. O significado destas
indústrias foi muito reduzido até 1930, quer em termos de produção, quer em
termos do número de trabalhadores, maioritariamente não-qualificados.
2.5 Balanço geral da economia
Os portos e caminhos de ferro e a exportação de trabalhadores constituíram
sectores prioritários de desenvolvimento depois de 1885. Por isso, até cerca de
1910, sensivelmente, contribuíram com a maior parte do rendimento exterior da
colónia. No entanto, o desenvolvimento progressivo da produção agrícola até
1930, veio a transformar esta actividade na maior fonte de receitas de
Moçambique.
2.6 Relações económicas entre Moçambique, Portugal e outros países
Moçambique não foi, neste período, para Portugal, uma fonte importante de
matérias-primas, dado que este país, pouco industrializado no início do século
vinte, não precisava delas em grande quantidade. Os produtos de Moçambique
iam principalmente para outros países, como a França, a África do Sul, a Grã-
Bretanha e a Alemanha. Por exemplo, calcula-se que, na década 1910/1920, uma
média de apenas 5 a 6 por cento das exportações iam para Portugal, enquanto 20 a
22 por cento iam para África do Sul.
Já em relação às importações de Moçambique, o Império Britânico
(nomeadamente Grã-Bretanha e India) era o maior fornecedor de têxteis, sendo
Portugal o principal fornecedor de vinho.
Em relação aos investimentos, havendo poucos excedentes de capitais em
Portugal, os equipamentos essenciais para plantações, portos e caminhos de ferro
etc., tinham que ser feitos ou por companhias estrangeiras, ou através de
empréstimos estrangeiros [6].
O baixo nível de trocas comerciais entre Portugal e Moçambique e a falta de um
sistema de controle efectivo das trocas com outros países, resultou na utilização
da moeda do principal parceiro de Moçambique, nomeadamente, a libra esterlina,
nas trocas internacionais e até internas da colónia. Essa prática alargou-se
consideravelmente com a queda do valor do escudo na década de 20.
Pode-se concluir deste quadro económico que, entre 1885 e 1930, a economia de
Moçambique foi reestruturada para servir os interesses das
Capítulo 1
burguesias europeias. Mas, enquanto noutras colónias essa nova economia
resultou em ligações económicas muito estreitas com as respectivas metrópoles,
no caso de Moçambique, tais relações com a metrópole foram relativamente
fracas. No período seguinte, 1930-1961, veremos que o objectivo central da
política colonial portuguesa será precisamente reforçar e proteger os interesses da
sua burguesia.
3. As mudanças demográficas entre 1885 e 1930.
3.1 População total.
As estimativas indicam um total de 3 milhões de habitantes em 1900 e de
4.200.000 em 1930. Este crescimento relativamente baixo explica-se pela
ocupação militar e pela imposição do imposto de palhota que, conjuntamente,
causaram fugas maciças para as colónias vizinhas. Acrescente-se a emigração de
milhares de moçambicanos para trabalhar na África do Sul, Rodésia do Sul e -São
Tomé e, ainda, epidemias, fomes e o recrutamento militar para as campanhas no
norte do país que, durante a I Guerra Mundial, causaram milhares de mortes [7].
3.2 Distribuição da população e função das cidades. A densidade da população era
muito variável, sendo as províncias de Nampula e Zambézia e algumas zonas do
litoral doutras províncias as mais populosas, com uma densidade que oscilava
entre 10 e 30 habitantes por quilómetro quadrado.
No fim dos anos 20, a esmagadora maioria da população moçambicana vivia nas
zonas rurais. Em 1930, apenas cerca de 100 mil pessoas viviam em centros
urbanos. Este número dividia-se entre Lourenço Marques, com 42.779 habitantes,
Beira, com 23.694, Inhambane, com 10.563, Quelimane, com 9.288 e Ilha de
Moçambique, com 6.898 habitantes.
De um modo geral, foi a nova dinâmica colonial do período imperialista que fez
crescer as cidades, como portos e terminais de caminhos de ferro, e centros de
administração, comércio e indústria.
Desde o início do novo período que as cidades se caracterizavam pela
coexistência de duas áreas distintas: o centro de administração, comércio, etc., e
os subúrbios, que se formaram à medida que as cidades foram
Moçambique, 1885-1930
crescendo. Na primeira, vivia a população branca e um reduzido número de
negros, indianos, chineses e mulatos, que formavam o conjunto dos funcionários,
dos comerciantes e primeiros industriais, dos profissionais independentes e dos
artesãos e operários. Nos subúrbios, viviam os trabalhadores braçais da
construção civil e aterros, das obras públicas, do porto e dos caminhos de ferro.
Esta população constituía o efectivo dos trabalhadores de carácter permanente nas
cidades.
A medida que o sistema de trabalho forçado se ,ia consolidando, trabalhadores
migrantes, recrutados nas zonas rurais, e recebendo salários extremamente baixos,
eram alojados nos compounds dos vários serviços (portos, caminhos de ferro e
óbras públicas, por exemplo).
4. A estrutura social, o racismo e o proto-nacionalismo
A colonização de Moçambique no período imperialista foi dinamizada pela
burguesia europeia, nomeadamente, de Portugal, Inglaterra, França e outros países
industrializados, que deve ser considerada, evidentemente, a classe dominante [8].
O interesse ou motivação desta classe era uma exploração, mais directa do que
anteriormente, dos recursos moçambicanos. Foi o campesinato africano que
forneceu a força de trabalho migratório e os produtos no novo processo de
acumulação do capital nas plantações, transportes, minas e comércio rural. Esse
mesmo campesinato continuou a alimentar a família do trabalhador e ele próprio
após o seu regresso. Foi ainda esse campesinato que forneceu, através dos
impostos, uma grande parte do rendimento do governo, e comprou grandes
quantidades de produtos das indústrias portuguesas.
Podemos considerar a burguesia, que vivia na Europa, e o campesinato
moçambicano, as principais camadas na nova estrutura colonial. A continuação da
resistência activa contra a ocupação colonial, as fugas maciças, e a resistência
contra o trabalho forçado expressam, no seu conjunto, a continuação do conflito
entre essas duas camadas.
No entanto, na evolução da nova economia colonial, emergiram outras camadas,
secundárias, mas muito importantes na vida política e económica do país e nos
conflitos que se desenvolveram nas cidades. Emergiu muito cedo, por exemplo,
uma burguesia comercial local, baseada principalmente em Lourenço Marques,
interessada no cresci-
Capítulo 1
mento da importação e exportação de produtos de e para o campesinato e no
trânsito de mercadorias de e para os países vizinhos. Os seus interesses estavam,
portanto, bastante ligados aos da burguesia na Europa e na África do Sul.
Mais tarde, desenvolveu-se uma burguesia agrícola local, que integrava os
colonos interessados na expulsão dos camponeses das melhores terras e a sua
transformação em trabalhadores forçados sazonais nas novas plantações e
machambas. Os interesses deste grupo entraram em conflito com os da grande
burguesia e do estado colonial, especialmente no sul do país, onde a burguesia
mineira inglesa insistiu sempre em reservar a maior parte do trabalho africano
para as suas minas sul-africanas [9].
Com o crescimento dascidades e a chegada de colonos à procura de trabalho,
emergiram duas camadas sociais: uma de trabalhadores permanentes, qualificados
e semi-qualificados, e outra da pequena burguesia. Devido ao privilégio
constitucional e legal proporcionado aos brancos pelo regime colonial, essas
camadas logo se dividiram em negros e mestiços, por um lado, e brancos, por
outro. Os brancos e não-brancos das duas camadas supracitadas estavam
igualmente interessados na defesa dos seus lugares contra a ameaça de
desemprego, em tempo de crise económica e, sempre que possível, no
alargamento das suas regalias, em tempo de expansão. Porém, o referido
privilégio constitucional assegurava que os benefícios recaissem sempre para os
brancos, frequentemente em detrimento dos outros.
Para melhor perspectivar os conflitos dessas camadas intermediárias, e a sua
relação com as barreiras raciais que cada vez mais dividiam a sociedade colonial,
é necessário recuar um pouco na análise dos interesses da burguesia e da política
do estado colonial.
4.1 Discriminação racial na estrutura colonial A discriminação racial era parte
inerente da estrutura colonial no período imperialista. Isto estava contido na
definição, expressa na legislação, regulamentos e instituições da colónia, da
população negra como fonte principal da riqueza na nova economia.
No fim do século XIX, os mais activos representantes do novo colonialismo
português em Moçambique, como Caldas Xavier, Antonio Enes e Mouzinho de
Albuquerque, justificaram as mais duras formas de
Moçambique, 1885-1930
extracção do trabalho da população, dizendo que o negro não era e não devia ser
igual ao cidadão português. Propuseram resolver o problema da falta de mão-de-
obra para empreendimentos capitalistas com o trabalho obrigatório do negro.
Esta filosofia vinha concretizada na primeia legislação sobre a divisão das terras
da época imperialista, que, em 1890, mandava reestruturar os antigos prazos da
Zambézia e estabelecia que os novos arrendatários dos prazos seriam unicamente
Europeus, sendo os 'indígenas' os fornecedores do trabalho obrigatório.
Em 189 ý, foram promulgados os primeiros regulamentos do passe em Lourenço
Marques, numa tentativa de evitar a escolha livre de emprego pelo trabalhador,
impedir a sua fuga e, assim, criar uma força de trabalho estável, com baixos
salários. Estas medidas distinguiam claramente o cidadão do 'indígena', e
obrigavam cada trabalhador 'indígena' na vila a trazer um certificado ou um disco
metálico, a chapa, com o número do seu passe. Se bem que, devido à falta de
estruturas policiais adequadas, tivessem pouco impacto no início, estes foram os
primeiros de uma série de regulamentos sucessivos para controlar, com cada vez
mais rigor, o trabalhador negro. Teoricamente os assimilados estavam isentos do
passe, mas, na prática, foram muitas vezes presos pela polícia colonial e
ameaçados com trabalho correcional [10].
Em paralelo, na administração rural, a diferenciação por raça era também evidente
no estabelecimento das circunscrições do distrito de Lourenço Marques em 1895,
com regulamentos (incluindo os relativos ao trabalho) apenas aplicáveis aos
'indígenas', prática sistematicamente seguida após a Reforma Administrativa de
Moçambique de 1907. Desde o início do século, tais regulamentos foram
progressivamente utilizados para assegurar o fornecimento regular de trabalho
forçado dos distritos rurais para as cidades.
Pode-se ver que as condições de luta dos trabalhadores pela defesa dos seus
interesses eram bastante diferentes segundo a raça, uma vez que a situação
política e legal do trabalhador branco era mais vantajosa. Para além do mais, as
organizações sindicais dos trabalhadores brancos foram sendo gradualmente
autorizadas pelo governo colonial depois de 1902, legitimação que não foi
extensiva aos trabalhadores negros. Em 1926, o regime colonial consolidou a
legislação discriminatória referente às posições política, civil e criminal da
maioria dos moçambicanos,
Capítulo 1
confirmando o que administrativamente veio a ser chamado o 'indigenato', para
referir a situação 'especial' do povo perante a constituição portuguesa.
4.2 A luta dos trabalhadores brancos e o reforço das barreiras raciais Incluídos
como plenos cidadãos na constituição política de Portugal, os trabalhadores
brancos não deixaram de lutar em defesa dos seus lugares, salários, e melhores
regalias. Esta luta significava que os salários e condições dos outros trabalhadores
iam piorando, porque a burguesia, aliciando os colonos com concessões
vantajosas, procurava sistematicamente recuperar os custos ao nível dos outros
escalões, diminuindo salários, utilizando mais trabalho forçado, etc. Desta
maneira, os trabalhadores brancos conseguiram obter sempre os melhores postos
de trabalho.
No entanto, a luta agudizou-se na crise económica que assolou o país durante e
depois da I Guerra Mundial. Com a justificação de que havia cidadãos
desempregados, os trabalhadores brancos, apoiados nas suas organizações,
reclamaram, com certo sucesso, a adopção dessas barreiras raciais no acesso aos
postos de trabalho que exigiam menos habilitações e, consequentemente, o
afastamento dos outros trabalhadores. Assim, na década de 20, por exemplo, o
lugar de guarda-retretes já era considerado um emprego para brancos em alguns
sectores de trabalho.
As desvantagens políticas e legais dos trabalhadores negros não impediram que
lutassem por melhoria de condições; só que as greves e protestos por eles
organizados, encontraram uma repressão policial sistemática e a utilização de
trabalhadores forçados como fura-greves. A luta dos poucos assimilados, através
dos jornais, também encontrou pouco sucesso contra o avanço dos trabalhadores
brancos.
Devemos dar ênfase ao facto de que não se trata aqui de um racismo proveniente
da ideologia pessoal dos trabalhadores brancos: o racismo institucionalizou-se na
sociedade colonial porque a-maioria da população foi definida como objecto
principal da exploração pela burguesia, e porque a nova estrutura colonial só
permitiu a um sector dos trabalhadores, os brancos, que lutasse pela defesa dos
seus interesses, através da criação da sua própria imprensa e organizações
sindicais [11].
Moçambique, 1885-1930
4.3 A pequena burguesia moçambicana, assimilação e educação Podemos
considerar que, no início do período imperialista, a pequena burguesia
moçambicana consistia em famílias e indivíduos de várias origens e posições
sociais. Havia, por exemplo, um reduzido número de comerciantes africanos que
abasteceriam a cidade de Lourenço Marques com mercadorias, como alimentos,
carne, peixe e lenha, de produção camponesa. Por outro lado, havia um pequeno
grupo de famílias mestiças, relativamente ricas, descendentes dos grandes
caçadores e comerciantes brancos que tinham explorado os recursos do sertão de
Lourenço Marques desde cerca de 1820. Estas famílias, ultrapassadas pelo fim do
comércio de marfim, entraram noutros campos económicos mais apropriados às
exigências da nova economia regional, nomeadamente, o recrutamento de
trabalhadores, comércio a retalho, e compra e venda de imóveis [12]. Em terceiro
lugar, havia um pequeno número de mulatos e negros que ocupavam posições
importantes no serviço militar e funcionalismo público [13].
A proeminência social dessa pequena burguesia deve-se ao facto de que, no
período pre-imperialista, as condições sócio-económicas e a atitude do poder
colonizador em relação às famílias mestiças e à assimilação dos negros, eram
diferentes do que viriam a ser no período entre 1885 e 1930. De facto, antes de
1885, isto é, antes da imigração de grande número de colonos brancos para
Moçambique, as famílias mestiças e os assimilados negros tiveram um papel
importante na expansão do comércio, administração e cultura portugueses em
Moçambique.
Por esta razão, antes de í885, a teoria de 'assimilação', segundo a qual os africanos
deveriams- governados pela mesma lei e condições que se aplicavam a cidadãos
portugueses, teve alguma expressão real para uma reduzida minoria em
Moçambique.
Depois de 1885, este quadro sofreu consideráveis alterações. Uma breve análise
da estrutura do comércio mostra como a emergente estratificação nacional e racial
resultou na exclusão da pequena burguesia moçambicana. A expansão dos
principais portos e cidades e a conquista das zonas rurais resultaram numa onda
de migração de colonos brancos à procura de oportunidades nos vários ramos de
comércio. A pequena burguesia branca de origem portuguesa tentou sempre
utilizar os seus privilégios políticos na luta para assegurar as melhores posições.
Capítulo 1
Deve-se notar, contudo, que a discriminação em beneficio de portugueses contra
os já estabelecidos comerciantes asiáticos, frequentemente reclamada por
pequenos comerciantes brancos, foi difícil. Interessadas na rápida expansão do
comércio rural de vinho (de Portugal) e têxteis (da India e Portugal), as burguesias
inglesa e portuguesa defenderam os indo-britânicos, cujo acesso ao oapital
comercial, rede de contactos no litoral e competência de negócios lhes davam
grandes vantagens na promoção das vendas nas zonas rurais. Por outro lado, o
comércio de trânsito para países vizinhos já era dominado por firmas estrangeiras,
maioritariamente inglesas.
Na concorrência pelo aproveitamento das restantes oportunidades, a nascente
pequena burguesia moçambicana foi colocada na defensiva pela agressividade
política dos aspirantes portugueses e pelas acções das instituições coloniais. Por
exemplo, através de um sistema de licenças oficiais, a Câmara Municipal de
Lourenço Marques impôs controles discriminatórios que, cada vez mais,
impediram aos comerciantes africanos o acesso ao mercado central, em beneficio,
dos brancos, que passaram a controlar, em grande parte, o abastecimento da
cidade. A divisão discriminatória das melhores terras nos arredores foi' também
utilizada para assegurar a acumulação dos estrangeiros. Desta forma, no
comércio, a pequena burguesia moçambicana foi efectivamente bloqueada,
restando-lhe, em geral, a possibilidade de ocupar posições subalternas no
emprego, em firmas não-portuguesas.
Além disso, no crescente aparelho estatal, os postos de emprego foram cada vez
mais reservados, na prática, aos brancos, e mesmo aqueles mulatos e assimilados
que já ocupavam lugares de importância, para além de sofrerem exclusão na vida
social, corriam o risco de serem discriminados através da reforma antecipada,
sendo os seus lugares ocupados por brancos [14].
A nível constitucional também, a pequena burguesia moçambicana encontrou
reveses. Como referimos, o estado colonial, levado por imperativos de
desenvolvimento económico capitalista e, em particular, pela necessidade de criar
uma força de trabalho muito barata e bastante controlada, elaborou uma série de
leis, regulamentos e instituições discriminatórias que visavam a definição e
identificação da população colonizada como 'indígenas'.
No que diz respeito aos assimilados e mulatos, esta legislação foi
Moçambique, 1885-1930
completada em 1917 por uma medida estabelecendo que, teoricamente, estes
também teriam de ser portadores de um documento comprovando o seu direito a
cidadania portuguesa e que não eram 'indígenas'. Embora revogada em 1921, foi
incorporada na consolidação geral da legislação em 1926, e representava para os
mulatos e assimilados a prova final de que o estado colonial pretendeu legalizar e
reforçar a discriminação, na base de raça, entre eles e os brancos. É de notar que
este conjunto de legislação contrariou as ideias de assimilação apregoada do
século passado e que 'assimilação', como termo oficial, tornou-se uma justificação
deológica do colonialismo, através da qual se pretendia esconder as barreiras
raciais (racismo institucionalizado).
A evolução da pequena burguesia moçambicana foi também influenciada pela
forma de educação disponível e, particularmente, pela expansão das igrejas
protestantes. Com efeito, não obstante a discriminação cada vez mais
institucionalizada na estrutura social e a determinação do regime colonial de
limitar as aspirações sócio-políticas do povo moçambicano, o sistema de ensino
não se orientou por um plano rigoroso ou padrão uniforme no período 1885-1930.
Por um lado, desde o início do período imperialista, colonialistas como Antenio
Enes e Mouzinho de Albuquerque, advogaram abertamente um sistema racista de
ensino em que a educação para os negros fosse restringida h formação de
trabalhadores manuais, necessários ao desenvolvimento capitalista da colónia.
Esta forma reduzida de educação era já sinónimo de 'civilização'. Por isso,
Mouzinho escrevia em 1898:
"O que melhor temos a fazer para educar e civilizar o indígena é desenvolver
praticamente as suas aptidões do trabalho manual e aproveitá-lo para
a exploração da província" [15].
De igual modo, o Governador-Geral de 1906 a 1910, Freire de Andrade,
preocupando-se com o problema das dívidas da colónia e com a necessidade de
um desenvolvimento rápido da economia, apesar das escassas fontes de capitais,
concluiu que a única educação a dar ao negro seria aquela que fizesse dele um
trabalhador.
No que diz respeito ao ensino das massas, predominavam para a maior parte deste
período as missões cristãs não-portuguesas (protestantes), que se estabeleceram
após 1880, a partir de sedes nos territórios vizinhos. Desde 1881, os missionários
metodistas da Junta Americana
Capítulo 1
para Missões no Estrangeiro [16] tentaram fundar várias missões na Província de
Inhambane, e abriram uma em Mount Selinda (na então Rodésia do Sul), que
tinha uma dependência em Gogoi na Província de Manica. A partir de 1890, a
Igreja Metodista Episcopal Americana substituiu as missões da Junta em
Inhambane. Em 1882, missionários protestantes anglicanos (da Inglaterra)
começaram a trabalhar na Província do Niassa, onde mais tarde abriram a missão
de Messumba, estabelecendo outras missões no sul, a partir de 1890. A Missão
Suiça (presbiteriana), que, em 1887, fundara a sua primeira estação em Rikatla
(cerca de 20 quilómetros de Maputo) e, em 1891, estabelecera um missionário na
corte real de Gaza, tinha 5 missões nas províncias de Maputo e Gaza por volta de
1930.
Até cerca de 1882, a Igreja Católica só mantinha paróquias que se destinavam aos
europeus, goeses e assimilados. Depois começou também a fundar missões em
meios africanos. Em 1911, havia aproximadamente 15 missões católicas,
localizadas nos centros principais de Moçambique. No mesmo ano, fundou-se em
Portugal o Instituto Nacional de Missões, com o objectivo de travar a expansão
das missões protestantes. Na década de 20, o estado português passou a ajudar
activamente a Igreja Católica. Estabeleceram-se, assim, entre 1911 e 1930, 27
novas missões nas províncias de Maputo, Zambézia, Tete e Nampula. No fim da
década de 20, o número de crianças nas escolas católicas tinha finalmente
ultrapassado o número de inscritos nas escolas protestantes [17].
As divergências que se semearam através da expansão das igrejas missionárias
não se restringiram somente à religião. Atingiram uma das bases fundamentais da
cultura moçambicana, a língua. Enquanto em geral as missões católicas
utilizavam apenas a língua portuguesa, que foi considerada pelos colonizadores
um veículo da legitima dominação cultural, as missões protestantes ensinavam,
muitas vezes, na língua da zona em que operavam.
Para uma rápida expansão do ensino destas missões em línguas africanas teria
contribuído a publicação dos livros em Ronga por Roberto Mashaba, entre 1885 e
1893 [18], e a tradução da Bíblia do inglês para o xitsua, iniciada pelos metodistas
americanos Wilcox e -Richards, auxiliados por Tizora Navess e David Maperre, e
concluída por M.M. Sicobele, entre 1901 e 1908 [19]. É também sabido que, na
mesma altura, as missões suiça e metodista fizeram omesmo para o Ronga [20].
Moçambique, 1885-I930
As actividades das missões protestantes, aliadas às suas fortes ligações com as
colónias inglesas vizinhas, deram lugar a protestos por parte de colonialistas
portugueses, que as acusaram de influenciar o povo moçambicano no sentido de
uma 'desnacionalização', em relação ao colonialismo e cultura portugueses. Com
efeito, alguns dos moçambicanos protestantes, que optaram, em geral, por postos
de emprego nas firmas privadas não-portuguesas [21], constituíram um novo e
distinto elemento da pequena burguesia nascente na cidade de Lourenço Marques,
no período entre 1885 e 1930.
4.4 Ultimos focos de resistência militar e o início do proto-nacionalismo
Após a resistência e a subsequente derrocada do apotentado estado de Gaza, que
constituía a maior ameaça ao plano de ocupação colonial, no sul de Moçambique,
alguns membros de proeminentes famílias de Gaza refugiaram-se no Transval. A
prisão, seguida da deportação do grande imperador Ngungunhana para os Açores,
teria também suscitado a vontade de voltar a pegar em armas para enfrentar de
novo o usurpador. Muitos eram, porém, os óbices à tamanha proeza, erguendo-se,
em primeiro lugar, a supremacia militar incontestável do inimigo e, em segundo, a
progressiva tomada de consciência dos derrotados de que a oposição à ordem
imposta por Portugal nunca mais podia, no futuro, basear-se exclusivamente nas
instituições tradicionais, seculares e religiosas.
A derrota da rebelião de Barué de 1917 [22], que marcou o fim das sublevações
armadas segundo moldes sócio-políticos tradicionais em Moçambique e África
Austral, e a ocupação do planalto dos Makonde em 1919-1920, confirmaram mais
uma vez essa convicção. [23].
No entanto, a evolução da nova estrutura sócio-económica após 1885 levou a
adopção de novas formas de contestação ao colonialismo. Essa contestação não se
baseava numa ideia desenvolvida de nacionalidade moçambicana nem da
reclamação de independência; não foi unificada nem coerente, e as formas em que
evoluiu foram claramente influenciadas pelo colonialismo. Por outro lado, as
ideias e acções revelavam, às vezes, uma certa independência de pensamento em
relação ao colonialismo, e contribuíram fundamentalmente para a sobrevivência
da cultura moçambicana. Por estas razões, podemos considerar essa contestação
Capítulo 1
como uma contribuição para o proto-nacionalismo, isto é, para os antecedentes do
nacionalismo moçambicano moderno.
A investigação histórica deste assunto até agora feita não nos permite um
tratamento aprofundado. Contudo, podemos constatar que uma das influências
que mais contribuiu para o desenvolvimento de novas formas de contestação foi a
expansão das missões, particularmente as missões protestantes, e a educação que
ofereceram. Para além do problema de 'desnacionalização', a que já referimos, do
ponto de vista do regime colonial, a au.;ência de controle do corpo docente, dos
currículos e dos manuais nas missões protestantes fez com que a formação e
exigências dos seus -beneficiários fossem incompatíveis com a dinâmica
capitalista colonial, assente sobre a exploração de massas pacificadas. Estes
indivíduos formados não aceitaram as normas de tratamento dos trabalhadores
braçais. Segundo o Administrador de Homoíne, na dé&ada de 20:
"Na província de Moçambique, . superabundam em todos os distritos os nativos
'letrados' - os assimilados, os quais não podendo ser todos atendidos nas suas
reclamações pelo direito de serem considerados aptos e nomeados para qualquer
lugar público, já pretendem associar-se em agremiações de classe, e fundar jornais
para atacar os poderes constituídos, não tardando muito que reclamassem o direito
de fazer propaganda política nacionalista, atacando e injuriando a raça europeia, a
semelhança do que tem sucedido,
e está crescendo nas colónias inglesas nossas vizinhas [241.
Estas atitudes de contestação foram evidentes entre o pessoal moçambicano das
igrejas protestantes, cujos catequistas eram considerados, por oficiais coloniais,
"os mais insubordinados, os mais avessos ao trabalho, os menos aproveitáveis de
todos os 'indígenas"' [25].
As igrejas 'separatistas'
De facto, a rejeição da subordinação manifestou-se com mais clareza nas
principais igrejas protestantes, que se separaram das missões religiosas europeias,
o que testemunha a consciência de religiosos moçambicanos da necessidade de
basear o seu desenvolvimento ideológico na cultura tradicional.
A primeira foi a African Gaza Church, fundada em 1907 por Benjamin Mavadhla
e outros moçambicanos residentes no Transval, que
Moçambique, 1885-1930
se separaram da Igreja Wesleyana. A identificação dos seus membros com o
antigo Império de Gaza manifestou-se numa justificação citada por Mavadhla
para a fundação da Igreja, nomeadamente, a referência bíblica à palavra 'Gaza'.
Não foi por acaso que, a esta Igreja, estava associado o nome de Simião Godide
Nqumayo, o herdeiro da linhagem real de Gaza, que vivia em Pissane, Transval,
"rodeado de muitos filhos dos emigrados a seguir a captura de Ngungunhane em
1895" [26]. Segundo a sua própria documentação, a Igreja teve sucursais noutras
partes da África do Sul e foi transplantada para a colónia de Moçambique em
1913 [27].
A informação citada, acrescentada aos conhecimentos relevantes da história da
África do Sul, mostra que as circunstâncias que conduziram à formação da Igreja
foram:
i) a conquista portuguesa de Moçambique e a penetração no sul do país do
capitalismo mineiro e agrícola da África do Sul, que resultou na emigração para
aquele território vizinho não só de trabalhadores moçambicanos como também de
representantes da casa real derrotada.
ii) a necessidade do povo de -uma expressão ideológica da sua identidade cultural
e da sua resistência contra a ocupação colonial,
visto que a oposição militar frontal era impossível.
iii) a incapacidade de algumas missões em Moçambique e na África do Sul de
acomodar as tradições sócio-culturais locais dos seus membros, de ultrapassar o
racismo dentro das suas próprias instituições, ou de separar-se suficientemente da
dominação política
colonial.
Foi em circunstâncias ,emelhantes que Sicobele, a quem já nos referimos, se
desligou da Missão Metodista Americana em Morrumbene, Inhambane, e juntou-
se a Victor de Sousa, então funcionário da administração em Inhambane, para
fundar, em Janeiro de 1918, a Igreja Episcopal Luso-Africana de Moçambique.
Sicobele, segundo suas palavras, fê-lo por "não querer servir mais os
estrangeiros..." [28], isto é, colonos portugueses e doutras nacionalidades.
De facto, os desígnios divergentes dos dois fundadores não tardaram a
desenvolver-se nos anos seguintes. Sousa participou na fundação da
Capítulo 1
Igreja "para combater, como diz, a 'desnacionalização' dos indígenas que
emigravam, e bem assim a influência das -missões evangélicas' estrangeiras que
contribuíam para essa 'desnacionalização"' [29]. Esta posição é bem patente no
relatório da sua II conferência anual que se realizou em Novembro de 1924, no
qual, inter alia, se afirmava:
"Os nativos súbditos de Portugal, vendo que os estrangeiros enviam seus
mi§sionários propagandistas em grande número a esta colónia, resolveram fundar
uma associação religiosa cristã Episcopal Egreja LusoAfricana [sici de
Moçambique, genuinamente portuguesa, para defender a soberania e a
Pátria" [301.
Sousa fundara a Igreja com o intuito de combater a 'desnacionalização' em relação
a Portugal. Sicobele, no entanto, recusando a língua portuguesa, e escrevendo em
xitsua e inglês, elaborou a história dos Tsua sublinhando a sua antiguidade e a
igualdade com a dos outros povos [31]. Analisando pormenorizadamente o texto
de história de Sicobele, suscitam-se-nos duas ideias fundamentais. A primeira é
que o autor recusa a inferioridade imposta e apregoada pelos colonizadores e
reivindica a igualdade. Trata-se de um caso raro no proto-nacionalismomoçambicano, pois, enquanto muitos escritores e poetas exprimiram a sua revolta
na língua do colonizador, desprezando as línguas nacionais [32], Sicobele fê-lo na
sua língua materna e, no desejo de que a sua obra pudesse transpor as fronteiras,
escreveu-a também em inglês.
A segunda, a mais importante, que constitui o objectivo final da sua contestação
cultural e que confirma a sua posição patriótica, é dada pelo slogan A África é dos
Africanos, que encontrou o seu eco em Lourenço Marques, em 1919, um pouco
depois da fundação da nova igreja. Este reforça ainda a sua decisão de não querer
servir mais os estrangeiros. Por esta razão, um investigador colonial concluiu,
mais tãÈde, que o texto "é um 'maná' para a propaganda nacionalista" [33]. A
discórdia e a disparidade de desígnios entre Sousa e Sicobele teria sido a causa
principal da cisão em 1925, após a qual Sousa fundou a Igreja Nacional Etiópica
Moçambicana [34].
O movimento associativo e literário Neste período, na história do movimento
associativo e literário de Lourenço Marques manifestou-se uma contestação do
colonialismo em
Moçambique, 1885-1930
várias questões [35]. Em geral, a sua posição foi reformista, no sentido de que
advoga melhoramentos dentro do sistema colonial. Desde o início da sua
actividade, protestou, por exemplo, contra a insuficiência da educação
proporcionada aos não-brancos pelo estado colonial. A elite moçambicana, cada
vez mais discriminada na colocação de empregados no aparelho colonial e nas
empresas, quis melhorar a qualidade e nível de ensino para concorrer melhor com
os imigrantes europeus e asiáticos. Mais tarde, reclamou contra a intensificação
das barreiras raciais no sistema educacional em si, particularmente, contra o
estabelecimento de um colégio europeu pela Igreja Católica [36].. Reivindicou a
cessação total da imigração de estrangeiros, quer europeus, quer asiáticos, que
ocupavam postos de emprego em detrimento dos moçambicanos. Em relação à
vida económica do país, reclamou contra os abusos do trabalho forçado, e
reivindicou uma maior valorização económica dos camponeses como produtores
137].
Ao nível político, o Grémio Africano e o seu jornal, O Brado Africano, deram
ênfase aos direitos civis que a Constituição portuguesa republicana garantiu,
teoricamente, sem discriminação de raça, a todos os indivíduos que tivessem
adoptado os usos e costumes da gente 'civilizada'. O lema do Grémio Africano era
"Somos portugueses". A sua explicação para o facto evidente de que o estado
colonial em Moçambique negava, cada vez mais, os referidos direitos aos não-
brancos residia na influência retrógada do racismo sul-africano entre os colonos
portugueses, devido à ausência de um controle efectivo a partir de Lisboa [38].
Mostrou-se, assim, o carácter do pensamento desta fracção da pequena burguesia
na altura: não sendo desenvolvida a análise da relação entre capitalismo,
colonialismo e racismo na África do Sul e em Moçambique, não se percebeu que,
após a conquista, o estabelecimento de uma rígida hierarquia racial contribuiu,
fundamentalmente, para manter o sistema de exploração económica nestes
territórios, de que a burguesia na Europa foi o beneficiário principal.
Com efeito, perante a debilidade económica de Portugal, em comparação com a
Grã-Bretanha, como colonizador na África Austral, e enganados sobre as
verdadeiras bases do racismo, os principais colaboradores de O Brado Africano
advogaram um reforço da influência sócioeconómica de Portugal, como o único
meio de enfrentar o racismo sulafricano.
Capitulo 1
Esta linha de argumentação manifestou-se e, com uma certa justificação na época,
nas questões da independência e da possível redivisão do território moçambicano.
Deve-se notar que, em 1910, a Grã-Bretanha concedeu independência à África do
Sul sob uma constituição essencialmente racista. Quando, na década seguinte,
alguns brancos reclamaram independência para Moçambique, O Brado Africano,
receando, sem dúvida, a consolidação do racismo branco nos moldes sul
africanos, argumentou com força contra tal reclamação. De igual modo, os
colaboradores de O Brado Africano receavam uma nova divisão das colónias
portuguesas em benefício da África do Sul, frequentemente proposta no período
da I Guerra Mundial, e que ressurgiu, nas décadas seguintes [39].
Desta forma, embora criticando aspectos do colonialismo, as vezes com acuidade,
a liderança do Grémio e os principais colaboradores de O Brado Africano
defenderam a integridade do colonialismo português. Colaboraram com algumas
das suas iniciativas, como, por exemplo, a nomeação, em 1928, sob a sua própria
proposta, de um dos membros fundadores do Grémio como propagandista
agrícola, pago pelo estado colonial, cuja tarefa era a de promover a integração do
campesinato nos planos coloniais de produção agrícola [40].
Para além disso, se bem que O Brado Africano fosse publicado com algumas
páginas em Ronga, a direcção frequentemente criticou as circunstâncias que
levaram a essa necessidade, nomeadamente, o uso das línguas moçambicanas nas
missões protestantes. Por razões semelhantes, chegou mesmo a advogar a
expulsão de missionários católicos não-portugueses. Neste respeito, o seu
pensamento era pouco diferente do dos principais ideólogos coloniais [41].
Por outro lado, é provável que os exageros do Grémio na defesa da cultura do
colonizador, aliados à posição relativamente privilegiada dos membros das velhas
famílias mulatas, que compunham a maior parte da direcção e dos colaboradores
(que escreveram em português) do jornal, levaram à aparência de acomodação
excessiva a uma hierarquia social colonial desvantajosa aos negros.
As divergências sócio-culturais implícitas nesta situação teriam conduzido à cisão
temporária do movimento associativo em Lourenço Marques, nos inícios da
década de 20, com a tentativa de formação de um 'Congresso Nacional Africano',
por elementos ligados às igrejas
Moçambique, 1885-1930
protestantes e outros decepcionados com o Grémio Africano. Parece que a
tentativa foi frustrada logo no início -por causas ainda desconhecidas [42].
5. Os conflitos do período 1915-1930
Passamos a rever, com certo detalhe, os conflitos no período 1915-1930,
importantes porque mostram algumas consequências do colonialismo português
em Moçambique, nomeadamente, a sua participação obrigatd'ria na I Guerra
Mundial, os efeitos dessa Guerra para a sociedade moçambicana e, finalmente, o
conflito político sobre o futuro carácter da exploração colonial.
5.1 A I Guerra Mundial e a crise económica e social da década de 20 Em Maio de
1915, Portugal aliou-se à Grã-Bretanha, França e Rússia na Grande Guerra contra
a Alemanha. Esta guerra exigiu a utilização de recursos materiais e humanos não
só dos países beligerantes, como também das respectivas colónias. A Portugal foi
atribuído o papel fundamental de ajudar a Grã-Bretanha na defesa das colónias
britânicas de África [43].
Estima-se, provisoriamente, em 100 mil o número de moçambicanos recrutados
obrigatoriamente, não só no centro do país (Barué), como também, e sobretudo,
nas províncias do norte e em Inhambane. Estes recrutados destinavam-se a
engrossar o exército português, que operava no norte de Moçambique contra as
forças alemãs vindas do então Tanganhica. Como o exército português não tinha
transporte motorizado, a vasta massa do contingente moçambicano servia para
carregar material e munições. Devido às pessimas condições de alimentação e
saúde, a taxa de mortalidade era muito alta, calculando-se que a maioria dos
recrutados terá morrido em serviço ou durante o regresso à casa, o que
representou uma perda sócio-económica considerável nas zonas rurais [44].
Logo ap6s o início da guerra, começaram a agudizar-se os defeitos do frágil
sistema económico português em Moçambique, com maior incidência no sector
financeiro. Isto traduziu-se na desvalorização contínua da moeda (Escudo), à
razão de 100 por centoentre 1914 e 1919, 200 por cento em 1920 e 600 por cento
entre 1921 e 1924 [45].
Capítulo 1
Na prática, isto resultou em aumentos sucessivos do custo de vida, e na queda dos
salários reais dos trabalhadores, quer rurais quer urbanos. Aumentou também
sucessivamente o mussoco, e o imposto de palhota que, nalgumas áreas, passou a
ser exigido em libras, tanto ao trabalhador migrante como aos outros
trabalhadores locais. Diminuiu cada vez mais a qualidade dos tecidos importados,
artigo fundamental no comércio rural.
Estes factores conduziram, por um lado, à migração para fora do país, onde a
atracção da libra esterlina e tecidos de melhor qualidade era cada vez mais
evidente e, por outro, à deserção do trabalho pouco remunerado. Assim,
agudizaram-se todos os problemas relacionados com o recrutamento de mão-de-
obra tanto pelo estado colonial, como por empresas capitalistas. Perante esta
situação, a administração colonial intensificou rusgas para o aprisionamento de
pessoas, que depois eram enviadas para o trabalho forçado nas companhias e
obras públicas.
. Por exemplo, nas províncias de Cabo Delgado e Niassa, o campesinato que já
tinha sido sujeito à pilhagem em produtos, dinheiro e mão-de-obra pela
Companhia do Niassa, agora tinha que enfrentar uma nova onda de exploração
levada a cabo pelos empregados dessa Companhia. Estes, recebendo cada vez
piores salários em termos reais, recorriam à agricultura, recrutando trabalhadores
à força, levando a que muitos camponeses organizassem e promovessem fugas
maciças. Calcula-se em dezenas de milhar o número de camponeses que fugiram
para o Tanganhica e a Niassalândia neste período [46].
Nas cidades de Lourenço Marques e Beira, os trabalhadores brancos, que
usufruíam de privilégios coloniais, desenvolviam as suas acções separadamente
dos trabalhadores negros, que em geral não gozavam dos mesmos direitos e, por
conseguinte, moviam uma luta paralela, embora ilegal. Desta forma, registou-se
uma série de greves em que os trabalhadores se manifestaram activamente contra
os efeitos económicos da crise. Das greves levadas a cabo em Lourenço Marques,
destacaram-se as dos ferroviários (brancos) em 1917 e 1920, as dos estivadores
(negros: 4 greves entre 1919 e 1921) e as do pessoal da empresa dos tranportes
urbanos (brancos) em 1916, 1920 e 1923 [47].
O estado colonial utilizou a estratégia de reprimir e dividir os trabalhadores, quer
negros, quer brancos, deportando os activistas brancos em 1920, e neutralizando
rapidamente as greves dos negros.
Moçambique, 1885-1930
Mas, às vezes, aliciou o reduzido número de assimilados assalariados, garantindo-
lhes algumas das regalias dos brancos.
Não obstante, a diferenciação de estatuto e tratamento dos brancos manifestou-se
bem evidente entre 1918 e 1920, ao ser concedido o pagamento em divisas da
maior parte do salário à maioria dos funcionários e trabalhadores brancos [48].
Nos anos seguintes, a crise manteve-se e veio a tomar proporções graves. O ano
de 1925 iniciou-se num autêntico clima de agitação. Foi-se desenvolvendo com
certa intensidade uma campanha a favor dos trabalhadores negros em Lourenço
Marques, através de O Brado Africano. Este apelava aos negros para se unirem e
lutarem por um objectivo comum.
Entretanto, os atropelos à lei eram prática corrente. Em Fevereiro de 1925, mais
de uma centena de trabalhadores negros recusou continuar a prestar serviço à
empresa Delagoa Bay Agency de Lourenço Marques, alegando maus tratos e
exigindo que os deixassem regressar às terras de origem. Pelo facto foram
imediatemente presos pela polícia colonial por ordem da Secretaria dos Negócios
Indígenas.
Em Junho, 300 trabalhadores negros dos Caminhos de Ferro de Lourenço
Marques reuniram-se junto à Casa dos Trabalhadores, manifestando-se contra o
não pagamento de um aumento salarial estabelecido pelo governo no ano anterior.
Entretanto, em todos os sectores de actividade continuavam a verificar-se as mais
flagrantes injustiças, desde violações às revisões salariais até ao despedimento
injustificado de trabalhadores.
Foi certamente animada pelo clima de descontentamento e agitação que pairava
sobre a cidade de Lourenço Marques que se deu em 13 de Agosto de 1925 a greve
dos trabalhadores da Delagoa Bay Development Corporation Limited, empresa
concessionária de diversos serviços urbanos (água, energia eléctrica e transportes
públicos). Os grevistas lutavam pela actualização de vencimentos.
Em Setembro de 1925, começou a greve dos estivadores negros do porto da
capital, reivindicando aumentos salariais e melhores condições sociais, seguindo-
se a greve dos trabalhadores ferroviários e portuários brancos, em defesa dos seus
interesses e privilégios, o que veio a transformar-se em greve geral. Iniciada em
11 de Novembro, a greve só viria a terminar em Março de 1926, tendo obrigado o
governo a declarar o estado de sftio na cidade. Finalmente, o governo colonial
neutralizou a
Capítulo 1
greve; foram presos e deportados para vários pontos de Moçambique os principais
dirigentes grevistas.
Em Agosto de 1925 estalou uma greve geral na Beira. Tratou-se da paralisação
geral e concertada de trabalhadores, funcionários e pequenos empresários
brancos, em protesto contra uma série de medidas decretadas pela administração
da Companhia Majestática. Assim, em 7 de Agosto, entraram em greve os
comerciantes, protestando contra o controle de divisas por parte da Companhia,
seguindo-se-lhes, por idêntico motivo, os pequenos agricultores colonos. Os
funcionários da Companhia entraram em greve em 2 de Setembro, exigindo uma
compensação salarial que cobrisse a depreciação da moeda e a alta do custo de
vida, entre outras reivindicações. A situação só voltaria à normalidade a 10 de
Setembro, tendo os grevistas conseguido uma vitória quase total, embora
temporária [49].
5.2 0 conflito sobre as bases da política colonial em Moçambique Na década de
20, para além dos conflitos entre a burguesia, por um lado, e o campesinato e os
trabalhadores, por outro, desenvolveu-se também um conflito político cada vez
mais aberto entre a burguesia metropolitana e uma parte da burguesia radicada em
Moçambique, nomeadamente os machambeiros colonos. A diferença não residia,
obviamente, na questão da exploração de mão-de-obra moçambicana, mas sim na
maneira específica de o fazer.
Os machambeiros colonos viam com bons -olhos a política económica da África
do Sul e da Rodésia do Sul para com a capitalização da agricultura colona. Tendo
conhecimento dos apoios financeiros e em infraestruturas (divisão sistemática das
terras, comunicações, investigação, ajuda de especialistas, etc.) oferecidos pelo
estado naqueles países vizinhos, exigiam do estado colonial português benefícios
semelhantes. Pensavam, assim, enriquecer através de uma maior utilização da
mão-de-obra moçambicana em plantações, propriedades agrícolas, criação le gado
e outros empreendimentos, especialmente no sul do país.
Este projecto contrariava o já estabelecido interesse da burguesia portuguesa e
inglesa em fazer uma acumulação, mais rápida e mais fácil, através da exportação
de mão-de-obra, evitando, assim, grandes investimentos fora das zonas mais
acessíveis do litoral do país.
No entanto. P voz dos machambeiros colonos era também a voz de
Moçambique, 1885-1930
alguns nacionalistas portugueses, que depois da onerosa participação de Portugal
ao lado da Grã-Bretanha na I Guerra Mundial, queriam aproveitar-se dessa aliança
para procurar capitais ingleses que melhor financiassem uma colonização
verdadeiramente portuguesa em Moçambique, em lugar do sistema tão
generalizado de trabalho migrat6rio em beneficio de outros. Queriam ainda
enfrentar as pretensões sul-africanas de ingerência activa no sul do país,
justificada pela alegada incapacidade dos portugueses de promover o
desenvolvimento de Moçambique [50].
Com efeito, a experiência da década de 20 na cultura de algodão, a matéria-prima

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